Jornal destacou trajetória de Antônio Granja, presidente de honra do Cidadania que morreu nesta segunda-feira

Dirigente centenário do PCB/PPS, hoje Cidadania, morreu no Espírito Santo, aos 106 anos (Foto: Álbum de família)

Em agosto de 2018, o site do jornal “Gazeta On Line” (veja abaixo) destacou a trajetória de Antônio Ribeiro Granja às vésperas do dirigente histórico do PCB (Partido Comunista Brasileiro)/PPS (Partido Popular Socialista), hoje Cidadania, completar 105 anos. Ele morreu aos 106 anos na madrugada desta segunda-feira (11), no Espírito Santo.

A reportagem mostra que o tempo não pareceu desgastar a memória do ex-líder sindical que mantinha a rotina de atividades partidárias.

“A idade avançada não fez Antônio Granja deixar de acompanhar a vida política do país. Atento às mudanças de cenário, ele demonstra preocupação com as eleições [presidenciais] deste ano [2018 ] e com os pedidos de intervenção militar no Brasil”, diz a matéria com um entrevista com presidente de honra do Cidadania e depoimentos de lideranças políticas do Espírito Santo sobre a sua atuação política.

Antônio Granja, um militante centenário ativo na política

Gazeta On Line

Prestes a fazer 105 anos, uma das mais expressivas lideranças políticas do Estado e atual presidente de honra do PPS mantém rotina de atividades partidárias

Os efeitos de mais de um século de vida não parecem desgastar a memória de Antônio Ribeiro Granja. Completando 105 anos na próxima segunda-feira (30), o comunista, presidente de honra do PPS e ex-líder sindical conta que ainda ouve todos os dias o noticiário, recebe visitas de lideranças políticas e participa de encontros em todo o país.

“Estou na ativa ainda, desde 1930”, diz o centenário. Após perder sua casa há cinco anos, por conta das enchentes ocasionadas pelas chuvas de 2013 que comprometeram a estrutura do imóvel em que morava, em Serra Dourada, na Serra, Granja recebeu a equipe do Gazeta Online na casa de um dos filhos, no mesmo bairro em que vivia. Sentado em sua cama, cercado de quadros com homenagens que recebeu, ele descreve, com detalhes e citando cada data, sua trajetória.

INÍCIO

Natural de Exu, em Pernambuco, logo na adolescência Granja seguiu o caminho de muitos de seus conterrâneos que iam buscar emprego em São Paulo. Foi lá que, em 1930, aos 17 anos, começou sua militância, ao entrar para a Aliança Liberal.

“A gente apoiava o Getúlio Vargas e houve uma eleição que foi nula, dando a vitória para o candidato do governo, Júlio Prestes. Era a época da política do café com leite. Então tomamos o poder pela força. Foi ali que comecei minha luta”, lembra.

Dali, Granja passou a atuar no movimento sindical e entrou para o Partido Comunista, em 1934. Trabalhou como pedreiro e operário em São Paulo, até ser chamado para a construção da ferrovia Brasil-Bolívia. Com a criação da Vale do Rio Doce, em 1942, veio para o Espírito Santo para trabalhar na oficina de vagões da companhia, em Cariacica.

No Estado, liderou o movimento sindical dos ferroviários, acompanhou a criação das primeiras leis trabalhistas e participou do surgimento das primeiras centrais sindicais do Brasil. Organizando greves e se opondo ao governo getulista do Estado Novo, Granja chegou a ser detido algumas vezes pela polícia no período.

Mesmo preso, eu nunca traí o partido e nunca neguei que era comunista. Toda vez que me pegavam, eles me perguntavam qual era meu partido e eu respondia: ‘Sou comunista’. E aí já tomava a primeira porrada

Com o fim da Era Vargas (1930-1945), o partido voltou à legalidade. Em 1947, Granja foi eleito vereador de Cariacica pelo PCB. Neste período, também ajudou a fundar a “Folha Capixaba”, o jornal dos comunistas no Espírito Santo. Na Câmara de Cariacica, ele ficou até 1952.

“Quando terminei o mandato, começaram a me perseguir e tive que deixar o Estado. Só voltaram a me chamar de Antônio Ribeiro Granja com a Lei da Anistia (1979). Foram 27 anos de perseguição. Depois do início da ditadura, ficamos em 18 dirigentes em todo o Brasil. Onze deles foram presos e assassinados. Eu consegui ser um dos sobreviventes”, relata.

Naquele época, Granja teve mais de 40 nomes diferentes. José Amaro, Luiz, Baiano e Francisco foram alguns deles. Este último lhe rendeu o apelido de Chiquinho, nome que a atual esposa, Silnéia do Espírito Santo, de 68 anos, o chama até hoje.

“Quando eu o conheci, em 1974, em Cachoeiras de Macacu (RJ), ele trabalhava na roça. No começo, não sabia que ele era comunista e nem que tinha outro nome. Aos poucos, ele foi me contando. Até a anistia, a gente mudava de casa a cada oito meses e olha que nos casamos quando a ditadura já estava em declínio”, conta Silnéia.

Com o fim da ditadura, Granja voltou a trabalhar para jornais do partido e foi convidado a escrever para a revista “Internacional”, com sede em Praga, na antiga Tchecoslováquia, hoje República Tcheca. Lá, viveu os últimos anos da União Soviética, voltando para o Brasil no início da década de 1990.

PCB

Com o fim da União Soviética, o Partido Comunista Brasileiro se dividiu em três correntes. Parte dos dirigentes defendia uma grande mudança, tirando da bandeira símbolos históricos como a cor vermelha e a foice com o martelo. Desse grupo surgiu o Partido Popular Socialista (PPS).

“Hoje, o partido se dividiu, não mantém as mesmas correntes e entraram pessoas que pensam diferente. Assim é o PPS, partido em que sou desde 2012 o presidente de honra. Mesmo assim, me sinto realizado”, explica.

PREOCUPAÇÃO COM ONDA CONSERVADORA NO PAÍS

A idade avançada não fez Antônio Granja deixar de acompanhar a vida política do país. Atento às mudanças de cenário, ele demonstra preocupação com as eleições deste ano e com os pedidos de intervenção militar no Brasil.

Granja compara o crescimento de grupos conservadores com a Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento inspirado nas ideias ultranacionalistas do fascismo e do nazismo, que ganhou força no Brasil durante a década de 1930.

Ele afirma que o próximo presidente terá muitas dificuldades para colocar o país em ordem e relembra o dia em que quase foi pego pelos militares.

VEJA ENTREVISTA

Depois das dificuldades que passou, acha que a democracia segue evoluindo?

A democracia é irreversível. Pode tardar, mas sempre aparece. Eu sinto que hoje ela está bem mais forte de quando comecei. Mesmo assim, ela enfrenta dificuldades, com a corrupção, os desvios dos cofres públicos, a crise de confiança com a classe política. Fico triste que hoje até partidos de esquerda se envolveram em corrupção. Mas não tenho dúvidas de que a democracia vai amadurecer, ela pode crescer de maneira torta, mas sempre vai estar em crescimento.

Como avalia os treze anos de governo petista?

Acho que o governo Lula é bem parecido com o governo de Getúlio. Enquanto acende uma vela para os trabalhadores, acende outra maior para os mais ricos. Manter essas duas frentes cria um problema que vai se afunilando até você ter que tomar um lado ou outro. Hoje é difícil você ver alguém que luta pela pureza da defesa do povo. Particularmente, eu sempre vi o Lula, por exemplo, como um oportunista. Veio de um movimento de operários, era a esperança de um povo, mas estava à frente do mensalão, dividiu as riquezas da Petrobras e dos Correios com os membros do partido. E deu no que deu.

O que pensa a respeito do processo de impeachment?

Não adiantou nada. Para mim, o presidente Michel Temer (MDB) será o segundo ex-presidente preso, depois do Lula. Assim que deixar o governo, vão cair em cima dele. A Lava Jato já está cercando. Infelizmente, a propina virou sistêmica no país e, quando é assim, é difícil dar fim. Como se diz por aí, desde 1945 não se bate um prego no Brasil sem pagar propina.

Como vê o crescimento de grupos que defendem a intervenção militar como solução?

Esses são os inimigos da pátria. São as mesmas correntes que vi nos nazistas, no movimento integralista de 1930 e nos fascistas da 2ª Guerra Mundial. São os mesmos inimigos com uma roupagem diferente. São ideias que se baseiam no terror. Quanto pior a situação do Brasil, quanto mais caos, melhor para eles conseguirem enganar o povo. O conteúdo de agora é o mesmo, só muda a forma. Fico triste, pois tive companheiros meus que nem sequer tiveram um enterro por lutar contra a ditadura…

O senhor chegou a ter medo de morrer durante a ditadura?

Em 27 anos na clandestinidade, teve uma vez que quase me pegaram. Eu morava em uma fazenda, em São Gonçalo (RJ), e já estava de mudança para uma outra casa. Foi meu filho que viu a polícia chegando e me avisou. Saí correndo pelo mato, tive que largar tudo. Me escondi e vi eles passando a 20 metros, com as armas em punho. Foi difícil, mas acho que cumpri minha tarefa.

O que pensa sobre o futuro do país?

Acho que o próximo presidente terá muito trabalho. Essa questão das reformas, da Previdência e do trabalho, é uma incógnita. O certo seria mudar de forma devagar, sem agredir a população. As pessoas vão ter que dar muito valor ao voto, não eleger qualquer um. Como eu disse, a democracia sempre cresce, mas às vezes passa por caminhos tortos.

REFERÊNCIA PARA LIDERANÇAS CAPIXABAS

“Ele é da geração do (Luís Carlos) Prestes. Se hoje a gente tem partidos de esquerda, deve muito à luta dele. É uma referência para nós”
Brice Bragato (PSOL), ex-deputada estadual

“Meu pai já falava da importância dele para o país. Quando entrei no PCB, ouvi falar dele de novo. É um homem íntegro”
Perly Cipriano (PT), ex-deputado estadual

“Eu o conheci na ditadura, quando estava sendo perseguido. Ficamos amigos e admiro sua luta”
Max Mauro (sem partido), ex-governador do Estado

“Fui convidado por ele para entrar no PPS. É um grande líder, que em um momento como esse merece ser cultivado”
Luciano Rezende (PPS), prefeito de Vitória

“Ele é da geração que sonhou uma sociedade mais igualitária. Tem uma trajetória bonita e é um exemplo”
Paulo Hartung (MDB), governador do Estado

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