Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (29/10/2019)

MANCHETES

O Globo

País ultrapassa marca de 1 milhão de armas registradas na PF
Congresso pede diálogo do Brasil com a Argentina
Reforma prevê promoção por mérito para servidor
Toffoli propõe ao Parlamento restringir prescrição de crimes
Ensino à distância dispara nas universidades particulares
Prefeito de São Paulo iniciará quimioterapia contra câncer
MP investiga Crivella por ordenar destruição de cabines
‘Rei Arthur’: Empresário confirma à Justiça americana compra de votos na Olimpíada do Rio

O Estado de S. Paulo

Guedes faz pacote em 5 eixos para conter gastos do governo
Toffoli quer ‘antídoto’ a prescrição de pena
Com câncer, Bruno Covas continua no cargo
Tensão com Fernández pode afetar Mercosul
Bolsonaro fala em criar partido e ‘separar’ do PSL
Chile muda ministros, mas atos continuam
Só 1 de cada 5 meninos tomou vacinas de HPV

Folha de S. Paulo

Bruno Covas tem câncer, e Prefeitura de SP é dilema
Argentina escolheu mal, diz Bolsonaro sobre eleito
Isenção de vistos a chineses e indianos preocupa Itamaraty
Recurso de Lula andou mais rápido que 85% dos casos
Governo planeja pacote para atrair aéreas estrangeiras
Guedes estuda reduzir carreiras do funcionalismo
Presidente compara STF e PSL a hienas que o atacam
Ator e diretor Jorge Fernando morre aos 64 anos
Dólar fecha abaixo de R$ 4 pela primeira vez desde 15 de agosto
Crivella destrói pedágio na Linha Amarela, mas Justiça manda refazer

Valor Econômico

Brasil assume protagonismo com pré-sal e nova regulação
Prévia indica lucro maior dos bancos
Itaú Unibanco é o vencedor de 2019 do prêmio ‘Valor Carreira’
Baixo crescimento preocupa Mitsui
Classes A e B voltam a aumentar
Agricultores declaram guerra ao ‘javaporco’
Argentina vive clima amistoso para transição

EDITORIAIS

O Globo

Argentina e Mercosul são estratégicos

A volta de Cristina Kirchner ao poder, como vice de Fernández, não justifica distanciamento do Brasil

A confirmação da derrota de Mauricio Macri para Alberto Fernández e Cristina Kirchner à primeira vista parece mais uma das reviravoltas que costumam acontecer na América Latina em que forças políticas à direita e à esquerda se revezam no poder, em movimentos circulares decorrentes das oscilações da economia. O que ocorre agora na Argentina, porém, não é um simples mais do mesmo.

A persistência da deterioração econômica e social do país transforma a derrota de Macri e de seu projeto de reformas liberais — mal executadas —, para o peronismo, em uma aposta de alto risco da sociedade argentina. Uma inflação de 50% ao ano, recessão estimada em 3%, desemprego e pobreza elevados seriam mesmo difíceis de Macri superar na sua tentativa de reeleger-se. Mas a crise a ser enfrentada pelo próximo governo pode fazer com que a Argentina volte ao experimentalismo populista do kirchnerismo.

Há dúvidas sobre se um governo com Cristina K. como vice-presidente terá confiança pública e meios para enfrentar as dificuldades criadas nos 12 anos em que dividiu o poder com seu falecido marido, Néstor Kirchner. Ela assumiu em 2007, sucedendo a Néstor, e aprofundou o nacional-populismo kirchnerista, levando a Argentina, mais uma vez, a quebrar por falta de divisas.

Alberto Fernández, peronista moderado que se chocou com a presidente Cristina quando foi seu chefe de gabinete, precisa indicar de maneira clara quem será a pessoa forte no governo. Terá de esvaziar a suspeita de que sua posição de cabeça de chapa serviria apenas de biombo para o peronismo voltar ao poder, sem correr o risco de ter seu projeto de governo prejudicado pela impopularidade da ex-presidente e senadora, contra quem há graves denúncias de corrupção. Caso contrário, deixará a impressão de que, eleito Fernández, Cristina assumirá o poder de fato, para voltar a tentar as conhecidas e inviáveis soluções populistas a partir da posse, no próximo 10 de dezembro.

O presidente Jair Bolsonaro, seguindo a trilha aberta pelo adversário Lula, assumiu um lado nas eleições argentinas, em mais uma infração às tradições do Itamaraty de não ingerência em assunto internos de outros países. Isso já havia sido feito pelo ex-presidente petista na Argentina, Venezuela, no Peru, Equador e na Bolívia, por exemplo. No seu estilo sem medidas, Bolsonaro apoiou Macri e fez duras críticas à chapa adversária. Chegou a ameaçar com a saída unilateral do Mercosul, um desatino devido ao peso do comércio com o bloco não só para o Brasil, como também o continente.

As economias brasileira e argentina já estavam em processo de integração antes da formalização do Mercosul, há 29 anos. Defender seu estilhaçamento por antipatia ideológica é contrariar o bom senso e, principalmente, os interesses nacionais. O comércio com a Argentina oscila em torno de US$ 15 bilhões anuais. É o principal mercado para bens manufaturados pelo Brasil e representa 60% das exportações para o Mercosul. É o terceiro parceiro comercial do país. Seria completo disparate entregar esse mercado à concorrência.

O Globo

Ação de Crivella na Linha Amarela é danosa para investimentos no país

Prefeito rompeu contrato unilateralmente e mandou arrancar cancelas de pedágio

Não satisfeito em romper unilateralmente o contrato de concessão do município com a Lamsa, empresa que administra a Linha Amarela, o prefeito Marcelo Crivella foi além — bem além. Na noite de domingo, funcionários da prefeitura, sem qualquer ordem judicial, derrubaram cancelas de pedágio — eles chegaram a usar uma retroescavadeira —, danificaram cabines, cortaram a energia e inutilizaram câmeras e sensores, liberando a passagem para os veículos.

A ação, sem precedentes, causou prejuízos ao patrimônio público, uma conta que será paga por todos os cariocas — a concessionária já anunciou que pedirá ressarcimento à prefeitura. Ontem a Lamsa obteve uma liminar restabelecendo a cobrança de pedágio, mas a destruição foi tamanha que, segundo a empresa, ela só deve ser retomada dentro de um mês. A Justiça, aliás, determinou multa de R$ 100 mil por dia em que a Lamsa ficar impedida de atuar. De novo, cariocas pagarão a conta.

A prefeitura alega que uma auditoria feita pelo município constatou prejuízo de R$ 1,6 bilhão no contrato com a Lamsa, valor que é contestado pela concessionária. Independentemente de quem está com a razão, chama a atenção o fato de a prefeitura, que é parte do contrato, atuar também como árbitro. Evidentemente, essa questão demanda uma regulação independente.

De qualquer forma, a ação descabida de Crivella representa uma quebra da ordem jurídica, um recuo civilizatório. O Brasil há tempos faz um esforço para reduzir a insegurança de contratos, fator importante para garantir investimentos privados para municípios, estados e o próprio país, todos de cofres vazios. No governo Fernando Henrique Cardoso foram criadas agências reguladoras justamente para mediar conflitos e criar regras mais claras para quem está disposto a investir no Brasil.

A agressão ao estado de direito ocorre num momento em que o Rio se aproxima de um novo ciclo de investimentos vindo do setor de óleo e gás. Rasgar contratos é desestimular futuros aportes em todos os setores. A repercussão do ato é péssima, no Brasil e no exterior — convém lembar que a Lamsa tem investidores estrangeiros.

A ação do prefeito é populista e eleitoreira. Sabe-se que motoristas não gostam de pagar pedágio. Mas também repudiam vias malconservadas, como ocorre em quase todo o Rio. Não é difícil imaginar como seria a Linha Amarela administrada pela prefeitura. Basta olhar para qualquer rua da cidade — a bem da verdade, a inépcia não ocorre apenas na conservação, mas em todos os setores da administração municipal.

Crivella age como político de uma República de Bananas, em que não há ordem constituída, o poder é do homem forte. Ele esquece que governa a segunda maior cidade do país.

O Estado de S. Paulo

A ilusão da bonança

O País só começou a retomar o caminho do crescimento porque fez a opção pela austeridade e pelas reformas. E esse ajuste ainda é muito tímido

O boletim Focus divulgado ontem pelo Banco Central (BC) mostra que o mercado está um pouco mais otimista em relação ao crescimento da economia. Elaborada pelo BC a partir de estimativas de bancos e consultorias, a projeção da expansão do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano passou de 0,88% para 0,91%. Há um mês, a expectativa era de um crescimento de 0,87%.

Essa mudança de humor foi captada em reportagem recente do Estado, na qual economistas de bancos informaram que estavam revendo para cima suas estimativas para o PIB deste ano. O Itaú, por exemplo, passou a esperar um crescimento de 1%, ante 0,8% na previsão anterior. Foi a primeira vez em três anos que o banco reviu para cima uma estimativa do PIB. Já o Safra, que projetava uma alta de 0,8%, passou a esperar 0,9%. “Pode parecer pouco, mas é uma diferença significativa. No fim de julho, esperávamos 0,8%, mas achávamos que podia ser até 0,5%. Agora, temos 0,9%, mas pode ser mais”, disse o economista-chefe do Safra, Carlos Kawall.

O mercado parece acreditar que a ligeira recuperação detectada em diversos indicadores começa a ganhar impulso. Houve aumento da abertura de vagas formais no mercado de trabalho, que apresenta saldo positivo há seis meses, e também expansão de 14% na concessão de crédito para pessoa física, com impacto particularmente importante na construção civil.

Tudo isso ainda está muito longe do otimismo verificado logo depois da eleição do presidente Jair Bolsonaro. Na época, em razão das promessas de um choque de capitalismo, o mercado previa uma alta de até 2,5% do PIB neste ano. Em pouco tempo, contudo, a condução errática do governo minou a confiança dos investidores, que reduziram sua projeção para menos de 1%. A conjuntura atual parece apontar que a bonança finalmente chegou, depois de anos de tempestade causada pela aventura lulopetista e pela ausência de reformas.

Tudo isso ainda é muito incipiente e não pode ser entendido como o fim da crise econômica. Há um longo caminho a ser percorrido para que se considere que o País está no caminho do crescimento sustentado.

A atual recuperação é fruto de um trabalho que vem sendo feito desde o governo de Michel Temer, que em pouco tempo reverteu o desastre legado pelo estatismo patológico da presidente cassada Dilma Rousseff e deixou o governo razoavelmente em ordem para seu sucessor. Para isso, fez aprovar medidas saneadoras, como o teto dos gastos, a reforma trabalhista e a redução do subsídio ao juro cobrado pelo BNDES.

A aprovação da abrangente reforma da Previdência foi continuação desse esforço – ainda que o governo Bolsonaro em muitos momentos tenha contribuído mais para sabotá-la do que para aprová-la.

O pior inimigo do governo, nesse caso, é a tentação de entender o bom momento como oportunidade eleitoreira. A história mostra que não foram poucos os presidentes que aproveitaram períodos de expansão da economia para distribuir benefícios e subsídios a torto e a direito, na expectativa de ganhar simpatia e amealhar votos. Considerando-se que o presidente Bolsonaro já está em campanha pela reeleição, como atestam suas seguidas declarações como candidato, é lícito presumir que o processo de recuperação da economia corre o risco de, mais uma vez, ser comprometido em razão de imperativos eleitorais.

Não se pode perder de vista que o País só começou a retomar o caminho do crescimento porque em algum momento fez a opção pela austeridade e pelas reformas. E esse ajuste ainda é muito tímido. O programa de privatizações ainda é tímido, e grande parte dos Estados está muito longe do equilíbrio fiscal necessário para que possa andar com as próprias pernas, sem necessidade de socorro federal. Além disso, não se sabe quais são as propostas do governo para as reformas tributária e administrativa, cruciais para o processo de retomada do desenvolvimento.

O crescimento sustentado da economia não é tarefa de um só governo. Deve ser um projeto permanente de Estado, isto é, não pode ser interrompido a cada eleição para satisfazer os interesses imediatos do grupo político que está no poder.

O Estado de S. Paulo

Servidores de quem?

Entre 2003 e 2017, os gastos com pessoal cresceram nos Estados quase 80% acima da inflação. No último ano, 12 Estados violaram a Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita estas despesas a 60%

É de grande interesse o estudo realizado pelo Banco Mundial sobre o funcionalismo público, não só por escancarar as distorções resultantes de décadas, para não dizer séculos, de patrimonialismo predatório, mas por antecipar o projeto de reforma administrativa que integra, juntamente com o pacto federativo e a reforma tributária, a “Agenda da Transformação do Estado” que o governo promete para as próximas semanas.

Com excesso de carreiras, estrutura fragmentada e rígida, progressões rápidas e gratificações generosas e generalizadas, o serviço público incha a máquina estatal e inviabiliza a responsabilidade fiscal. Além de os salários iniciais serem altos, a sua progressão é determinada por tempo de serviço ou aquisição de títulos acadêmicos (um resquício do bacharelismo), deixando pouca margem para gratificações por desempenho. Quando existem, são sistematicamente desvirtuadas, já que quase todos as recebem, inclusive os inativos. Em 87% das carreiras com bônus por desempenho, 9 em 10 servidores os recebem. Nos Estados, as gratificações chegam a 40% da remuneração mensal, e dentre as suas 179 modalidades – quantidade que inviabiliza a transparência e a fiscalização –, 105 vão para a aposentadoria.

Entre 2003 e 2017, os gastos com pessoal cresceram nos Estados quase 80% acima da inflação. No último ano, 12 Estados violaram a Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita estas despesas a 60%. Em metade dos Estados os gastos com os servidores inativos crescem mais do que os com ativos, prejudicando a reposição de quadros.

A máquina do funcionalismo é não só custosa e ineficiente, mas promove a desigualdade social. Os servidores federais ganham em média quase 100% mais que seus similares na iniciativa privada – a maior disparidade em 53 países pesquisados – e dois terços deles estão na faixa dos 10% mais ricos da população. Dentro do próprio funcionalismo, a desigualdade entre os que ganham mais e os que ganham menos é, segundo a pesquisa, maior do que no mercado privado. Em um mesmo cargo, o salário-base do servidor mais bem remunerado pode superar em cinco vezes o menor salário da categoria.

Segundo o secretário especial de Desburocratização do Ministério da Economia, Paulo Uebel, o projeto do governo contém quatro diretrizes: foco em servir a sociedade; valorização dos servidores; agilidade e inovação; e eficiência e racionalidade. Duas medidas serão cruciais: a modificação da política de salários iniciais altos e a adoção de mecanismos de triagem e incentivo aos mais produtivos. A mera redução dos salários iniciais em 10% geraria uma economia de R$ 26,35 bilhões na próxima década. Se os aumentos salariais fossem congelados por três anos, haveria uma economia de R$ 187,9 bilhões. Nessa equação, é preciso considerar que durante a recessão que deteriorou a renda dos brasileiros e relegou um terço da população economicamente ativa ao subemprego, desemprego ou desalento, os gastos com o funcionalismo estadual, por exemplo, continuaram subindo na ordem de 6,4% ao ano.

Além disso, será necessário vencer as pressões corporativas do funcionalismo e reformular o instituto da estabilidade, um expediente que não pode continuar sendo uma regra imutável. É difícil tocar nos direitos adquiridos dos 11,5 milhões de servidores (5,6% da população) que consomem 15% do PIB. Até 2030, 40% dos funcionários da ativa estarão aposentados. Para os que os substituirão, a estabilidade não pode ser um direito, mas uma prerrogativa excepcional inerente a alguns cargos.

Os servidores têm uma oportunidade de provar a quem realmente querem servir: se ao interesse público, com justos proventos, ou se ao seu patrimônio pessoal, às custas do interesse público. Como disse o secretário Paulo Uebel, na cerimônia de lançamento da pesquisa, a sociedade hoje desconfia do serviço público e os servidores se sentem desmotivados. E concluiu: “Nós, servidores públicos, precisamos assumir o compromisso de resgatar a confiança da sociedade”.

O Estado de S. Paulo

O futuro da Argentina

Quem governará a Argentina: o presidente eleito ou sua vice? Sanar esta dúvida é o primeiro desafio de Alberto Fernández

Um peronista assumido voltará à Casa Rosada, num ciclo que se repete há mais de 50 anos. O advogado Alberto Fernández foi eleito presidente da Argentina no primeiro turno com 48,1% dos votos. O presidente Mauricio Macri, que concorria à reeleição, recebeu 40,4% dos votos no pleito de domingo passado.

A vitória de Fernández era previsível. A chapa encabeçada pelo peronista – com a ex-presidente Cristina Kirchner como vice – obteve 47,4% dos votos nas prévias realizadas em agosto – 15,1% a mais do que os votos dados à chapa do atual presidente naquela ocasião. De acordo com a legislação eleitoral argentina, um candidato a cargo executivo é eleito no primeiro turno quando obtém 45% dos votos ou uma votação acima de 40%, desde que, neste caso, a diferença em relação ao segundo colocado seja de, no mínimo, 10 pontos porcentuais.

Imprevisível é o futuro da Argentina sob a presidência de Alberto Fernández. A composição vitoriosa entre os peronistas e os kirchneristas – em essência, um só grupo – foi um curioso caso em que a vice foi quem escolheu o cabeça de sua chapa. Do ponto de vista estritamente eleitoral, foi uma jogada de mestre. Cristina Kirchner, como é sobejamente sabido, tem pesadas contas a prestar à Justiça de seu país, que vão de suspeitas de corrupção e lavagem de dinheiro à participação no assassinato do procurador Alberto Nisman, em 2015. Ter seu nome à frente da chapa poderia repelir votos decisivos numa eleição tão polarizada.

É fato que o presidente eleito, tendo servido aos governos de Néstor e Cristina Kirchner, deu mostras de independência política em relação ao casal, deixando de apoiá-los quando as divergências entre eles se tornaram incontornáveis. É forçoso reconhecer, no entanto, que a vitória de alguém como Fernández – o primeiro presidente da Argentina eleito sem antes ter sido deputado, prefeito ou governador – é devida, em grande medida, ao apelo eleitoral do kirchnerismo em expressivos segmentos da sociedade, não obstante a ruína legada ao país pelo desbragado populismo dos Kirchners. Vender ilusões é da essência do populismo.

Alberto Fernández é tido como um peronista “moderado” e “pragmático”. Só o tempo dirá se a moderação e o pragmatismo atribuídos ao presidente eleito irão se impor à agenda regressiva de Cristina Kirchner. Em outras palavras, hoje o mundo há de perguntar quem governará a Argentina: o presidente eleito ou sua vice? Sanar esta dúvida é o primeiro desafio de Alberto Fernández.

Há outros. O presidente eleito assumirá um país alquebrado em função de uma perversa crise econômica. A inflação anual na Argentina é de 53,5%, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Cerca de 36% dos argentinos vivem abaixo da linha da pobreza. Se a origem dessa crise está na irresponsabilidade do governo de Cristina Kirchner (2007-2015), seu agravamento é devido à incapacidade do presidente Mauricio Macri de propor medidas saneadoras. Com Macri, a Argentina teve de recorrer novamente à ajuda financeira do FMI, que impôs em contrapartida medidas de austeridade que contribuíram ainda mais para o desgaste do atual presidente.

Ainda assim, o presidente Mauricio Macri conseguiu recuperar um bom porcentual de votos nos três meses entre as prévias e a eleição, o que indica uma clara divisão da sociedade. É difícil que Fernández consiga unir o país em torno de seu governo. Outro desafio que tem diante de si é o de ao menos diminuir o grau de polarização do país em torno de uma agenda nacional.

A eleição na Argentina impõe igualmente desafios ao Brasil. Cabe ao presidente Jair Bolsonaro apor os interesses do País às suas preferências de ordem política e ideológica. Bolsonaro apoiou a reeleição de Mauricio Macri e já se pôs a dar declarações desairosas em relação a Alberto Fernández. Mas os interesses dos dois países, é bom reforçar, estão umbilicalmente ligados na América Latina. A relação entre Brasil e Argentina, os maiores parceiros regionais, caminhará seja qual for o tratamento que os chefes de Estado e de governo dispensem um ao outro. Melhor que sejam relações republicanas.

Folha de S. Paulo

Hora de conversar

Dependência mútua exige relação pragmática entre Fernández e Bolsonaro

Desde as primárias argentinas realizadas em agosto, quando Alberto Fernández conquistou vitória expressiva sobre o presidente Maurício Macri, já se esperava que o primeiro triunfasse sobre o segundo no pleito de domingo (27).

O prognóstico, com efeito, confirmou-se, embora a diferença (48% a 40,5%) entre os dois, significativamente menor do que apontavam as pesquisas, indique que a intensa campanha do atual mandatário nas últimas semanas surtiu efeito.

O esforço não se mostrou suficiente para reverter o desgaste decorrente da ruína econômica dos últimos dois anos. Eleito com uma agenda de reformas liberais e ajustes após 12 anos de intervencionismo dos governos Kirchner, Macri entrega um país em muitos aspectos pior do que recebeu.

O PIB encolheu 2,5% em 2018, e a recessão se mantém neste ano. A inflação ronda os 55% ao ano, e o índice de desemprego alcançou 10,6% no segundo trimestre. Tais fatores contribuíram para o aumento substancial da taxa de pobreza. Hoje, cerca de 35% da população encontra-se nessa situação, e 7,7% são considerados indigentes.

Amenizar esse cenário crítico constitui o principal desafio do próximo mandatário argentino, que terá como seu vice nada menos que a ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015).

Assim, a grande incógnita reside em saber se o governo Alberto Fernández será uma continuação do ciclo kirchnerista, marcado por políticas populistas como congelamento de tarifas e subsídios, ou se representará uma nova etapa para o país, em que previsíveis medidas de cunho social se combinarão a uma gestão responsável.

A recuperação da Argentina também interessa ao Brasil, que tem no vizinho seu principal comprador de produtos manufaturados. A crise afetou a balança comercial entre os dois países e, entre janeiro e julho, as exportações argentinas caíram cerca de 40% em relação ao mesmo período do ano passado.

No front bilateral, espera-se ainda a distensão das relações entre Fernández e o presidente Jair Bolsonaro.

O brasileiro, após tentativas lamentáveis de interferir no pleito do país vizinho em favor de Macri, se negou a cumprimentar o novo presidente pela vitória.

O argentino, por sua vez, aplicou predicados duros a Bolsonaro e, numa provocação, posou no domingo fazendo o sinal de apoio ao movimento Lula Livre —que o brasileiro classificou como uma afronta.

A dependência comercial, a proximidade geográfica e os vínculos históricos entre os dois países fazem com que um não possa prescindir do outro. Que as diferenças ideológicas de agora deem logo lugar a uma relação pragmática e benéfica às duas nações.

Folha de S. Paulo

Sem tempo a perder

Apesar de esforços, Brasil recua 15 posições em ranking de competitividade

A queda da posição do Brasil no novo relatório de competitividade do Banco Mundial, o Doing Business 2020, mostra como é difícil ascender na escala global de facilidade de negócios e eficiência regulatória, que estão associadas ao grau de desenvolvimento econômico.

O relatório mede uma série de critérios específicos, como abertura de empresas, permissões para construções, burocracia para transferência de propriedade e facilidade para pagar impostos.

Apesar dos esforços recentes, o Brasil recuou para a 124ª posição, 15 abaixo do ano passado e similar ao 125º lugar obtido em 2018.

Não é que o país tenha piorado. A nota subiu em alguns quesitos, mas apenas 0,5 ponto no total (de 58,6 para 59,1, do máximo de 100). O problema é que os outros, sobretudo os grandes concorrentes, estão melhorando mais rápido.

É o caso da China, que avançou fortemente na maioria dos quesitos e subiu sua nota em 4 pontos (8 vezes mais que o Brasil, portanto). Com isso, conseguiu saltar nada menos do que 15 posições —da 46ª para a 31ª— em apenas um ano.

Mais comparáveis, os países da América Latina em geral também progridem rápido. Apesar dos problemas individuais, várias das principais economias da região aparecem à frente do Brasil.

O resultado mostra que o país não pode se contentar com melhorias pontuais para as empresas. Para progredir na corrida por investimentos será necessário um programa continuado, que remova os principais gargalos sistêmicos.

Dentre eles, aparece com destaque a questão tributária. Nesse quesito, o Brasil está realmente na lanterna —fica na incrível 184ª colocação, entre 190 países, em tempo gasto para pagar impostos.

Não é surpresa que seja assim, dado o conhecido caos normativo vigente, sobretudo na tributação de bens e serviços. Por isso, a reforma tributária é essencial para reforçar a competitividade e colocar o país no radar dos investimentos.

Embora pareça existir disposição e raro alinhamento político a favorecer a criação de um imposto sobre valor agregado em linha com os padrões globais, não houve avanço neste ano, dada a falta de foco demonstrada pelo Executivo, que perdeu tempo precioso tentando ressuscitar a nefasta CPMF.

Tudo indica que caberá ao Congresso centrar esforços nessa pauta fundamental para a economia. Não há tempo a perder, inclusive porque a concorrência não perde.

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