MANCHETES
O Globo
São Paulo para com chuva forte, ‘novo normal’ no país
Para autoridades, Adriano tinha informantes
Perícia: voz não é do porteiro que citou Bolsonaro
Após 40 dias de crise, presidente da Cedae cai
Mortos em epidemia já passam de mil
AKK: Annergret Kramp-Karrenbauer desiste da sucessão de Merkel
Prêmios de ‘Parasita’ podem abrir mais portas em Hollywood
O Estado de S. Paulo
Temporal faz São Paulo viver dia de caos
Na hora do sufuco, paulistano andou até de trator
Prefeitura deixa de gastar R$ 2,7 bi em obras anticheia
Aplicativos ignoram bloqueios em vias alagadas e motoristas reclamam
Defesa mantém sob sigilo dados de pensão de filha de militar
Só metade dos Estados deve alcançar o PIB pré-crise
Folha de S. Paulo
Tempestade inunda e trava São Paulo
Prejuízos no setor privado podem passar de R$ 140 mi
Morte de miliciano levanta dúvidas sobre rede de apoio
Bolsonaro silencia sobre morte de ex-PM e critica imprensa
Na periferia, mutirão da Aliança exalta Moro
Rede faz convite a Marta Suplicy para Prefeitura de SP
Dados de verbas da Secom contradizem Fabio Wajngarten
Valor Econômico
Preços de ações atingem maior nível da história
Valor do IRB cai R$ 11 bi no mercado
Caiado diz que Goiás pode ir a ‘liquidação’
Enchentes paralisam São Paulo
Noxis Energy busca sócio para refinaria
Com epidemia, Xi enfrenta seu ‘Tchernobil’
EDITORIAIS
O Globo
O impacto positivo da queda dos juros da dívida interna
É substancial a redução de gastos com os cortes na Selic, mas nada será preservado sem mais reformas
As dívidas interna e externa frequentam os pesadelos de governantes brasileiros desde sempre. Uma economia com desbalanceamentos estruturais, pouco integrada ao mundo, com industrialização tardia e incompleta, não teria mesmo facilidade em manter em dia seus compromissos com o exterior, pagos em moeda forte, e também padeceria do peso crescente dos gastos públicos, inflados nos ciclos de populismo.
Mas encontra-se numa fase singular. Sua base moderna de produção agropecuária e uma eficiente estrutura de exportação de minérios aproveitaram a decolagem econômica da China, que passou a importar volumes crescentes de alimentos e matérias-primas em geral. Assim, o país acumulou reservas que passaram a poder pagar sua dívida com o exterior, algo de notável ineditismo.
Restou a questão da dívida interna, bastante inflada pelos erros do ciclo Lula/Dilma, tanto que a relação dívida/PIB, que estava em 51,5% em dezembro de 2013, encerrou o ano passado em 75,8%, devido às barbeiragens heterodoxas do segundo governo Lula, aprofundadas por sua sucessora.
A queda dos juros internos iniciada ainda no governo Temer, e que prossegue com Bolsonaro, é um fator adicional neste cenário, que serve de poderosa ajuda na redução da pressão da dívida pública sobre as finanças do Estado.
Como mostra o jornal “O Estado de S.Paulo” de ontem, a taxa de juros que incidiu sobre a dívida bruta em 2019 encerrou o ano em 7,8% e havia sido de 8,3% no exercício anterior.
A taxa básica de juros (Selic) incide sobre boa parte da dívida, daí a sua redução constante ter gerado no ano passado uma economia de R$ 68,9 bilhões para o Tesouro. Praticamente o mesmo que foi arrecadado em novembro no leilão de dois dos quatro blocos licitados do pré-sal, para exploração de petróleo.
A Selic chegou a 4,25%, em níveis jamais atingidos pela taxa desde sua criação em 1999. Mantido tudo como está e confirmadas as melhores previsões, a redução da conta de juros da dívida pública poderá ser este ano de R$ 120 bilhões. Soma impensável não faz muito tempo.
Mas não se pode esperar que os cortes na Selic substituam o dever de casa que Executivo e Legislativo precisam fazer para garantir a estabilidade da economia.
Os juros são apenas um dos fatores de aceleração ou atenuação das despesas públicas. Há outros, que, se não forem contidos, continuarão a desestabilizar as finanças governamentais.
Não se pode deixar de lado o fato de que apenas a reforma da Previdência e o teto constitucional dos gastos não conseguem dar o lastro fiscal para a economia voltar a crescer sem sustos. Portanto, a queda dos juros serve para criar um providencial espaço de tempo para serem aprovadas outras mudanças estruturais — PEC da Emergência, reformas administrativa, tributária. Sem elas, continua-se no ciclo da mediocridade econômica.
O Globo
Chuvas no Sudeste mostram o quanto governos estão despreparados
União, estados e municípios precisam se planejar para enfrentar tempestades
Governos têm se mostrado incapazes de dar respostas adequadas às tempestades, fenômeno que se torna cada vez mais frequente, como mostram os estragos no Sudeste este ano. Ontem, municípios da Grande São Paulo viveram um dia de caos. A capital, maior cidade do país, parou devido ao transbordamento de rios e córregos. Foram registrados mais de cem pontos de alagamento; vias importantes como as marginais Tietê e Pinheiros se tornaram intransitáveis, deixando motoristas ilhados — em alguns pontos, carros ficaram submersos; parte do serviço de trens chegou a ser paralisada; moradores e comerciantes tiveram casas e lojas invadidas pelas águas; repartições suspenderam atividades. Em Osasco, uma criança ficou ferida num deslizamento de terra.
Não ameniza a angústia de quem viveu esse drama a justificativa de que a tempestade de ontem em São Paulo foi a mais intensa para o mês de fevereiro em 37 anos. Excepcional, de fato. Mas episódios semelhantes no Espírito Santo, em Minas e no Rio de Janeiro deveriam ter servido de alerta. Em Belo Horizonte e outras cidades mineiras, as chuvas de janeiro mataram 57 pessoas, deixaram milhares de desabrigados ou desalojados e causaram prejuízos incalculáveis. Foram as mais devastadoras dos últimos cem anos. No Sul do Espírito Santo, dez pessoas morreram, e cidades foram arrasadas pelas enxurradas do mês passado. No Rio, a previsão de chuvas fortes para esta semana preocupa, à medida que ainda estão presentes as consequências do temporal de abril de 2019 — o maior em duas décadas —, que deixou dez mortos.
De nada adianta culpar a natureza, como é típico nessas situações. Resta aos governos — não só aos estaduais e municipais, mas também à União, já que se trata de questão de Estado — traçarem planos para atenuar o impacto desses fenômenos, de modo a evitar mortes e reduzir danos. É preciso criar estratégias de curto, médio e longo prazos. Emergencialmente, há que se ter um plano de contingência para retirar moradores de áreas de risco, levando-os para abrigos, e fechar vias sujeitas a inundações ou deslizamentos. O alagamento pode ser inexorável, mas ao menos as pessoas estarão em segurança.
Mais efetivas serão as medidas de médio e longo prazos, como obras contra cheias e de contenção de encostas, que demandam planejamento e investimentos. Fundamental também é mapear as moradias em áreas de risco, como encostas e margens de rios, e estabelecer políticas para remover esses moradores — a leniência com a ocupação irregular costuma resultar em tragédias. É certo que outras chuvas virão, e com intensidade cada vez maior. Portanto, é preciso pressa, para que as cidades estejam mais bem preparadas na próxima tempestade.
O Estado de S. Paulo
Bomba-relógio fiscal
A relutância do governo em negociar suas propostas no Congresso – ou seja, em fazer política – está pondo a máquina pública na rota do colapso
A relutância do governo em negociar suas propostas no Congresso – ou seja, em fazer política – está pondo a máquina pública na rota do colapso. O crescimento da dívida pública funciona como uma bomba-relógio que só pode ser desmontada por amplas reformas de Estado. O desmonte começou com a reforma da Previdência e só será consumado com outras, como a administrativa e a tributária, mas enquanto não for, o País precisa de mecanismos emergenciais para desacelerar a contagem regressiva. A isso serve a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 186, alcunhada não à toa “Emergencial”. Encaminhada ao Senado em novembro, ela está há quase dois meses atolada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Duas disposições constitucionais garantem a sustentabilidade fiscal do poder público: o Teto de Gastos, pelo qual a máquina pública não pode gastar mais do que um determinado valor, e a Regra de Ouro, pela qual não se pode endividar para pagar despesas correntes. Ocorre que, devido às disfunções da máquina pública, os gastos obrigatórios com salários e aposentadorias não param de crescer, comprimindo os gastos discricionários com infraestrutura, inovação e outros. Para dar uma ideia, em 2014 os investimentos públicos corresponderam a 1,4% do PIB. Em 2019, foram inferiores a 0,5%. Ou seja, na rota em que está, a única função do Estado será cobrir os custos com o funcionalismo. Como esses custos só crescem, será preciso arrecadar cada vez mais impostos ou se endividar cada vez mais.
A PEC Emergencial estabelece mecanismos de ajuste fiscal sempre que as despesas superarem 95% das receitas. Esses mecanismos impedem a criação de novas despesas obrigatórias através, por exemplo, do bloqueio de promoções de carreira, concursos e criação de cargos, ou da redução da carga horária e do salário dos servidores.
Na abertura dos trabalhos legislativos, o presidente Jair Bolsonaro disse esperar que a PEC Emergencial e as outras propostas que integram o Plano Mais Brasil sejam aprovadas rapidamente pelo Congresso. A rigor, o Planalto não tem feito mais do que isso: esperar. Mas não é isso que a população espera de seu presidente. Enquanto ele espera, as despesas de 13 Estados já superam 95% das receitas. Logo eles serão acompanhados por outros. A contagem regressiva não só avança, como se acelera.Quem não está esperando são as corporações do funcionalismo, que têm as bancadas mais sólidas no Congresso. O seu poder de mobilização pode ser verificado na própria consulta pública lançada pelo Senado, que indica apenas 1,8 mil votos favoráveis à PEC contra quase 100 mil contrários. A oposição, por sua vez, consolida a narrativa da inconstitucionalidade da PEC.
As vozes mais sensatas e preocupadas com a coisa pública além de seus interesses partidários e corporativos têm cobrado o protagonismo do governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, talvez o principal responsável pela aprovação da reforma da Previdência, advertiu recentemente que a condução das reformas não pode ser jogada “nas costas do Parlamento”. Até agora essa tem sido a principal “estratégia” do governo com o Congresso: inundá-lo com propostas e depois abandoná-las à sua própria sorte. Foi assim na reforma da Previdência. Ocorre que, neste último caso, os efeitos só se farão sentir a médio e longo prazos. Sem a PEC Emergencial, contudo, o Teto será rompido já este ano pela União e por Estados e municípios em todo o País. Como as dívidas dos entes subnacionais são garantidas pela União, estas bombas estourarão na cara do governo. Como sabem os congressistas, à medida que o tempo passa, a emergência só se torna mais emergencial. “Velha” ou “nova”, a política real, na hora do aperto, saberá cobrar o seu preço.
Em outras palavras, a PEC deveria ser aprovada o quanto antes pelo bem da Nação. Mas o governo Bolsonaro deveria se dar conta de que precisa dela para o bem de seu próprio projeto de poder. Não é o melhor motivo, mas se servir para aprovar a PEC, será suficiente.
O Estado de S. Paulo
Mais uma do MEC
Ao restringir viagens de docentes e cientistas, o MEC afasta o Brasil do mundo globaliza
Na mesma semana em que a imprensa mundial divulgou que universidades e centros de pesquisa do mundo inteiro estão promovendo encontros científicos para tentar coibir o avanço da epidemia de coronavírus, os jornais brasileiros publicaram a Portaria n.° 2.227, baixada pelo Ministério da Educação (MEC) no último dia de 2019. Num de seus artigos, ela estabelece que os órgãos vinculados à pasta – inclusive as universidades federais e os institutos técnicos – só podem autorizar, “no máximo, a presença de dois representantes em eventos no País e um representante para eventos no exterior”, mesmo que os gastos com viagens e diárias não sejam pagos pela União.
Os dois fatos estão vinculados e dão a medida da incompetência administrativa e da insensibilidade do MEC na gestão de um governo que já bloqueou verbas do ensino superior público e acusou as universidades federais de ser “locais de balbúrdia e doutrinação”. Na prática, a portaria inviabiliza reuniões da mais alta relevância da comunidade acadêmica, onde cientistas discutem com colegas o estágio de suas pesquisas, descobertas preliminares e dados coletados ou que aguardam publicação. Também dificulta encontros científicos financiados por organismos multilaterais e por agências internacionais de fomento à pesquisa.
Em resposta a mais essa iniciativa desastrada do MEC, cerca de 40 entidades científicas lideradas pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) divulgaram um documento, solicitando ao ministro Abraham Weintraub a revogação de alguns artigos da portaria, especialmente os que dispõem sobre procedimentos para afastamento de professores, cientistas e pesquisadores.
O documento lembra que a portaria prejudica a internacionalização e o protagonismo da ciência e da tecnologia nacionais. A portaria também impede a realização de seminários, congressos, simpósios e reuniões anuais de sociedades científicas, dificultando a troca de experiências entre jovens pesquisadores. E ainda ameaça a realização de missões bilaterais e colaborações internacionais, que foi um dos instrumentos utilizados nas últimas décadas por países asiáticos – como Coreia do Sul – para colocar suas instituições de ensino e pesquisa nas primeiras colocações dos rankings de qualidade.
“As restrições à mobilidade contribuirão para o empobrecimento da formação do jovem cientista brasileiro, fato que não ocorre em nenhum outro país que preze pela ciência e pela tecnologia. Devido ao crescimento exponencial do conhecimento científico, é comum ter, em uma mesma unidade ou grupo de pesquisa, cientistas que, embora reunidos em torno de um tema, trabalham em projetos e subáreas distintas. Por isso mesmo, é frequente, em reuniões nacionais e internacionais, a participação de membros de uma mesma unidade ou grupo de pesquisa”, diz o documento.
Segundo o presidente da ABC, o físico Luiz Davidovich, a portaria foi escrita por quem não entende de ensino e pesquisa, que é o caso de Weintraub. Dirigentes de outras entidades vão além. Segundo eles, os problemas da portaria não foram causado só por ignorância e incompetência, mas, também, por preconceito ideológico, tal a aversão de vários ministros do governo Bolsonaro à globalização. Esse argumento ganhou força depois que, procurada para comentar a reivindicação das sociedades científicas, a equipe de Weintraub afirmou que a resposta seria dada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), cujo novo presidente é defensor da teoria criacionista, que se opõe à teoria da evolução das espécies, que há muito tempo foi endossada pela ciência.
A escalada de descalabros do MEC resulta do erro que o governo Bolsonaro cometeu ao privilegiar critérios mais religiosos do que técnicos, numa área tão estratégica para o futuro do País, como a educação e a ciência.
N. da R. – A revogação da portaria evita seus efeitos, mas não apaga sua inspiração.
O Estado de S. Paulo
A captura das agências
Bolsonaro quer manter sua capacidade de exercer influência política nas agências
O presidente Jair Bolsonaro pretende preencher 22 diretorias de 10 agências reguladoras que estão vagas com funcionários alinhados à sua agenda política, como informa o Estado. Bolsonaro afirma que está fazendo nomeações técnicas, mas há informações segundo as quais os candidatos às vagas não podem ser “esquerdistas” ou terem ligações com o PT.
Não é de hoje que os interesses políticos contaminam o preenchimento de diretorias das agências. A prática de trocar essas vagas por apoio político no Congresso era comum nos governos do PT – e o resultado disso foi a indicação de diretores sem a menor qualificação para o cargo, afetando diretamente o desempenho das agências.
Seja por fisiologismo, no caso petista, seja em razão de depuração ideológica, como pretende Bolsonaro, a nomeação de diretores das agências sem que se priorizem critérios técnicos desmoraliza esses órgãos tão importantes. E talvez seja esse o objetivo, já que tanto Lula da Silva e Dilma Rousseff, a seu tempo, como Jair Bolsonaro disseram considerar as agências um estorvo – para o atual presidente da República, “as agências travam os Ministérios” e constituem “um poder paralelo”.
As agências foram criadas nos anos 1990 como resposta à necessidade de prover a regulação de serviços públicos cuja administração estava sendo concedida ou vendida à iniciativa privada. A ideia era definir direitos e obrigações do Estado e do setor privado nos contratos de concessão ou equivalentes, sempre tendo o interesse público como norte.
Para isso, as agências têm de ser autônomas, para evitar pressões políticas. A elas cabe estabelecer normas para regular a exploração dos serviços, fomentar a competição e assegurar que os consumidores sejam atendidos de forma adequada, sem interrupção e por preço justo. É preciso garantir que essas normas não mudem ao sabor de interesses políticos ou de qualquer outra natureza, pois disso depende a segurança jurídica.
Um mercado de serviços públicos bem administrado, com previsibilidade regulatória e protegido de influências de caráter privado, é atraente para os investidores, sendo fundamental para o desenvolvimento sustentável do País.
O problema é que as agências quase sempre estiveram à mercê de pressões políticas e empresariais e padeceram, ao longo de décadas, de uma legislação confusa e pulverizada. Foi somente no ano passado que o Congresso aprovou um marco jurídico para as agências, a Lei Geral das Agências Reguladoras (Lei 13.848/19), com normas claras de governança comum a todos esses órgãos, independentemente da área de atuação. O marco concede autonomia financeira, administrativa, funcional e decisória às agências. Além disso, determina que os dirigentes tenham comprovada experiência profissional na área – para evitar casos como a nomeação de um ex-diretor de time de basquete para a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), feita pelo então presidente Lula da Silva para agradar ao MDB.
A ideia do marco regulatório é diminuir, tanto quanto possível, a ingerência política sobre as agências, seja por parte do presidente da República, que nomeia diretores, seja por parte do Congresso, que aprova ou não os indicados e, além disso, exerce o controle externo sobre esses órgãos. Ademais, o marco busca acabar com a vacância em cargos de diretoria, causada pelo atraso do presidente nas nomeações – que prejudica o funcionamento das agências.
Bolsonaro vetou parte desse marco jurídico, justamente para continuar a ter liberdade de nomear quem bem entender, preservando sua capacidade de exercer influência política nas agências.
O presidente Jair Bolsonaro elegeu-se com a promessa de estimular as forças do mercado para impulsionar o desenvolvimento do País. Ao contaminar as agências reguladoras com sua pauta ideológica e política, porém, Bolsonaro colabora para piorar ainda mais o já deteriorado ambiente de negócios do Brasil.
Folha de S. Paulo
Memórias de Adriano
Operação que matou miliciano ligado a Flávio Bolsonaro precisa ser esclarecida
Ainda não estão por inteiro esclarecidas as circunstâncias que provocaram a morte do ex-capitão da PM fluminense Adriano Nóbrega, encontrado por policiais no domingo (9), em um sítio na Bahia, depois de mais de um ano foragido.
Ele era um dos alvos da Operação Intocáveis, deflagrada em janeiro de 2019 pelo Ministério Público, com o objetivo de prender suspeitos de comandar milícias que atuam no Rio de Janeiro.
O ex-PM era suspeito de ser o chefe da milícia da favela de Rio das Pedras, o grupo mais antigo da cidade.
Em conversas telefônicas gravadas com autorização da Justiça, era chamado de “patrão”.
Adriano apresentava longo histórico em contravenções e atividades criminosas. Foi preso diversas vezes, condenado por homicídio, expulso da PM por envolvimento com o jogo do bicho.
Foi apontado como líder de um grupo de assassinos profissionais do qual faria parte o policial aposentado Ronnie Lessa, acusado no assassinato da vereadora Marielle Franco. Suspeita-se, também, que o ex-capitão fosse sócio do controle de metade das máquinas caça-níqueis da capital fluminense.
Na época em que foi lançada a Operação Intocáveis, surgiram as já notórias evidências de relações entre o miliciano e o senador Flávio Bolsonaro, quando este exercia o mandato de deputado estadual no Rio de Janeiro.
Contas controladas por Adriano, que mantinha a mulher e a mãe no gabinete do filho do presidente da República, destinaram recursos para Fabrício Queiroz, o ex-assessor tido como operador do esquema da “rachadinha” —que consiste no desvio fraudulento de recursos dos salários de servidores.
Em meio às investigações, ganharam projeção fatos sugestivos, como uma moção de louvor ao ex-capitão, apresentada por Flávio Bolsonaro à Assembleia fluminense, em outubro de 2003, seguida da concessão ao policial da Medalha Tiradentes, em junho de 2005.
Naquele mesmo ano, Adriano também mereceu um discurso em sua defesa, por parte do então deputado federal Jair Bolsonaro.
Todos esses fatos, além de outros levantados nas apurações, não deixam dúvida sobre a relevância das informações que o ex-PM poderia prestar em auxílio à elucidação de práticas ilícitas do submundo das milícias e de suas ramificações.
Não é sem motivo, portanto, que se levantem especulações sobre uma possível “queima de arquivo” na ação que levou à morte do procurado na Bahia. Pela versão oficial, o foragido resistiu à abordagem com o uso de armas de fogo e foi alvejado no confronto.
A dúvida que se ventila é se o fato de o ex-capitão estar isolado numa casa em área rural não favoreceria uma atuação mais paciente e cautelosa do cerco policial, de modo a preservar sua vida — e os relatos que poderia oferecer à Justiça. Os responsáveis pela operação têm, pois, explicações a apresentar.
Folha de S. Paulo
9 mortos, nenhum culpado
Desfecho de inquérito sobre Paraisópolis expõe falhas do controle da polícia
Com o pedido de arquivamento do inquérito militar sobre a ação da PM em Paraisópolis, restou dissolvida a responsabilidade pela morte de nove jovens em dezembro.
Embora continue em andamento a investigação pela Polícia Civil, o desfecho pouco conclusivo dado ao caso na esfera da Corregedoria da Polícia Militar expõe as falhas das instituições incumbidas de responsabilizar agentes de segurança.
Por respeito às mortes dos jovens na desastrosa ação de 31 policiais durante um baile funk, esperava-se que as responsabilidades individuais e coletivas fossem investigadas com o esmero que a gravidade do caso requer. Essa não tem sido a regra, entretanto.
Relatório da Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo, de setembro de 2019, apontou que em 2017 a Corregedoria investigou menos de 3% dos casos de operações que resultaram em morte.
Embora a atuação do órgão esteja inerentemente limitada por fazer parte da corporação, a PM de São Paulo carece até de um modelo que favoreça alguma isenção.
A experiência internacional revela pontos que poderiam ser melhorados, como a criação de um plano de carreira específico para a Corregedoria e serviços de proteção contra eventuais represálias.
Órgãos como o Ministério Público paulista, que não tem exercido o controle externo da polícia a contento, e a Ouvidoria das Polícias, cujo ouvidor foi substituído no dia de divulgação do balanço de suas ações, devem encontrar um ambiente institucional em que possam exercer tais funções. Isso tampouco tem sido a regra.
Tecnicamente, operações de controle de distúrbio —como são chamadas as ações como a de Paraisópolis— devem, pelas regras da própria polícia, priorizar rotas de fuga e não encurralamento.
Os jovens mortos em dezembro não eram da região, o que sugere que não conheciam a área para conceber formas de dispersão.
Além das responsabilidades individuais, ora arquivadas, qual a responsabilidade coletiva da corporação pelos erros nesta operação? Tal pergunta, apesar de fundamental para evitar novas mortes, tarda em ser respondida pelas autoridades policiais e pelo governador João Doria (PSDB).
Valor Econômico
Fase principal do ativismo monetário ficou para trás
Ao chegar a um recorde de baixa, e retirar o país do ranking dos campeões mundiais de juros, não há muito mais que ele possa fazer diretamente
O Banco Central passou quase toda a segunda metade da década reduzindo a taxa básica de juros. O Comitê de Política Monetária indicou que o ciclo de distensão monetária pode ter chegado ao fim, mas não fechou as portas a cortes residuais. A direção da política agora seguirá o compasso da recuperação da economia, que tem desencorajado projeções otimistas. Além disso, o BC tem procurado encorajar a concorrência bancária, de forma a conseguir maior proximidade entre a Selic real hoje exígua (perto de 1%) e os juros cobrados de consumidores e empresas, um múltiplo generoso dela. Ao chegar a um recorde de baixa, e retirar o país do ranking dos campeões mundiais de juros, não há muito mais que ele possa fazer diretamente.
Há incógnitas novas no horizonte da política monetária. É certo que o novo ambiente criado, de encolhimento da participação dos bancos oficiais (somavam mais de 50% da oferta de crédito), fim dos subsídios fartos do maior fornecedor de empréstimos de longo prazo (BNDES) e a Selic em 4,25% aumentam a potência da política monetária. A velocidade e magnitude com que isso ocorrerá, no entanto, não são conhecidas – na verdade, é algo inédito na história recente do país.
Até aonde o Copom enxerga, vê um equilíbrio de expectativas. A meta de 2021, de 3,75%, que entra agora na mira do BC, mostra pouco espaço para mais cortes. As projeções apontam para 3,8%, com o câmbio atual (perto do de equilíbrio), com um juro um pouco maior – apenas em 2021. Os núcleos de inflação abandonaram o terreno qualificado de confortável e estão agora no considerado adequado.
Para os juros caminharem na direção contrária, de alta, falta um bom caminho. A ociosidade da economia continua grande e foi mais uma vez corroborada pelo desempenho decepcionante da indústria em dezembro, fechando o ano em queda. O comportamento dos serviços deixou a desejar e houve alguma revisão para baixo nas expectativas de crescimento.
A inflação, que deu pinotes a partir da gripe suína na China, voltou a cair e surpreendeu em janeiro, com 0,21%, a menor marca desde o Plano Real. A desvalorização cambial, que prossegue e é relevante, não foi até agora capaz de sensibilizar os preços domésticos. Pode haver mais surpresas neste front com a epidemia de coronavírus na China, e a desaceleração adicional da economia global. O preço das commodities recuaram significativamente, e, embora a demanda por alimentos não deva ter retração relevante na China, a composição da oferta pode mudar, em detrimento das exportações – o Brasil depende muito da evolução da economia chinesa (petróleo, soja e do minério de ferro consumidos lá somam mais de dois terços do total da vendas desses produtos pelo país).
Não se descarta uma onda deflacionária, mais uma vinda da China. Em conjunto com efeitos da crise sanitária, como a redução do saldo comercial e menor impulso das exportações na alavancagem da economia doméstica, a inflação pode cair para longe da meta. Nesse caso, nova redução dos juros pode se tornar viável e, como o BC já mostrou até aqui, ele não hesitaria em aproveitar a brecha.
Há poucos fatores jogando a favor do aquecimento da economia, que esquentasse também os índices de inflação, mas eles existem. A redução dos juros desencorajou investimentos de ampla parcela de aplicadores, a grande maioria concentrada nos fundos de investimentos que tem como parâmetro de rendimentos o CDI, isto é, Selic. A poupança teve saques recordes em dezembro, os fundos DI perderam recursos e uma parte do dinheiro flui para as ações. É possível, e no passado foi assim, que os recursos se destinem para os ativos reais, em primeiro lugar imóveis, cujo mercado ensaia forte recuperação. Essa onda tende a se espraiar para o consumo de bens duráveis e toda a economia.
O impulso dependerá da reação da folha de salários, que segue o ritmo modorrento da recuperação da indústria e dos serviços. Sem redução rápida do desemprego – não prevista – o consumo das famílias não dará saltos. A reação dos investimentos não será forte.
O BC resolveu interromper o ciclo de distensão até que fique claro para qual lado a economia se moverá. É razoável entrever que a inflação caia mais, a economia continue andando devagar e os juros se mantenham estimulativos – talvez com empurrão pequeno extra a partir de meados do ano. O fato é que, como o BC apontou, a fase principal do ativismo monetário já ficou para trás.