Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (10/06/2020)

MANCHETES

O Globo

Sob pressão, governo volta a divulgar dados totais da pandemia
Novo programa social vai substituir Bolsa Família
Pedidos de seguro-desemprego batem recorde em maio
Planalto desiste de trasnferir R$ 83,9 milhões para a Secom
MP Eleitoral: STF deve enviar provas ao TSE
Com humanos acuados, robôs ganham espaço na pandemia
TJ do Rio decide liberar a reabertura
Após ataques, Witzel agora quer retomar diálogo com Bolsonaro
Maracanã, 70 anos em 70 jogaços

O Estado de S. Paulo

Após 82 dias, comércio de rua reabre em SP com horário restrito
MPF dá aval a uso de provas de fake news no TSE
Planalto recua de repasse do Bolsa Família para a Secom
Dossiê sobre Wizard
TSE define Fundo Eleitoral
País registra 1.185 mortes e 31 mil infecções em 24 horas
Por dia, 25 mil desempregados pedem seguro ao governo
Skatistas usam curvas de Niemeyer

Folha de S. Paulo

Interior registra mais casos e mortes ao reabrir economia
Comércios reabrem hoje em São Paulo; shoppings, talvez amanhã
General diz que governo vai divulgar todos os dados
Óbitos por SRAG se multiplicam onde vírus não aparece
OMS reforça que assintomático também transmite
Corrida pela cloroquina gera desassistência
Sem controle de contágio, retomada não é garantida
Verba volta ao Bolsa Família após ir para publicidade
PSL é partido que mais cresce, mesmo após saída de Bolsonaro
Polícia indicia 11 em caso de contaminação de cervejas da Backer
Santander planeja corte de 20% dos empregados no país; banco nega
Bolsa de Valores e bancos não abrem amanhã
Floyd, rosto de atos contra o racismo, é enterrado nos EUA

Valor Econômico

Argentina vai pedir 3 anos de carência ao FMI
Crise global
Ajuda será proporcional ao emprego
Renda Brasil deve reunir programas
Plano Mourão contra desmate é bom, mas há desconfiança
Bancos elevam juro do crédito à agricultura

EDITORIAIS

O Globo

Bolsonaro deveria entender críticas e acenos de Toffoli

A epidemia e a crise que chega não garantem boas perspectivas para o presidente e seu projeto eleitoral

A rara calmaria com que o dia de ontem transcorreu até o início da noite começou com uma reunião do ministério do presidente Bolsonaro transmitida ao vivo pela TV Brasil, e que transcorreu dentro dos protocolos e etiquetas condizentes com esses encontros, diferente daquela de abril.

Em seguida, o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, atendendo a convite da Câmara dos Deputados, deu explicações à comissão externa formada na Casa para tratar da crise da Covid-19, principalmente sobre a nova e polêmica metodologia de contabilização das estatísticas do avanço da epidemia no país. E anunciou que o ministério voltaria a divulgar os dados da forma como vinha fazendo, conforme determinação do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, em atenção a reclamações de partidos políticos.

Não faz muito tempo, esta mesma agenda poderia ter levado Bolsonaro a usar a sua artilharia contra alvos diversos, todos de alguma maneira relacionados à democracia. A melhor hipótese para o comportamento distendido de Bolsonaro, pelo menos no dia de ontem, seria que o presidente afinal passou a refletir sobre a trajetória que segue no seu radicalismo, percebendo que seu destino é o isolamento.

Ajudará bastante Bolsonaro e o país se ele entender as críticas que o presidente do Supremo, Dias Toffoli, lhe fez na segunda- feira sobre a dubiedade com que se refere à democracia, e acerca dos ataques que manifestações, com seu apoio, têm feito ao estado democrático de direito e especialmente à Corte. O presidente pode ter uma claque ruidosa, mas não se governa na tranquilidade com apenas 30% ou 25% de apoio, e elevada taxa de desaprovação enquanto a população enfrenta a mais grave ameaça na saúde pública em décadas, a epidemia do coronavírus.

A construção de uma ampla frente pela democracia é forte empecilho a projetos golpistas do presidente, se ele os tiver. Entrevista concedida no domingo na GloboNews por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) à jornalista Míriam Leitão demonstrou a viabilidade da aliança.

É certo que o desconforto dos brasileiros crescerá mais ainda com o desemprego e a perda de renda que já começam a ocorrer no aprofundamento da recessão deflagrada pela epidemia, com efeito corrosivo nos planos eleitorais do presidente. Bolsonaro precisa entender o apelo de Toffoli à união entre os poderes para o combate à Covid, mas que também precisará se estender à passagem pelos momentos difíceis que estão a caminho com a crise às portas. Semear o caos como tática golpista colherá apenas mais caos.

Virar as costas ao mundo, sem preocupar-se com reações bizarras na pandemia ou o proposital descontrole do desmatamento na Amazônia, somados aos ataques à democracia, significa também inviabilizar uma passagem menos dolorosa pela recessão já contratada, porque faltarão investimentos externos para isso. Tudo a ser debitado da conta do presidente.

O Estado de S. Paulo

A ‘dubiedade’ do presidente

A manutenção do regime plenamente democrático depende fundamentalmente da defesa clara de suas instituições contra os ataques dos liberticidas

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, disse que “algumas atitudes” do presidente Jair Bolsonaro “têm trazido uma certa dubiedade, e essa dubiedade impressiona e assusta a sociedade brasileira”. O ministro enfatizou que Bolsonaro e o vice-presidente Hamilton Mourão “juraram defender a Constituição e são democratas”, e que “chegaram ao poder pela democracia e merecem nosso respeito”. Contudo – enfatizando que falava “em especial” do presidente Bolsonaro, com quem dialoga e tem, em suas palavras, “uma relação harmoniosa” -, declarou que “não é mais possível” ter “atitudes dúbias” em relação à democracia.

Isto é, a manutenção do regime plenamente democrático depende fundamentalmente da defesa clara de suas instituições contra os ataques dos liberticidas – como tem acontecido com frequência preocupante nos últimos tempos por parte dos camisas pardas que idolatram Bolsonaro, sem que o presidente da República os censure de nenhuma maneira. Ao contrário, Bolsonaro, enquanto diz respeitar a democracia e os demais Poderes, confraterniza com quem advoga às escâncaras o fechamento do Supremo e do Congresso e demoniza a oposição.

É essa “dubiedade” que, de fato, como disse o ministro Toffoli, “impressiona e assusta a sociedade brasileira”. Não é possível se dizer um democrata e, ao mesmo tempo, atacar a imprensa dia e noite, avisar que não cumprirá alguma decisão judicial e estimular movimentos golpistas, como fez e faz Bolsonaro. Também nada há de democrático quando um presidente diz que “o grande problema do momento” são as manifestações pacíficas contrárias a seu governo, cujos participantes Bolsonaro, sem qualquer amparo na lei e no bom senso, já qualificou como “terroristas”. Segundo o presidente, “estão começando a colocar as mangas de fora”.

À parte o fato estarrecedor de o chefe do Executivo considerar o “grande problema do momento” algumas passeatas de opositores, em vez da pandemia de covid-19, essas declarações explicitam mais uma vez sua rematada incapacidade de entender o que é e como funciona uma democracia.

Para Bolsonaro, a democracia e suas instituições atrapalham seu governo. Manifestações de rua, por exemplo, não são expressão legítima de descontentamento, e sim, segundo ele, sabotagem por parte dos que “não aceitaram perder no voto as eleições de 2018”. Além disso, na concepção bolsonarista, o Supremo tem se intrometido indevidamente no trabalho do presidente – seja ao suspender a nomeação de um seu amigo para chefiar a Polícia Federal, por evidente desvio de finalidade; seja ao impedi-lo de determinar unilateralmente a reabertura de comércio e de serviços nos Estados e municípios, pois tal decisão feriria o princípio federativo; seja ao ordenar que o Ministério da Saúde volte a divulgar os números completos da pandemia, sem qualquer manipulação e omissão, de acordo com o princípio constitucional da publicidade da administração pública.

Pouco importa que nesses como em outros casos as decisões do Supremo tenham seguido estritamente a Constituição. Para Bolsonaro, os ministros do STF usurpam seu poder e o impedem de governar. Talvez seja por esse motivo que o presidente tenha dito que tudo vai melhorar em seu governo quando ele mudar a composição do Supremo. “Eu vou indicar o primeiro ministro do Supremo agora em novembro. O primeiro. Vai arrumando as coisas devagar aqui”, declarou.

Ou seja, a expectativa de Bolsonaro é que um ou dois ministros indicados por ele, num colegiado de 11, seja o suficiente para fazer o Supremo dobrar-se às suas vontades. Além de revelar profunda ignorância de como funciona o Supremo, tal raciocínio explicita o desejo bolsonarista de domesticar o Judiciário, fazendo-o trabalhar a favor de seu projeto autoritário de poder – exatamente como fez o ditador venezuelano Hugo Chávez.

Como destacou o ministro Toffoli em seu discurso, a estabilidade democrática do País se deve em grande parte à autonomia e à independência das instituições: “Seguiremos vigilantes em relação a qualquer forma de ataque ou ameaça ao Poder Judiciário, ao Supremo Tribunal Federal e às instituições democráticas deste país”. É o que esperam os cidadãos brasileiros que amam a liberdade.

Folha de S. Paulo

Bolsa ou Renda

Programa anunciado gera dúvidas; governo fará bem se ampliar cadastro de pobres

Parece provável que questões e questiúnculas políticas ocupem grande parte do debate em torno do recém-anunciado Renda Brasil — que, segundo o ministro Paulo Guedes, da Economia, será uma versão ampliada do Bolsa Família a ser lançada, em caráter permanente, após o pior da pandemia.

De mais mesquinho, haverá decerto resmungos contra a mudança marqueteira do nome do programa, além da retomada de disputas pela paternidade da ideia de transferir renda diretamente para os estratos mais pobres da população.

Trata-se de polêmica que não deveria sobreviver a esta altura. Vem de longa data, em todo o mundo, o aperfeiçoamento das ações assistenciais do Estado, a partir de estudos acadêmicos, experiências em diversos países e fomento de organismos como o Banco Mundial.

Essa modalidade, mais focalizada e menos paternalista, começou no Brasil de forma embrionária sob o tucano Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e ganhou impulso nas administrações petistas de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-10) e Dilma Rousseff (2011- 16).

Mais relevante, no âmbito político, é o que a nova iniciativa pode revelar dos rumos do governo Jair Bolsonaro. Será afrouxada, em definitivo, a austeridade orçamentária? O presidente enfraquecido está em busca de uma outra base de sustentação política e eleitoral?

Um tanto de ceticismo deve preceder tais especulações. Primeiro, porque Guedes é dado a anúncios bombásticos que resultam em coisa nenhuma —já falou, por exemplo, em zerar o déficit público em um ano, arrecadar R$ 1 trilhão com privatizações e obter 40 milhões de testes para a Covid-19 de um misterioso empresário britânico.

Ademais, o regime de arrocho fiscal não é mera escolha ideológica. O governo brasileiro, que hoje depende de dinheiro emprestado até para o custeio cotidiano, não conseguirá criar novas despesas permanentes sem convencer o mercado credor de que a alta explosiva da dívida pública será contida.

Tudo considerado, o governo fará bem se aproveitar a experiência do auxílio emergencial na pandemia, já problemática, para tornar mais completo seu cadastro de famílias de baixa renda, de modo a incorporar trabalhadores informais.

É desejável rever a distribuição de recursos da portentosa rede nacional de proteção social —programas como o seguro-desemprego, por exemplo, deixam de fora quem não teve a carteira assinada. A carga tributária deve mirar mais a renda e menos o consumo.

Com qualquer nome que venha a ter, a transferência de recursos aos mais carentes precisa ser preservada e, se possível e necessário, ampliada —com critérios transparentes e o mínimo de politicagem.

Valor Econômico

Boicote do governo à luta contra pandemia chega às estatísticas

Em um mesmo dia, o governo apresentou dois números diferentes de vítimas da covid-19

O governo de Jair Bolsonaro não apenas se eximiu de conduzir o combate ao novo coronavírus como se moveu sem parar para dificultar os passos daqueles a quem restou a tarefa de enfrentar uma doença altamente contagiosa. A atitude macabra de esconder e omitir dados abrangentes e detalhados sobre a pandemia é mais uma na escalada de barbaridades capitaneadas pelo presidente.

O coronavírus foi um desastre para o mundo e para os brasileiros – mais de 37 mil mortos até ontem – e devastador para as aspirações de Bolsonaro de se reeleger com pouco esforço. Qualquer político minimamente inteligente procuraria combater o contágio para abreviar o período de parada súbita da economia. Se fizesse isso, Bolsonaro teria feito a coisa certa em uma hora terrível para a nação e poderia até ganhar tração eleitoral.

Como a razão fugiu correndo pelos fundos quando Bolsonaro subiu a rampa principal do Palácio do Planalto, as ações do presidente se chocaram com a realidade – o conjunto da obra em progresso é tenebroso. O presidente viu na rápida disseminação do vírus e na política de distanciamento social executada com maior ou menor afinco pelos governadores, a oportunidade política obtusa de desdenhar da doença e atribuir a vários políticos que vê como concorrentes nas urnas (João Doria, de São Paulo e Wilson Witzel, do Rio) a responsabilidade pelo desastre econômico subsequente.

Essa interpretação delirante, que não deixou espaço sequer para fiapos de solidariedade humana, pautou a série de atos para boicotar o trabalho de vida e morte contra a pandemia. Em vez de dar o exemplo esperado de quem ocupa o cargo, o presidente disse que o vírus não era nada e que todo mundo morre um dia (“E daí?”). Não perdeu tempo para misturar-se a seus apoiadores, recusando-se a usar máscara e a impedir aglomerações.

A rotina do poder deve causar tédio a Bolsonaro, para quem governar é criar atritos com tudo e com todos. Uma das vítimas foi seu ministro da Saúde, Luiz Mandetta, de cuja popularidade se enciumou. Nelson Teich, sucessor de Mandetta, não resistiu um mês, saiu sem dizer os motivos, mas era patente que tinha se enganado ao entrar no hospício em que se transformou o ministério – exibido ao vivo e em cores na reunião de 22 de abril.

O terceiro ministro da Saúde é um militar cumpridor de ordens, que loteou o ministério com mais duas dezenas de companheiros de armas, após recomendar um protocolo médico pelo uso da cloroquina até mesmo em casos leves da covid-19. Um especialista em gestão, o empresário Carlos Wizard, foi convocado, disse que o número de mortes foi inflado, sugeriu uma recontagem, provocou espanto e indignação e escafedeu-se.

Com um ministro interino na Saúde, as mortes na pandemia mudaram de ritmo – mais de 1 mil por dia – e ainda não atingiram seu pico. Parte da elevada conta está sendo cobrada do presidente, depois de tantos e ininterruptos desatinos. O Brasil caminha para o segundo lugar em número de mortos e casos confirmados, atrás dos Estados Unidos – dois países liderados por negacionistas de primeira hora, Trump e Bolsonaro.

O presidente, no entanto, não gostou dessa publicidade unanimemente negativa, que o tornou objeto de ojeriza internacional. Os boletins oficiais, documentos que seguem métodos e padrões aceitos e usados internacionalmente para a contabilidade da pandemia, começaram a atrasar, o que nunca havia ocorrido. Quando ressurgiram, não traziam o número acumulado de mortos e contaminados e continham nova forma de apresentar os óbitos em 24 horas. Em um mesmo dia, o governo apresentou dois números diferentes de vítimas da covid-19.

A manobra é bizarra, mas não suas consequências. Deter o rastro de mortes do vírus, localizá-lo e isolá-lo depende muito de estatísticas as mais detalhadas e abrangentes possíveis. Além disso, as estatísticas são indispensáveis para que a estratégia de abertura do confinamento possa ser bem-sucedida, ao orientar o planejamento das ações. Um pool de jornais (O Globo, O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, Extra e os portais G1 e UOL) se propôs a suprir números que se tornaram pouco confiáveis nas mãos do governo.

Após a atrocidade com os números, Bolsonaro provavelmente atribuirá mais uma tentativa de imputar-lhe crime de responsabilidade à perseguição política e não ao jogo de vale-tudo que resolveu jogar em meio a um morticínio raramente visto e à maior recessão da história brasileira.

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