Ser brasileiro em toda a sua dimensão e patriota, sobretudo para aqueles que tiveram o privilégio e o benefício do ensino, sustentado quase todo ele na fase de alfabetização pelo Poder Público, é bater no peito e proclamar para que todos ouçam de Sul a Norte, de Leste a Oeste: eu leio!
E ser brasileiro e patriota é assumir compromissos claros para que os 15 milhões de brasileiros excluídos do acesso à escola e à educação formal possam um dia também gritar em uníssono: nós também lemos!
O ato da leitura está na raiz do verdadeiro cidadão, com capacidade ampliada para pensar a sua própria existência e desenvolver o espírito crítico, podendo fazer suas escolhas à luz de informações claras, sem a contaminação fraudulenta da manipulação e das notícias falsas. Claro, além de ser fonte de prazer, dimensão importante para se viver em comunidade e em um mundo cada vez mais asfixiante e competitivo, que empurra o ser humano à vala de infelicidades ampliadas e dolorosas.
Nesse sentido, não podemos deixar passar em branco o próximo 12 de outubro quando se comemora no Brasil o dia da leitura.
Mas o que está em jogo não é só o ato de se saber ler mecanicamente, também deve entrar no pacote de preocupações das políticas públicas a capacidade de se discernir o texto com qualidades informativas e estéticas daquele que vem sujo por inverdades, tão comuns nos tempos virtuais em que vivemos. Hoje, por exemplo, quem só lê as mensagens de redes sociais nos formatos oferecidos está se convertendo em um analfabeto funcional de outro tipo, com pouca contribuição aportada à sua gente, ao seu povo.
No campo das novas tecnologias, para se evitar as fakes news e o poder ciclópico e manipulador das grandes plataformas, urge a aprovação de regulamentações que preservem a democracia e a liberdade de pensar do brasileiro. Muitos projetos tramitam no Congresso em torno do tema e esperamos que, em breve, o país possa ter uma das legislações mais eficazes e modernas do mundo em relação ao tema.
Mas um outro passo deve ser dado: a busca de proteção e incentivo ao texto impresso, com foco no livro, nos jornais, nas revistas.
Sabemos todos nós, ninguém segura a marcha das conquistas tecnológicas e, obviamente, toda a herança de Gutemberg encontra-se sob a pressão do desenvolvimento. Mas, há espaços para que essas antigas plataformas de leitura se reorganizem, se estabilizem em novo patamar e continuem a dar a sua contribuição à cultura nacional. E o Poder Público, em articulação com a sociedade, cumpre papel essencial na busca de alternativas à crise.
Quanto à mídia, um passo a ser dado imediatamente, o Estado não pode ideologicamente persegui-la, sufocando-a economicamente, como virou rotina no governo Federal. Um segundo passo: há que se buscar equilíbrios de mercado para fortalecer os impressos, e nesse caso as grandes plataformas tecnológicas não podem fugir à sua responsabilidade no tocante a um projeto dessa natureza, de grande interesse nacional.
O livro, que acompanha em seus vários formatos a aventura humana em todo o mundo, também merece um olhar forte por parte do Poder Público. Livrarias – segundo o editor Martins Fontes, não devem existir mais do que 1000 delas no Brasil – devem ser incentivadas e um dos instrumentos que o governo federal tem em suas mãos é usar o livro didático para alavancá-las. Além do mais, deve-se abandonar de vez a ideia de cobrança de impostos sobre o produto, como está configurada na reforma tributária enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso nacional.
A defesa do livro deve entrar com força nos parlamentos, com mais destaque no Congresso Nacional, criando-se e fortalecendo-se frentes, bancadas e apresentando-se projetos de interesse do setor. A bancada do livro, inclusive, é uma ideia que o Cidadania vem defendendo nessas eleições municipais em todo o país.
Ler é mudar o Brasil, é mudar o mundo, é mudar as pessoas. Para melhor. (Congresso em Foco – 11/10/2020)
Eliziane Gama é senadora pelo estado do Maranhão e líder do Cidadania no Senado