Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (19/03/2020)

MANCHETES

O Globo

Bolsonaro reage com novo pacote, mas é recebido com panelaços
Autônomos e informais terão R$ 200 por três meses
Coronavírus: dois ministros e Alcolumbre infectados
Empregos: salário e jornada poderão ser reduzidos
Após 4ª morte em SP, comércio vai ficar fechado
Trump e Merkel comparam desafio atual à 2ª Guerra

O Estado de S. Paulo

Governo permitirá que empresas cortem salários e jornada à metade
22 capitais têm panelaço contra Bolsonaro
Com mais 3 mortes, SP fechará lojas a partir de amanhã
Renda de informal deve cair 10% no trimestre
Eduardo contraiu ‘vírus mental’, diz chinês
Anvisa autoriza registro de 8 kits de testes rápidos
Hospitais denunciam preço abusivo de insumos

Folha de S. Paulo

Governo vai permitir corte de salário e jornada pela metade
Alvo de novo panelaço, Bolsonaro tenta reagir
São Paulo registra mais 3 mortes, e hospital tem 8 funcionários em UTI
Nas redes, centro se alinha à esquerda contra Bolsonaro
Governadores bolsonaristas tratam vírus como alto risco
SP registra mais três mortes por Covid-19 e Brasil tem 428 casos
Dias Toffoli vê atuação impecável da imprensa durante a crise
Familiares do 1° paciente que morreu estão internados
SP terá que fazer uma gestão de leitos de UTI para que o sistema não entre em colapso
Covas fecha lojas e Doria, shoppings em SP
Outros estados mantêm centros de compras abertos
Ministro do STF pede que juízes avaliem penas alternativas
Ação policial contra o novo vírus pode ter efeito simbólico, dizem especialistas
No norte da Itália, pacientes morrem sem extrema-unção
Presidente de Portugal decreta estado de emergência

Valor Econômico

Analistas já veem recessão e esperam mais gasto público
Bolsonaro volta a criticar ‘histeria’ e enfrenta panelaço
Montadoras começam a parar e parte do comércio terá de fechar
Alcolumbre e dois ministros estão com coronavírus
Óleo abaixo de US$ 25 pressiona a Petrobras

EDITORIAIS

O Globo

Resposta na economia tem de ser incisiva

O estado de calamidade permite medidas à altura de uma pressão recessiva jamais observada

Depois de um fim de semana em que a pandemia do coronavírus se tornou mais grave, o conjunto de medidas anunciado na segunda-feira pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, deixou uma única certeza, a de que muito mais teria que ser feito. O próprio Guedes admitiu a insuficiência das ações, quando se referiu à intenção do governo de “tomar medidas a cada 48 horas”, se fosse necessário. E seria. O ministro sequer ficou para responder a perguntas dos jornalistas, saiu para uma reunião ministerial. Demonstrou não dar muita importância ao minipacote.

Ao todo, envolvia R$ 147 bilhões, mas quase tudo já previsto no Orçamento. O anúncio feito na noite de terça de que o governo encaminharia ao Congresso pedido de decretação de estado de calamidade pública, com base na Lei de Responsabilidade Fiscal, foi um alívio. Pelo menos a área econômica tinha consciência de que nem mesmo a crise financeira global iniciada em fins de 2008 pode ser comparada ao que acontece agora na economia mundial. Desta vez, um vírus forçou a paralisação de sistemas produtivos, a começar pela Ásia, num processo em cascata que começa a chegar ao Brasil.

Com as pessoas em casa, para quebrar a cadeia de contaminação, o consumo desaba, derruba o PIB e estanca investimentos. Não há registro pelo menos no pós-guerra de que, em tão pouco tempo, tenha se formado uma pressão recessiva tão poderosa. Por isso, o Estado precisa gastar para se contrapor ao risco de uma quebradeira que eliminará empregos e salários.

Os freios e contrapesos fiscais da LRF exigem adequada autorização formal do Congresso para que o governo deixe de cumprir a meta fiscal deste ano (um déficit de R$ 124 bilhões). No início da noite de ontem, ao vivo, com o presidente Jair Bolsonaro, foi assinada medida provisória de socorro às companhias aéreas, algumas das primeiras vítimas dessas crises globais. Também estava presente o presidente do Supremo, Dias Toffoli, o que deu amplitude institucional ao ato, em que o ministro do STF destacou o projeto de lei que cria um comitê para gerenciar conflitos jurídicos, e entre instituições, que surgirão na execução deste programa. Bolsonaro e Toffoli assinaram o projeto, que conta com o apoio dos presidentes da Câmara e Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. O procurador-geral da República, Augusto Aras, José Múcio, do Tribunal de Contas (TCU) e André Mendonça, da Advocacia-Geral da União, também estiveram presentes. Foi um gesto importante de unidade na República para tratar de uma grave crise econômica e de saúde pública.

As dificuldades que se aproximam de um país com 27 milhões de pessoas desempregadas e subempregadas, 40% da força de trabalho na informalidade, e com um outro Brasil que vive em favelas, um santuário para coronavírus, exigem medidas rápidas e amplas.

A entrevista coletiva à tarde, do presidente e ministros, todos paramentados com máscaras, aumentou o pessimismo, atenuado pela demonstração, dada à noite, de entendimento entre poderes da República, diante das adversidades. Toffoli, a poucos metros de Bolsonaro, elogiou o trabalho da imprensa, alvo do presidente. Os próximos dias indicarão qual a impressão verdadeira.

O Globo

Setor cultural precisa de socorro específico contra efeitos da epidemia

Atividade que reúne mais de 300 mil empresas e emprega 1,9 milhão no país não pode ser abandonada

A cultura já sente o impacto das medidas de contingência para conter o avanço do coronavírus no país. Nas duas maiores cidades brasileiras, São Paulo e Rio, o setor entrou numa espécie de quarentena que, na prática, não tem prazo para acabar, à medida que a retomada das atividades depende de como evoluirá a epidemia.

Na sexta-feira, o governador do Rio, Wilson Witzel, determinou o fechamento de cinemas, teatros e casas de shows. O governador de São Paulo, João Doria, tomou decisão parecida, fechando equipamentos culturais do estado e recomendando que cinemas e teatros fizessem o mesmo. Ontem, Doria vetou também o funcionamento de shoppings na Grande São Paulo, o que, indiretamente, afeta as salas de exibição. Eventos também estão sendo cancelados. O Lollapalooza, que seria realizado em abril, em São Paulo, foi remarcado para dezembro.

Evidentemente, as medidas são importantes para evitar aglomerações. Sabe-se que parcela do público de cultura é formada por idosos, um dos grupos de risco para o novo coronavírus.

Mas há que se pensar na sobrevivência de um setor que, segundo o Sistema de Informações e Indicadores Culturais (SIIC), emprega 1,9 milhão de pessoas em 325 mil empresas ou organizações no país. E é fortemente marcado pela informalidade — entre 2014 e 2018 o percentual de trabalhadores com carteira caiu de 45% para 34,6%.

O secretário de Cultura e Economia Criativa de São Paulo, Sérgio Sá Leitão, estima em R$ 34,5 bilhões as perdas da área. Espera-se para hoje o anúncio de medidas que contemplem esse setor que representa 3,9% do PIB do estado.

O pesquisador da FGV Projetos Luiz Gustavo Barbosa diz que a cultura precisará de ajuda do governo para enfrentar os planos de contingência do coronavírus e se reerguer. Para ele, são necessárias soluções específicas, além das medidas genéricas anunciadas na segunda-feira pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Barbosa cita, por exemplo, linhas de crédito e incentivos fiscais a empresas e produtores culturais.

Certamente, o setor cultural não será o único a sofrer os devastadores efeitos do coronavírus. Todos perderão, de uma forma ou de outra. Mas não se pode deixar que vire pó atividade tão importante para a sociedade, e não apenas isso, que gera empregos e renda, tendo impacto relevante na economia de estados como São Paulo e Rio de Janeiro. Uma hora a tormenta vai passar, mas é preciso que se sobreviva até lá.

O Estado de S. Paulo

Com os nervos à flor da pele

Os cidadãos não suportam mais um governante que tudo faz para politizar a epidemia, agravando uma situação que já é crítica

Num gesto espontâneo, cidadãos foram à varanda de seus apartamentos na noite de terça-feira em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Brasília e outras cidades para protestar contra o presidente Jair Bolsonaro.

São brasileiros cansados de um presidente cujo único talento parece ser a capacidade de ampliar as crises que deveria administrar e conter. O valor simbólico dessa manifestação, independentemente de sua dimensão, é muito maior do que o ato golpista de domingo passado, em que grupos bolsonaristas, insuflados pelo presidente, foram às ruas em algumas cidades para pedir o fechamento do Congresso e a prisão de políticos e de ministros do Supremo Tribunal Federal.

No domingo, Bolsonaro festejou o que chamou de manifestação “espontânea” de seus apoiadores, e disse que lá estava o “povo”. Esse devaneio populista começou a ser desfeito na noite de anteontem, quando o presidente experimentou a exasperação sincera de quem está cansado de suas patranhas e resolveu demonstrar publicamente essa insatisfação.

Além disso, Bolsonaro vem perdendo popularidade de forma acelerada nas redes sociais, segundo a percepção do próprio entorno do presidente, como informou o Estado. Como se sabe, a única coisa que Bolsonaro leva a sério são os cliques e as interações do mundo virtual, que ele toma por real. Ante a perspectiva de perder o controle no ambiente em que até agora navegava soberano – por ter menosprezado uma epidemia letal e que está causando imensos transtornos e incertezas para todos os brasileiros –, Bolsonaro tentou parecer mais cordato. “Superar esse desafio depende de cada um de nós”, escreveu no Twitter, pregando “serenidade” e pedindo que “população e governo, junto com os demais Poderes”, somem “esforços necessários para proteger nosso povo”. Vindo de quem até horas antes se dizia vítima de um “golpe”, denunciava a “disputa de poder” por parte “desses caras”, em referência aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, e criticava as medidas sensatas dos governadores para conter a pandemia, foi um avanço. Resta saber até onde irá a “moderação” de Bolsonaro.

Na mesma frase em que pregava a união de todos para enfrentar a crise, o presidente disse que “o caos só interessa aos que querem o pior para o Brasil”. Ou seja, mesmo quando precisa demonstrar que governa para todos e no interesse coletivo, continua a valer-se de suas fantasias conspirativas para propagar sua mensagem divisionista e de ódio, com a qual construiu sua carreira política e chegou à Presidência. O lobo pode até perder o pelo, mas jamais perderá o vício.

Se estivesse realmente empenhado em se emendar e agir como presidente da República, e não como chefe de facção, Bolsonaro teria condenado categoricamente a convocação, pelas redes bolsonaristas, de uma nova manifestação governista, marcada para 31 de março, aniversário do golpe de 1964, explicitamente destinada a defender um novo golpe. Até agora não o fez. Pior: pelo Twitter, informou que ontem haveria um “panelaço” a favor de seu governo, como resposta aos protestos daqueles que, presos em suas casas por causa da quarentena imposta pela pandemia e com os nervos à flor da pele, não suportam mais um governante que tudo faz para politizar a epidemia, agravando uma situação que já é crítica.

Assim, de nada vale o mise-en-scène patético de um presidente que agora aparece com seus ministros, todos com máscaras, para tentar mostrar serviço, pois a presença de Bolsonaro já foi dispensada por aqueles que estão à frente dos esforços contra a pandemia, inclusive no próprio governo. Hoje, está claro que Bolsonaro não é um presidente, mas um estorvo. Não à toa, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que tem feito até aqui um bom trabalho, corre o risco de perder o emprego para o diretor da Anvisa, Antonio Barra Torres, um médico bolsonarista que, para agradar ao chefe, não viu nenhum risco de contaminação da covid-19 numa manifestação governista da qual participou o presidente.

Até aqui, Bolsonaro viveu de inventar crises. Na primeira crise real de seu governo, mostrou do que é feito.

O Estado de S. Paulo

O STF e a saúde

Decisão deve reduzir significativamente a judicialização da saúde no País

Ao julgar um recurso contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, que obrigou o governo estadual a fornecer remédios de alto custo fora da lista do Sistema Único de Saúde (SUS) a uma paciente cardiopata sem condições financeiras, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão sensata.

Por um lado, entendeu que, em casos excepcionais, Estados e prefeituras têm de arcar com as despesas, desde que os remédios estejam registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Por outro lado, determinou que, nos casos não excepcionais, o poder público só deve pagar os medicamentos que constam da lista do SUS. A distribuição de medicamentos é prevista pela Constituição, cujo artigo 196 define que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”.

A ação foi impetrada em 2007 e seu julgamento pelo STF, que começou em 2016, foi interrompido por pedido de vista do ministro Teori Zavascki, que morreu num acidente aéreo em 2017. Apesar da decisão tomada na sessão plenária de 11 de março deste ano, o caso ainda não foi totalmente encerrado porque os ministros deixaram para definir nas próximas sessões os critérios para concessão de medicamentos em casos excepcionais.

Embora o STF já tenha manifestado entendimento semelhante nessa matéria nos últimos anos, este caso tem uma peculiaridade. Como foi julgado sob o rito do princípio da repercussão geral, a decisão dada a ele valerá para mais de 42 mil processos idênticos que tramitam nas diversas instâncias do Poder Judiciário. Isso deve reduzir significativamente o problema da judicialização da saúde, que desde o início da década de 2000 afeta municípios, Estados e a União. Ele começou quando as áreas de saúde das três instâncias decidiram, por falta de recursos orçamentários, não atualizar a lista de medicamentos do SUS. A justificativa foi que os gastos com os tratamentos de alto custo para poucos pacientes reduzem os recursos direcionados ao restante da coletividade.

No início, essa estratégia permitiu a contenção de gastos, uma vez que esses remédios eram antigos e sobre eles não insidia o pagamento de royalties para os laboratórios farmacêuticos. Com o avanço da tecnologia, porém, foram surgindo remédios de nova geração muito mais eficientes, o que levou o Ministério Público e as Defensorias Públicas a recorrerem aos tribunais. Isso fez com que a discussão nos tribunais passasse a envolver o alcance da discricionariedade das prefeituras, Estados e União em matéria de política pública. O problema ganhou tal magnitude que, há alguns anos, com apoio de um hospital de São Paulo, o Conselho Nacional de Justiça firmou um acordo de cooperação técnica com o Ministério da Saúde para dar suporte a decisões judiciais relacionadas a problemas de custeio de medicamentos de última geração. Pelo acordo, o hospital emite parecer sobre a imprescindibilidade de medicações não listadas pelo SUS.

Os ministros que votaram na sessão de 11 de março tocaram nesse ponto. “Direitos sociais são plenamente judicializáveis, independente de reservas orçamentárias. Não cabe ao Judiciário formular políticas públicas, mas pode corrigir injustiças concretas”, disse o relator, ministro Marco Aurélio. “O fato de o medicamento ser de alto custo e para doença rara não libera o poder público de estabelecer políticas públicas para o atendimento da pequena parcela da população atingida. Ao contrário, justamente as dificuldades de mercado que levam ao desinteresse da indústria na pesquisa e comercialização desses remédios demandam uma ação estatal para concretizar o direito à saúde. Precisamos racionalizar essas ações”, endossou o ministro Gilmar Mendes.

Neste momento em que o poder público atravessa uma grave crise fiscal e o País enfrenta uma das piores epidemias de sua história, com muitas consequências ainda não de todo mapeadas pelos sanitaristas, a decisão do STF é oportuna.

O Estado de S. Paulo

A voz da responsabilidade

Diante da pandemia, o ajuste fiscal não é prioridade. A urgência é salvar vidas, e a economia

Diante das circunstâncias extraordinárias impostas pela pandemia do novo coronavírus, é louvável a reação dos Poderes da República, adotando medidas também excepcionais, tanto para reduzir o contágio como para minimizar os efeitos sociais e econômicos da covid-19.

Com a urgência que o tema requer, a Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira passada, três projetos de lei que contribuem para o enfrentamento da pandemia. O primeiro refere-se à liberação de recursos a Estados e municípios, permitindo o uso de saldos de repasses do Ministério da Saúde de anos anteriores em serviços de saúde diversos aos originalmente previstos.

O segundo projeto de lei aprovado proíbe a exportação de produtos médicos, hospitalares e de higiene que sejam essenciais para o combate à pandemia de coronavírus, enquanto perdurar o quadro de emergência em saúde pública. O terceiro projeto libera a venda de álcool em embalagens maiores que as permitidas atualmente, facilitando o uso do produto para desinfecção.

Vale lembrar que, no início de fevereiro, o Congresso aprovou a Lei 13.979/2020, dispondo sobre “as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus”. Entre outras ações, a lei dispõe sobre o isolamento, a quarentena e a realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação, bem como a “restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País” de acordo com orientações da Anvisa.

Na terça-feira passada, o Ministério da Saúde e o Ministério da Justiça expediram portaria regulamentando a Lei 13.979/2020 e relembrando que o Código Penal tipifica como crimes condutas contrárias à saúde pública. A portaria menciona o art. 268, que trata da “infração de determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”, e o art. 330, a respeito da desobediência à ordem legal de funcionário público.

“Contamos com todos os brasileiros para que essas medidas sejam cumpridas voluntariamente e com responsabilidade”, disse o ministro Sérgio Moro, lembrando ainda que quem descumprir orientação de isolamento ou quarentena terá de responder perante a Justiça.

Ainda que tenha agido com inexplicável atraso, o Palácio do Planalto agora atuou corretamente ao solicitar ao Poder Legislativo o reconhecimento de Estado de Calamidade Pública. Prevista para durar até o dia 31 de dezembro de 2020, a medida, que precisa ser aprovada pelo Congresso, permitirá realizar gastos extraordinários, além do que foi fixado na lei orçamentária deste ano.

O ajuste fiscal é uma evidente necessidade do País. No entanto, diante da pandemia do novo coronavírus, o reequilíbrio das contas públicas deixa de ser prioridade absoluta. A urgência agora é salvar vidas e prover todas as condições possíveis para que a economia seja afetada o menos possível. “O decreto de calamidade pública por conta da covid-19 (…) é uma medida importante para a flexibilização de mais recursos para o atendimento à nossa população”, disse o presidente do Senado, Davi Alcolumbre.

A despeito das reticências do presidente da República – até o início da semana ele tratava a pandemia do novo coronavírus como histeria –, o governo federal determinou o fechamento da fronteira com a Venezuela, em função do avanço do vírus. Comentando a medida, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que “o governo já deveria ter fechado as fronteiras. Já deveria ter restringido os voos internacionais e a circulação de pessoas, principalmente nos Estados onde a projeção é de problemas maiores, como nos Estados do Rio e de São Paulo”. Ontem, a Agência Nacional de Transportes Terrestres suspendeu o transporte internacional de passageiros em região de fronteira.

Situações excepcionais exigem medidas excepcionais. A reação diligente das instituições é um fato extremamente positivo. Se houve casos de cegueira deliberada em algumas autoridades, tal disfuncionalidade não foi a resposta habitual. A responsabilidade teve voz.

O Estado de S. Paulo

O setor de turismo na UTI

O choque da pandemia no setor é gravíssimo – para muitos será letal – e exige terapia intensiva

A pandemia da covid-19 impõe sacrifícios a todos. Mas para alguns setores de atividade o choque será particularmente brutal, exigindo cuidados especiais das autoridades. É o caso do turismo, que contribui com cerca de US$ 8,8 trilhões para a economia mundial.

O ano de 2020 deveria ser excelente. Algumas autoridades previam um recorde de receita. Em janeiro, mesmo com a epidemia na China (a maior emissora de turistas do mundo), a Organização Mundial do Turismo previa um crescimento de 3% a 4%. Mas, no dia 6/3, antes de a Organização Mundial da Saúde declarar a pandemia, ela estimou um encolhimento de 1% a 3%, com perdas de US$ 30 bilhões a US$ 50 bilhões. O potencial de piora é evidente. O World Travel and Tourism Council alertou que até 50 milhões de empregos estão ameaçados e que, no pior cenário, o setor poderá encolher 25%.

Cerca de 80% a 90% da cadeia produtiva é composta por empresas de pequeno e médio portes, que costumam receber poucos benefícios e isenções governamentais, não têm grandes reservas de caixa e se recuperam mais lentamente de crises graves. Hotéis, operadoras de turismo, promotores de eventos e, sobretudo, as companhias aéreas falam em “colapso total”.

No Brasil, enquanto as companhias aéreas negociam com o Ministério de Infraestrutura um pacote emergencial, as entidades que reúnem empresas de turismo solicitaram uma série de medidas urgentes ao Ministério do Turismo. Entre elas, linhas de crédito especial na Caixa e no Banco do Brasil, com carência de 6 meses; postergação de impostos relativos à folha de pagamento; liberação do saque do FGTS para funcionários do setor; parecer favorável do Ministério da Justiça quanto à remarcação de viagens (as empresas alegam não ter condições de devolver os valores); e alíquota zero do Imposto de Renda nas remessas ao exterior feitas por empresas do setor para quitar serviços turísticos.

O Poder Executivo e, eventualmente, o Legislativo terão de avaliar em que medida esses pedidos são viáveis aos cofres públicos. Mas, assim como as autoridades sanitárias, as econômicas precisam distinguir grupos de risco e tratar diferenciadamente casos graves, leves e assintomáticos. Em 2019 o turismo movimentou R$ 238,6 bilhões no Brasil e empregava quase 3 milhões de pessoas. Mas só em março as taxas de cancelamento chegaram a 85%. O choque da pandemia no setor é gravíssimo – para muitos será letal – e exige terapia intensiva.

Folha de S. Paulo

Calamidade

Que ao menos ações do governo sejam mais coerentes que afirmações do presidente

Enquanto o Brasil registra as primeiras mortes provocadas pela Covid-19, o governo Jair Bolsonaro toma, em meio a um discurso errático, suas primeiras medidas mais drásticas —entre as quais se destaca, pela carga simbólica, o pedido ao Congresso de reconhecimento do estado de calamidade pública.

Em termos práticos, abre-se o caminho para a elevação de gastos públicos destinados a combater a doença e seus efeitos econômicos. Nesta quarta (18), anunciou-se um desembolso de R$ 15 bilhões em três meses para o amparo de trabalhadores informais.

A providência vai ao encontro do que defendeu esta Folha, mas ainda carece de detalhamento.

Espera-se que ao menos as ações do governo se mostrem mais tempestivas e coerentes que as declarações do chefe de Estado. Em confusa entrevista coletiva, cercado de ministros, Bolsonaro mostrou mais preocupação em repetir bravatas do que em aprender o uso correto da máscara de proteção.

Além de apontar a calamidade pública, o Executivo publicou portaria estabelecendo punições a quem descumprir ordens médicas e determinando o uso de força policial para encaminhar pacientes desobedientes.

Todas as unidades da Federação estão suspendendo as aulas nas escolas das redes pública e privada e limitando as atividades nas repartições. O estado do Rio proibiu a entrada e a saída de ônibus na região metropolitana, além de reduzir a lotação dos coletivos.

Em São Paulo, cidade mais atingida, o prefeito Bruno Covas (PSDB) decretou situação de emergência e determinou o fechamento de comércios e aparelhos culturais.

Nada disso constitui exagero, ainda que as mortes contadas até aqui representem parcela pequena das infecções causadas pelo vírus Sars-Cov-2. Hoje, a letalidade da doença é estimada em 3,6%, com uma distribuição bastante desigual entre as faixas etárias.

O maior risco decorrente da epidemia, do ponto de vista da saúde pública, é o contágio maciço da população num curto espaço de tempo, e, por conseguinte, a sobrecarga dos serviços de atendimento.

Pelos dados até aqui coletados, cerca de 15% das pessoas contaminadas terminam por desenvolver quadros graves, que podem acarretar a necessidade de cuidados hospitalares, e 5% atingirão estado crítico, necessitando de suporte ventilatório em leitos de UTI.

Como se trata de uma doença que se alastra velozmente, a demora para agir pode levar a um colapso do sistema de saúde, como tem sido visto na Itália e no Irã.

O efeito colateral das medidas de isolamento e quarentena é a queda brutal, ainda que temporária, da atividade econômica, com efeitos dramáticos sobre a renda dos mais vulneráveis. Esta calamidade pode ser apenas atenuada, a um custo fiscal grande, porém inescapável.

Folha de S. Paulo

Risco carcerário

Parte dos presos deve ir para casa, de modo a atenuar impacto do coronavírus

Se a fase de aumento exponencial da Covid-19 já constitui um enorme problema em escala nacional, ela se torna um pesadelo nas penitenciárias. Nelas, a crise sanitária se soma a uma de segurança pública, o que justifica decisões que decerto parecerão controversas.

No que diz respeito à saúde, é difícil imaginar ambiente mais favorável à disseminação do vírus do que as cadeias. Lá há celas de poucos metros quadrados, quase sempre superlotadas, com pouca ou nenhuma ventilação, onde lavar as mãos com frequência, como recomendam os médicos, pode ser uma impossibilidade.

Uma vez dentro de um presídio, o Sars-Cov-2 vai se espalhar em velocidade muito maior do que em outros ambientes —e será quase impossível conter a disseminação.

Para agravar o quadro, a população carcerária apresenta altas prevalências de moléstias como tuberculose e Aids, o que levará a letalidade do coronavírus nas cadeias a superar a verificada na população. Esse efeito deve ainda ser magnificado pela má condição nutricional dos presos e pela precariedade do acesso a serviços de saúde.

No plano da segurança, a situação não é menos alarmante. Prisões se tornaram palcos de disputas entre facções criminosas, que não raro terminam em carnificina.

A simples ansiedade em relação à epidemia somada a medidas de proteção aos próprios presos, como a restrição de visitas e a suspensão de saídas temporárias, ampliam significativamente o risco de rebeliões e fugas. Já tivemos uma prévia disso em penitenciárias paulistas nos últimos dias.

Diante dessa situação de absoluta excepcionalidade, cumpre adotar medidas para reduzir a superlotação, e o próprio Supremo Tribunal Federal poderá decidir algo nesse sentido. Enquanto a questão não é submetida ao plenário, o ministro Marco Aurélio Mello já conclamou juízes a seguir nessa trilha.

As sugestões, apresentadas numa ação movida pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa, incluem conceder liberdade condicional ou prisão domiciliar a detentos idosos ou portadores de moléstias que podem agravar a Covid-19, bem como a gestantes e lactantes.

Essa lista pode e deve ser ampliada, não apenas por razões humanitárias mas também para reduzir ameaças à segurança pública.

Valor Econômico

Diante da crise, Bolsonaro comete erros em série

Líderes do Legislativo e do Judiciário, por enquanto, pedem que Bolsonaro governe. A depender da condução e da evolução da crise, podem mudar de ideia

Além de representar um risco institucional ao país, o presidente da República, Jair Bolsonaro, revelou-se também um risco à saúde pública. A propagação do coronavírus ameaça a vida de dezenas de milhares de brasileiros. Em sua ignorância garbosa, Bolsonaro não acha que o perigo é tão grande, cisma que pode ser uma armação, mais uma, da mídia e, mesmo sob suspeita de estar infectado após 12 membros da delegação que o acompanhou aos EUA serem portadores do vírus, resolveu ir a manifestações públicas e cumprimentar todo mundo. Pode ser o início do fim de seu prestígio político, pois o coronavírus é uma coisa séria demais.

A pandemia, uma das mais agressivas em décadas, ameaça o Brasil em seus pontos mais deficientes, as rede de saúde pública e a de proteção social. A pressão sobre elas será avassaladora, ainda mais porque suas demandas recaem sobre uma rede pública de saúde que já sofre a pressão de 180 mil casos de dengue e 6 mil de chicungunya. Mesmo sistemas de saúde eficientes, nos países ricos, estão sob estresse e vários deles não estão totalmente preparados para suportar a demanda súbita de centenas de milhares de pessoas a seus serviços.

Ao dizer que é “responsabilidade sua” estar ou não infectado, espalhando vírus por aí, o presidente demonstrou mais uma vez que não está à altura de suas responsabilidades e não mede esforços para manter-se no poder, apesar de ter dito durante campanha eleitoral que acabaria com a reeleição. O método com que pretende atingir seus objetivos, no entanto, não são os que regem a democracia.

As últimas ações do presidente são um escândalo. Bolsonaro se comporta como um agente provocador, afrontando sem parar os dois outros Poderes da República, e buscando caminhos para uma ditadura. Seus credos não mudaram, desde sua deputação medíocre por 28 anos, marcada por defesa dos pleitos dos militares e nunca mostrou qualquer respeito pela Constituição.

Não é verdade que eleito, Bolsonaro tenha um mandato para conduzir o Brasil ao fim da democracia, com o fechamento do Congresso e a prisão de ministros do STF, como sonha grande parte dos lunáticos que o aplaudem, tão vulneráveis ao coronavírus como o ex-capitão, ainda que acredite estar protegida por sua falta de informação abissal diante de uma pandemia devastadora.

Ao juntar-se a multidões, Bolsonaro ignorou todo o trabalho de seu ministro da Saúde, Luiz Mandetta, e dos governadores com os quais ele se reuniu. Agora, enciumado, pretende que Mandetta tenha um trabalho mais “ideológico” de defesa do governo, cujo presidente desacredita seu trabalho. Como só pensa em seu poder pessoal, insinuou que pode atrapalhar bastante o ministro, que está envolvido em uma batalha de vida e morte contra o vírus.

O presidente se superou ao misturar-se a manifestações de apoiadores contra o Judiciário e o Legislativo e, mais que isso, convocar o povo a lhe dar apoio em uma cruzada antidemocrática contra as instituições, a que por dever constitucional tem de proteger.

O presidente fica feliz com seu circo particular, que pode acabar logo. A pandemia do coronavírus pode causar danos sanitários, econômicos e sociais de uma magnitude poucas vezes vista. Suas bravatas de que se trata de histeria da imprensa logo mais será confrontada com hospitais superlotados e filas no SUS – uma paisagem desoladora, que pode perdurar mais tempo do que se imagina.

Bolsonaro não está à altura do cargo para o qual foi eleito ou de comandar o Brasil diante do desafio que lhe foi imposto. Em períodos de tranquilidade, suas traquinagens autoritárias eram descontadas na conta das promessas de uma economia em crescimento – a tarefa da qual o ministro Paulo Guedes foi incumbido. O sucesso de Guedes seria a chave para a reeleição, mas no meio do caminho veio uma crise, cuja gravidade Bolsonaro sequer percebe e que mal sabe avaliar. A incompetência e despreparo do presidente são patentes e tão claras quanto o mergulho que a economia sofrerá no ano. Diante da tempestade que se avizinha, Bolsonaro desafia quem não concorda com ele a ir às ruas, confiante de que se as coisas saírem do controle contará com o apoio dos militares de alta patente que o cercam no Planalto como escudo protetor.

Suas apostas são de alto risco. Quanto pior a crise sanitária e econômica, menor a chance de permanecer no Planalto. Líderes do Legislativo e do Judiciário, por enquanto, pedem que Bolsonaro governe. A depender da condução e da evolução da crise, podem mudar de ideia.

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