Quando crescem no mundo e no Brasil as críticas à desigualdade e os apelos à taxação dos ricos, é decepcionante a afirmação (Valor Econômico – 11/02/2020) do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), negando taxar as grandes fortunas na reforma tributária. “Nunca tratei [de taxação de] grandes fortunas e não vou tratar”, disse na saída de almoço com empresários na Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ).
Em contrapartida, seguem vigentes os enormes prejuízos aos salários causados pela injustiça tributária expressa na defasagem da tabela do Imposto de Renda (IR) que atingiu astronômicos 103,87%, segundo estudo do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco).
Entre 1996 e 2019, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) somou 327,37%, enquanto os reajustes realizados pelo governo chegaram a 109,63%. Nos últimos 23 anos, em apenas cinco as correções superaram a inflação: 2002, 2005, 2006, 2007 e 2009. Desde 2016, não há correção da tabela.
Hoje é isento de IR quem ganha até R$ 1.903,98. Se a tabela fosse corrigida pela inflação acumulada, cerca de 10 milhões de contribuintes que ganham até R$ 3.881,65 ficariam isentos de pagar o IR.
Entre 1976 e 1978, o Brasil tinha 16 faixas de renda nas tabelas do IR, o que garantia maior progressividade. Entre 1983 e 1985, a tabela tinha 13 faixas e a alíquota máxima era de 60% (já foi de 65% entre 1963-1965). A partir da década de 1990 – à exceção dos anos de 1994 e 1995 – o número de faixas caiu para três e a alíquota máxima reduziu-se para 25%. Em 2009, a tabela foi novamente modificada, com a adoção de cinco faixas de salário e alíquota máxima de 27,5%.
Enquanto os poderes centrais são imperdoáveis com os assalariados, pois arrocham o seu poder de compra e fazem que mais e mais trabalhadores entrem na faixa que começa a pagar IR, esses mesmos poderes são dóceis à ”moneycracy” (dinheirocracia) – que não abrirá mão tão fácil de seus privilégios fiscais.
A Comissão Mista do Congresso Nacional a ser criada para formatar a reforma tributária deve ser pressionada por milhões de cidadãos para que a tabela do IR seja corrigida e que os que mais têm e ganham paguem mais.
Caso contrário, a reforma será um teatro farsesco onde valerá a máxima do escritor Giuseppe Tomasi di Lampedusa, em seu clássico “O Leopardo”: “Tudo deve mudar para que tudo fique como está” – marcando mais uma vez, infelizmente, o triunfo e alegria da minoria e a derrota e tragédia da maioria. (Voz de Guarulhos – 13/02/2020)
Eduardo Rocha, economista