NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE
O famoso magnata norte-americano John Davison Rockefeller começou a trabalhar com 16 anos, em 1855, como contabilista de um armazém de retalhos. De família modesta e religiosa, quando completou 19 anos, pediu demissão e partiu para seu próprio negócio: abastecer o Exército da União. Durante a Guerra Civil americana (1861-1865), vendeu uniformes, farinha, sal, sementes e carne de porco, concorrendo com o antigo patrão. Com o fim da guerra, mudou de ramo e comprou uma refinaria de petróleo, na qual fabricava querosene para iluminação. Em 1985, fundou a Standart Oil Company.
Chegou a controlar 90% das refinarias dos Estados Unidos, mas a Suprema Corte, em 1911, resolveu acabar com o monopólio da empresa e ordenou a criação de mais 30 companhias petrolíferas, origem das gigantes Exxon, Chevron, Atlantic, Mobil e Amoco, que continuaram sob seu controle acionário. Nessa época, Rockefeller era o homem mais rico do mundo, com uma fortuna pessoal de US$ 318 bilhões, transformando-se num mecenas das artes e patrono da educação e da pesquisa. Criou a Universidade de Chicago, museus, bibliotecas e um instituto de pesquisas médicas que leva seu nome. É dele a frase “o melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada; o segundo melhor negócio, uma empresa de petróleo mal administrada”.
A Petrobras, durante o governo Lula, conseguiu transformar uma refinaria de petróleo num péssimo negócio, com a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, segundo depoimento da ex-presidente da empresa Maria das Graças Foster, no Senado, quando a operação virou mais um caso do escândalo do petrolão. A ex-presidente Dilma Rousseff, que presidia o Conselho de Administração da Petrobras por ocasião da compra, alegou que aprovou a decisão sem saber dos anexos do contrato, com cláusulas muito desvantajosas para o comprador, negociadas pelo então diretor Nestor Cerveró, um dos condenados na Lava-Jato.
Ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF), por seis votos a quatro, rejeitou um pedido de suspensão da venda de oito refinarias e ativos da Petrobras a partir da criação de empresas subsidiárias. A iniciativa fora questionada pelo Congresso, que embargou a venda das refinarias de Landulfo Alves (BA), Presidente Getúlio Vargas (PR), Abreu e Lima (PE), Alberto Pasqualini (RS), Gabriel Passos (MG), Isaac Sabbá (AM), Lubnor (CE) e a Unidade de Industrialização de Xisto (PR), com o argumento de que Petrobras estava descumprindo um entendimento do próprio STF ao desmembrar a empresa-mãe para, em seguida, vender esses ativos sem autorização do Legislativo.
Endividamento
O relator do caso, ministro Édson Fachin, votou para conceder a liminar ao Congresso e suspender a venda dos ativos, porém, a maioria dos ministros do STF discordou. Seis ministros avaliaram que o entendimento da Corte não foi descumprido, e que as operações representam um desinvestimento por parte da estatal — e não uma fraude para repassar o controle acionário ao setor privado. A decisão é uma mudança de paradigma, comemorado pelo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, que foi indicado para o cargo pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, com a tarefa de mudar o perfil da empresa, que passará a se dedicar à exploração de petróleo, deixando as áreas de refino e distribuição para o setor privado.
Se a máxima de Rockefeller ainda vale, a venda das refinarias será um novo alento para Guedes, que, na quarta-feira, estava acusando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, de boicotar as privatizações. A decisão ainda será apreciada no mérito, mas a maioria que se formou no Supremo, dificilmente, mudará de orientação. Votaram a favor da venda das refinarias os ministros Alexandre de Moraes, que contestou o relator; Luís Barroso; Dias Toffoli; Cármen Lúcia; Gilmar Mendes; e o presidente do Supremo, Luiz Fux. Votaram com o ministro Édson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello.
A venda das refinarias, segundo a direção da Petrobras, servirá para reduzir o endividamento da empresa, que consome 35% do caixa gerado por suas operações. Somente em juros, essa dívida equivale a um sistema completo de produção, com plataformas, sistemas submarinos e poços, capaz de produzir 150 mil barris de petróleo por dia, com receita anual de US$ 3 bilhões. O objetivo de Castello Branco é obter mais recursos para concentrar as atividades da Petrobras na exploração de petróleo leve do pré-sal, antes que o óleo extraído em águas profundas e ultraprofundas deixe de ser um negócio rentável, por causa dos custos de exploração e da mudança de modelo energético em curso no mundo, principalmente no setor automotivo. (Correio Braziliense – 02/10/2020)