O Centrão é um dos pilares do plano de reeleição do presidente Jair Bolsonaro
O governo vai mal em todas as áreas “e pior ainda nas outras”, resume o ditado. Apesar disso, e no sentido inverso à emergência da tragédia epidêmica, o presidente Jair Bolsonaro mantém estabilizados os seus índices de popularidade: não cai abaixo de 20, não sobe muito além dos 30.
São piso e teto, que não consegue dilatar, e transformam seu governo em campanha eleitoral permanente. Uma campanha que, desde 2018, nunca cessou de fato. Agora, mesmo, um dia voa ao Piauí, desafiando o PT do governo estadual; noutro vai a Bagé, terra do general Medici, símbolo da ditadura militar de que se propõe herdeiro. Tudo com um mesmo sentido.
O plano reeleitoral de Bolsonaro assenta-se em três pilares: sua ação pessoal, a ação dos ministros e, agora, a contratação do Centrão.
Com a ajuda emergencial de R$ 600 presa à lapela, confundindo-se com a magnanimidade da iniciativa, Bolsonaro espera que o eleitorado esqueça a má figura que fez e insiste em fazer com relação à pandemia.
Precisa de cenas de popularidade explícita que, inclusive, sejam à prova, graças às prerrogativas do cargo e da caneta, de manobras judiciais que possam ameaçar a estabilidade do seu palanque. As previsões são sinistras.
Já o segundo pilar, a administração, deixa aos ministros, que devem lhe oferecer outras bandeiras e motivações para que continue cavalgando no lombo do jegue ou nos braços dos mais exaltados.
Pede a eles que governem. No momento, governar é formular o programa Renda Brasil, para colar a Bolsonaro o apelo emocional do Bolsa Família e outros itens de propaganda, como o Pró-Brasil, preparado às pressas para reunir obras velhas ou novas a serem tocadas, ou não.
Certamente foi para viabilizar isto que o presidente mudou de opinião e autorizou o aumento de impostos, resultado sem fantasia da ressurreição da CPMF e extinção das deduções com médicos e escola (olhem aí, de novo, a negação da Ciência e da Saúde).
Ao Centrão, terceiro pilar do plano reeleitoral, cabem a governabilidade e a sustentação político-partidária de sua candidatura. É bem verdade que venceu o primeiro mandato sem este recurso, mas não estava tão desgastado como hoje. Por isso, e por haver apostado em um único líder desse grupo tão eclético, é que os assessores políticos correm para evitar que a onda minguante atinja o bloco antes de ter de entrar em cena.
A primeira metade do mandato foi perdida pela guerra contra um invisível inimigo ideológico. A segunda metade será perdida na luta para ganhar um segundo mandato. Este será, com certeza, perdido, pois perdeu a credibilidade para se confiar no contrário.
A sua entrega ao Centrão foi uma aposta na reeleição. Daí haver ocorrido ao cientista político Antônio Lavareda que o governo Bolsonaro divide seu tempo em AC (antes do Centrão) e DC (depois do Centrão). Com a carga de ironia da invocação do tempo bíblico.
Por mais que pareça alheio à engenharia que confia mantê-lo no topo até a realidade do voto na urna, Bolsonaro a vislumbrou quando se viu caindo em direção ao piso, já com 25% de ótimo e bom. Saiu de fininho, abandonou o estilo truculento e o confronto para se recuperar e avaliar melhor, inclusive, a oposição, que o surpreendeu. Não esperava tão cedo a ação da Justiça nem os movimentos de rua dos seus adversários.
Ainda não chegou ao seu máximo, os 34% que teve no primeiro turno de 2018. Mas está mais perto desta marca do que dos 25% do seu teto baixo.
Os mesmos cálculos que alimentam Bolsonaro alimentam também seus opositores. As pesquisas que registram o teto e o piso do otimismo do presidente indicam também a existência real de 70% de insatisfeitos. Um contingente para virar qualquer jogo. Donald Trump estava absoluto até outro dia. Com Joe Biden na campanha, chegou àquele ponto em que o medo da derrota inspira o apelo à anulação, ao adiamento, à fraude futura. Por que não se repetir o mesmo no Brasil? (O Estado de S. Paulo – 05/08/2020)