Jair Bolsonaro tem um caso antigo com as teorias da conspiração. Desde que virou deputado, em 1990, ele descreve o Brasil como um país à beira do comunismo. O fantasma vermelho nunca existiu, mas o ajudou a acumular sete mandatos.
No Planalto, o capitão continuou a combater inimigos imaginários. Ao enfrentar as primeiras dificuldades no Congresso, ele insinuou que haveria um complô para derrubá-lo. Ao ser criticado pelas queimadas na Amazônia, acusou o ator Leonardo DiCaprio de participar de uma trama contra a floresta.
Ontem Bolsonaro voltou a investir na ficção. Ao chegar da viagem à Índia, ele declarou que os problemas do Enem podem ter sido fruto de sabotagem. Na mesma entrevista, levantou suspeitas sobre a auditoria que não identificou fraudes no BNDES. “Tem coisa esquisita aí”, garantiu. Em ambos os casos, o presidente não apresentou nenhum fato concreto para sustentar o que disse.
A tese de um conluio para melar o Enem não para em pé. A lambança é de responsabilidade do Ministério da Educação, que permitiu a troca de gabaritos e demorou a reconhecer a extensão do problema.
Se houve sabotagem, ela foi promovida pelo próprio governo. Bolsonaro disse que escolheria todos os ministros por critérios técnicos, mas entregou o MEC a dois seguidores de Olavo de Carvalho. Ao nomear Ricardo Vélez e Abraham Weintraub, premiou a incompetência a serviço da guerra ideológica.
No caso do BNDES, o discurso conspiratório ajuda o presidente a disfarçar um vexame. Desde a campanha, ele prometia abrir a “caixa-preta” do banco. A tal auditoria custou R$ 48 milhões e não encontrou nenhum sinal de corrupção.
Bolsonaro não parece acreditar nas próprias cascatas, que usa como muletas para desviar a atenção de problemas. Mesmo assim, suas teorias ainda convencem muita gente. Segundo pesquisa do Instituto da Democracia, 45% dos brasileiros não confiam na contagem de votos do TSE. O presidente é o primeiro na fila para desacreditar as urnas eletrônicas. (O Globo – 29/01/2020)