Luciano Huck ainda não disse sim, mas já não é o mesmo que disse não. Em novembro do ano passado, em reunião para avaliar os resultados eleitorais dos movimentos de renovação da política, um amigo perguntou-lhe sobre a experiência da candidatura a presidente e quais haviam sido suas sensações. Segurando uma taça de suco, declarou com firmeza: “Não sou mais a mesma pessoa, volto para casa diferente”. Foi a senha para a conclusão de que a política se entranhara e a candidatura para a próxima disputa era uma certeza.
Relatou outras descobertas de sua rápida passagem pelo mundo novo. Disse, por exemplo, ter notado que os partidos políticos, ao contrário da impressão que passam, são muito fortes, e que a estrutura de poder no Brasil é sólida. Um aprendizado importante para os passos seguintes.
Em meados de novembro deste ano, em São Paulo, convocou-se encontro semelhante para avaliar os resultados do trabalho de um ano de atuação dos novos políticos. Reacenderam-se as expectativas e a certeza da candidatura, embora Huck ainda mantenha envolto em mistério seu intrincado, delicado e certamente emocionante processo de decisão. É a vida que está, de novo, em jogo.
Só que, agora, o tempo para construção trabalhará a favor. As conveniências de seu projeto pessoal já se confundem com os objetivos dos políticos e partidos que gravitam ao seu redor. Huck traz uma marca forte: é o único, constatam, que poderá derrotar Jair Bolsonaro. “Não importa a cor do gato”, diz o lema que a todos conduz: “O objetivo é preservar a democracia”.
Nesta conclusão está embutida uma hipótese amarga, não pronunciada com todas as letras. A de que Bolsonaro, com quatro ministros do Supremo para nomear e tendo já no seu regaço o procurador-geral da República, pode não ser mais o mesmo presidente ao fim dos oito anos.
Por ser Huck, então, o desafiador com chances, é crescente o envolvimento dos políticos com sua candidatura. Armínio Fraga coordena grupos de estudos sobre Educação, Saúde, Previdência, Segurança, Desigualdade, o que assegura ser a questão social o ponto central do projeto, sobrepondo-se, inclusive, à Economia.
Nesses estudos se envolvem movimentos e instituições ligados ao candidato, em especial os da Educação. Nizan Guanaes formula a estratégia de Comunicação e um grupo já numeroso de políticos conversa e aproxima o apresentador de diferentes partidos: Cidadania, Podemos, DEM, pouco importa, a persona é de centro-esquerda.
Entre os responsáveis pela busca da densidade política estão Paulo Hartung, Jorge Bornhausen, Roberto Freire, Raul Jungmann, Fernando Henrique Cardoso, Rodrigo Maia, Mendonça Filho, Eduardo Leite, Elder Barbalho, Ratinho. Todos tocam seus afazeres atuais sem perder Luciano de vista.
Os políticos estão impressionados com dois traços, para eles, reveladores: Huck tem conteúdo, substância, não é uma celebridade de TV que cumpre o script. Sua preocupação social é genuína e seu programa seria uma demonstração disso. Aquela agenda – Lar Doce Lar, Lata Velha, Quem quer ser milionário, avaliada pela esquerda como assistencial –, é considerada hoje uma forma concreta de expressar sua preocupação com o povo. Ele pede aos especialistas soluções urgentes para o desemprego, a segurança, o SUS, tudo o que vê agonizar em suas viagens ao interior dos Estados pelo Brasil afora.
Na sua fortaleza de marido, pai, filho e amigo modelo, vasta fortuna e sucesso empresarial, está também sua fragilidade: A saída não tem volta. Ganhando ou perdendo, não será mais esse Huck de vida glamourosa, e ele sabe disso. Precisa conduzir juntos a celebridade e o pretenso político até a definição final. Uma atividade alimenta a outra, necessariamente. O dilema é mais existencial que político. (O Estado de S.Paulo – 27/11/2019)