MANCHETES DA CAPA
O Globo
Pressionado, Bolsonaro cede ao Centrão e tenta controlar militares
Aliada de Lira na articulação política
Mudança na Defesa desagrada às Forças
Delegado da PF assume Justiça
Ernesto deixa o Itamaraty
Enfermeiros denunciam falta de insumos
Pandemia causou uma em cada seis mortes no Brasil em 2020
Governo busca solução política para Orçamento
Desencalhe reconecta Ásia e Europa
Qatar: Seleções protestam contra violações dos direitos humanos no país-sede da Copa
O Estado de S. Paulo
Ministro da Defesa cai por recusar uso político das Forças Armadas
Orçamento deve ter ‘pedalada’ por emendas cortada
Hospital de SC decidirão quem vai para a UTI
Futebol expõe atleta à covid como médicos
Navio é desencalhado no Canal de Suez
EUA atrelam verbas a controle de desmate
Folha de S. Paulo
Bolsonaro troca 6 ministros, afaga o centrão e surpreende militares
Escolha de deputada visa Congresso em 2022
Novo nome da Justiça é ligado à bancada da bala
Diplomata discreto vai conduzir o Itamaraty
Estados aliados são privilegiados por emendas
Tensão na PM da Bahia passa por estresse e pressão
Por ameaça, Doria afirma que morará no Bandeirantes
Internações em UTIs de São Paulo desaceleram
Procuradora disse a Deltan que Lava Jato ajudou ‘Bozo’
Contra diretriz, estados alteram ordem do plano nacional de vacinação
Governador do Rio faz festa de aniversário durante a pandemia
Natura doa R$ 4 mi para a compra de doses
Canal de Suez é liberado
Valor Econômico
Pressionado, Bolsonaro substitui seis ministros
Militares resistem a alinhamento
Nas mãos de cada um
Bittar diz que elaborou Orçamento com governo
Pedidos de recuperação crescem no país
Queiroga tem ‘terra arrasada’ pela frente
Faculdade privada perde quase um quarto de calouros
EDITORIAIS
O Globo
Bolsonaro precisa vetar gastos além do teto no Orçamento
As despesas previstas nas contas aprovadas pelo Congresso para este ano estão pelo menos R$ 37 bilhões além do que prevê a Lei do Teto de Gastos
Com mais de três meses de atraso, o Congresso aprovou enfim a Lei Orçamentária de 2021 na última quinta-feira. Fora todas as características já conhecidas e invariavelmente preservadas no nosso Orçamento — 94% engessado por despesas obrigatórias e colonizado por um sem número de feudos e interesses paroquiais —, desta vez ele também veio com um ingrediente especial: a contabilidade criativa que o torna não apenas inexequível, mas também ilegal.
As despesas previstas nas contas aprovadas pelo Congresso para este ano estão pelo menos R$ 37 bilhões além do que prevê a Lei do Teto de Gastos. Esse estouro está contratado para além do déficit primário já estipulado em R$ 234 bilhões e dos R$ 44 bilhões destinados ao novo auxílio emergencial por fora dos limites fiscais impostos pela lei. O TCU deverá alertar o presidente Jair Bolsonaro de que, se sancionar o Orçamento sem vetos, cometerá crimes de responsabilidade da mesma natureza que os julgados no impeachment de Dilma Rousseff.
Dois fatores contribuíram para tornar o Orçamento inexequível. Primeiro, a omissão do Ministério da Economia. Desde o ano passado era sabido que estava defasado o valor do salário mínimo usado no cálculo de todas as despesas da Previdência, benefícios a idosos e deficientes (BPC), seguro-desemprego e abono salarial. Elas foram subestimadas em R$ 17,5 bilhões, segundo cálculo do próprio ministério divulgado no último dia 22.
O segundo fator foi a manobra do relator do Orçamento, senador Márcio Bittar (MDB-AC), para, atendendo à pressão do Centrão, elevar os recursos disponíveis às notórias “emendas parlamentares”, gastos em obras e projetos indicados por deputados e senadores em suas bases eleitorais, a maioria alocados no Ministério do Desenvolvimento Regional. Na peça aprovada, elas superam em R$ 26 bilhões o valor máximo permitido pelo teto de gastos.
Para acomodar as novas despesas, Bittar estipulou cortes fictícios em gastos obrigatórios, como aposentadorias. O único com base na realidade é o adiamento do abono salarial para 2022, representando economia de R$ 7,4 bilhões. As demais despesas obrigatórias estão todas previstas em lei. Como será impossível deixar de realizá-las, o estouro do teto acarretará, assim que o dinheiro acabar, a paralisação de atividades do governo, ou “shutdown”.
De gastos estimados em mais de R$ 1,5 trilhão, o Orçamento original já previa apenas R$ 92 bilhões para custear toda a máquina administrativa e para os investimentos federais. Descontando os R$ 37 bilhões de estouro, restariam, em plena crise da pandemia, R$ 55 bilhões para custeio e investimentos. Só o custeio consumiu R$ 67 bilhões no ano passado.
A manobra de Bittar para garantir dinheiro a projetos eleitoreiros demonstra a irresponsabilidade de um Congresso que cuida de interesses paroquiais, mas se omite diante de reformas capazes de reduzir as despesas obrigatórias que engessam o Orçamento. Pior ainda, o relator tentou burlar o teto de gastos, única âncora que ainda confere um mínimo de disciplina fiscal ao Estado. Se Bolsonaro não tem a convicção necessária para preservá-la, a ameaça de impeachment deveria ao menos convencê-lo a vetar gastos além do teto. E que o Congresso se debruce enfim sobre as reformas, para poder apresentar orçamentos exequíveis, sem pôr em risco a credibilidade do país.
O Estado de S. Paulo
A demissão do ‘orgulhoso pária’
Ernesto Araújo será devolvido a seu merecido anonimato, lugar onde seus delírios não prejudicam o País
Ernesto Araújo finalmente deixará de ser ministro das Relações Exteriores. Depois de passar mais de dois anos contribuindo decisivamente para arruinar a imagem do Brasil no exterior, Araújo entregou o cargo em meio a uma enorme pressão de parlamentares governistas, especialmente no Senado.
O motivo imediato da hostilidade a Araújo foi sua atuação danosa aos interesses do País em relação aos esforços para a obtenção de vacinas contra a covid-19, sobretudo suas agressões à China, país que fornece os insumos para a fabricação dos imunizantes produzidos no Brasil.
Seu afastamento foi considerado indispensável pelos senadores envolvidos na reformulação completa da política de combate à pandemia. Afinal, não havia a menor possibilidade de suavizar as relações com a China enquanto o Itamaraty fosse chefiado por um ministro que insinuou reiteradas vezes que aquele país fabricou o coronavírus, chamado por ele de “comunavírus”, para prejudicar as democracias e disseminar o comunismo.
Vendo-se encurralado, Ernesto Araújo fez o que os extremistas fazem melhor: partiu para o ataque com ilações maldosas. Foi às redes sociais para sugerir que os senadores – citando especialmente Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado – o estavam pressionando não para obter vacinas, mas por interesse em favorecer a China no leilão da tecnologia 5G. Ao agir assim, Araújo selou sua sorte – a senadora Kátia Abreu o chamou de “marginal” –, mas, ao mesmo tempo, deu à militância bolsonarista um discurso sob medida para atribuir sua queda ao comunismo chinês e à suposta pusilanimidade de políticos interesseiros.
Mas que ninguém se engane: tudo o que Ernesto Araújo fez ao longo de sua passagem pelo Ministério das Relações Exteriores, até o último minuto, seguiu rigorosamente as diretrizes do presidente Jair Bolsonaro.
“O presidente Bolsonaro tem confiança no meu trabalho. Meu trabalho não é meu, é a implementação de uma agenda de política externa que o presidente traz desde a campanha”, disse o então chanceler em entrevista recente ao Estado. E ele completou, para não deixar dúvidas: “Tenho respaldo (de Bolsonaro) porque desde o começo sempre propus ao presidente maneiras de implementar as ideias dele. (…) O presidente me nomeou por causa do meu compromisso de fazer a política que ele queria, implementar as coisas que ele quer, a visão de mundo”.
Desse modo, pode-se supor que Bolsonaro aceitou se desfazer de seu lealíssimo chanceler muito a contragosto, e somente quando ficou claro que era sua própria sobrevivência política que estava em jogo.
Tem sido assim desde que o Centrão se assenhoreou do governo, tutelando o presidente para fazê-lo parar de sabotar o combate à pandemia. A troca no Ministério da Saúde, que obrigou Bolsonaro a se livrar de outro serviçal fiel, o intendente Eduardo Pazuello, foi apenas o começo.
Diante disso, é possível – embora, em se tratando de Bolsonaro, não exatamente provável – que o próximo chanceler seja escolhido para restabelecer um mínimo de racionalidade na chefia do Itamaraty. Não será uma tarefa fácil: o bolsonarismo planeja desde sempre transformar a Chancelaria em uma cidadela de lunáticos reacionários, sob inspiração de um obscuro ex-astrólogo que mora nos Estados Unidos.
Nessa toada, Araújo entrou para a história como o chanceler que disse ter orgulho da condição de “pária internacional” que o País assumiu sob o comando de Jair Bolsonaro; que chamou de “cidadãos de bem” os golpistas que invadiram o Capitólio para tentar reverter na marra a derrota de Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos; e que ajudou a azedar as relações não só com a China, mas com diversos vizinhos sul-americanos e com países europeus. Uma folha de serviços e tanto, para quem foi nomeado chanceler sem nem sequer ter sido embaixador.
Felizmente, ao que parece, Ernesto Araújo será devolvido a seu merecido anonimato, lugar onde seus delírios não prejudicam o País. Sem ele, o governo de Bolsonaro tende a ficar um pouco menos bolsonarista – o que, a esta altura, é um alento.
P.S.: Este editorial já estava na página quando chegou a notícia de que o general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, pedira demissão do cargo.
Folha de S. Paulo
Tumulto em Brasília
Acuado por centrão e empresariado, Bolsonaro troca ministros e causa inquietação
Jair Bolsonaro foi mais uma vez fiel ao seu estilo ao deflagrar nesta segunda-feira (29) uma tentativa atabalhoada de reorganização do seu governo, remanejando de surpresa várias peças importantes.
Algumas mudanças emitem sinais inquietantes, como a demissão do general Fernando Azevedo. Ele estava à frente do Ministério da Defesa desde a posse de Bolsonaro e exercia papel moderador, como anteparo contra os avanços autoritários do presidente.
Ao se despedir, Azevedo fez questão de destacar a importância de preservar as Forças Armadas como instituições de Estado, num momento em que a crescente ocupação de cargos por militares prejudica sua imagem ao confundi-las com os desacertos de Bolsonaro.
Azevedo será substituído pelo general Braga Neto, hoje ministro da Casa Civil, para onde será transferido outro general da reserva, Luiz Eduardo Ramos, que chefia a Secretaria de Governo.
A dança de cadeiras abre espaço para que o centrão, que assumiu neste ano o comando da Câmara e do Senado, tenha a deputada Flávia Arruda (PL-DF) na Secretaria de Governo, chave para a interlocução com o Congresso.
O ministro da Justiça, André Mendonça, voltará para a Advocacia-Geral da União e será substituído pelo secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres, seguidor de Bolsonaro que cobiçava a pasta desde a época em que o ex-juiz Sergio Moro ainda tinha emprego em Brasília.
Acuado por pressões do centrão e do empresariado, Bolsonaro também decidiu substituir Ernesto Araújo, o diplomata de ideias tresloucadas que chefiou a política externa nos últimos dois anos, por Carlos Alberto Franco França.
Nunca faltaram bons motivos para o presidente demitir Araújo. Nas últimas semanas ele se tornou alvo preferencial do Congresso, que passou a culpá-lo pelas dificuldades enfrentadas pelo Brasil na busca de vacinas para enfrentar a pandemia de Covid-19.
A gestão desastrosa do chanceler no Itamaraty afastou o Brasil de seus maiores parceiros comerciais, obstruiu canais de diálogo essenciais para a defesa dos interesses brasileiros e impôs à imagem do país vexames sucessivos.
Mas os retrocessos são resultado de uma parceria desenvolvida pelo presidente com Araújo, não apenas das ações do auxiliar inepto, e levará tempo para reconstruir as pontes que os dois dinamitaram.
Se as mudanças iniciadas nesta segunda abrem caminho para uma necessária correção de rumos, apostar numa reviravolta seria superestimar a capacidade de Bolsonaro de acertar na escolha dos seus ministros e subestimar os desafios à sua frente.
Valor Econômico
Sem as linhas emergenciais, crédito dá sinais de estagnação
O governo parece não entender que para muitas empresas pode ser tarde demais para uma recuperação
O crédito estagnou no início do ano, em consequência da retração causada pela segunda onda da pandemia e do fim das linhas emergenciais, que minoraram os efeitos da crise nas empresas e a dar alguma sustentação à economia no segundo semestre do ano passado. Dados de fevereiro divulgados ontem pelo Banco Central (BC) mostram que o saldo total das operações de crédito segue pouco acima de R$ 4 trilhões. Houve um aumento de 0,7% sobre janeiro, insuficiente para superar a inflação de 0,86%, sem falar nos juros. O mesmo padrão caracterizou janeiro.
O Relatório Trimestral de Inflação (RTI) confirmou, na semana passada, a expectativa de desaceleração do crédito neste ano. A oferta de empréstimos vai diminuir exatamente em um momento em que famílias e empresas precisam de recursos para enfrentar a segunda onda da pandemia e o governo mostra pouco empenho em erguer as redes de apoio à sociedade. Apesar de saber exatamente como fornecer tanto o auxílio emergencial quanto o crédito, após a experiência relativamente bem-sucedida do ano passado, inexplicavelmente, o governo tarda em agir.
Em um de seus boxes, o Relatório Trimestral de Inflação expõe a previsão de que o estoque de crédito vai crescer 8% neste ano, praticamente a metade dos 15,7% de 2020. Considerando que a inflação esperada é de 5% e os juros estão em alta em consequência da elevação da taxa Selic, pouco alívio virá dessa frente. A oferta de crédito para as famílias ficará relativamente estável, com aumento esperado de 11,5% em comparação com 11,2% em 2020. O principal aperto será exatamente nas linhas para as empresas, que devem aumentar 3,4%, ou seja, uma variação negativa em termos reais, depois de terem saltado 21,9% em 2020. As concessões de novos créditos às empresas estão em queda há três meses consecutivos e as linhas mais afetadas são as de capital de giro, conta garantida e desconto de cheques.
O cavalo de pau vai ocorrer exatamente no crédito direcionado, que abrange as linhas que o governo montou em 2020 para enfrentar a situação de emergência. O crédito direcionado para empresas deu um salto de 22,8% no ano passado, depois de ter encolhido 14% em 2019. A previsão para este ano não para de piorar e agora está em recuo de 7%. Já o crédito direcionado para as pessoas físicas deve crescer 11%, em razão da expansão do financiamento imobiliário, embora menos do que os 11,7% de 2020.
O Centro de Estudos de Mercado de Capitais (Cemec) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) avalia que as condições de financiamento para as empresas serão menos favoráveis neste ano. As empresas serão pressionadas pelo vencimento de impostos que foram postergados e pelo fim da carência de operações de crédito que foram renegociadas e tiveram os pagamentos ampliados. Como acrescenta a Febraban, haverá o peso ainda da elevação do IOF sobre o crédito e da maior alíquota da CSLL dos bancos a partir de julho.
Apesar desse quadro sombrio, demora a ser colocada em prática a reformulação das linhas emergenciais. As maiores esperanças estão depositadas no Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), que começou a funcionar no segundo semestre e liberou R$ 37,5 bilhões, em 516 mil operações. Somente agora, no fim de março, é que passou pelo Senado um Pronampe reformulado, idealizado para ser permanente, que terá que passar pela Câmara e ser regulamentado, para então entrar em vigor.
Não se sabe se terá o efeito positivo na economia dada as mudanças de condições, a começar pelo forte reajuste do custo. Os juros cobrados saltaram de 1,25%, além da taxa Selic, para 6% mais a Selic, em consequência da menor cobertura pelo Fundo de Garantia de Operações (FGO). Na versão original, o FGO cobria até 100% de cada operação até 85% da carteira total. Para minorar a paulada, o prazo foi ampliado de 36 meses para 48 meses.
Além disso, o governo já prometeu linha semelhante ao Pronampe, mas para bares, restaurantes e pequenos negócios semelhantes, com juros menores, com recursos do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e poderá liberar R$ 3 bilhões. Nada se fala a respeito do Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (Peac), que chegou a liberar R$ 92 bilhões.
Assim como falta senso de urgência ao governo para providenciar vacinas, oxigênio e outros insumos básicos, o governo parece não entender que um quarto do ano já se passou e que para muitas empresas pode ser tarde demais para uma recuperação.