MANCHETES
O Globo
Toffoli adia por 6 meses o uso de juiz de garantias
Acordo entre EUA e China pode afetar agronegócio
Chefe da Secom acusado de conflito de interesse
INSS: reforço militar equivale a 1/3 dos servidores
Segurança hídrica do Rio está ameaçada, diz UFRJ
Confirmada 2ª morte por contaminação de cerveja
Verbas para projetos na Antártica preocupam
Putin vai propor mudança para conservar poder
O Estado de S. Paulo
Agressores de mulher e homicidas não vão ter juiz de garantias
Matemática e Física ajudam PF a decifrar rede criminosa
Na recessão, País perdeu 17 fábricas
Bolsonaro desiste de subsídio para luz de templos
Aliados usaram fundo atacado pelo presidente
Década foi a mais quente da história
Startups com verba do SoftBank cortam vagas
Mineiros com medo de cerveja
Putin manobra para permanecer no poder
Folha de S. Paulo
Secretário de Bolsonaro ganha de contratadas pelo governo
EUA e China assinam primeira fase de acordo
Mesmo com Black Friday, vendas ficam abaixo do esperado
Toffoli adia em 6 meses o prazo para implantar juiz de garantias
Após adiamento, Brasil inaugura nova base para pesquisas na Antártida
Há ameaça real à segurança hídrica do Rio, diz UFRJ
Água usada em cerveja estava contaminada; já são três os mortos
Doria usa revista e fichamento para reprimir protestos
Câmara dos Estados Unidos envia impeachment de Trump ao Senado
Putin inicia plano para ficar no poder após 2024
Valor Econômico
Acordo EUA-China tem efeito limitado para soja brasileira
Rússia – Reforma sem mudança
Energia solar terá R$ 9,5 bi de investimentos
Governo revê normas de segurança no trabalho
Receita cobra IR sobre multa de Odebrecht
Uma ‘CVM’ para universidades particulares
EDITORIAIS
O Globo
Crise no INSS reflete letargia da máquina pública
A grande falha foi não se ter um plano para atender o público, e ainda havendo redução de pessoal
Era aparente a calmaria no início do ano para o governo. Um gigantesco engarrafamento de quase 2 milhões de pedidos de benefícios crescia nos guichês virtuais do INSS e iria abrir a agenda de problemas para o Planalto resolver em 2020. Anteontem, anunciou-se a convocação remunerada de 7 mil militares da reserva para reforçar os quadros de funcionários do Instituto, a fim de apressar o atendimento aos segurados.
Uma tarefa grandiosa, pois, como revelou terça-feira o secretário especial da Previdência, Rogério Marinho, a cada mês 990 mil novos pedidos de aposentadorias e de outros benefícios chegam ao INSS.
Havia pelo menos dois fortes motivos para o crescimento da pressão sobre os balcões do INSS. Um atua de forma permanente. Trata-se do envelhecimento crescente da população, que aumenta vegetativamente o número de aspirantes à aposentadoria. Outro, a perspectiva concreta de uma reforma na Previdência — tentada em 2016 no governo Michel Temer e anunciada por Bolsonaro. Começou cedo, portanto, a corrida à aposentadoria, para se escapar do risco de qualquer nova regra restritiva.
Tudo muito óbvio, mas o governo parece ter sido apanhado de surpresa. E não trabalhou como deveria, tampouco o INSS.
Por isso, o Ministério da Economia, a Secretaria Especial da Previdência e o Planalto estão sendo obrigados a correr para compensar um prejuízo. O que talvez não seja possível. Ao menos que se consiga estancar o crescimento da enorme fila de espera.
Esta lerdeza da máquina burocrática serve de grande exemplo em tempo real da paralisia atávica das estruturas governamentais, salvo exceções.
A corrida à aposentadoria também ocorre entre funcionários do INSS, onde há grande parcela de servidores em condições de se retirar do serviço público. No início do mês, segundo o GLOBO, havia 31.572 servidores do Instituto em condições de pedir aposentadoria, ou mais de um terço do quadro (34%). Apenas nos primeiros cinco dias úteis do ano, 676 funcionários se aposentaram. No Rio, os que podem sair do serviço ativo passam dos 55%.
O fato também não era desconhecido do governo. Tanto que o Ministério da Economia conta com esta retirada de servidores para reduzir o quadro do funcionalismo ativo, sem contratar novos servidores.
Sistemas automatizados passariam a fazer as tarefas dos servidores aposentados. Mas não se tem notícia de qualquer projeto sério e avançado neste sentido.
Esta crise no INSS não só chama a atenção para a proverbial inércia da burocracia pública, mas também ressalta a importância da própria reforma administrativa pretendida pelo Ministério da Economia. Sem uma gestão do funcionalismo feita em bases profissionais, técnicas, problemas como este voltarão a ocorrer.
O Globo
Problema da água no Rio é mais um exemplo de ineficiência da Cedae
Privatização da companhia que atende à Região Metropolitana não pode mais ser adiada
Há mais de dez dias moradores da Região Metropolitana do Rio enfrentam problemas com a qualidade da água fornecida pela Cedae. O que deveria ser incolor, inodoro e insípido, como se aprende na escola, tem chegado às torneiras das casas com aspecto turvo, mau cheiro e gosto ruim. O fenômeno já atinge 69 bairros da capital e seis municípios da Baixada Fluminense.
Ontem, quase duas semanas depois de surgirem os primeiros relatos sobre alterações num serviço essencial para os fluminenses, o presidente da companhia, Hélio Cabral, falou pela primeira vez sobre o assunto, durante entrevista coletiva. Pediu desculpas à população pelos transtornos, bebeu água da Cedae na frente dos repórteres, para mostrar que não há risco para a saúde, e disse que a situação será normalizada “muito em breve”, sem, no entanto, fixar prazo para uma solução.
Desde 7 de janeiro, a Cedae tem reiterado que o problema é causado pela presença da geosmina — substância orgânica produzida por algas — nos mananciais. Fenômeno natural, que não traria risco à saúde, segundo a companhia. Acontece que a geosmina pode explicar o mau cheiro e o gosto ruim na água, mas não a turbidez, como a própria empresa reconhece.
E, embora a Cedae tenha divulgado laudos atestando que a água atende aos padrões de potabilidade do Ministério da Saúde, a população não parece convencida. Tanto que tem esvaziado as prateleiras de água mineral nos supermercados, onde o produto já está em falta. Distribuidoras têm registrado aumento de até 30% nas vendas.
O problema na água que abastece cerca de 9 milhões de pessoas na Região Metropolitana é mais um capítulo na história de ineficiências da Cedae. Essa falta de compromisso com o Rio e outras cidades do estado fica patente nos números do ranking do saneamento feito pelo Instituto Trata Brasil. A capital caiu do 39º lugar, em 2018, para 51º no ano passado, ficando atrás de Curitiba, São Paulo, Goiânia, Palmas, João Pessoa, Belo Horizonte, Porto Alegre, Brasília, Boa Vista e Salvador. Embora o atendimento de água se aproxime da universalização (99,1%), o de esgoto tratado é de apenas 46%. Não surpreende que a cidade fluminense mais bem colocada na lista seja Niterói (10ª), onde o serviço é privado.
De fato, está na hora de privatizar a Cedae — já há uma modelagem sendo feita no BNDES — , como prevê o Regime de Recuperação Fiscal a que o Rio aderiu em 2017. Para isso, é preciso vencer a força das corporações, que trabalham para que fique tudo como está. Mas é tarefa inadiável. A segunda metrópole do país não pode ficar refém da inépcia da Cedae. É possível que a atual crise acabe “em breve”, como promete a estatal, mas outras geosminas virão.
O Estado de S. Paulo
Consumo, um foco de ânimo
Os novos números do comércio varejista melhoram um cenário marcado pelo forte recuo da indústria e pela estagnação dos serviços em novembro
Turbinado pela Black Friday, o comércio varejista vendeu 0,6% mais em novembro e acumulou 3,3% de avanço em sete meses seguidos de expansão. Os novos números melhoram um cenário marcado por forte recuo da indústria e pela estagnação dos serviços em novembro. As vendas de lojas, farmácias e supermercados confirmaram de novo a reanimação do consumo. Essa é uma condição essencial para a continuidade e a aceleração da retomada econômica em 2020. O Ministério da Economia elevou de 2,32% para 2,4% sua estimativa de aumento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. No ano passado, a expansão deve ter ficado em 1,12%, segundo a avaliação provisória da equipe econômica.
A animação dos consumidores em novembro é atribuível às promoções do varejo, inspiradas no modelo da Black Friday, e à liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do PIS-Pasep. Mais dinheiro do FGTS está sendo liberado neste ano. Os juros básicos, de 4,5%, permanecem no mais baixo nível da série histórica e isso também favorece as vendas de uma parte do comércio.
Os dados do varejo foram publicados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Mas a reativação do consumo, embora persistente, continua moderada. Apesar dos números positivos de 2019, o volume vendido pelo comércio varejista ainda ficou, em novembro, 3,7% abaixo do pico registrado em outubro de 2014, quando o País começava a cair na recessão. Mas há um detalhe positivo em relação a esse dado: essa é a menor distância em relação ao pico desde o início da recuperação econômica, há três anos.
Em novembro, o comércio varejista vendeu 2,9% mais que no mesmo mês do ano anterior. A comparação do período de janeiro a novembro com o de um ano antes também é positiva e mostra um ganho de 1,7%. Em 12 meses houve expansão de 1,6%. Houve perda de ritmo, porque no período encerrado em outubro o avanço acumulado havia sido de 1,8%. Além disso, as vendas do varejo ampliado – com inclusão de veículos, seus componentes e materiais de construção – diminuíram 0,5% de outubro para novembro, mas ainda acumularam ganhos de 3,8% no ano e de 3,6% em 12 meses. O recuo mensal decorreu da redução de vendas de automóveis.
A perda de vigor do setor automobilístico afetou outros segmentos industriais e prejudicou no fim do ano o desempenho geral da indústria, já insatisfatório em vários meses de 2018 e na maior parte de 2019. O pior dado de novembro foi a queda de 1,2% da produção industrial, depois de três meses de resultados positivos. Dezesseis das 26 categorias avaliadas na pesquisa tiveram produção menor que no mês anterior. O volume produzido em 12 meses foi 1,3% menor que o do período anterior. Além disso, em novembro a atividade industrial diminuiu em 11 dos locais pesquisados, incluídos os grandes núcleos da indústria no Sudeste e no Sul.
Não haverá efetiva e duradoura retomada do crescimento econômico sem a recuperação da indústria, especialmente da indústria de transformação, em crise há quase dez anos. Será necessário muito investimento em modernização e em capacidade produtiva, mas a curto prazo é preciso reduzir a ampla ociosidade das máquinas e equipamentos. Isso dependerá, em parte, de uma recuperação mais firme e mais intensa do consumo, ainda limitada por vários fatores, incluído o desemprego superior a 11% da força de trabalho.
A limitação do poder de consumo refletiu-se em novembro na estagnação da demanda de serviços. A produção de serviços diminuiu 0,1% de outubro para novembro e se manteve 9,8% abaixo do pico alcançado em novembro de 2014.
A redução de 1,5% nos serviços prestados às famílias ilustra as dificuldades ainda vividas pela maior parte dos brasileiros. A inflação das famílias de baixa renda, mais acentuada nos meses finais de 2019, agravou essas dificuldades e as tornou mais penosas.
Como pouco se fez pela redução do desemprego em 2019, as condições do mercado de trabalho ainda afetam a economia. Apesar de tudo, a retomada deve continuar.
O Estado de S. Paulo
Tragédias anunciadas
País não só corre o risco de uma nova tragédia como Mariana ou Brumadinho, como ignora a extensão desse risco e os meios de minimizá-lo
A julgar pelo último levantamento da Agência Nacional de Águas (ANA) sobre a segurança das barragens, o País não só corre o risco de uma nova tragédia como Mariana ou Brumadinho, como ignora a extensão desse risco e os meios de minimizá-lo. Isso porque a implementação da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) caminha a duras penas. A classificação das barragens está longe de ser completada e, no mais das vezes, a escassa fiscalização opera praticamente às cegas. Por conseguinte, são incipientes os processos de correção das irregularidades.
A PNSB foi estabelecida em 2010 para garantir padrões rigorosos de segurança e ampliar o controle público sobre as obras. As barragens enquadradas na PNSB devem elaborar seu Plano de Segurança da Barragem, consolidando dados e protocolos referentes à sua estrutura, operação e segurança. Definir se uma barragem se submete ou não à PNSB é portanto fundamental para fiscalizar suas condições e eventualmente punir as infrações e cobrar os responsáveis.
O relatório, feito com dados de 2018 – antes portanto da catástrofe de Brumadinho –, reporta que, das 17.604 barragens cadastradas, apenas 7.386 (42%) possuem algum ato de autorização. Em 3% dos casos não se sabe sequer quem é o empreendedor responsável. Até o momento, sabe-se que 4.830 barragens apresentam alguma das características que as enquadra na PNSB e 1.962 estão isentas. Para as demais 10.812 (61%) não há dados para saber se se enquadram ou não. Das que se enquadram, 68% apresentam Dano Potencial Associado alto e 23% apresentam Categoria de Risco alta, e 19% estão classificadas em ambos os padrões. Somente 30% das barragens implantaram o seu Plano de Segurança.
Das 5.086 barragens classificadas na Categoria de Risco alta, 28% o foram por alguma anomalia grave e 26%, por falta de informação. Pelo menos 68 barragens estão em situação “crítica”, ou seja, apresentam vulnerabilidades alarmantes, em geral pelo baixo nível de conservação. Em relação às barragens assim classificadas em 2017, 20 foram retiradas da lista, mas 25 não remediaram suas deficiências graves. Dessas barragens críticas, 60% pertencem a entidades públicas, na maior parte federais ou estaduais. Ou seja, do que se sabe, o maior risco de nova tragédia vem diretamente da negligência do poder público na manutenção de suas instalações.
Segundo a ANA, uma das razões para o parco progresso na implementação da PNSB é a estrutura dos órgãos fiscalizadores, em geral carentes de recursos humanos e financeiros, o que resulta em um baixo índice anual de fiscalizações.
Diante deste cenário, a ANA faz algumas recomendações. Dentre elas, que os fiscalizadores concentrem esforços para definir se as barragens sob sua jurisdição se enquadram ou não na PNSB, refinando seus cadastros e regularizando-as quanto à autorização. Das instâncias decisórias, a ANA reclama medidas que mobilizem um corpo estável para atuar na implementação da PNSB, já que a rotatividade dos técnicos é apontada como um dos complicadores. Além disso, sugere uma rubrica orçamentária específica para segurança de barragens, o que permitiria mais planejamento e controle. Para fortalecer e dinamizar a fiscalização, recomenda-se o estabelecimento de um plano plurianual de fiscalização, e a intensificação de parcerias com instâncias como a Defesa Civil, serviço geológico ou Polícia Militar. Junto a eles, e também aos empreendedores, é preciso harmonizar os Planos de Contingência e de Ação e Emergência.
A ANA aponta a necessidade de estudos a fim de criar uma fonte de recursos para dar sustentabilidade financeira às ações de segurança, em que usuários beneficiados contribuam com os empreendedores para as ações de operação, manutenção e segurança da barragem. Por fim, é preciso fomentar a cultura da prevenção e não da remediação, promovendo não só junto aos empreendedores, mas à população, a divulgação de informações e protocolos relacionados à segurança.
O Estado de S. Paulo
Caneladas e barbeiragens
‘Barbeiragens’ cometidas pela Subchefia de Assuntos Jurídicos são inadmissíveis num país que se pretende sério
A tumultuada relação do presidente Jair Bolsonaro com o Congresso, uma das marcas de seu primeiro ano de mandato, é fruto tanto da má concepção que o chefe do Poder Executivo tem do papel do Poder Legislativo e da democracia representativa como das “barbeiragens” que foram cometidas no período por um dos órgãos mais estratégicos do governo, a Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ), ligada à Secretaria-Geral da Presidência. À frente dos dois órgãos está o ministro Jorge Oliveira, um dos mais próximos auxiliares do presidente.
O alto número de rejeição aos projetos do Poder Executivo enviados ao Congresso em 2019 – Jair Bolsonaro é o presidente com a pior taxa de conversão de projetos em lei desde a redemocratização do País, em 1985 – deve-se, em grande medida, ao bem conhecido desprezo do presidente pela construção de uma base de apoio parlamentar pautada por valores republicanos e a uma visão turvada que tem do Poder Legislativo, entendido como mero carimbador das propostas oriundas do Palácio do Planalto.
Muitos decretos, medidas provisórias e projetos de lei caíram sob o crivo do Poder Legislativo porque foram pessimamente concebidos no conteúdo e, sobretudo, na forma.
Talvez inspirado pela expressiva votação que recebeu, o presidente Jair Bolsonaro arvorou para si o papel de intérprete fidedigno das vontades do “povo”, ignorando o fato de que 513 deputados federais e 81 senadores, a rigor, têm tanta representatividade quanto a Presidência da República, ou mesmo mais. Essa confusão, ora acidental, ora deliberada, fez com que alguns temas caros ao presidente Bolsonaro e a seus apoiadores mais aguerridos perdessem força no Congresso, onde outros atores sociais e interesses, não necessariamente afinados com a agenda presidencial, também estão representados.
Ajudou a baixa conversão legislativa do Poder Executivo no ano passado a péssima qualidade técnica das propostas enviadas ao Congresso. A responsabilidade por garantir o apuro jurídico dos projetos que saem do Palácio do Planalto é da SAJ, órgão que historicamente sempre foi vinculado à Casa Civil, mas que em junho de 2019 passou à alçada da Secretaria-Geral da Presidência. A quem a SAJ está subordinada é a questão menos importante, mero arranjo administrativo que o presidente decida dar a seu governo. O que causa espanto é o número das chamadas “barbeiragens” cometidas pela Subchefia que tem por missão justamente servir como o último filtro do rigor jurídico das propostas do Poder Executivo antes que elas atravessem a Praça dos Três Poderes.
O ministro Jorge Oliveira, advogado e policial militar da reserva da Polícia Militar do Distrito Federal, assumiu a SAJ no início do ano passado. Desde então, já deu aval para aumento de gastos sem dotação orçamentária, para reedição de medidas provisórias de igual teor no mesmo ano, o que é proibido pela Constituição, e chancelou a edição de decretos que continham dispositivos claramente inconstitucionais. Alguns dos erros são tão primários que comprometem bem mais do que apenas a qualidade técnica dos projetos do Executivo: depõem contra a própria Presidência da República, que parece não ter feito nada para evitar o constrangimento dos “pitos” que recebeu de ministros do Supremo Tribunal Federal, de parlamentares e de membros de outros órgãos do governo.
Por trás desses erros pode haver método. O presidente Jair Bolsonaro estimulou em um sem-número de ocasiões o embate entre os seus apoiadores e o Congresso, como se este fosse um anteparo aos bons desígnios do presidente, que envia os projetos pedidos pelo “povo”, mas os parlamentares não fazem a sua parte. Um de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro, chegou a dizer que “por vias democráticas” seria muito difícil “transformar o País”.
Seja por incompetência, seja por método, as “barbeiragens” cometidas pela SAJ em 2019 são inadmissíveis em um país que se pretende sério. Oxalá a má experiência suscite mais humildade e estudos neste ano.
Folha de S. Paulo
Nova realidade
Com aumento de idosos, país precisa de políticas para empregar os mais velhos
A população brasileira vive um processo acelerado de envelhecimento e projeções do IBGE apontam para um salto na quantidade de pessoas com 65 anos ou mais de 9,8% neste ano para 20% em 2046. Em 2060, cerca de um quarto do total entrará nessa faixa etária.
Apesar do prognóstico, o Brasil carece de um debate mais maduro sobre políticas que possam garantir um envelhecimento digno a todos. Aqui, não se trata de falta de leis, pois desde 2003 os que têm 60 anos ou mais contam com uma série de direitos assegurados pelo Estatuto do Idoso.
Entre eles, há gratuidade no transporte público, vagas exclusivas, meia-entrada em atividades culturais, acesso a remédios e pensão alimentícia a quem não consegue prover o seu sustento.
Embora necessárias, essas políticas assistenciais podem não ser suficientes diante dos desafios de empregabilidade que os idosos agora têm após a aprovação da reforma da Previdência. Para se aposentar, as mulheres deverão trabalhar até os 62 anos; os homens, até os 65.
Muitas vezes ignorado no debate sobre discriminação, o preconceito etário é uma realidade dura para muitos idosos à procura de emprego, além de configurar crime punível com seis meses a um ano de reclusão pelo Estatuto do Idoso.
A criminalização, porém, não dá conta de combater os vieses etários no setor privado, pois é intrínseco do preconceito encontrar formas sutis de praticar a discriminação, o que dificulta atestar na prática casos em que há violação da lei.
Combater isso requer, entre outras medidas, melhorar processos seletivos para valorizar a experiência adquirida pelos mais velhos e desenvolver habilidades desse público para encontrar vagas.
A perpetuação do preconceito contra pessoas idosas também não deixa de ser danosa para a economia, já que priva o mercado de profissionais bastante capacitados.
Atentas a esse fato, as universidades brasileiras já aumentaram, entre 2010 e 2017, o total de professores com 50 anos ou mais de 33,7% para 37,9% nos cursos de graduação e pós-graduação.
Em um mercado de trabalho cujo futuro prevê a extinção de carreiras tradicionais, cabe ao poder público pensar políticas de capacitação para a população idosa, mas sem deixar de cuidar daqueles em situação de vulnerabilidade —em 2018, segundo dados oficiais, houve aumento de 13% nos casos de violência contra idosos no país.
Sem medidas para o crescente índice de abandono e de maus-tratos contra a população mais velha e políticas para melhorar sua empregabilidade daqui em diante, muitos dos direitos dos idosos podem acabar limitados apenas à letra da lei nas próximas décadas.
Folha de S. Paulo
Fora dos trilhos
Projetos ferroviários mal concebidos em SP e em MT agravam o panorama do setor
O transporte ferroviário no Brasil padece de muitas mazelas, dentro e fora das cidades. Mesmo nos maiores centros urbanos, há baixíssima cobertura geográfica de modalidades como o metrô e dos veículos leves sobre trilhos, ou VLT.
Fora dos municípios, a malha para o transporte de carga é ultrapassada e limitada. No setor de passageiros, quase inexistente.
Estudo da Confederação Nacional da Indústria mostra que cerca de 30% dos trilhos no país estão inutilizados e que 23% não têm mais condições de operar. Dos 28 mil km da malha ferroviária nacional, 8,6 mil km não estão em uso.
Desde 2001, o fluxo transportado por trens teve crescimento médio anual de 3,8%, mas quase que exclusivamente em razão da expansão do transporte de minério de ferro.
No transporte inter-regional de passageiros, os dois únicos serviços regulares em operação (Vitória-Minas e Carajás) deslocam apenas 1,2 milhão de pessoas por ano. Como comparação, a norte-americana Amtrak atende 32 milhões.
O atraso na área adentra as cidades. São Paulo e Rio, por exemplo, têm sistemas de metrô e VLTs relativamente organizados, mas incompatíveis com a demanda existente. No segmento de trens urbanos são recorrentes os problemas de segurança e atrasos.
Diante desse panorama, são lamentáveis as conclusões de duas recentes reportagens desta Folha.
Em São Paulo, a via que liga o centro da cidade ao aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, foi entregue em 2018 ao custo de R$ 2,3 bilhões. A linha 13-Jade possui trens que comportam 2.000 passageiros por viagem, mas eles têm transportado, em média, apenas 35 (2%).
Entre seus maiores problemas está o fato de a linha não chegar aos terminais do aeroporto, obrigando os usuários, carregados de malas, a tomar um ônibus para completar o trajeto. Mais R$ 175 milhões deverão ser gastos para reparar o imperdoável erro de concepção.
Em Cuiabá (MT), outro exemplo de descaso é o abandono das obras do VLT que ligaria o centro da cidade ao aeroporto Marechal Rondon. Prevista para terminar em 2014, a obra foi abandonada e, em seu percurso, restaram esqueletos e entulho que afugentaram o comércio e atrapalham o trânsito.
Em grave crise fiscal e com investimentos no mínimo histórico, o poder público no Brasil não pode mais se dar ao luxo de tocar obras desse tipo, sem viabilidade financeira ou com projetos descabidos.
Valor Econômico
Produção agrícola promete um novo recorde neste ano
Os números mostram também que a torcida para a melhora da economia brasileira neste ano pode contar com o suporte da agropecuária
O Brasil caminha para marcar mais um recorde na produção agrícola, indicam as previsões mais recentes. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgou na semana passada a estimativa de que a safra 2019/20 de grãos vai atingir 248 milhões de toneladas, projetando crescimento de 2,5% em relação à anterior, acima do que havia previsto em dezembro. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também elevou os números anteriores e agora prevê aumento de 0,7% da safra, para 243,2 milhões de toneladas.
Uma combinação de clima favorável, disponibilidade de crédito, aumento da área plantada e da produtividade sustentam o novo recorde. De acordo com os dados da Conab, a área plantada total estimada aumentou 1,5%, para 64,2 milhões de hectares, e a produtividade média, calculada em 3.864 quilos por hectare, avançou 1% na mesma base de comparação.
Os registros recordes serão puxados pela soja, desta vez, e não pelo milho como foi no ano passado. A colheita da soja desta safra começou nos últimos dias em Mato Grosso, principal produtor do país, com algum atraso (Valor 13/10). A falta de chuva retardou o plantio em várias regiões, mas a comercialização está adiantada. O Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) notou que já há negociação até da próxima safra, estimulada pela elevação dos preços na bolsa de Chicago, pela boa relação de troca com fertilizantes e pelo comportamento do câmbio. O bom desempenho da produção em Mato Grosso vai neutralizar os resultados do Rio Grande do Sul, que serão prejudicados pelas chuvas irregulares no período de plantio.
A soja responde por nada menos que 1,1 milhão do aumento de aproximadamente 1,4 milhão de toneladas previsto pela Conab no volume total da safra deste ano. A colheita da oleaginosa alcançará o recorde de 122,2 milhões de toneladas, um aumento de 6,3% em relação à safra 2018/19. Os números do IBGE não são muito diferentes: estima uma colheita de soja em 122,4 milhões de toneladas, com aumento de 7,8% acima do registrado no ano passado.
Avaliações do setor privado são ainda mais otimistas. A Agroconsult fala em uma colheita de soja de 124,3 milhões de toneladas, impulsionada pelo aumento de 2,2% da área plantada -36,7 milhões de hectares. Há quem veja nisso reflexo do comportamento do mercado em 2019, quando os chineses ampliaram as compras do Brasil, resultado do atrito comercial com os EUA, outro grande produtor de grãos. Agora que os dois gigantes parecem se encaminhar para normalizar as relações, resta saber os reflexos na produção brasileira. A intenção dos produtores brasileiros é liderar a exportação de soja.
Já a produção de milho deve ser menos exuberante, mesmo sobre uma base de comparação elevada. Somando a primeira, segunda e terceira safras, a Conab prevê 98,7 milhões de toneladas de milho produzidos, 0,3% acima do projetado em dezembro, mas 1,3% menor que o da safra anterior. O resultado será prejudicado porque a segunda safra tende a sofrer redução de 3,1%, para 70,9 milhões de toneladas, em consequência do clima.
Em relação aos demais principais produtos agrícolas, poucas foram as mudanças nas previsões. A Conab ajustou a projeção para o algodão para 2,8 milhões de toneladas, um aumento de 1,1% em relação à temporada passada. No caso do arroz, a colheita foi ajustada para 10,6 milhões de toneladas, 1% mais que em 2018/19; no feijão, o volume total das três safras do ano foi mantido em 3 milhões de toneladas. Já no caso do trigo, do qual o Brasil é um dos grandes importadores, a Conab reduziu levemente a estimativa para a colheita.
Estudo do Bradesco mostra o Brasil como responsável por mais de um terço da produção mundial de soja, à frente dos Estados Unidos, responsável por quase 30%. O Brasil exporta pouco mais da metade da produção da oleaginosa e quase 20% do algodão, enquanto a China concentra 57% das importações globais da primeira e 24% do segundo. Das exportações brasileiras de soja, 75% vão para a China e 10% para a Europa. Os números expõem bem como o Brasil é afetado pelo clima das relações entre os Estados Unidos e a China.
De toda forma, os números mostram também que a torcida para a melhora da economia brasileira neste ano pode contar com o suporte da agropecuária, que tem um peso de 5,5% no Produto Interno Bruto (PIB), quase o mesmo dos 5,4% da construção civil. O PIB da agropecuária deve crescer ao redor de 2% neste ano, acima do esperado para 2019.