Incapaz de desenvolver políticas próprias, bolsonarismo é marcado por paralisia e polêmicas vazias
Alçado muito rapidamente ao poder, o novo conservadorismo não dispunha nem de programa, nem de quadros. Por isso, em seu primeiro ano de governo, Bolsonaro mais atravancou do que construiu políticas públicas.
Sergio Moro, a estrela do governo, propôs um ambicioso pacote legislativo anticrime que primeiro foi engavetado e depois completamente reconfigurado pelo Congresso, mostrando que a desarticulação da nova política paga um preço.
Na educação, prevaleceu durante todo o ano uma mistura de polêmicas inócuas e inépcia administrativa. Vélez Rodrigues e depois Weintraub bradaram contra a cultura progressista das universidades e o conteúdo dos livros didáticos, mas não foram capazes de propor nenhum tipo de política própria.
Os defensores do presidente tiveram que se bater pela miúda política do método fônico de alfabetização e por um pouco expressivo programa de captação de recursos e empreendedorismo para as universidades que está fadado ao fracasso.
Na cultura, as controvérsias ideológicas produziram uma pouco expressiva mudança na Lei Rouanet e uma grande paralisia no desembolso dos recursos do audiovisual.
Roberto Alvim chegou no final do ano, prometendo trazer uma visão genuinamente conservadora, mas o baixo orçamento, os limites constitucionais e a falta de respaldo no meio são garantia de que sua política também vai ser inócua.
No meio ambiente, Salles buscou se concentrar em um ambientalismo urbano que escapasse da contradição de preservar o meio ambiente e sustentar o compromisso com o ruralismo predador.
O ministro tentou desenvolver ações que ignorassem o desmatamento e se concentrassem em uma política de resíduos e saneamento básico. A dimensão da crise na Amazônia, porém, soterrou seus esforços. Aqui, a agenda negativa não pode ser considerada inócua, já que as consequências para o clima são graves e duradouras.
É na discreta pasta dos direitos humanos que o governo parece ter sua vitrine. Damares foi aos poucos convertendo a política de direitos humanos numa política de defesa da família tradicional, dando sequência a seu habilidoso trabalho político interdenominacional no meio evangélico.
Olhando com distanciamento, o bolsonarismo no primeiro ano foi apenas paralisia e controvérsia vazia – pelo menos no tocante às políticas públicas. O governo só apresentou uma política própria no campo econômico, que ele sempre tratou como um apêndice desimportante, afastado da agitação conservadora que o sustenta. (Folha de S. Paulo – 07/01/2020)
Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.