Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (11/11/2019)

MANCHETES

O Globo

Evo Morales renuncia sob protestos e pressão militar
Último dia de Enem tem novo vazamento
Segunda instância: PEC deve valer para réus recém-soltos
Fundos de pensão abrem planos familiares
PMs são presos após garçom ser morto a tiro
Novo BRT ficou só na promessa
Extrema direita torna-se a 3ª força do Parlamento espanhol

O Estado de S. Paulo

Evo e mais três na linha de poder renunciam na Bolívia
Ex-políticos viram lobistas e abrem portas a empresários
Recuperação econômica pode reduzir dividas em atraso
Fotos do Enem vazam nas redes durante a prova
Partido socialista de Sánchez vence eleição espanhola

Folha de S. Paulo

Evo Morales renuncia na Bolívia
Moro eleva ataques a Lula e pede reação no Congresso
Primeiro indígena no cargo foi tentado pelo caudilhismo
Mensalidade escolar sobe mais de 100% em sete anos
Romeu Zema – Brasil tem hoje excesso de direitos e poucos deveres
TSE determina que WhatsApp informe sobre disparos
Leitores defendem a Folha dos ataques de Jair Bolsonaro
Pacote do governo busca estimular emprego formal
Sigla socialista não obtém maioria na eleição espanhola

Valor Econômico

Só 6% das cidades cumprem metas do saneamento básico
Gestor de obra inacabada pode ser penalizado
Sob pressão, Morales renuncia na Bolívia
R$ 1 bi para ampliar vida útil de Angra I
Lula, solto, vai tentar unificar a oposição

EDITORIAIS

O Globo

O alerta que vem com o aumento da desigualdade

Conflitos em várias partes do mundo mostram que abismo social virou uma condicionante política

Era de se esperar que a aguda recessão de 2015/2016, legada ao país pelos governos lulopetistas, causasse estragos, alguns de efeito prolongado, como o contingente de desempregados — 12,5 milhões de pessoas em setembro, segundo o IBGE. Mas este é só um sintoma da deterioração das condições de vida da população. Há outros. Um retrato contundente dessa realidade está exposto na pesquisa Síntese de Indicadores Sociais, divulgada na quarta-feira pelo IBGE. Segundo o estudo, desde o início da crise econômica, em 2014, 4,5 milhões de brasileiros foram lançados na extrema pobreza, o que representa um aumento de 50% no número de miseráveis em quatro anos.

No ano passado, segundo a pesquisa, 13,5 milhões de brasileiros viviam na extrema pobreza — pelos critérios do Banco Mundial, com menos de R$ 145 por mês. Esse contingente, o maior da série histórica, corresponde a duas vezes a população da cidade do Rio de Janeiro, a segunda maior do país. Entre essas famílias de miseráveis, o rendimento médio no ano passado foi de apenas R$ 69 por mês. De acordo com o estudo, embora em 2018 a economia tenha dado sinais de recuperação, essa ligeira retomada não interrompeu o aumento da miséria.

Não é apenas o quadro atual que preocupa, mas também as projeções para os próximos anos. O diretor da FGV Social, Marcelo Neri, diz que se o Brasil crescer 2,5% ao ano, sem que a desigualdade aumente, somente em 2030 o país retornará ao patamar de extrema pobreza que registrava em 2014 (9 milhões de miseráveis). O que torna difícil cumprir a meta pactuada em 2015 com a ONU, dentro dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), de erradicar a miséria no país até 2030.

Os números mostram ainda que a desigualdade no país tem se acentuado. Nos últimos quatro anos (2014-2018), a renda do 1% mais rico da população cresceu 9,4%, enquanto a dos 5% mais pobres caiu 40%. Um dos motivos para o declínio é o aumento da informalidade.

Nem mesmo políticas públicas voltadas a essa população, como o Bolsa Família, estão conseguindo mudar o quadro. Os R$ 89 mensais (por pessoa) pagos pelo programa estão abaixo do valor que delimita a pobreza extrema.

É preciso refletir sobre o aumento da desigualdade. Os números mostram o agravamento de uma situação que já era das mais complexas. Obviamente, retomar o crescimento é necessário, mas não suficiente. A desigualdade está se tornando condicionante política relevante para todos, como mostram indicadores e pressões sociais tanto no Brasil quanto no Chile, nos Estados Unidos, na França e no Oriente Médio.

No Chile, um simples aumento de tarifa de transporte deu origem a uma convulsão social que não se via no país há décadas. E expôs mazelas, entre elas a desigualdade, que estavam latentes.

É verdade que o governo tem avançado nas reformas — a da Previdência, por exemplo, tem potencial para reduzir desigualdades históricas. Mas há que se ir além. E o essencial é estancar esse processo que arrasta grandes contingentes para a miséria.

O Globo

Símbolo da corrupção, Arco Metropolitano precisa ser resgatado

Rodovia que custou R$ 1,9 bilhão se tornou escura e perigosa e hoje é evitada pelos motoristas

Quando o Arco Metropolitano do Rio foi inaugurado, em 1º de julho de 2014, o destino traçado para ele parecia promissor. Afinal, é incontestável a importância para a economia fluminense de uma rodovia ligando Manilha, na Região Metropolitana, ao Porto de Itaguaí, e cortando todas as grandes estradas de acesso à capital, como Rio-Teresópolis, Rio-Petrópolis, Via Dutra e Rio-Santos. Passados cinco anos, porém, a realidade parece ter tomado outro atalho, bem mais tortuoso do que o das longas retas do Arco. Como mostrou reportagem do “Jornal Nacional”, da TV Globo, na última segunda-feira, a rodovia de R$ 1,9 bilhão virou um exemplo de tudo o que não deve ser feito numa obra pública.

Iniciado em 2008, durante a gestão de Sérgio Cabral, e inaugurado pelo seu sucessor, Luiz Fernando Pezão — ambos presos pela Lava-Jato —, o Arco é uma estrada pavimentada e iluminada pela corrupção. Um dos exemplos mais gritantes são as luminárias alimentadas por energia solar. Foram instalados 4,7 mil postes ao longo da rodovia, um a cada 17 metros, mas a maioria já não funciona, ou por falta de manutenção ou por furto de material. O Tribunal de Contas do Estado apontou sobrepreço de R$ 4 mil por unidade, totalizando cerca de R$ 17 milhões. Dono da empresa que montou os postes, César Augusto Craveiro Amorim foi preso pela Lava-Jato em 2018. Relatório da Controladoria-Geral do Estado mostra que se o governo tivesse optado por iluminação convencional, poderia economizar R$ 55 milhões em 25 anos.

Privada do milionário sistema de iluminação, a estrada se transformou numa via escura e perigosa, rota preferencial de assaltantes, à medida que é precário o policiamento ao longo de seus 71 quilômetros— trecho já inaugurado, de um total de 145 quilômetros. Segundo o JN, quase 200 pessoas foram assaltadas na via este ano. Evitado pelos motoristas, que preferem usar caminhos mais longos — porém mais seguros —, o Arco é subutilizado.

A falta de fiscalização e o abandono generalizado também têm contribuído para a ocupação irregular de terrenos às margens da rodovia.

Até hoje o Arco ainda não foi concluído, pois falta a duplicação do trecho Magé-Manilha, tocada pelo governo federal — as obras estão paralisadas.

O fato é que a União, responsável pelo Arco, precisa tomar conta da rodovia, ou concedê-la à iniciativa privada. O que não se pode é assistir à deterioração gradual de uma estrada bilionária, concebida para dinamizar a economia do estado e desafogar corredores importantes como a Dutra e a Avenida Brasil. Além de um choque de gestão, ela necessita de policiamento, para que motoristas se sintam seguros e possam voltar a usá-la. Quanto mais abandonada, maior será o prejuízo para todos.

O Estado de S. Paulo

Os desafios da Previdência

Em dez anos, as desonerações tributárias cresceram 268%, enquanto a receita previdenciária no mesmo período cresceu apenas 24,6%

A reforma da Previdência deve ser celebrada como uma demonstração de maturidade institucional do País. Feitas as contas, porém, fica claro que, mais do que o fim de uma jornada, ela é só o primeiro passo no longo caminho que levará ao equilíbrio das contas públicas. Não se trata apenas de complementá-la com as reformas administrativa e tributária, mas de prosseguir até o fim o saneamento do sistema de aposentadorias e pensões. Em auditoria recente, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que a reforma cobrirá menos de 20% do rombo nos regimes previdenciários. Entre os próximos passos, o mais importante é a reformulação do sistema de Estados e municípios, objeto de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) – a PEC paralela já aprovada em primeiro turno no Senado. Apesar disso, metade dos Estados, como mostrou matéria do Estado, está se antecipando e prepara suas próprias reformas.

Segundo o TCU, são necessários ao menos R$ 5,1 trilhões para tapar o rombo da Previdência entre 2020 e 2029. Para esse período, a economia conquistada com a reforma recém-aprovada é calculada em cerca de R$ 800 bilhões. Mesmo que a reforma de Estados e municípios seja integralmente aprovada, gerará uma economia adicional de R$ 442 bilhões.

Além disso, estão fora da reforma aprovada a previdência das Forças Armadas, que responde por 6% do rombo projetado da Previdência, e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a idosos de baixa renda e deficientes físicos, que representa 11,5% do rombo. A reforma dos militares que tramita no Congresso pode gerar uma economia de R$ 7 bilhões em dez anos, uma parcela inferior a 3% do déficit das aposentadorias militares nesse período, que é de R$ 305 bilhões. Já o BPC, se não for reformulado, será deficitário em R$ 588 bilhões em dez anos.

Entre as várias distorções apontadas pelo TCU está o excesso de renúncias de receitas. Em dez anos, as desonerações tributárias cresceram 268%, enquanto a receita previdenciária no período cresceu apenas 24,6%.

Como há dúvidas sobre a aprovação da proposta de emenda constitucional que aplicaria as modificações já feitas em âmbito federal a Estados e municípios, governo e Congresso já preparam um “plano B”, denominado Lei de Responsabilidade Previdenciária, a fim de induzir os entes subnacionais ou a aderir à reforma federal ou a realizar suas reformas.

Enquanto isso, os Estados fazem bem em não perder tempo e elaborar suas próprias propostas. Em geral, elas tendem a replicar os principais pontos da reforma federal. Entre eles, a idade mínima para a aposentadoria de servidores homens (65 anos) e mulheres (62 anos), com pelo menos 25 anos de tempo de serviço, e também a elevação das alíquotas de contribuição.

Em São Paulo, uma das medidas é aumentar a alíquota previdenciária cobrada aos servidores estaduais de 11% para 14%. O governo de Goiás apresentou uma proposta abrangente, já com a adesão de todos os municípios goianos, prevendo, entre outras coisas, a cobrança de alíquotas extraordinárias em situações de calamidade financeira – como a que o Estado enfrenta atualmente. O Rio Grande do Sul já tem pronto um texto de reforma, bastante alinhado à reforma federal. Rio de Janeiro e Santa Catarina também preparam projetos próprios, e buscam ainda formatar uma proposta conjunta envolvendo os Estados das Regiões Sul e Sudeste.

Essas correções, muitas vezes duras, se devem a anos de irresponsabilidade fiscal por parte de governos que pouco a pouco deformaram imensamente a máquina pública do País e a de cada Estado. Mas, uma vez que a economia até 2022 é pouca, esse é um caso em que os interesses do governo de turno – de curto prazo – e os interesses de Estado – de longo prazo – tendem a ser conflitantes. Por isso, é imperativo que a população de cada Estado una forças à União, pressionando seus respectivos governos e legislaturas de baixo para cima. A alternativa é o colapso.

O Estado de S. Paulo

Dismorfia diplomática

O que o presidente Bolsonaro vê como “autodeterminação”, “altivez” e “ato de soberania” de um gigante diplomático adormecido até sua posse, não passa da pequenez da submissão aos interesses dos Estados Unidos

No que concerne às relações exteriores, o Brasil é acometido de uma espécie de “dismorfia reversa” aos olhos do presidente Jair Bolsonaro. A dismorfia é um transtorno que leva a pessoa a ver no espelho uma feiura imaginária, defeitos que ninguém além dela mesma vê. O que o presidente Bolsonaro vê como “autodeterminação”, “altivez” e “ato de soberania” de um gigante diplomático adormecido até sua posse, não passa da pequenez da submissão aos interesses dos Estados Unidos. Ou melhor, do presidente Donald Trump.

Como tem sido há 28 anos, a Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) condenou por amplíssima maioria – 187 votos a 3 – o bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos a Cuba em 1962. Pela primeira vez na história, o Brasil votou com os Estados Unidos e Israel pela manutenção do embargo, quebrando, mais uma vez, a respeitável tradição diplomática do País. Desde 1992, quando foi apresentada a primeira proposta de resolução condenando o embargo à ilha caribenha, o Brasil vinha se posicionando a favor de sua aprovação.

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, classificou o reposicionamento do Brasil como uma “quebra de paradigma”. “Nada nos solidariza com Cuba. O regime cubano, desde sua famigerada revolução há 60 anos, destruiu a liberdade de seu povo, executou milhares de pessoas, criou um sistema econômico de miséria e, não satisfeito, tentou exportar sua ‘revolução’ para a América Latina”, escreveu o chanceler no Twitter. Em seu discurso na ONU, em setembro, o presidente Jair Bolsonaro já havia tratado da necessidade de combater um “plano” urdido por Fidel Castro, Hugo Chávez e Lula da Silva para “estabelecer o socialismo em toda a América Latina”.

A questão não se restringe à “solidariedade com Cuba”, tendo a ver com uma posição altiva do Brasil contra um ato de força cometido unilateralmente por uma nação contra outra, sem a chancela da ONU. É por essa razão que o País tem se posicionado pela aprovação da resolução contra o embargo há tanto tempo, não pela aprovação tácita das arbitrariedades cometidas na ilha.

Não se discute que o regime castrista impôs severos danos ao povo cubano, que desde 1959 vive sem liberdade, privado de toda sorte de bens tangíveis e intangíveis. Mas se é assim há seis décadas, isso se deve em boa medida às consequências do próprio embargo econômico. Não à toa, o governo cubano nunca empreendeu grandes esforços para que a medida fosse suspensa. Sempre interessou aos irmãos Fidel e Raúl Castro manter vivo o temor do inimigo externo a fim de escamotear desmandos domésticos. Lembremos que partiu do ex-presidente Barack Obama a iniciativa de distender as relações entre Washington e Havana em 2014.

O fim do embargo econômico a Cuba, que só pode ser determinado pelo Congresso dos Estados Unidos, impõe-se por razões humanitárias e geopolíticas. O povo cubano já sofre há demasiado tempo, vítima da exploração de sua miséria para fins políticos tanto pelo regime castrista como por países como o Brasil. Alinhados ideologicamente, os governos do PT sempre relativizaram a truculência da ditadura caribenha em nome de uma suposta “luta anti-imperialismo”.

Como antípoda de Lula da Silva, Jair Bolsonaro deveria ser o primeiro a defender o fim do bloqueio para que, uma vez conhecendo as benesses da liberdade, o povo cubano pudesse repudiar com mais veemência a violência a que está submetido. Mas isso seria exigir demais, já que para tal o presidente brasileiro teria de pensar por conta própria, e não com a cabeça de Trump.

Incapaz de formular a sua própria política externa, tendo como norte o melhor interesse do País e nossa longa tradição diplomática, o presidente Jair Bolsonaro parece se contentar em deixar como marca de sua diplomacia a submissão quase absoluta aos interesses de seu contraparte norte-americano. No ano que vem será conhecido o próximo presidente dos Estados Unidos. A ver se a aposta foi bem feita.

O Estado de S. Paulo

Supremo penalista

Na prática, o Supremo Tribunal Federal passou a ser a quarta instância de julgamento em matéria penal

A maioria das decisões colegiadas do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017 (56,5%) foi tomada em processos criminais. O dado foi apurado pelo Supremo em Números, grupo de pesquisa vinculado à Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio). É a primeira vez na série histórica do Supremo em Números, idealizado em 2010, que mais da metade das decisões colegiadas do STF tratou de questões de natureza penal.

É um sinal dos tempos, corolário de profundas mudanças por que passam não apenas a Corte – internamente e aos olhos dos cidadãos –, mas também o País. Se há alguns poucos anos era inimaginável que autoridades dos primeiros escalões da República, altas lideranças partidárias e empresários graduados pudessem ser tocados pelo Direito Penal, hoje causa rebuliço quando seus processos repousam em paz nos escaninhos da Justiça.

O ponto de inflexão, quando passou a ser mais habitual o julgamento de casos criminais pelo STF, foi a chegada do caso do mensalão do PT à Corte, em 2007. Por envolver uma série de autoridades com foro especial por prerrogativa de função, o STF teve de ser envolvido desde a fase de inquérito até o julgamento da Ação Penal 470, cinco anos depois. A Corte tratou, inclusive, dos casos de réus que não detinham o chamado foro privilegiado, mas foram julgados pelos ministros por suas ligações com aquelas autoridades. A Operação Lava Jato, iniciada em 2014, só fez aumentar a quantidade de ações criminais no STF.

Embora tenha aumentado a proporção de decisões colegiadas em processos criminais, ações dessa natureza ainda são minoria no STF, como aponta o Supremo em Números. Dos 31.476 processos em tramitação no STF, 5.581 (18%) tratam de matéria penal, sendo 75% dos casos o julgamento de habeas corpus. “O Supremo trabalha predominantemente com a legislação ordinária e, neste aspecto, pode-se dizer que atrai para si uma competência que é do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a duplica”, conclui o relatório do Supremo em Números. Na prática, o STF se tornou a quarta instância de julgamento em matéria penal.

Evidente que esse aumento da carga criminal que chega ao STF diminui a dedicação de seus 11 ministros aos temas de natureza constitucional, o que, em tese, seria a missão precípua da Corte. Há juristas que veem nesse novo balanço processual do STF um desvio de finalidade, sobretudo porque as questões penais envolvem indivíduos e não têm, portanto, o condão de gerar repercussão para outros casos. “O STF é a Corte Suprema que mais julga matérias da Justiça comum no mundo. Acaba perdendo a sua natureza constitucional, passando a ser um tribunal ordinário, o que desconfigura a sua função de guarda da Constituição”, disse ao Estado o professor Cláudio Langroiva, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Na verdade, quem determina que o STF não é apenas uma corte constitucional é a própria Lei Maior. E desde há muito.

A competência do STF para o julgamento penal de certos casos e certos réus é dada pela Constituição desde a fundação do Império, tendo sido consolidada na primeira Constituição republicana, de 1891. Pode-se discutir – e, de fato, é uma discussão pertinente – se a Corte Suprema está ou não estruturada para o processamento de ações dessa natureza. Se não está, não foi por falta de tempo para que se organizasse a fim de exercer bem a missão.

Se, por um lado, o STF há de se estruturar materialmente para o julgamento de ações de natureza penal em prazo aceitável – crítica que constantemente se faz à Corte –, por outro, as instâncias inferiores do Judiciário também precisam urgentemente corrigir suas distorções. Um pernicioso efeito cascata, causado até pelo desrespeito a decisões exaradas pela Corte Suprema por juízes de graus inferiores, também contribui para o aumento dos casos criminais que chegam a Brasília. Mas não seria exagero dizer que alguns ministros do STF gostaram do protagonismo que passaram a ter na vida nacional a partir do crescimento de sua atuação em ações penais.

Folha de S. Paulo

Eles contra eles

Lula deve acentuar polarização que também beneficia Bolsonaro; perde o debate

Há muito mais dúvidas do que certezas a respeito do futuro político e jurídico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva —agora livre, mas ainda inelegível, alvo de processos e sujeito a novas jurisprudências.

Fato é que o cacique petista se mostra disposto a empregar sua versão mais messiânica no esforço de despertar uma oposição de esquerda carente de ideias e lideranças. Seus primeiros movimentos fora da cela o confirmam.

No imediato reencontro com palanques e microfones, Lula atacou os inimigos imagináveis: o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ministro Sergio Moro, claro, mas também milicianos, a reforma da Previdência, Donald Trump e, como seu antípoda, a imprensa.

Ao mesmo tempo, retoma a glorificação de feitos de seu governo —deixando de lado o contexto do período e, mais ainda, os desdobramentos da gestão de sua sucessora.

Chama a atenção, no caudaloso comício em São Bernardo no sábado (9), a ênfase de Lula nos temas econômicos. Chegou a falar de taxa Selic e spread bancário ao discorrer, com boa dose de razão, sobre os efeitos limitados da recente queda dos juros do Banco Central.

O ex-presidente explora o que é ao mesmo tempo um trunfo e uma vulnerabilidade de Bolsonaro.

Trata-se da área em que o governo dispõe de uma agenda coerente e uma equipe qualificada. Ademais, há a expectativa plausível de uma recuperação da atividade, ainda que modesta, capaz de reforçar o capital político do mandatário.

Entretanto as reformas e ajustes em andamento, por necessários que sejam, envolvem temas explosivos como direitos trabalhistas e previdenciários, o valor do salário mínimo, privatizações, o custeio da educação e da saúde.

Sobrarão, portanto, elementos para amparar a tradicional estratégia da esquerda de associar o controle orçamentário à insensibilidade social ou a interesses escusos.

Já se noticia que Lula pretende rodar o país com a justificativa oficial de preparar o partido para as eleições municipais do próximo ano. Ou, mais exatamente, para recolocá-lo como expoente maior de um dos polos do espectro ideológico.

No figurino de mártir, o petista deve acentuar uma polarização que muito interessa também a Bolsonaro —que mais uma vez tem a oportunidade de personificar a vasta rejeição ao lulismo.

Tal modelo de antagonismo tende a alimentar mistificações e investidas populistas de lado a lado. Sataniza-se o oponente a todo momento, no afã de inflamar as próprias hostes militantes.

Ganham os dois protagonistas. Perde, em racionalidade, o debate político e programático.

Folha de S. Paulo

Diplomacia pueril

Ao defender embargo a Cuba, Itamaraty muda para agradar aos EUA, sem ganho

Ao declarar apoio ao embargo econômico imposto a Cuba pelos Estados Unidos, o governo Jair Bolsonaro (PSL) deu mais uma mostra da maneira imatura como conduz a política externa brasileira.

Nesta quinta (7), o país votou contra uma resolução da Organização das Nações Unidas que condena o embargo, conjunto de medidas adotadas pelos EUA para estrangular a economia cubana em 1960, logo após a vitória da revolução liderada por Fidel Castro.

Como em anos anteriores, a condenação obteve o apoio de maioria expressiva, com votos de 187 países. Além do Brasil, só Israel e os próprios EUA votaram contra.

É certo que Bolsonaro nunca escondeu a antipatia pela ditadura cubana e o desejo de alinhamento com os americanos. Ainda assim, a maneira como sua opção foi feita e as justificativas apresentadas pelo Itamaraty são preocupantes.

O Brasil sempre votou contra o embargo, em respeito a normas internacionais e à prática de condenar sanções unilaterais.

Desta vez, porém, o país cedeu docilmente à pressão dos Estados Unidos, que sugeriram que o Brasil seria considerado tolerante diante das violações de direitos humanos praticadas em Cuba e na Venezuela se não revisse sua posição.

De nada serviram os apelos do representante brasileiro na ONU, o embaixador Mauro Vieira, que apontou riscos criados para os interesses brasileiros com a guinada.

Consumada a mudança, o chefe do Itamaraty, Ernesto Araújo, foi às redes sociais fazer uma imprecação contra Cuba, Venezuela e o comunismo —talvez esquecido de que horas antes a Petrobras se associara a estatais chinesas para explorar o petróleo do pré-sal.

O discurso pode agradar aos seguidores de Bolsonaro, mas não ajuda a proteger os interesses brasileiros. Se amanhã outro país quiser impor sanções ao Brasil porque ele não cuida direito das suas florestas ou por outro motivo qualquer, a defesa será mais difícil.

Além de não avaliar com atenção os riscos, o Itamaraty também não parece ter examinado os resultados obtidos pelo embargo.

Passadas quase seis décadas, é evidente que as restrições só serviram para dificultar a vida dos cubanos e aumentar a resistência do regime castrista, que pode culpar os EUA por tudo que vai mal na ilha.

Nada disso parece importar para Bolsonaro. Com seu empenho em agradar Trump, ele espera remover barreiras a produtos brasileiros nos EUA e obter outras vantagens. Até agora, nada conseguiu.

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