Mesmo aqueles que não o apreciam ou o detestam acabaram cedendo. Emmanuel Macron, mestre de cerimônias do G-7, teve de administrar essas reuniões obsoletas, excessivamente formais, repetitivas e aviltadas duas ou três vezes nos últimos anos pelo estado de espírito tumultuado de Donald Trump – e conseguiu fazer do encontro um acontecimento.
Os jornalistas vindos do mundo inteiro não perguntavam exclusivamente sobre o conteúdo das conversas entre os dirigentes, mas queriam saber onde estava Macron. “Vocês viram Macron? Ele vai se pronunciar? O que ele disse a Trump?” Os holofotes se fixaram nesse presidente tão jovem, polido e especialista em golpes baixos, caminhos escabrosos e meias verdades.
Ele não se contenta em ser uma pessoa formidável quando se trata de manobrar, mas é também corajoso. E tinha de ser, para convidar o chanceler do Irã diante de Trump e depois conseguir que o americano não saísse batendo a porta. Um almoço improvisado teve essa proeza.
É possível que Trump, hoje ou amanhã, escreva um tuíte para dizer que esse francês é um palhaço ou um malandro, mas a obra diplomática de Macron não brilhará menos.
A história nos ensina que os melhores diplomatas são grandes mentirosos. Se essa regra for exata, Macron é um verdadeiro Talleyrand (o diplomata astuto e genial de Napoleão). Durante dois dias, ele se apresentou como um ecologista apaixonado e intrépido. A verdade é que ele é ecologista apenas em intervalos: de preferência, às vésperas de eleições, em razão do voto dos agricultores. Depois, passadas as eleições, ele volta a ser indiferente.
No campo da ecologia, Macron foi o inspirado porta-voz em Biarritz. “Temos de responder ao apelo do oceano e da floresta que queima”, disse. Mas o balanço do seu reinado é medíocre. No início do seu mandato, ele escolheu para ministro um verdadeiro ecologista, respeitado e experiente: Nicolas Hulot, que jamais conseguiu levar a cabo as reformas drásticas que a desesperada situação do planeta impunha.
Assim, Hulot renunciou ao cargo há um ano. Macron o substituiu friamente por um sujeito simpático, mas quase nulo, que teve de se demitir rapidamente após serem revelados os jantares principescos que ele oferecia a seus amigos por conta da república.
Outra retratação: há alguns meses, Macron assumiu brilhantemente a defesa do acordo de livre-comércio com o Mercosul, que deve suprimir taxas alfandegárias de inúmeros produtos, ameaçando a agricultura francesa com a carne da América Latina.
O presidente francês já havia mudado tardiamente sua opinião, pressionado pelos agricultores franceses, mas não sabia como voltar atrás. Então, Jair Bolsonaro lhe prestou um serviço, permitindo que ele recusasse o acordo por nobres razões.
E a Guiana? Certamente, Macron tem razão de dizer que a França é uma potência amazônica. No entanto, nesse aspecto, ela seria exemplar?
O governo francês estava analisando a proposta de uma enorme empreiteira, que pretendia destruir imensos espaços da floresta amazônica para instalar a maior mina de ouro do mundo a céu aberto. Um massacre. Por muito tempo, Macron tentou evitar esse assunto, mas os protestos locais foram tão ruidosos que ele se resignou, há algumas semanas, a proibir o projeto.
Saberemos nas próximas semanas se o show de Macron em Biarritz, suas manobras, suas sutilezas e temeridades, terão consequências ou se desaparecerão suavemente sob o silêncio dos dias. Essa é outra questão. (O Estado de S. Paulo – 27/08/2019 – tradução de Terezinha Martino)
Gilles Lapouge é correspondente em Paris