Em entrevista, presidente do Cidadania volta a cobrar CPI, critica leilão por vaga no STF e defende Huck como alternativa à polarização “corrupção ou obscurantismo” que representam os extremos da política atual
Em entrevista nesta segunda-feira (3) ao programa “Em Cantos”, da Radiocracia Já, o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, criticou a gestão do presidente Jair Bolsonaro, falou sobre a pandemia do novo coronavírus e comentou as perspectivas para as eleições presidenciais de 2022. Segundo ele, a atuação do Congresso Nacional no enfrentamento da doença, que já matou mais de 94 mil pessoas no país, é mais relevante do que o trabalho do Executivo.
“Estamos vendo uma participação de deputados e senadores no enfrentamento da pandemia com maior responsabilidade do que o próprio Executivo. As grandes iniciativas para o combate da pandemia e para aliviar a crise econômica, que era anterior à doença e foi aprofundado por ela, melhorou o nível de confiança e credibilidade do Congresso perante a sociedade”, destacou.
Freire, porém, mostrou preocupação com a condução do ponto de vista político e lembrou que o Congresso já deveria ter instalado uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para discutir a negligencia do Executivo com o avanço da Covid-19 sobre a população.
“Vários fatos já aconteceram bem determinados e que poderiam, por exemplo, ensejar algumas CPIs, mas estamos vendo um Congresso politicamente paralisado. E não adianta dizer que é a pandemia porque o plenário remoto está funcionando até para votar emendas constitucionais. Não temos uma CPI para discutir esse absurdo que o Tribunal de Contas da União mostrou que é o Ministério da Saúde usar apenas 30% dos recursos destinados ao combate à pandemia”, criticou.
Leilão para o STF
Durante o bate papo, o ex-parlamentar foi questionado se a intervenção da Procuradoria-Geral da República, que pediu acesso a todas as informações da Lava-Jato em Curitiba, estaria ligada a uma eventual disputa por uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Para Freire, o presidente busca blindar a família e seu envolvimento com milícias.
“O PGR não é o único que está sendo encantado pelo presidente por uma vaga no Supremo. Tem o presidente do STJ, que amenizou a prisão do Queiroz. Tem todo o setor que criticava a Lava-Jato e que tem em Bolsonaro um grande momento em função dos seus problemas com seu clã familiar e suas relações com milicianos. Ele busca essa blindagem e a PGR está exercendo um pouco esse papel”, pontuou.
Para ele, a desarticulação da Lava Jato pode ter sido um passo para o qual Augusto Aras contou com “força e sustentação” do Centrão. “Não é um bom sinal para o país”, apontou Freire. O presidente nacional do Cidadania também analisou o papel do STF como guardião da Constituição frente a um governo que coloca em risco a democracia, principalmente por ter em seus quadros articuladores – e o próprio presidente – que são órfãos da ditadura.
Esse núcleo, observou, trabalha para reduzir o papel de todo e qualquer outro Poder e tornar a presidência “mais imperial ainda”. São exemplos disso, listou, o presidente “imaginando governar sob decretos, não respeitando determinadas autonomias, e uma política de destruição de instituições” às quais esse núcleo atribuiu a pecha de “movimento cultural dos comunistas”.
“Essa luta deles é uma tentativa de impor toda uma visão retrógrada e antidemocrática. Nesse sentido, o STF tem tido uma conduta exemplar, de coibir e colocar diques para essas tentativas. Talvez hoje o grande poder da República na defesa da Constituição”, sustentou.
Cenário Para 2022
Freire avaliou que a eleição de Bolsonaro está ligada a um uso indiscriminado das redes sociais e aos episódios de corrupção dos governos do PT, o que culminou na polarização que o país vive hoje. Na avaliação do ex-parlamentar, mesmo que Jair Bolsonaro não passe pelo processo de impeachment, que ele enxerga como necessário, a sociedade já analisa um novo cenário eleitoral em 2022, que fuja aos extremos “corrupção ou o obscurantismo”.
Sobre a possibilidade de uma candidatura de Luciano Huck, Freire falou que ele continua sendo a alternativa. “Não estamos tratando com alguém que é só um bom apresentador, mas com alguém que tem lucidez, que tem capacidade de construir equipe e liderança. Ainda existe essa hipótese, que diminuiu o ritmo em função da pandemia. É uma pessoa que pode representar uma alternativa moderna, contemporânea do futuro que vem”, disse.
Levado a fazer uma análise da possibilidade de o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro se lançarem à Presidência em 2022, Freire afirmou que a alternativa deve dialogar com setores liberais e democráticos de direita.
“Mandetta não é homem de direita, eu diria que ele é um liberal, poderia ser um centro-direita, mas é um democrata. É uma figura respeitável. Sérgio Moro também é um dos cotados, mas não sei se ele vai sobreviver com Bolsonaro. Temos que dialogar com todas essas forças porque se pudermos fazer uma frente ampla como alternativa democrática e progressista, esse é o grande caminho que temos para 2022”, argumentou.
Questão ambiental
O presidente nacional do Cidadania também falou sobre a agenda ambiental nesse novo momento de mudança da sociedade. Ele disse não ser pessimista, até porque “viu surgir a ideia das organizações que buscavam preservar a natureza, os primórdios do verde”.
“Essa ideia que eu vi surgir não é apenas dos verdes, ela é do mundo. Quem hoje não fala da sustentabilidade? Quem admite processo de desenvolvimento sem cuidar da natureza? Hoje, você começa a discutir a natureza sem agredi-la e sem tornar a relação homem/natureza desfavorável à continuidade de uma existência permanente. Desmatamento não é uma questão específica dos ambientalistas, começa a ser dos investidores e até do setor financeiro”, analisou.