MANCHETES
O Globo
Guedes assina medida que transfere Coaf para o Banco Central
“Rei Arthur”, foragido, é flagrado em vida de luxo em Miami
Fila para remédios especiais no Rio tem ao menos 8.500 doentes
Automação pode afetar emprego de metade dos trabalhadores do país
Racismo: Os efeitos do preconceito na saúde das crianças
EI assume ataque que matou 63 em casamento no Afeganistão
Protestos em massa em Hong Kong desafiam proibição
Favorito na Argentina faz aceno de paz a Bolsonaro
O Estado de S. Paulo
MEC quer definir verba de universidade por desempenho
Placar aponta resistência à indicação de Eduardo
Bolsonaro ataca Fernández de novo
Presidente ficará isolado, diz Bebianno
Previdência provoca ‘debandada” no MP
Mercado imobiliário, enfim, esboça retomada
Folha de S. Paulo
SP terá de gastar até R$ 1 bilhão a mais com Rodoanel Norte
País não puniu ninguém por morte de 300 presos em 3 anos
Deltan afirma que seguiu a lei ao usar dados da Receita
50 milhões não têm proteção trabalhista ou previdenciária
Embraer completa 50 anos em mudança de identidade
Superlotado, Pedrinhas vê melhora na estrutura
Fernández criticou gestão de Cristina, vice em sua chapa
Valor Econômico
Juros do cheque especial persistem acima de 300%
Alta renda dá fôlego a setor imobiliário
‘Rei do bitcoin’ enfrenta ação e penhora
Substituição de importação
Fernández diz a Bolsonaro: ‘Não fecho economia’
Mil municípios podem ficar sem repasses federais
Exportação de frutas vai a US$ 1 bi em 2020
EDITORIAIS
O Globo
Carta garante independência ao Ministério Público
Bolsonaro gostaria de um PGR subordinado ao Planalto, uma impossibilidade legal
Cabe ao presidente fazer indicações para postos-chave na cúpula do Judiciário e, no Ministério Público, o do procurador-geral da República (PGR). Para diluir o poder do chefe do Executivo, nomes que recebem o aval do presidente são submetidos ao Congresso. Cumpre-se, dessa forma, o pressuposto republicano de não haver poder absoluto, estando todos sob o sistema de freios e contrapesos.
Além disso, cargos preenchidos têm blindagens legais para garantir a independência com a qual essas instituições funcionam, conforme estabelecido na Constituição.
O modelo é aplicado nas democracias modernas, e funciona. Sem impedir que haja choques, inerentes à democracia, que tem seus mecanismos para mediar divergências. O presidente Jair Bolsonaro, devido ao perfil autoritário, é um teste para este sistema.
Bolsonaro já reclamou da Justiça e também do Congresso, por impedi-lo de alterar lei aprovada pelo Legislativo — o Estatuto do Desarmamento —, baixando decretos presidenciais. Recuou e remeteu projeto de lei aos parlamentares. É um processo educativo para homens públicos autoritários.
No momento, Bolsonaro se prepara para indicar o novo procurador-geral da República, que tem prerrogativa de encaminhar denúncia ao Supremo contra o próprio presidente, parlamentares federais, ministros etc. O Ministério Público, nos termos da Constituição, defende “a ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” Com “independência funcional”. Não tem, portanto, qualquer subordinação ao Executivo, Judiciário e Legislativo. É a materialização do oposto do que Bolsonaro gostaria que fosse a organização do Estado.
Enquanto faz contatos com candidatos a substituir Raquel Dodge, traça o perfil do procurador ideal: sem estrelismo; sem ser “xiita” nas questões do meio ambiente, das minorias, dando o exemplo da proteção ao índio.
Além de serem critérios vagos, o presidente parece desejar um servidor do Executivo.
Se for assim, precisará de alguém muito afinado com ele. Fernando Henrique Cardoso escolheu Geraldo Brindeiro, tão fiel ao presidente que a oposição maldosamente o apelidou de “engavetador-geral da República”.
Não livrou FH de todos os dissabores, porque qualquer procurador tem prerrogativas para encaminhar denúncias. E isso aconteceu no período tucano. De lá para cá o MP se fortaleceu e a instituição ganhou espaços, não só devido à Lava-Jato.
Procuradores são atuantes, por exemplo, em questões ambientais e referentes a minorias, como os índios, não por acaso citados por Bolsonaro. Por mais próximo dele que venha a ser o novo procurador, é seguro que há à frente muito espaço para desentendimentos entre o governo Bolsonaro e o MP. Mas nada que as instituições não possam administrar.
O Globo
Governo precisa decidir o futuro dos Correios, com ou sem privatização
A melhor alternativa é a venda da ECT, mas não há estudos sobre a operação e falta debater alternativas
O presidente e o ministro da Economia têm mencionado a intenção de privatizar os Correios, serviço público com 356 anos de existência e uma estrutura composta por 105 mil pessoas, e 12 mil agências que atendem a 5,5 mil municípios. Já foi modelo em eficiência e credibilidade. Hoje é mais uma estatal em degradação.
Os Correios representam uma síntese de um longo ciclo de desgoverno nas empresas públicas. Encerrou 2018 com receita de R$ 18,5 bilhões, dos quais dois terços consumidos na despesa com pessoal e me-nosde3% investidos no negócio. Na última década teve uma nova diretoria a cada dois anos e passou por uma dúzia de greves.
A exploração sindical e partidária acabou levando a estatal e seu fundo de pensão, Postalis, ao centro dos principais casos de corrupção dos últimos 15 anos. Um flagrante de pagamento de propina numa sala da diretoria ilustrou o caso conhecido como mensalão — compra de maioria parlamentar no primeiro governo Lula.
Na sequência, revelou-se uma série de fraudes no Postalis. Uma delas foi o pagamento de US$ 120 milhões na compra de títulos cujo valor de face somava US$ 41 milhões.
Foi uma operação financeira com sobrepreço de US$ 79 milhões (191%), num fundo de investimento cujo único cotista era o Postalis. Boa parte dos papéis estava lastreada em títulos emitidos pelo governo e pela estatal de petróleo da Venezuela, a PDVSA. Valiam pouco mais que a tinta e o papel usados.
Negócios como esse, realizados em meio à luta entre o PT e o PMDB pelo comando da estatal, levaram o Postalis a perder 25% do patrimônio dos associados.
A privatização é uma alternativa que merece ser considerada, já adotada com êxito no Japão, por exemplo.
Mas é necessário cautela, porque o serviço público postal brasileiro tem peculiaridades.
Os Correios obtêm 92% de sua receita (R$18,1 bilhões) em 324 cidades. Descontada a despesa operacional nessas áreas, apura superávit R$ 6,7 bilhões anuais. Em outros 5.246 municípios, a situação é inversa: gasta R$ 8,1 bilhões por ano para faturar R$ 1,5 bilhão —ou seja, perde R$ 6,6 bilhões na operação.
Até agora, a privatização dos Correios não passou de citação em discursos do presidente e do ministro da Economia. Inexistem estudos e não há debate sobre alternativas realistas para o futuro da empresa. Lamentável, porque a degradação desse serviço estratégico limita as chances de expansão mais rápida do comércio eletrônico.
O Estado de S. Paulo
Nem esquerda nem direita
Em setembro de 2009, o então presidente Lula da Silva, referindo-se à disputa eleitoral pela sua sucessão no ano seguinte, fez um discurso no qual qualificou de “fantástico” o fato de que, segundo ele, a campanha prometia ter “um nível muito melhor” porque “pela primeira vez nós não vamos ter um candidato de direita na campanha”. “Antigamente – Lula dizia –, era o centro-esquerda e a esquerda contra os trogloditas da direita”. E continuou: “Vocês querem conquista melhor do que numa campanha neste país a gente não ter nenhum candidato de direita? Vai ser uma coisa inédita”.
Dez anos depois, o presidente Jair Bolsonaro declarou, em referência à campanha eleitoral do ano que vem, que comunistas são semelhantes a fezes e disse que, “nas próximas eleições, vamos varrer essa turma vermelha do Brasil”. Tirados os termos escatológicos, o pronunciamento guardou semelhanças com aquele feito por Bolsonaro no dia de sua posse, em que qualificou o início de seu governo como o “dia em que o povo começou a se libertar do socialismo”. Quem leva a sério tais delírios de retórica fica convencido de que o País está há pelo menos uma década prisioneiro de uma guerra sem quartel entre radicais de esquerda e de direita, empenhados numa campanha de destruição mútua.
Esse embate, além de excitar militantes e fanáticos de ambos os lados, teria capturado a agenda e a inteligência nacionais de tal modo que todo ato de governo, tanto agora como no passado lulopetista, deve ser avaliado sob o prisma da orientação ideológica do mandatário de turno, e não por sua pertinência e por seus fundamentos. A persistência da crise nacional, com efeitos particularmente nocivos para a parcela mais pobre da população, indica que a redução ideológica dos problemas brasileiros não serve bem ao País. Ao contrário, perturba o debate sobre os principais problemas e, consequentemente, a adoção das melhores soluções. Fariam melhor os líderes políticos do País se atentassem para as condições sem as quais nenhuma governança será bem-sucedida, seja qual for sua inspiração ideológica.
A primeira condição indispensável é a responsabilidade fiscal. É a partir da necessidade imperiosa de equilibrar receitas e despesas que a sociedade e o poder público são obrigados a discutir as reais prioridades do País. Nenhum governo, seja à esquerda ou à direita, consegue implementar sua plataforma sem as contas em ordem. Além disso, não é possível incentivar o desenvolvimento do País sem um ambiente de negócios que estimule o investimento privado e o aumento da produtividade. Para isso, é preciso reduzir a burocracia, tornar as regras claras, previsíveis e estáveis e, principalmente, garantir a plena prevalência do Estado de Direito e das normas democráticas.
O governo de um mandatário dado a rompantes motivados por certezas ideológicas, atropelando a lei e ignorando os limites institucionais do exercício do poder, torna tudo muito incerto, o que naturalmente inibe investimentos. E é de investimentos que o País precisa. Do mesmo modo, o País não terá nenhuma chance de atingir um alto grau de desenvolvimento sustentado se não tiver uma política externa pautada pelo objetivo de agregar mercados, e isso implica manter boas relações com a maior parte do mundo. Fará mal o governo que alinhar automaticamente o Brasil a qualquer país, ainda mais por motivos exclusivamente ideológicos, pois essa atitude tende a fechar preciosas portas comerciais e a diminuir o peso brasileiro em organismos multilaterais.
Também fará muito mal ao Brasil o governo que sinalizar menosprezo a tratados internacionais, algo que somente Estados párias fazem. Por fim, mas não menos importante, o crescimento sustentado do Brasil depende de uma política social que proporcione condições dignas de educação, saúde, saneamento básico e segurança pública para todos, seja qual for a condição socioeconômica. Nenhum país progride condenando uma parcela de sua população ao desemprego crônico e à pobreza permanente. Enquanto esquerdistas e direitistas se digladiam em sua guerra imaginária para salvar o Brasil uns dos outros, milhões de brasileiros vivem a dura realidade da falta de perspectiva e de respeito.
O Estado de S. Paulo
Diligência para a impunidade
O País está numa delicada situação econômica e social – com mais de 25 milhões de desempregados, subempregados e desalentados –, mas o presidente Bolsonaro está preocupado com o bem-estar das pessoas que são multadas por dirigir em excesso de velocidade nas estradas. Na quinta-feira passada, o presidente determinou a suspensão do uso de radares estáticos, móveis e portáteis nas rodovias federais até que o Ministério da Infraestrutura conclua “a reavaliação da regulamentação dos procedimentos de fiscalização eletrônica de velocidade em vias públicas”. Antes de adotar uma medida que afeta a segurança e a vida de tantas pessoas nas estradas, seria minimamente razoável que fosse feito o tal estudo determinado pelo presidente Bolsonaro.
Mas ele seguiu outra lógica e outra prioridade. Sem ter feito estudo prévio, Jair Bolsonaro mandou tirar os aparelhos das estradas “para evitar o desvirtuamento do caráter pedagógico e a utilização meramente arrecadatória dos instrumentos e equipamentos medidores de velocidade”. Ou seja, o presidente Bolsonaro não precisa de nenhum estudo para ter seu diagnóstico do tema. Para ele, a cobrança de multa de quem dirigiu acima da velocidade permitida é um problema que deve ser resolvido o quanto antes. Os outros problemas nacionais podem esperar, mas é urgentíssimo, na cabeça de Jair Bolsonaro, que os motoristas não sejam incomodados nas rodovias por radares móveis. O presidente Bolsonaro manifesta, assim, não ter maiores pudores em utilizar a caneta presidencial para decretar a certeza da impunidade.
Com a suspensão dos radares móveis, cada motorista poderá dirigir na velocidade que lhe aprouver sem se preocupar com multas e essa bobagem de segurança nas estradas. Pelo que o presidente Bolsonaro deu a entender, sua intenção era suspender até mesmo o uso dos radares fixos. Como afirmou, só não determinou o fim dos radares fixos porque os equipamentos fazem parte de contratos em vigor com empresas. “O radar fixo não está nessa relação, o fixo não está porque tem contrato.
Não posso mexer, não vamos alterar contrato”, declarou. Velocidade nas estradas é um assunto sério, que merece especial prudência. Se, como afirma o presidente Jair Bolsonaro, está havendo a utilização de radares móveis com finalidade meramente arrecadatória, mais certo ainda é que muita gente tem dirigido acima da velocidade permitida. Só há multa se houver excesso de velocidade. Ou seja, se o poder público está arrecadando muito com os radares móveis, o problema não é a multa em si. O problema é o desrespeito costumeiro à legislação de trânsito, pondo a segurança e a vida de muitas pessoas em risco. Mas o presidente Bolsonaro parece não se abalar com essas questões de segurança.
Para ele, o inconveniente do excesso de velocidade são as multas que oneram os motoristas. E, por isso, ele resolve o problema suspendendo a utilização dos instrumentos de aferição de velocidade. Na sua estranha lógica, morta a multa, morto o problema. É de um grande cinismo, portanto, alegar que o uso dos radares móveis promove o “desvirtuamento do caráter pedagógico” desses instrumentos. A medida presidencial não manifesta nenhuma preocupação pedagógica. Ao contrário, seu objetivo é assegurar impunidade a quem dirige em excesso de velocidade. O caráter da suspensão é absolutamente antipedagógico, estimulando a que os motoristas não se atenham aos limites de velocidade.
Se estiverem atentos para frear nos pontos com radar fixo, não receberão nenhuma multa. E esse incrível estado de coisas se deve ao zelo do presidente Bolsonaro, em sua diligência para evitar a punição de quem desrespeita a legislação de trânsito. Não é alvissareiro para o País que o presidente da República cultive e promova tão inusitada escala de prioridades e de valores. O caminho do desenvolvimento nacional passa por estimular o cumprimento da lei, e não por facilitar a sua burla.
O Estado de S. Paulo
Estados atolados em gastos
Como um grande sumidouro, os gastos com pessoal e Previdência engolem a cada ano uma parcela maior da receita dos governos estaduais, tornando mais difícil a prestação de serviços e aumentando o risco de insolvência. Dezesseis Estados mais o Distrito Federal (DF) já perderam a garantia da União para tomar empréstimos. Outros seis Estados, incluído São Paulo, estão arriscados a entrar para esse grupo já no próximo ano, advertiu a Secretaria do Tesouro Nacional. Basta uma olhada nesses tenebrosos dados financeiros para confirmar a necessidade urgente da reforma previdenciária em todos os níveis de governo. A solução mais simples, mais veloz e mais eficiente será a inclusão de Estados e municípios na reforma já em discussão no Congresso.
O caminho mais prático, nesta altura, deve ser mesmo o encaminhamento, a partir do Senado, de uma proposta paralela de emenda constitucional, mas para isso os governadores ainda relutantes terão de abandonar seu comodismo político. A piora da situação financeira de Estados e Municípios foi confirmada para todo o País com a publicação, pelo Tesouro Nacional, do Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais. Os entes são classificados em quatro categorias de acordo com sua capacidade de pagamento. Só um Estado tem nota A: o Espírito Santo, assunto de reportagem do semanário britânico The Economist por sua competente administração fiscal. Nove têm nota B, incluído São Paulo. As categorias C e D reúnem as unidades sem condições de receber garantia da União para tomar empréstimos.
De 2017 para 2018 o número de unidades nos dois níveis inferiores passou de 15% para 17,63% do conjunto formado por Estados e DF. Só três Estados, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, têm nota D. As péssimas condições financeiras dos três são notórias há vários anos. O caso do Rio de Janeiro se destaca, no entanto, como exemplo incomum dos vínculos entre corrupção, desmandos administrativos e devastação fiscal, econômica e social. O relatório fica longe dos aspectos mais escabrosos da experiência fluminense, mas boa parte da história já foi registrada nas páginas mais feias da crônica política, da crônica policial e dos autos da Justiça.
O quadro das notas poderá piorar em 2020. Seis Estados – Acre, Pará, Paraíba, Piauí, Paraná e São Paulo – estão perto de romper o limite de 95% na relação entre despesa corrente e receita corrente líquida e poderão passar à categoria C em 2020. Além disso, 14 Estados já gastam com pessoal mais que 60% da receita corrente líquida, teto fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O cenário já seria muito ruim mesmo sem a falsificação das contas, mas ainda é preciso considerar esse dado: despesas de R$ 11,4 bilhões foram escondidas em 2018 para evitar o descumprimento da LRF e punições para governadores.
Sem isso, os governos estaduais teriam terminado o ano com déficit primário de R$ 5,8 bilhões, em vez de registrar superávit de R$ 5,6 bilhões. Os governos terão de consertar seus problemas fiscais sem ajuda federal, porque a situação das contas públicas impede qualquer renegociação das dívidas estaduais, adiantou o secretário de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues. Não é, de fato, tempo adequado a mais leniência. Uma das causas do agravamento dos problemas estaduais foi o endividamento autorizado pelo poder central, irresponsavelmente, na fase petista. Houve relaxamento nas contas de todos os níveis de governo.
Tem-se falado, em Brasília, de novo pacto federativo, com nova repartição de recursos entre União, Estados e municípios. Também se tem falado sobre repasse de recursos da cessão onerosa, negociada entre União e Petrobrás, a Estados e municípios. Será imprudência cuidar desses temas sem fixar, muito claramente, condições de responsabilidade para os governos subnacionais e critérios para uso de recursos. Um país com Estados e municípios incapazes de sobreviver sem grandes transferências e sem o socorro frequente da União tem sido e continuará sendo um arremedo de Federação.
Folha de S. Paulo
Falência múltipla
Estrangulamento orçamentário avança e ameaça órgãos e serviços federais; culpa não é do teto de gastos, mas da alta dos desembolsos obrigatórios
Por uma análise fria de números, os programas de ajuste orçamentário levados a cabo desde 2015 são, até aqui, um relativo fracasso.
Em valores corrigidos, a despesa com pessoal, custeio, programas sociais e investimentos se aproximou de um nada modesto R$ 1,4 trilhão nos últimos 12 meses. Trata-se do mesmíssimo patamar de 2014, quando Dilma Rousseff (PT) consumou a ruína do Tesouro Nacional na busca pela reeleição.
Desde lá, o gasto primário — isto é, sem contar encargos com juros — supera a arrecadação. Com isso, a dívida pública já saltou do equivalente a 56% para quase 80% do Produto Interno Bruto.
Os dados, pois, estão longe de de ser e ver um regime draconiano. Apenas se estabilizou o dispêndio, em nível alto para padrões internacionais, na casa dos 20% do PIB, e recorde para o histórico doméstico.
Pode causar espanto, assim, a notícia de que órgãos e serviços estão ameaçados de paralisia pelo esgotamento de recursos. Nas palavras do presidente Jair Bolsonaro (PSL), “os ministros estão apavorados”.
A explicação não é novidade. As grandes despesas, com Previdência Social e salários do funcionalismo, seguem em elevação, por imposições legais, no primeiro caso, e por injunção política, no segundo.
Em contrapartida, impõe-se um arrocho real sobre uma fração pequena dos gastos —basicamente os destinados a investimentos e ao custeio da máquina pública.
Estes encolheram de R$ 192 bilhões, em 2014, para R$ 120 bilhões nos últimos 12 meses. Se não for revertido o contingenciamento em vigor, o número cairá abaixo dos R$ 100 bilhões neste 2019.
Na vida real, isso se traduz, primeiro, em corte drástico de obras públicas. A segunda etapa, mais visível a cada dia, se dá nos compromissos cotidianos da administração. Escasseiam verbas para contas de água ou energia; estão em risco bolsas de pesquisa e serviços como a emissão de passaportes.
Nesse cenário crescem, previsivelmente, as pressões pelo abrandamento do teto para os desembolsos federais, inscrito na Constituição em 2016. Alguma flexibilização, de fato, pode ser inevitável.
Erra, porém, quem culpa a regra constitucional pelo estrangulamento. O que impede a normalização orçamentária, já deveria estar claro, é o governo depender de dinheiro emprestado diariamente.
Não existe crédito eterno e incondicional. A menos que se contenham os gastos obrigatórios com aposentadorias e salários, portanto, haverá falências múltiplas de órgãos e serviços nos próximos meses e anos. Com ou sem teto.
Folha de S. Paulo
A saga da despoluição
Aos milhares que passam diariamente por suas avenidas marginais, o Tietê e o Pinheiros fazem recordar a incapacidade dos governos p aulistas de transformar o que hoje são esgotos a céu aberto em cursos d”água capazes de quebrar a paisagem cinza da capital.
Ao menos desde a gestão de Fleury Filho (MDB) como governador (1991-94), sucedem-se promessas vãs de que em algum momento do futuro será possível nadar nos rios ou mesmo beber de suas águas. Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra também fizeram suas tentativas nas mais de duas décadas de administração tucana.
Em 2011,por exemplo, depois de dez anos e R$ 249 milhões (em valores atuais) gastos, chegou-se à conclusão de que o método de flotação,pelo qual se juntaria a sujeira em flocos na superfície para remoção, não funcionava. Já foram despendidos cerca de R$ 3 bilhões com projetos do tipo.
Agora, o plano do governo de João Doria (PSDB) prevê reduzir à metade a poluição no Pinheiros até 2022, ao custo de R$ 1,5 bilhão. Para isso, a Sabesp fará licitações para que 14 empresas tornem-se responsáveis por áreas da cidade, nas quais terão a tarefa de conectar o esgoto a estações de tratamento.
Espanta que, segundo a estatal, haja 500 mil imóveis na bacia do rio Pinheiros cujos dejetos são lançados diretamente em córregos sem tratamento algum. Mais preocupante ainda, 30% do esgoto na maior e mais rica cidade do país não é tratado, e 13%, nem sequer coletado pela Sabesp.
A ideia de remunerar as empresas contratadas pelo desempenho na despoluição, e não pelas obras construídas, parece correta.
Outro propósito do governo é usar pequenas estações de tratamento de esgoto modulares para dar destino aos dejetos em áreas de ocupação irregular ou de difícil acesso, que no mais das vezes vão parar em córregos locais.
Diante do histórico de compromissos frustrados, não há como deixar de lado o ceticismo diante da iniciativa. Avesso ao comedimento retórico, o governador Doria não ajuda a descrever um cenário mais realista quando fala em fazer do entorno do Pinheiros um polo gastronômico, como o de Porto Madero, em Buenos Aires.