NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE
Toda vez que se fala em reforma ministerial, os ministros mais inseguros começam a dar declarações atacando os setores descontentes com o governo, como uma forma de agradar o presidente Jair Bolsonaro. É uma receita de bolo: houve um erro clamoroso no ministério ou uma denúncia contra o gestor, o ministro em apuros sapeca um post no Twitter ou dá uma coletiva com uma declaração bem polêmica, atacando a imprensa, os professores, os artistas e outros setores considerados desafetos do presidente da República. O campeão nessa estratégia é o ministro da Educação, Abraham Weintraub. Com isso, cria-se uma situação na qual a saída do cargo seria vista como uma derrota de Bolsonaro para os seus desafetos. Aparentemente, está funcionando.
A última do ministro foi acusar universidades federais de estarem envolvidas na plantação de maconha e produção de drogas em laboratório, o que provocou reações dos reitores, do Ministério Público e até da Justiça. Weintraub utilizou casos isolados de ocorrências policiais para acusar diretamente a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). No primeiro caso, usou como exemplo alguns pés de maconha plantados numa área de cerrado próxima ao Câmpus Darcy Ribeiro, erroneamente avaliado pelos policiais como pertencente à UnB. No segundo caso, foi a apreensão de 14 buchas de maconha e 1kg de haxixe no câmpus da UFMG, mas seus portadores não eram alunos nem funcionários da instituição. Foi o suficiente para o ministro generalizar.
Boatos de queda de ministros não faltam. Na semana passada, as vítimas eram o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que se encarregou de desfazer o boato divulgando sua agenda com Bolsonaro, e o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, enrolado no caso das candidatas laranjas do PSL em Minas Gerais. Agora, os alvos preferenciais são o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, por causa do quase fracasso do leilão do pré-sal, e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, com a imagem pichada por causa do desmatamento na Amazônia e da demora para enfrentar o desastre ambiental causado pelo derramamento de petróleo no litoral brasileiro.
Três variáveis que podem levar Bolsonaro a alterar a composição de seu governo: primeiro, o desempenho da administração propriamente, uma vez que a aprovação do governo continua negativa (na pesquisa XP de novembro, por exemplo, eram 39% de ruim e péssimo e 35%, de ótimo e bom); segundo, a criação de seu partido, a Aliança pelo Brasil, que precisa ser prestigiado no governo para ser uma alternativa de poder; terceiro, a instabilidade da base do governo, que aumentou com o racha do PSL e tem provocado reveses para o governo no Congresso, com a derrubada de vetos e a não aprovação de medidas provisórias.
Segunda instância
O ministro da Justiça, Sérgio Moro, se reunirá hoje com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, os líderes da Casa e também alguns deputados para discutir a chamada PEC da Segunda Instância. Na Câmara, a Comissão de Constituição e Justiça aprovou, na semana passada, a admissibilidade da PEC que altera os artigos 102 e 105 da Constituição, de autoria do deputado Alex Manente. O Senado também discute um projeto com o objetivo de permitir a prisão após condenação em segunda instância, mediante alteração do Código de Processo Penal (CPP), acabando com os recursos especiais e extraordinários para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF), ou seja, sem emenda constitucional.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nega a existência de uma corrida com o Senado para aprovação da PEC, mas já está instalando uma comissão que vai apreciar o mérito da proposta. Isso significa que a PEC vai tramitar na Câmara de fato, apesar da resistência surda dos que são contra a mudança constitucional. Essa resistência será ainda maior no Senado, embora exista um grupo aguerrido de senadores que defendem a prisão após a condenação em segunda instância.
A propósito, amanhã, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento do compartilhamento de dados sigilosos da Receita Federal com o Ministério Público Federal (STF) e outros órgãos de controle. Votaram até agora o presidente da Corte, Dias Toffoli, relator do caso, contra o compartilhamento sem autorização judicial, e o ministro Alexandre de Moraes, a favor. (Correio Braziliense – 26/11/2019)