MANCHETES
O Globo
Trump anuncia taxação do aço do Brasil e da Argentina
Exportação para China provoca alta do preço da carne
Privatização do BB já é discutida pela equipe de Guedes
PMs de baile funk são afastados; Doria isenta tropa de culpa
Cientistas da UFRJ lideram nova descoberta sobre ELA
Vereadores se articulam para CPI da Sacolinha
Novo presidente da Funarte liga rock a satanismo
Nova cracolândia cresce em terreno doado ao Museu Nacional
Escola Britânica aciona polícia após ameaça de morte de ex-professor
Secretário-geral da ONU: ‘Mundo vive um ponto crítico’
Oposição venezuelana sobre desgaste por casos de corrupção
O Estado de S. Paulo
Em revés para governo, Trump diz que vai taxar aço brasileiro
Seis PMs são afastados após mortes em Paraisópolis
Feliciano é o campeão em emendas liberadas
Pior novembro em 4 anos na balança
Abertura de capital da XP pode passar de US$ 2 bilhões
Folha de S. Paulo
Trump diz que vai retomar tarifas sobre aço do Brasil
Policiais de Paraisópolis dão versões diferentes
Doria afirma que repressão a bailes não vai mudar
Teste expõe estagnação da educação nacional
Chefe de comunicação de Bolsonaro distorce e erra ao contestar Folha
Primeira a presidir AMB declara que não é hora de discutir o Judiciário
Beatles vieram instaurar o comunismo, diz novo presidente da Funarte
Valor Econômico
Trump taxa aço brasileiro e constrange Bolsonaro
Braskem deve ser vendida em até 3 anos
‘PSDB não pode se apresentar à direita do que é’, diz governador
Dívida bruta vai ser de até 78% do PIB neste ano, prevê Mansueto
O colapso na OMC e o risco da lei da selva
Acordo entre MP e Cade vai renovar regulações
EDITORIAIS
O Globo
Populismo eleitoral de Trump atinge o Brasil
Bolsonaro, que pensava receber tratamento especial da Casa Branca, tem mais uma lição de realidade
A decisão do governo Trump de não apoiar, por enquanto, a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) já serviu de alerta a Bolsonaro para não confundir relacionamento pessoal e afinidades ideológicas com interesses políticos e diplomáticos. O presidente brasileiro voltou de sua visita à Casa Branca, em março, com o ar triunfante de quem abrira um canal de comunicação pessoal com Trump.
Com a indicação do filho Eduardo para a embaixada brasileira em Washington, Bolsonaro pareceu entender que ele se tornaria interlocutor privilegiado com a cúpula do poder Executivo americano.
A realidade se mostra diferente. Bolsonaro recuou no lançamento do filho para o principal posto no exterior do Itamaraty e ontem o presidente e seu governo foram surpreendidos pelo anúncio feito por Trump, por um tuíte, seu meio de comunicação predileto, de que decidira restabelecer tarifas sobre importações de aço e alumínio de Brasil e Argentina, devido à “maciça desvalorização” de suas moedas, o real e o peso, contra os interesses do agronegócio exportador americano.
Quem no Planalto ainda acreditava na diplomacia do relacionamento pessoal teve um baque. Sabe-se que os governos transitam na diplomacia movidos por seus interesses, e que o de Trump é guiado hoje e cada vez mais pelos objetivos de reelegê-lo no ano que vem e livrá-lo do processo de impeachment que tramita na Câmara dos Representantes. Duas metas que se confundem, e devem ser perseguidas a qualquer custo, de acordo com o estilo trumpista.
A alegação de que Brasil e Argentina forçam grandes desvalorizações cambiais para aumentar a capacidade de competir no mercado exterior é falsa. Trata-se da mesma acusação que a Casa Branca faz à China, neste caso com razão, devido ao controle que o Estado chinês exerce sobre a economia.
O câmbio do Brasil é flutuante desde 1999, com o Banco Central intervindo apenas para conter oscilações muito fortes, para cima ou para baixo. Não visa a inverter tendências. A moeda argentina, por sua vez, acumula grandes desvalorizações devido ao risco político da volta de Cristina Kirchner ao poder, como vice de Alberto Fernández. E muito porque, mais uma vez, o BC argentino ficou sem divisas, circunstância em que o câmbio sempre se desvaloriza fortemente .
O movimento de Trump tem visível intenção eleitoral, para reter e ampliar o eleitorado de regiões americanas que sofreram com a desativação de usinas e metalúrgicas, entre outras, incapazes de competir com China e até mesmo Brasil. Trump modelou o discurso populista do “América, primeiro” e defende o isolacionismo, o “antiglobalismo”, para este eleitor e os dos bolsões do agronegócio.
O governo Bolsonaro é atingido por uma espécie de bala perdida. Precisa saber as razões pelas quais Trump aperta o gatilho.
O Globo
Tragédia em favela de Paraisópolis expõe despreparo das polícias
Em São Paulo, ação da PM durante baile funk terminou com nove pessoas mortas
A desastrosa ação da polícia que terminou com nove pessoas mortas num baile funk em Paraisópolis, Zona Sul de São Paulo, na madrugada de domingo, deve servir de reflexão para autoridades de segurança de todo o país. O trágico episódio não é fato isolado. Ao contrário. O despreparo das polícias tem ficado evidente em operações cada vez mais letais em diferentes estados.
No caso de Paraisópolis, a polícia alega que fazia uma operação na comunidade quando dois homens atiraram contra os agentes e fugiram em direção ao baile, o que teria causado o tumulto generalizado. Testemunhas contam outra versão. Segundo elas, os policiais fecharam as saídas principais do evento, deixando as pessoas encurraladas.
Independentemente do que tenha acontecido de fato — espera-se que tudo seja apurado com rigor e isenção —, percebe-se que a polícia não está preparada para lidar com multidões. Estima-se que havia cerca de 5 mil pessoas no Baile da 17, como é conhecido o evento que atrai para a favela moradores da capital e de cidades vizinhas. Num cenário caracterizado por becos e vielas, a polícia usou bombas de efeito moral e balas de borracha. Ora, o que se esperava que acontecesse? É óbvio que haveria tumulto e pessoas pisoteadas.
Chama a atenção também a ação truculenta dos policiais. Vídeos gravados por moradores e exibidos domingo no “Fantástico”, da Rede Globo, mostram PMs chutando pessoas caídas no chão.
No Rio, a morte da menina Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, no Complexo do Alemão, em setembro, também expôs os desacertos das ações policiais. Segundo as investigações, um PM atirou num suspeito, mas a bala bateu num poste, e um dos fragmentos atingiu a menina, que estava dentro de uma Kombi. Não deveria ser difícil imaginar que, no entorno do tal suspeito, havia dezenas de pessoas inocentes.
Também no Rio, ao fim da festa da torcida do Flamengo pelo título da Libertadores, no Centro, em 24 de novembro, PMs, em procedimento questionável, usaram bombas de efeito moral e apontaram armas para a multidão.
Lamenta-se que governadores dos dois maiores estados do país, João Doria (SP) e Wilson Witzel (RJ), sigam a linha bolsonarista de enfrentamento do crime a qualquer custo, sem medir as consequências.
Episódios como esses mostram o equívoco do projeto de excludente de ilicitude proposto pelo presidente Jair Bolsonaro, que pretende extinguir a punição a policiais que matam em serviço. Espécie de licença para matar.
Entende-se que os altos índices de violência exijam rigor das polícias. Mas elas precisam agir dentro da lei, e com protocolos, para proteger inocentes. Caso contrário, PMs correm o risco de se igualar a seus inimigos.
O Estado de S. Paulo
Nova ameaça do amigo Trump
É difícil dizer se a passividade de Jair Bolsonaro diante de uma evidente agressão reflete seu despreparo, uma espantosa ingenuidade ou incompreensão do que se passa no cenário internacional. Ou será uma mistura de tudo isso?
Guia espiritual, modelo ideológico e inspirador diplomático do presidente Jair Bolsonaro, o presidente norte-americano, Donald Trump, voltou a ameaçar o Brasil com barreiras à importação de aço e alumínio. Segundo ele, o governo brasileiro vem promovendo “maciça desvalorização” de sua moeda e prejudicando, com esse expediente, o comércio exterior dos Estados Unidos. A acusação e a ameaça valem também para a Argentina. A depreciação do real e do peso barateia produtos brasileiros e argentinos, facilitando uma competição desleal com os industriais e agricultores americanos. Essa é a essência do argumento. Teria sentido se a acusação fosse verdadeira. Mas chega a ser uma perversão acusar os governos de Brasília e de Buenos Aires pela desvalorização de suas moedas nacionais. Trata-se de evidente fenômeno de mercado, como percebe qualquer pessoa razoavelmente informada.
Indagado sobre a ameaça, num contato com a imprensa, o presidente Bolsonaro prometeu conversar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e, se necessário, buscar um contato com o presidente americano. “Se for o caso, ligo para o Trump”, disse Bolsonaro, acrescentando ter “canal aberto” com a Casa Branca.
Mais uma vez o presidente brasileiro misturou o relacionamento pessoal – real ou imaginário – com assuntos de governo e projetos políticos. O presidente Donald Trump está obviamente movendo peças num jogo de seu interesse – e, até certo ponto, de interesse de segmentos da produção americana. A economia dos Estados Unidos continua em crescimento, mas sinais de enfraquecimento têm sido apontados por analistas. Alguns apontam risco de recessão.
Há divergências quanto a esse risco, mas o presidente, candidato à reeleição e ainda sujeito a um processo de impeachment, tem evidente interesse em preservar o apoio de seu eleitorado, em boa parte favorável ao protecionismo, e em evitar más notícias econômicas desde a fase pré-eleitoral.
O ataque ao Brasil e à Argentina é basicamente uma ampliação do conflito comercial entre Estados Unidos e parceiros bem mais fortes e ameaçadores que qualquer país sul-americano. A China é o principal adversário. Em segundo lugar está a União Europeia.
Acusações de manipulação cambial têm sido dirigidas ao governo chinês e, de vez em quando, a autoridades alemãs, embora a Alemanha seja apenas um dos integrantes da zona do euro. É o sócio mais forte, sem dúvida, mas é uma evidente fantasia acusar o governo alemão de provocar a depreciação da moeda comum.
No caso do Brasil a fantasia colide com dados perfeitamente visíveis do dia a dia. Para conter a instabilidade, o Banco Central (BC) tem vendido grandes volumes de dólares no mercado cambial. Qualquer participante do mercado – e isso inclui muitos investidores estrangeiros – conhece muito bem esses fatos. A aparente ignorância do presidente Trump e de gente de seu governo é tão notável quanto suspeita.
Entrevistado ontem por uma tevê americana, o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Wilbur Ross, falou sobre negociações com a China, falou em novas tarifas se falhar um acordo e depois foi questionado a respeito de Brasil e Argentina. “Nossos melhores aliados precisam também cumprir as regras”, respondeu, concentrando-se no problema do real. Então, repetiu a acusação e a ameaça de Trump. Mas é preciso respeitar regras formuladas por quem?
Nenhuma regra cambial ou comercial foi violada por autoridades brasileiras ou argentinas, exceto, talvez, alguma regra inventada por Trump. Sua ameaça é mais uma exibição de sua conhecida truculência. “Espero que Trump tenha entendimento e não nos penalize”, disse o presidente Jair Bolsonaro. “Tenho quase certeza de que ele vai nos atender.” Quase certeza, apesar de sua decantada amizade com Trump, do “canal aberto” e das superiores qualidades do presidente americano? É difícil dizer se a passividade de Bolsonaro diante de uma evidente agressão reflete seu despreparo em relação a questões de Estado, uma espantosa ingenuidade ou incompreensão do que se passa no cenário internacional. Ou será uma mistura de tudo isso?
O Estado de S. Paulo
A farra das notas fiscais
Tudo indica que foram apresentadas notas frias para justificar o uso de dinheiro público sabe-se lá onde e com que finalidade
O Estado apurou que 20 dos 53 deputados federais da bancada do PSL, ex-partido do presidente Jair Bolsonaro, requereram à Câmara dos Deputados o ressarcimento de R$ 730 mil por serviços prestados por firmas que não existem nos endereços informados nas notas fiscais. Ou seja, tudo indica que foram apresentadas notas frias para justificar o uso de dinheiro público sabe-se lá onde e com que finalidade.
Cada um dos 513 deputados têm à disposição uma verba mensal que varia entre R$ 39 mil e R$ 44 mil, a depender do Estado pelo qual o deputado foi eleito. A chamada Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap) destina-se, como o nome indica, ao custeio dos gastos de gabinete inerentes à atividade parlamentar, entre os quais passagens aéreas, serviços postais, manutenção de escritórios de apoio, locação de veículos, contratação de consultores técnicos.
Evidentemente, há irregularidades na utilização da chamada verba indenizatória em quase todas as legendas com representação na Casa. No entanto, o que particulariza o caso do ex-nanico PSL é o fato de o partido ter saltado de 1 deputado federal eleito em 2014 para 53 em 2018, tornando-se uma das três maiores bancadas da Câmara, adotando o desgastado discurso da “nova política”, que, grosso modo, significa a negação de práticas imorais e patrimonialistas que durante anos abalaram a confiança dos brasileiros no Poder Legislativo. Pelo que se vê, a tal “nova política” ainda não deu o ar da graça, mas as velhas práticas seguem a todo vapor.
A apuração do Estado revelou casos escandalosos no uso da cota parlamentar, mas uns conseguem ser ainda mais escandalosos do que outros. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), apresentou notas no valor total de R$ 80 mil emitidas por um advogado que, segundo a assessoria do parlamentar, “atua para a família Francischini há mais de seis anos”. O deputado diz que o pagamento ao advogado é feito com recursos da Ceap porque o advogado o “auxilia na atuação à frente da CCJ”. A proximidade do profissional com os assuntos particulares da família Francischini torna justo o receio de que público e privado possam se misturar à custa do contribuinte.
Desde fevereiro, quando teve início a atual legislatura, 19 escritórios de advocacia foram contratados por deputados do PSL com verbas da cota parlamentar. Destes, 11 são escritórios de advogados que atuam ou já atuaram em causas privadas dos parlamentares. Estes alegam que, quando se trata de questões que não envolvem o exercício do mandato, pagam os advogados com recursos próprios.
Outra destinação bastante nebulosa para os recursos da cota parlamentar são as gráficas. Os deputados Julian Lemos (PSL-PB) e Heitor Freire (PSL-CE) pediram o ressarcimento de R$ 97 mil pela impressão de panfletos e 70 mil informativos com um balanço de seus primeiros meses de mandato. No endereço que consta na nota fiscal emitida por uma empresa em Riacho Fundo (DF), onde o serviço teria sido prestado para os gabinetes de ambos os parlamentares, não há uma gráfica, mas um lava a jato.
O deputado Professor Joziel (PSL-RJ), que contratou por R$ 41 mil uma gráfica que não existe no endereço informado na nota fiscal – há um salão de beleza no local – tem um jeito bastante peculiar de aliviar sua consciência. “Gerou nota? Foi aprovado pela Câmara? Se isso aconteceu, a gente não tem preocupação de ir lá in loco (checar se a empresa existe)”, disse ao Estado. O deputado deveria saber que, de fato, não se espera que ele se ponha em diligências. Mas a responsabilidade final sobre a veracidade – e moralidade – dos gastos de seu gabinete é apenas dele.
A farra das notas fiscais frias para justificar o uso da cota parlamentar diz muito sobre a índole de quem as apresenta. Mas diz igualmente sobre os frouxos mecanismos da Câmara para fiscalizar o uso de vultosos recursos públicos. Se assim não é por compadrio, é por incompetência.
O Estado de S. Paulo
Violência inaceitável
Há indicação de graves erros do poder público em Paraisópolis. Ele não proibiu o baile ilegal; e apavora a constatação do uso da violência
O que se viu no baile funk na favela de Paraisópolis, na zona sul da capital, na madrugada do domingo passado foi absolutamente inaceitável. Nove pessoas morreram pisoteadas e 12 ficaram feridas em razão de tumulto surgido a partir de uma ação da Polícia Militar (PM). Segundo a PM, agentes de segurança perseguiam dois suspeitos, que entraram no baile como meio de fuga. A polícia, então, invadiu a festa, que tinha cerca de 5 mil pessoas, para dar continuidade à perseguição, desencadeando uma grande confusão entre os participantes do evento.
É imprescindível investigar prontamente o que de fato ocorreu em Paraisópolis, identificando os responsáveis pelos trágicos acontecimentos. Há relatos e evidências de agressão de policiais contra os participantes da festa. A Polícia Civil e a Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo informaram que vão apurar as circunstâncias do caso.
De toda forma, as informações disponíveis até o momento indicam uma sucessão de graves erros do poder público, que, de forma alguma, poderiam ter ocorrido.
Em primeiro lugar, foi acintoso o despreparo dos policiais militares. Segundo o relato da própria corporação, os policiais colocaram em risco a vida e a integridade de 5 mil pessoas para perseguir dois suspeitos. O mínimo senso de prudência recomendava que, quando os suspeitos entraram no baile para se esconder, a PM sustasse imediatamente a ação. Dar continuidade à perseguição policial num evento dessas proporções foi uma enorme temeridade. Os policiais ali presentes foram incapazes de avaliar minimamente os riscos que sua ação poderia desencadear.
Mesmo depois de ter entrado no baile perseguindo os dois suspeitos – o que já foi um sério erro operacional –, ao constatar que o intento de capturar os fugitivos tinha se frustrado e que sua presença no baile produzia considerável alvoroço, a PM deveria ter imediatamente agrupado seus agentes e se retirado. O primeiro erro – entrar no baile – não concedia autorização para novos e mais graves erros. A sequência de erros revelou preocupante falta de comando sobre os policiais presentes na área. O uso da força por parte do Estado não pode ser desorganizado, intempestivo e menos ainda acéfalo.
Dessa forma, o próprio relato da PM sobre o que ocorreu na madrugada de domingo passado em Paraisópolis contradiz a declaração do porta-voz da PM, tenente-coronel Emerson Massera, em entrevista à rádio Eldorado, de que ainda “não é possível apontar que houve uma falha dos policiais”. Houve, no mínimo, duas falhas graves flagrantes por parte da PM.
Outro aspecto da lamentável tragédia diz respeito à presença de menores de idade na festa. Dos nove jovens mortos, quatro eram menores de idade – três tinham 16 anos e um, 14 anos. A legislação estabelece uma série de condições para a realização de um evento com a participação de crianças e adolescentes. É competência da administração municipal averiguar o preenchimento desses requisitos, antes da concessão do alvará, bem como realizar a necessária fiscalização do cumprimento dessas condições.
Não se tem notícia de nenhuma autorização do poder público para a realização do Baile da Dz7, onde ocorreu a tragédia. Segundo o governador João Doria, “(o baile) não deveria sequer ter ocorrido, porque é ilegal. Fere a legislação municipal”. O mais espantoso é que esse baile é realizado há quase uma década, todos os fins de semana, de quinta a domingo. Trata-se de um evidente descaso do poder público, que permite a ocorrência continuada de uma atividade ilegal.
O poder público sabia perfeitamente da ocorrência do evento. No domingo, no local do baile, havia seis motocicletas da PM estacionadas, para reforçar o patrulhamento da região. O problema, portanto, não é a ausência do poder público. Há uma atuação disfuncional das autoridades. Espanta saber que elas se omitem do dever de proibir a organização continuada do baile funk ilegal; e apavora a constatação de que as autoridades exorbitam no uso da violência, sem motivo e sem objetivo plausíveis.
Folha de S. Paulo
Por mais competição
Limite a juro do cheque especial deve ser paliativo na busca de concorrência
Num país com elevada concentração no mercado financeiro, mostra-se oportuna a intervenção do Banco Central para baixar os juros do cheque especial. A iniciativa não pode ser pontual, contudo, e deve inserir-se numa agenda consistente de fomento à concorrência.
A nova regulamentação permite a cobrança de tarifa máxima de 0,25% sobre o limite disponibilizado para cada cliente, que deverá ser deduzida do custo do financiamento. Valores até R$ 500 estão isentos. Em contrapartida, a taxa de juros será limitada a 8% ao mês —elevadíssimos, mas pouco menos da metade do patamar atual.
O cheque especial, por suas características, justifica regulação diferenciada. Trata-se, para começar, do crédito mais oneroso, com juros anuais de 305% ao ano, um múltiplo da taxa média de todos os tipos de financiamento pessoais, hoje em torno de 50%.
Por se tratar de um empréstimo contingente, a regulação impõe um custo de capital para todos os limites disponibilizados, mesmo quando não utilizados. O resultado é que os clientes que caem no cheque especial, com frequência mais pobres e menos escolarizados, acabam pagando por todos.
A permissão para cobrança de tarifa proporcional à linha contratada tem como objetivo reduzir tal impacto regressivo e induzir ao uso mais racional do crédito.
Ademais, como o cheque especial é utilizado como recurso de última instância, a demanda é pouco sensível aos juros cobrados, o que favorece abuso de poder de mercado por parte dos bancos.
Prova disso é que a modalidade representa apenas 1,4% do volume total de crédito do sistema financeiro para pessoas físicas, mas responde por nada menos que 13% da margem dos bancos com intermediação (já descontadas as provisões para perdas).
Foram essas as justificativas do BC para impor o teto na cobrança de juros. Também parece ter havido pressão política para a decisão, o que preocupa por remeter ao risco do intervencionismo.
Mesmo assim, e embora passível de crítica por se tratar de uma fixação de preço, a medida não constitui propriamente novidade. Outros países adotam restrições nesse tipo de financiamento, conscientes da relação assimétrica e dos riscos sociais envolvidos.
No caso brasileiro, o teto não pode ser mais que um paliativo temporário, que não resolverá o problema principal —a falta de competição num sistema ainda fechado.
O Brasil coleciona estatísticas que demonstram excessivo poder de mercado por parte dos grandes bancos, que ostentam lucratividade acima de outros setores da economia —e até mais em recessões.
O foco, portanto, deve ser a ação firme das autoridades com o propósito de reduzir espaços para comportamento oligopolista das grandes instituições e facilitar a chegada de novos entrantes em todos os segmentos financeiros.
Folha de S. Paulo
Paz uruguaia
Presidente eleito do país vizinho dá mostra de tolerância, observada no pleito
Após 15 anos de governos de centro-esquerda, o Uruguai moveu seu pêndulo ideológico com a vitória de Luis Lacalle Pou, 46, nas eleições presidenciais.
O triunfo sobre o adversário governista, Daniel Martínez, da Frente Ampla, se deu por margem bem menor que a apontada pelas pesquisas, em diferença de apenas 1%.
Embora os últimos três mandatos tenham trazido bons resultados ao país, que manteve invejável estabilidade política e econômica, a coalizão situacionista se desgastou na gestão do atual chefe do Executivo, Tabaré Vázquez.
Dois fatores parecem ter contribuído para tal. O primeiro foi a economia, que depois de apresentar durante uma década expansão média acima dos 5%, tem amargado taxas pífias nos últimos três anos. O país enfrenta, ademais, um rápido e expressivo aumento dos índices de violência urbana.
No contexto latino-americano, a ascensão de Lacalle Pou mantém o padrão recente de alternância de poder, da esquerda para a direita ou vice-versa, como já observado no Chile, na Argentina, na Colômbia, no México e no Brasil.
Internamente, porém, não devem ser esperadas mudanças bruscas. A despeito de ter contado com o apoio de forças mais conservadoras no segundo turno, o presidente eleito anunciou, por exemplo, que não pretende reverter avanços no campo dos direitos civis, como as leis do aborto e do casamento gay.
Apenas a legalização da maconha deve sofrer alterações, mas Lacalle Pou já afirmou que manterá a possibilidade de os usuários plantarem a própria erva.
A mesma atitude conciliadora se viu, felizmente, nas declarações do uruguaio acerca do Mercosul, cujo fortalecimento defendeu.
O espírito de tolerância e civilidade, por fim, foi a marca de todo o processo eleitoral —e constitui exemplo a ser louvado numa América do Sul plena de conflagrações.
Valor Econômico
Melhorar competitividade exige mais foco do governo
Se o governo quer ficar entre os 50 países mais competitivos em três anos terá que intensificar as medidas
O governo resolveu agir depois do fiasco no mais recente levantamento do Doing Business do Banco Mundial. Divulgado em outubro, o ranking que reflete o ambiente para os negócios no período de junho de 2018 a maio passado mostrou que o Brasil recuou entre 190 países analisados. Um novo programa para melhorar a competitividade acaba de ser anunciado, além de medidas para reduzir a burocracia, especialmente na legislação. Seus resultados ainda devem levar tempo para aparecer e certamente será preciso fazer mais do que isso para fazer a economia ganhar tração.
O Brasil perdeu postos no Doing Business deste ano e ficou no 124º lugar, oito posições abaixo do 116º do levantamento anterior. É o caminho oposto ao prometido pelo presidente Jair Bolsonaro na reunião do Fórum Econômico Mundial, no início do ano, de levar o país aos 50 primeiros lugares até o fim do mandato. A nota brasileira até melhorou, de 58,6 para 59,1. Mas outros estão fazendo reformas mais rapidamente e passaram à frente. A campeã é a China, que fez mudanças modernizantes importantes em oito das dez áreas analisadas pelo Banco Mundial.
No total, 115 países realizaram 294 reformas regulatórias no período analisado. Já o Brasil mostrou melhoria em apenas três dos dez critérios – registro de propriedades, abertura de empresas e solução de insolvências. Piorou no processo de obtenção de alvará de construção. Nem piorou nem melhorou quanto à proteção de acionistas minoritários, comércio internacional, acesso ao crédito, respeito aos contratos, obtenção de instalação elétrica e pagamento de impostos.
Agora, o Ministério da Economia, em parceria com o Movimento Brasil Competitivo (MBC), calculou em quanto exatamente essas deficiências oneram a economia. O chamado custo Brasil chegou a R$ 1,5 trilhão, o equivalente a 22% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse é nada menos que o gasto adicional das empresas brasileiras em relação à média dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). O levantamento levou em conta normas burocráticas, barreiras comerciais, tributos complexos, riscos judiciais, infraestrutura deficitária entre 12 temas, com a análise de 31 indicadores.
O sistema tributário segue sendo a maior amarra da economia brasileira, colocando o país na 184ª posição entre as 190 economias analisadas. O empresário brasileiro é obrigado a gastar 1.501 horas anuais apenas com a burocracia relativa ao pagamento de impostos, cinco vezes a média latino-americana e mais de nove vezes a dos países da OCDE. Também é inacreditável que arque com 65% dos lucros em taxas, ante médias de 47% e 40% para esses dois grupos. O resultado é um custo adicional de R$ 280 bilhões.
Por conta das regras trabalhistas, outra grande pedra no sapato, empregar custa R$ 320 bilhões a mais do que a média da OCDE, calculou o estudo. Além disso, o trabalhador leva de 42% a 45% daquilo que é pago pelo empregador porque o governo fica com o restante. Na média internacional, ele fica com 62% a 65%. Além dos altos custos de contratação e dos riscos relacionados a processos trabalhistas, o Brasil está atrasado na produtividade da mão de obra, em consequência das deficiências na educação.
Em reação ao levantamento, o Ministério da Economia lançou o Programa de Melhoria Contínua da Competitividade, com três linhas de atuação. Uma delas envolve analisar e acompanhar os indicadores de produtividade e qualidade do ambiente de negócios.
Alguns dias depois, o governo publicou decreto que determina a revisão dos atos normativos de todos os órgãos e entidades da administração pública federal direta, autarquias e fundações também para reduzir o custo Brasil. O impacto é estimado em R$ 200 bilhões, com a redução e racionalização dos atos legais. Segundo estimativa da Federação da Indústria do Estado de São Paulo, 5 milhões de normas impactam a vida dos cidadãos e das empresas, que gastam R$ 137 milhões por dia para acompanhar suas mudanças.
Nada foi feito especificamente em relação à área trabalhista. O custo do crédito é outro exemplo de como a velocidade das mudanças fica aquém do desejável. Apesar de a taxa básica de juros vir caindo há cerca de um ano, pouco impacto houve no custo do crédito para as empresas e famílias. Os dois exemplos mostram que, muitas vezes, as mudanças reais levam tempo para serem postas em prática. Se o governo quer ficar entre os 50 países mais competitivos em três anos terá que apertar o passo e intensificar as medidas.