MANCHETES
O Globo
Câmara articula votar fim do foro com restrição a prisão de político
Abertura oficial do carnaval acaba em tumulto
Novas UPPs terão câmera em uniforme de PM
Legislativo e Judiciário terão de conter gastos
Base brasileira na Antártica será reinaugurada
Ilusão sob medida para foto
Irã reforça policiamento contra protestos
O Estado de S. Paulo
Moro espera que STF corrija ‘falhas’ no juiz de garantias
Mudança no Bolsa Família prevê aumento do benefício
Década passada foi a pior para o PIB no Brasil
No Rio, bala perdida mata 4 idosos em 1 mês
CPIs na Alesp têm resultados quase nulos
Na onda dos campeões
Inteligência artificial contra o tumor de pele
Protestos antigoverno se intensificam no Irã
Folha de S. Paulo
Julgamento do STF aquece venda de crédito tributário
Governo estuda projeto que prevê adoção de idosos
Menina de quatro anos sobrevive cinco dias na floresta amazônica
Para sair do cadastro positivo, é preciso fazer um cadastro
Tribunais pressionam para adiar adoção de juiz de garantias
Monogamia é cômoda e barata, mas muito frágil
No Rio, já é Carnaval
Iranianos voltam às ruas contra o governo
EUA querem mais voos fretados para deportar brasileiros
Valor Econômico
Competição pressiona ganho com ‘maquininhas’
Odebrecht pagou R$ 1,5 bi a 77 delatores
Empresas buscam novo perfil para seus trainees
Dedução de IR de domésticos é extinta
Nissan apressa plano secreto para separação da Renault
PT tenta se aproximar de grupos evangélicos
Itaú vai criar comercializadora e vender energia no mercado livre
Produção científica brasileira é baixa, apesar de avanços
EDITORIAIS
O Globo
Chance de mudar o país com a reforma administrativa
É preciso repensar a política salarial do setor público. Na média, um servidor ganha 36% a mais do que um trabalhador do setor privado
O governo prevê enviar ao Congresso, em fevereiro, o seu projeto para reforma e modernização do Estado. É evento importante e fundamental para a recuperação das perspectivas de desenvolvimento econômico e social do país. O grande desafio é promover a eficiência no serviço público.
A tarefa começa, mas não se esgota, na reordenação e no planejamento de uma força de trabalho de 11,4 milhões de pessoas com vínculos formais no setor estatal — excluídos os empregados das empresas públicas. Mais da metade desse efetivo (57,3%) está nas prefeituras municipais, pouco mais de um terço (32,3%) nos escritórios estaduais e um décimo ( 10,4%) na área federal.
A reforma precisa ter foco na flexibilização das relações entre os governos e trabalhadores, para permitir uma adequação do contingente que deve ser alocado em escolas, hospitais, segurança pública e outras áreas-chave na prestação de serviços.
É essencial acabar com os supersalários e reduzir as disparidades nas remunerações nos Três Poderes. E deve-se ir além, por exemplo, na promoção da igualdade entre sexos, hoje quase inexistente no setor público. Não somente em remuneração, mas também no preenchimento de cargos de dirigentes.
Mulheres recebem menos que homens em todos os níveis, em todos os Poderes, mostram recentes estudos do Ipea e do Banco Mundial. São minoria nos cargos da média e alta administração federal, demonstra o Atlas do Estado Brasileiro.
É preciso repensar a política salarial do setor público para aproximar os salários do funcionalismo às remunerações da iniciativa privada. Na média, um servidor ganha 36% a mais do que um trabalhador assalariado do setor privado.
Será importante, ainda, reduzir o número de carreiras, pois existem mais de 300 na área federal e nos estados, redesenhando a estrutura de pagamentos, para estabelecer menores salários de entrada e vincular promoções ao desempenho. Na miríade de gratificações e penduricalhos salariais hoje existente, premia-se até pelo comparecimento ao posto de trabalho.
Ao mesmo tempo, é essencial reestruturar o serviço público em bases operacionais realistas. Como exemplo, na saúde existem nada menos que 1.358 organismos federais com poder decisório e influência na execução da política setorial, segundo registros do recém-desativado Sistema de Organização e Inovação Institucional do Governo Federal (Siorg). Em transportes, as decisões passam por 1.024 instâncias. Na educação, existem 1.036 áreas de gestão e, na segurança pública, 2.375 segmentos operacionais.
Caberá ao Congresso a lapidação do projeto de reforma administrativa. Espera-se que os parlamentares não se limitem e proporcionem aos Três Poderes a flexibilidade necessária para introdução de novos padrões de eficiência no serviço público.
O Globo
Rio precisa de uma real política de integração tarifária nos transportes
Sistema atual, com normas distintas no estado e no município, é prejudicial aos passageiros
O bilhete único — forma de integração tarifária em que o passageiro pega duas ou mais conduções e paga uma única passagem, dentro de um período específico — demorou a chegar ao Rio. O modelo intermunicipal (B.U.) surgiu em fevereiro de 2010 e o municipal (Bilhete Único Carioca), em novembro daquele mesmo ano — na capital paulista estava implantado desde 2004, mas, antes disso, já funcionava com sucesso em outras cidades do país.
É inegável que, apesar do atraso, eles representaram um ganho para os trabalhadores, especialmente aqueles que dependem de linhas intermunicipais, em que as tarifas são bem mais altas do que as da capital. Não se trata apenas de uma questão de transporte. Na hora de reivindicar uma vaga de emprego, moradores da Baixada Fluminense podem ficar em desvantagem em relação aos da capital, mesmo os de áreas mais distantes, à medida que custos com passagens se tornam maiores.
Mas a questão é que os bilhetes, tanto do estado quanto do município, foram implantados de forma capenga. Ao ser lançado, o Bilhete Único Carioca só dava direito a ônibus convencionais e micro-ônibus, excluindo coletivos com ar-condicionado — exemplo do poder que as empresas sempre exerceram no setor. Já o cartão intermunicipal ficou mais restrito após a crise financeira do Rio.
O problema maior é que os bilhetes carioca e intermunicipal não se comunicam. Se um passageiro pegar dois ônibus municipais ou um ônibus e o VLT para ir ao trabalho, pagará só uma passagem. Mas, se optar por ônibus e metrô, não terá o mesmo benefício. Ainda que as linhas metroviárias fiquem dentro da cidade, os sistemas tarifários não são integrados.
Isso cria distorções. Um morador da Rocinha que queira ir à Barra, por exemplo, pode pegar dois ônibus e pagar apenas uma tarifa. Se for de metrô, a viagem poderá ficar mais cara se precisar de outra condução para complementar o trajeto. Entende-se por que a bilionária Linha 4 está subutilizada.
O início de um novo ano é momento oportuno para se repensar a questão da integração tarifária. E ela deve envolver governador, prefeito, deputados, vereadores e as diversas concessionárias. O Rio precisa ter um bilhete integrado para todos os transportes. Outras cidades já fazem isso.
Durante décadas, empresários de ônibus — que dominam cerca de 70% do mercado de transporte do Rio — pagaram propina a agentes públicos para defender seus interesses, em detrimento dos cidadãos, como mostram as investigações da Lava-Jato. Conseguiram aumentos de tarifa, isenção tributária, detonaram CPIs. Está mais do que na hora de poder público e concessionárias olharem pelos passageiros.
O Estado de S. Paulo
Governo perdido
Não há tempo a perder. A situação econômica e social do País exige um governo capaz de enfrentar as prioridades nacionais, sem desperdiçar energias.
No início de seu segundo ano, o governo de Jair Bolsonaro dá claros sinais de estar sem rumo definido. A cada semana surgem novas medidas e ações, absolutamente pontuais e sem um objetivo comum. Além de tirar eficácia da ação estatal, essa falta de coordenação provoca atritos e tensões absolutamente desnecessários entre órgãos do governo. Não há tempo a perder. A situação econômica e social do País exige um governo federal capaz de definir e enfrentar as prioridades nacionais, sem desperdiçar energias em ações que não apenas não trazem benefícios relevantes, como são, em muitos casos, atalhos para o atraso.
Por exemplo, o presidente Bolsonaro deseja conceder subsídio na conta de luz para templos religiosos de grande porte, revelou o Estado. Para tanto, Bolsonaro solicitou ao Ministério de Minas e Energia a minuta de um decreto contendo o agrado às igrejas. A ideia é que os templos paguem tarifas mais baratas no horário de ponta, semelhantes às cobradas durante o dia. O valor que as igrejas deixariam de pagar seria custeado por outros consumidores.
Como era previsível, a equipe econômica manifestou resistência à proposta do subsídio na conta de luz para as igrejas. O ministro da Economia, Paulo Guedes, sempre defendeu a necessidade de reduzir esse tipo de benefício. A benesse às igrejas tem um impacto tarifário direto, sendo a energia um dos insumos fundamentais para a atração de investimentos e, consequentemente, para a retomada do crescimento econômico. Estima-se em R$ 22 bilhões anuais o total dos benefícios embutidos na conta de luz e repassados para os consumidores. Também contrário ao subsídio, o Tribunal de Contas da União (TCU) já orientou o Poder Executivo, em outras ocasiões, de que não pode ser criado benefício sem dotação orçamentária.
Outra medida, absolutamente pontual e sem nenhuma conexão com as prioridades do País, foi a extinção do Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), decretada por meio da Medida Provisória (MP) 904/19. O seguro oferece coberturas para danos por morte e invalidez permanente, bem como reembolso de despesas médicas e hospitalares, em razão de acidentes de trânsito.
Em dezembro, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a eficácia da MP 904/19, por entender que a matéria deve ser regulada por lei complementar, não cabendo alterá-la por meio de MP. Agora, durante o período de recesso do Judiciário, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, deu outra liminar sobre o caso, reconhecendo a competência do Conselho Nacional de Seguros Privados para reduzir o valor do DPVAT.
Por iniciativa do governo, instaurou-se uma confusão absolutamente desnecessária sobre o DPVAT. Vale lembrar que a extinção do seguro também desorganizava a emissão dos papéis relativos à documentação de veículos em todo o País. Por força de convênio com o Denatran, a Seguradora Líder era responsável por emitir esses documentos. Com a MP 904/19 em vigência, não se sabia quem ficaria encarregado dessa atribuição.
O governo precisa ter cuidado com suas ações. Construir exige tempo, plano, recursos e execução adequada. Destruir ou desorganizar é muito mais fácil. Além disso, medidas descoordenadas produzem danos muito além de suas respectivas áreas.
No início do segundo ano de mandato, era de esperar que o presidente Jair Bolsonaro, com a experiência adquirida em um ano no Palácio do Planalto, estivesse mais apto a dar um rumo para o governo. Até agora, isso não foi visto. Jair Bolsonaro fez ultimamente várias ações; por exemplo, editou MP para aumentar benefício de alguns delegados federais; interferiu por MP nas regras de escolha dos dirigentes das universidades federais; comprometeu-se a dar reajuste aos agentes de segurança do DF. No entanto, tais medidas, em vez de mostrarem que o governo federal está enfrentando os problemas nacionais, transmitiram a mensagem inversa.
São abundantes os sintomas de que o governo está perdido. Mas há reformas a serem feitas, e este é o caminho óbvio que o País deve seguir. Há um país a ser governado. Basta querer fazê-lo.
O Estado de S. Paulo
Mais parques para São Paulo
Os novos parques se situam em regiões com predominância de populações de baixa renda, carentes de áreas de lazer.
Os paulistanos terão acesso em breve a cinco grandes reservas ambientais – quatro na zona sul e uma na zona leste –, que juntas somam uma área de mais de 2 mil hectares, como mostrou o Estado. São Unidades de Conservação (UCs), que têm situação idêntica à das grandes reservas nacionais, com a diferença de que são administradas pelo Município. São Paulo, que se ressente da falta de parques e áreas verdes, dará assim um importante passo para a solução desse problema, que se agravou com o rápido crescimento da cidade e o aumento de sua população.
Até agora, o acesso a esses parques naturais – Itaim (477 hectares), Varginha (419 hectares), Jaceguava (410 hectares), Bororé (193 hectares), estes quatro na zona sul, e Fazenda do Carmo (449 hectares), na zona leste – só era possível com agendamento prévio, o que atraía apenas cerca de 50 visitantes por mês, em geral escoteiros, escolares em excursão e pesquisadores universitários. A lei determinava, no entanto, que essas áreas tivessem planos de manejo e se integrassem à vida da cidade, o que só será feito agora.
Quando esse trabalho for concluído, os paulistanos poderão passear pelas trilhas das matas e cruzar com preguiças, bugios e veados-catingueiros que vivem nesses santuários de mata virgem. Na flora, destacam-se ali embaúbas prateadas, cedros, palmitos juçara e cambuci da Mata Atlântica. Essas árvores já vêm sendo catalogadas para que os visitantes possam identificá-las. Para que esses parques se mantenham com todos esses atrativos, mesmo com sua abertura ao público, deverá ser feita uma rigorosa fiscalização das regras a serem criadas.
Por isso, a abertura ao público será precedida pela implantação de um projeto-piloto, neste e no próximo mês. Será um período de observação do comportamento e principais interesses dos visitantes, com base nos quais serão traçadas as normas de funcionamento dos parques. Nesse período, a cada dia da semana um dos cinco parques ficará aberto. Nos fins de semana, será franqueado o acesso a todos eles. O primeiro a abrir, no dia 14, será o parque do Itaim, que fica na região de Parelheiros. Os próximos serão os parques Varginha, Bororé e Jaceguava, que margeiam as Represas Billings e Guarapiranga. O parque Fazenda do Carmo será aberto dia 4 de fevereiro. Ele fica numa ótima posição, entre Itaquera e São Mateus, em área com 50 nascentes que fazem parte do sistema que forma o Córrego Aricanduva.
“É imprescindível a população participar (desses locais). Não adianta manter um lugar a que ninguém vai”, afirma Anita Correia de Souza Martins, diretora da Divisão de Gestão de Unidades de Conservação da Secretaria Municipal do Meio Ambiente. A criação das condições necessárias para isso já está bem adiantada. O projeto-piloto vai encontrar instalados elementos da estrutura básica destinada ao funcionamento dos parques: além das trilhas traçadas, sedes administrativas, estacionamentos e banheiros, construídos com recursos vindos de medidas compensatórias de grandes obras de infraestrutura, como o Rodoanel e o Monotrilho da zona leste.
Há um aspecto a assinalar nesses novos parques que em breve serão integrados ao sistema de lazer da cidade. Todos se situam em regiões com predominância de populações de baixa renda, as mais carentes de áreas públicas de lazer. Isto torna particularmente relevante a iniciativa do governo do prefeito Bruno Covas.
Outra medida importante está se tornando realidade nesse setor. Começa a funcionar, em regime de concessão à iniciativa privada, dois – Lajeado, na zona leste, e Brigadeiro Faria Lima, na zona norte – dos seis parques que, com o Ibirapuera à frente, passam da Prefeitura à empresa Construcap. Ela administrará esse conjunto durante 35 anos em troca do direito de explorar comercialmente os parques, preservando suas características, inclusive a entrada gratuita. No Ibirapuera, a Construcap começa a fazer intervenções em julho. Ela pagou R$ 70,5 milhões pela concessão e promete investir mais R$ 167 milhões.
O Estado de S. Paulo
Concentração hospitalar
Além das crescentes fusões e aquisições de hospitais, e de um mercado de laboratórios historicamente concentrado, vem aumentando no País a verticalização da cadeia de atendimento
Acompanhando uma tendência global de duas décadas, as fusões e aquisições de hospitais e laboratórios têm crescido no Brasil. Nos últimos três anos o crescimento se acelerou, sendo registradas, respectivamente, 31, 50 e 52 operações. Em tese, a concentração pode tanto melhorar como piorar os serviços. Por um lado, a capacidade gerencial ou clínica do hospital adquirido pode se beneficiar com a expertise do comprador e com ganhos de escala. Mas, por outro lado, a burocracia resultante desta escala pode absorver recursos que poderiam ser investidos na melhora dos serviços, e as concentrações podem, sobretudo em âmbito regional, enfraquecer as pressões competitivas para que os hospitais busquem mais qualidade com preços menores. Um estudo do New England Journal of Medicine sobre o mercado norte-americano permite mensurar o que tem ocorrido na prática naquela economia pujante – mas pode, também, servir de exemplo para o caso brasileiro.
O que já se sabia de levantamentos anteriores é que as fusões levam a um aumento dos preços. Segundo pesquisa do Quarterly Journal of Economics, essa majoração é da ordem de 6% a 7%. Faltavam, no entanto, dados sobre o impacto na qualidade dos serviços.
Os pesquisadores do estudo mais recente avaliaram o desempenho de quase 250 hospitais adquiridos ao longo dos três anos anteriores à aquisição até quatro anos depois, mensurando quatro variáveis: satisfação do paciente; mortes no primeiro mês de internação; retornos um mês após a alta; e a frequência com que pacientes cardíacos, pulmonares e cirúrgicos receberam os cuidados recomendados.
“As fusões e aquisições dos hospitais estão associadas a uma modesta deterioração na experiência dos pacientes, pequenas e insignificantes mudanças na readmissão e nas taxas de mortalidade e efeitos inconclusivos sobre o desempenho dos procedimentos clínicos”, constatam os pesquisadores. Em outras palavras: a crescente concentração do mercado hospitalar aumenta os preços, mas não melhora a qualidade dos serviços.
Ao menos em relação à experiência do paciente, a qualidade piora. A hipótese dos pesquisadores é que, ao contrário dos procedimentos clínicos, os aspectos mais observáveis pelos pacientes, como a qualidade do atendimento, são particularmente afetados pelo enfraquecimento das pressões competitivas para atrair clientes.
Os empresários responsáveis por estas transações sempre as justificaram afirmando que a majoração nos preços era compensada pela melhora na qualidade. Mas agora, como disse ao Wall Street Journal a médica Susan Haas da Escola de Saúde Pública de Harvard, os responsáveis por regular o mercado podem replicar: “Provem”. Entre os eventuais efeitos relativos à queda de competitividade, as autoridades têm avaliado relatos de cobranças abusivas e falta de transparência por parte de hospitais, laboratórios e seguradoras.
Em que pesem as particularidades nacionais, os desafios são similares para os reguladores brasileiros. Além das crescentes fusões e aquisições de hospitais, e de um mercado de laboratórios historicamente concentrado, vem aumentando no País a verticalização da cadeia de atendimento, pela qual as operadoras de planos de saúde constituem sua própria rede de hospitais e serviços auxiliares para controlar os custos.
Recentemente, em matéria publicada no site da revista Época, o presidente da Confederação Nacional de Saúde, Breno Monteiro, alertou para o fato de que o descredenciamento de hospitais pelas operadoras para favorecer sua própria rede restringe a concorrência, com o risco do aumento de preços acompanhado pela queda na qualidade. Segundo ele, a Agência Nacional de Saúde Suplementar seria o âmbito próprio para promover essa discussão.
Há aí um campo importante para pesquisadores e reguladores da saúde no Brasil. Espera-se que os primeiros tragam novas luzes sobre os reais efeitos da crescente concentração do mercado que cabe aos segundos regulamentar com cautela, mas sem demora.
Folha de S. Paulo
Muro de contenção
STF demonstrou independência ao barrar medidas abusivas de Bolsonaro
Encerrado o primeiro ano do mandato de Jair Bolsonaro, é reconfortante verificar que o Supremo Tribunal Federal funcionou como anteparo diante de algumas das iniciativas mais abusadas do presidente.
Em junho, um veredito unânime da corte reduziu o alcance do decreto com o qual Bolsonaro pretendia extinguir conselhos criados para garantir participação da sociedade em decisões do governo.
O tribunal proibiu o chefe do Executivo de usar o dispositivo para extinguir colegiados criados por leis aprovadas no Congresso. No entendimento do STF, tal medida representaria uma violação das prerrogativas do Legislativo.
Em agosto, em outra decisão unânime, o plenário derrubou uma medida provisória que transferia da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultura a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas.
Era a segunda tentativa de Bolsonaro de pôr em prática a ideia, que já tinha sido repelida pelo Congresso na primeira vez. Novamente, o Supremo soube dar à afrontosa iniciativa a resposta merecida.
Decisões individuais de integrantes da corte, ainda pendentes de análise pelo plenário, também barraram medidas que ameaçavam o financiamento da saúde pública, a proteção dos direitos da infância e a saúde financeira de jornais.
Em todos esses casos, os magistrados cumpriram bem o papel que lhes foi confiado pela Constituição, o de zelar pelos princípios que ela protege e deter todos aqueles que agem como se os desprezassem.
Note-se que os membros do STF o fizeram a despeito do estilo contemporizador adotado pelo ministro Dias Toffoli na presidência do tribunal, função em que tem se empenhado para evitar o acirramento de tensões com Bolsonaro.
Toffoli reafirmou sua inclinação pacificadora ao anunciar a pauta para este semestre, embora não faltem ali assuntos com potencial para criar animosidade entre o STF e bases bolsonaristas mais radicais.
Para citar um exemplo, em fevereiro o Supremo deve julgar as ações que questionam a legalidade da tabela que fixou preços mínimos para o transporte rodoviário de cargas, implementada pelo governo Michel Temer para pôr fim à greve dos caminhoneiros em 2018.
Em poucos meses, o mandato de Toffoli como presidente do STF chegará ao fim. O rodízio no tribunal prevê sua substituição pelo ministro Luiz Fux em setembro.
Mas a dança das cadeiras deveria importar pouco. Com a retomada do Judiciário após o atual recesso, o plenário da corte terá novas chances de mostrar que só o colegiado do Supremo reúne força suficiente para reafirmar sua independência e honrar seu compromisso com a defesa da Constituição.
Folha de S. Paulo
Racismo salarial
Debate sobre equidade racial no setor privado avança, mas a passos lentos
A diferença salarial de 45% entre brancos e negros no Brasil captada pelo IBGE em 2019 não pode ser integralmente explicada sem que se recorra a um fator: racismo.
Quando isoladas variáveis como grau de instrução e experiência, a disparidade na remuneração entre brancos e negros não justificada por outros fatores continua significativa, de 31%, segundo estudo do Instituto Locomotiva publicado nesta Folha.
O dado não é novo. Pesquisa internacional em 2018 atribuiu ao viés racial dos processos de seleção e promoção das empresas um quarto da disparidade salarial entre negros e brancos no Brasil.
Embora seja expressiva a evidência estatística, as medidas tomadas no setor privado, em resposta, caminham a passos bem menos assertivos. Promover equidade racial requer enfrentar barreiras estruturais em múltiplos níveis.
Demanda, de um lado, quebrar as bolhas de acesso. Iniciativas que busquem ligar empresas a profissionais negros qualificados são bem-vindas como forma de combater redes de contato que perpetuam diferenças raciais, em especial em cargos de liderança.
Empresas têm revisto seus processos de seleção e avaliação de desempenho para mitigar os efeitos de vieses raciais, por vezes inconscientes, por vezes não.
Tem se tornado comum, por exemplo, a prática de currículos às cegas, onde informações sensíveis como endereço do candidato são omitidas. Iniciativas mais promissoras têm sido vistas nas primeiras fases da carreira, em especial de estagiários e trainees.
O desafio, portanto, reside em incrementar a representatividade de profissionais negros nos cargos intermediários e de liderança. Uma vez inseridos, é preciso garantir-lhes oportunidades e um ambiente profissional inclusivo.
Empresas mais diversas tendem, internamente, a reduzir o absenteísmo e ser mais inovadoras. Externamente, ampliam redes de contato e melhoram a conexão com diversos públicos consumidores.
Muitas têm atuado em conjunto com concorrentes em coalizões e fóruns, mostrando que mais diversidade tende a beneficiar a todos.
Ao setor público, no entanto, cabe pensar políticas que enfrentem a questão da informalidade. Dados do IBGE de 2019 mostram que quase metade da população negra (46,9%) ocupa vagas precárias. Sem esta mudança, o racismo salarial persistirá.
Valor Econômico
Debate sobre nível ideal de reservas volta à pauta
Na esteira da saída recorde de dólares do Brasil em 2019, o Banco Central se desfez de quase 10% do colchão de liquidez externa do qual o país dispõe. As vendas de US$ 36,9 bilhões das reservas internacionais contribuíram para diminuir a volatilidade cambial, em um período no qual o dólar chegou a encostar em R$ 4,30.
E ainda ajudaram a política fiscal, ao retirar 2% do Produto Interno Bruto (PIB) da dívida bruta e diminuir a chamada taxa de juros implícita da dívida líquida, que reflete a diferença entre o custo de captação do governo e o que ele recebe de remuneração dos seus ativos.
O movimento do BC levou as reservas do país para US$ 356,9 bilhões ao fim de 2019. No pico do ano passado, antes de a autoridade monetária dar início ao seu programa de intervenções cambiais, elas tinham atingido US$ 390,5 bilhões.
Desde que o governo Luiz Inácio Lula da Silva iniciou a política de acumulação de divisas em moeda forte, o volume ideal desse seguro contra crises externas é alvo de debate. A discussão era mais acirrada quando a diferença entre a taxa de juros brasileira e a praticada internacionalmente era bem maior do que hoje, dado que a manutenção desse colchão tinha maior custo.
Mesmo com custo alto em grande parte do tempo, não há como se negar, como pontuou o economista José Luis Oreiro em entrevista ao Valor, que a constituição das reservas foi um acerto da política econômica do período do PT. Permitiu não só suavizar movimentos cambiais durante o período de euforia econômica que se sucedeu ao boom de commodities e à conquista do grau de investimento pelo país na década passada, mas também eliminou a vulnerabilidade externa que levou o Brasil reiteradas vezes a graves crises econômicas.
Por algum tempo, também produziu bons frutos fiscais, ao reduzir fortemente a dívida líquida do setor público. À época, esse indicador era o principal a ser acompanhado pelos analistas econômicos. Mas acabou sendo substituído pela dívida bruta após o exagero de empréstimos do Tesouro ao BNDES, movimento que era neutro para a dívida líquida, mas não para a política fiscal como um todo.
Agora, em outro contexto e com o BC atuando intensamente no mercado à vista de câmbio, é natural que o tema do nível ideal de reservas volte à tona. Bem como o debate sobre até onde a autoridade monetária deve interferir no funcionamento do mercado.
É verdade que no ano passado ocorreram algumas atipicidades que justificariam uma postura mais ativa do BC. Como algumas fontes governamentais pontuam, a forte valorização dos ativos, tanto de renda fixa como de renda variável, geram movimentos naturais de realização de lucros e, consequentemente, saída de divisas.
Além disso, a queda na taxa de juros Selic praticamente neutralizou a outrora popular operação de carry trade, quando o investidor toma dinheiro no exterior e aplica no Brasil para se aproveitar do diferencial de juros. Sem esquecer da troca de perfil de dívida das empresas, que quitaram operações de crédito externo por interno. Assim, o governo entende que deve haver alguma acomodação desses fluxos de saída.
Seja como for, está colocada a discussão sobre até onde o BC deve ir no uso das reservas. Diferentes economistas ouvidos pelo Valor apontam que ainda haveria folga para novas reduções do volume total. Para o diretor do ASA Bank e ex-secretário do Tesouro, Carlos Kawall, o nível ótimo de reservas estaria entre US$ 250 bilhões e US$ 300 bilhões. Ou seja, se ele estiver correto, o país poderia se desfazer de ao menos US$ 50 bilhões, volume ainda maior do que o vendido no ano passado e que retiraria outros 1,5% da dívida bruta.
O problema, contudo, é que o número ideal de reservas está sujeito a uma série de juízos subjetivos. E é um fato concreto também que reservas altas desencorajam movimentos especulativos contra a moeda local, com todas as consequências negativas que isso pode trazer, como alta da inflação, diminuição do crescimento econômico e dificuldades de pagamento de dívidas no exterior. Além disso, precisa-se cuidar de que o regime de câmbio flutuante continue valendo, com o menor volume de interferência possível.
O BC parece ter aproveitado bem o espaço que tinha para atuar e agiu oportunamente. Mas a partir de agora, como notou fonte do governo ouvida pelo Valor, terá que ser ainda mais cuidadoso, pesando como sempre os custos e benefícios para o país.