As desonerações feitas até agora sobre a folha de pagamento não exigiram das empresas nenhuma contrapartida no sentido de ampliar os empregos dos 17 setores beneficiados (eram 28 até abril de 2018), dentre eles os de calçados, call center, comunicação, têxtil, couro, construção civil e de infraestrutura, transporte metroferroviário, rodoviário coletivo e de cargas, automotivo, proteína animal, máquinas e equipamentos, tecnologia da informação, projeto de circuitos integrados.
A atual desoneração, de um lado, libera as empresas do desconto de 20% ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e, de outro, cobra alíquotas que vão de 2% a 4,5% sobre o valor da receita bruta. O benefício fiscal, que acabaria agora em dezembro de 2020, foi prorrogado até dezembro de 2021, por decisão de deputados e senadores, mas o presidente Jair Bolsonaro vetou a prorrogação. O Congresso Nacional, contudo, votará, nos próximos dias, pela derrubada do veto presidencial e o benefício assim ganhará mais tempo de vida.
Chama a atenção que não há uma só amarração no sentido de vincular o benefício à ampliação de empregos dentro desses setores desonerados. A lógica prevalecente é a de manter ou reduzir o mínimo possível os já existentes. Já passou do ponto ou da hora de enfim capital, trabalho e governo pactuarem um conjunto de medidas orientadas para erguer uma ação público-privada baseada no tripé formado pela desoneração com redução de jornada para geração de emprego.
Isso não é impossível de ser feito. A ampliação do emprego via redução da jornada de trabalho de 39 para 35 horas semanais na França, ainda no governo de Lionel Jospin (1997-2002), virou realidade ao garantir que a redução de impostos sobre a folha de pagamento para todas as empresas com mais de 20 empregados fosse acompanhada da redução da jornada de trabalho e da contratação de trabalhadores adicionais.
O desemprego é resultado de múltiplas causas, dentre as quais se destacam a chamada reestruturação produtiva (expressão da necessidade do permanente revolucionamento da ciência e da técnica aplicadas ao processo gerador de valor) e a dos descaminhos das políticas macroeconômicas recentes e agora, fundamentalmente, a causada pela pandemia no novo coronavírus.
A Covid-19 provocou um infarto econômico mundial e reconfirmou ontologicamente o trabalho – este eterno e necessário intercâmbio entre o gênero humano e a natureza para a reprodução da vida – como a força material fundante na gênese e no desenvolvimento do ser social. A retomada da atividade econômica deve ser pautada pela inovação necessária para colocar na ordem do dia, dentre outras questões, uma nova “geografia” do tempo do trabalho para que cada um trabalhe menos para que todos possam trabalhar. (Voz de Guarulhos – 10/09/2020)
Eduardo Rocha, economista