MANCHETES
O Globo
Câmara suaviza regras para mulheres e pensões
PDT e PSB avaliam expulsar infiéis que apoiaram reforma
Bolsonaro pretende indicar seu filho para embaixador nos Estados Unidos
MEC anuncia 108 escolas ‘cívico-militares’
O Estado de S. Paulo
Bolsonaro diz que vai indicar filho para embaixada nos EUA
Câmara ameniza regras para policiais e mulheres
Rodrigo Maia vira o ‘Senhor Reforma’
MEC lança plano para criar 108 escolas cívico-militares
Liberação de verba deve levar mais de 1 ano
Meio século sem Julio de Mesquita Filho
Comissão aprova MP da Liberdade
FHC critica pedido de expulsão de Aécio
Barragem transborda e alaga cidade de Bahia
Trump manda ‘caçar’ imigrantes
Folha de S. Paulo
Bolsonaro vai indicar filho para embaixada nos EUA
Alteração na Previdência beneficia mulheres
Ministro da AGU é bom nome para STF, diz Bolsonaro
Comissão aprova mudanças em 36 artigos da CLT
Passaporte terá de novo ‘pai’ e ‘mãe’, afirma presidente
Recusa a porte de arma mais fácil vai a 70%, diz Datafolha
MEC prevê 108 escolas militares em áreas carentes até 2023
Valor Econômico
Equipe econômica pretende unificar reformas tributárias
Bolsonaro quer nomear filho embaixador
BRF e Marfrig abandonam plano de fusão
‘Ignorância é mortal’, diz cientista
Dasa compra laboratório argentino
Oferta de ações cresce 325% no 1º semestre
O espírito de Bretton Woods está sob ataque
MP 881 prevê ‘Carf’ para multas trabalhistas
EDITORIAIS
O Globo
O poder de convencimento da crise da Previdência
Votação do projeto revelou o enfrentamento do controle ideológico exercido por partidos
No rescaldo da votação em primeiro turno do projeto de reforma da Previdência, um ponto alto é o surpreendente apoio de 379 deputados, 71 a mais do que o mínimo necessário de 308 votos. As expectativas mais otimistas apostavam em 360.
Terminou indo bem mais além. Não se discute que uma das causas foi o competente trabalho político do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que soube ocupar os espaços deixados pela falta de coordenação por parte do Planalto, quase sempre enredado em questões menores, picuinhas ideológicas. Ou “besteiras”, nas palavras do general Santos Cruz, em entrevista à revista “Época”, depois de ser demitido da Secretaria de Governo, devido a tensões geradas no Palácio pela excessiva interferência familiar junto ao presidente Bolsonaro.
Tamanha margem de apoio na votação deve ter outras explicações. Não se pode menosprezar a influência das bases, a considerar que recente pesquisa Datafolha sinaliza que a aceitação popular da reforma ultrapassa numericamente a rejeição.
A diferença (47% a 44%) ainda está dentro da margem de erro, mas é significativo que este placar possa ser virado. Há incontáveis especulações sobre os motivos. Por exemplo, a maciça cobertura do assunto feita pelo jornalismo profissional.
Seja como for, houve um volume grande de desobediências no PSB e PDT, partidos de esquerda que fecharam questão contra a reforma.
De nada adiantou: no PDT, oito da bancada de 27 deputados (29%) votaram a favor da reforma, entre eles a jovem Tabata Amaral, que obteve expressiva votação em São Paulo; no PSB, o dissenso foi maior, tendo contrariado a ordem do partido 11 dos 32 deputados da legenda (34%).
Espera-se como se comportarão as direções partidárias, sob o risco de ficarem bem menores no Congresso caso expulsem os deputados. Este tipo de questão, porém, não contaminou os partidos de fé ideológica rígida, à beira da religiosidade: PT, PCdoB e PSOL.
Diante da patrulha, Tabata usou a rede social para explicar que não vê a reforma como do governo, e que ela é urgente e necessária. Também para reduzir as desigualdades, pois entende que o atual sistema previdenciário transfere renda de pobres para ricos.
A deputada diz que estudou o assunto. Certamente viu levantamentos oficiais que mostram a disparidade entre aposentadorias do funcionalismo público e dos empregados do setor privado, bem como as elevadas cifras que o Tesouro —leia-se, os contribuintes —transfere para bancar os benefícios dessas castas.
Não faltam estatísticas para provar o descalabro a que chegou a Previdência brasileira, que além de ser um instrumento de concentração de riquezas — a elite do funcionalismo aposentado está nas faixas de renda mais elevada— já representa mais da metade de todos os gastos da União, sem considerar o pagamento de juros.
Os deputados que rejeitaram a camisa de força do fechamento de questão apenas foram racionais.
O Globo
Prisão de dois suspeitos de integrar máfia no país é alerta na segurança
É preciso desvendar ligações da organização com facções que controlam venda de drogas
A prisão, pela Polícia Federal, na segunda-feira, de dois italianos suspeitos de integrar um braço da máfia conhecido como Ndrangheta, na América do Sul, leva a um outro patamar a atuação das organizações criminosas no Brasil. Se antes o grande desafio era minar o poder das facções, responsáveis pelos alarmantes índices de violência no país, agora ele passa a ser bem maior, à medida que acrescenta a máfia a esse cenário já explosivo.
A dupla foi presa num condomínio de luxo em Praia Grande, litoral paulista, durante operação da PF do Paraná batizada de Barão Invisível. Segundo as investigações, os italianos, da região da Calábria, controlariam 40% dos envios globais de cocaína. Ainda de acordo com a PF, os dois seriam o elo entre produtores de coca na América do Sul e a passagem pelo Brasil.
Grandes quantidades de droga apreendidas nos portos de Paranaguá
(PR) e Santos (SP), inclusive batendo recordes históricos, já tinham chamado a atenção dos policiais. Havia a suspeita de que organizações criminosas internacionais estariam por trás do negócio. Agora, não há mais dúvida.
A prisão resultou de um bem-sucedido trabalho de inteligência e cooperação com o governo italiano. Como deve ser. Foragidos desde 2014, os suspeitos moravam num prédio equipado com sofisticadas câmeras de vigilância. O apartamento de cobertura tinha paredes falsas, onde eles escondiam drogas, dinheiro e armas — a PF apreendeu duas pistolas, uma quantia não especificada em espécie e documentos falsos usados pelos italianos.
O STF decidirá se eles poderão ser extraditados para a Itália. Mas certamente o caso não se encerra aí. Ainda há fatos a esclarecer sobre a atuação desse braço da máfia no Brasil, especialmente no que diz respeito à ligação da organização com as facções criminosas que controlam a venda de drogas no país.
O que parece claro é que não há lugar para amadorismo no combate às organizações criminosas. Sucessivos governos negligenciaram o papel da União nesse processo. Apenas no governo Michel Temer foi criado o Ministério da Segurança e, mesmo assim, sem orçamento. O presidente Jair Bolsonaro o fortaleceu, criando a superpasta da Justiça e Segurança Pública, sob comando do ex-juiz Sergio Moro, dando ao governo federal o necessário protagonismo no enfrentamento do crime.
É inegável que para combater organizações criminosas, algumas com ramificações no exterior, é preciso que União e estados trabalhem de forma cada vez mais integrada, com inteligência, tecnologia, uso de forças-tarefas — a exemplo da Lava-Jato — e a indispensável cooperação internacional. Somente assim será possível fazer frente ao avanço da criminalidade que, pelo visto, é mais complexo do que se pensara.
O Estado de S. Paulo
Vitória do bom senso
Até pouco tempo atrás, a reforma da Previdência era considerada um tema politicamente tóxico, que poucos candidatos a cargo eletivo tinham coragem de defender – malgrado sua evidente necessidade. Agora, no entanto, o que não falta são políticos a reivindicar a paternidade da vitória acachapante no primeiro turno da votação da reforma da Previdência na Câmara. A notável mudança de atitude provavelmente deriva da construção de um consenso, no País, sobre a urgência do saneamento do sistema de aposentadorias, e esse processo não aconteceu de uma hora para outra nem dependeu de uma só pessoa.
É preciso lembrar, por exemplo, que o mais recente esforço em favor da reforma começou no governo de Michel Temer, que assumiu o ônus de enfrentar esse tema espinhoso mesmo sob pena de ampliar ainda mais sua já enorme impopularidade. Depois, o presidente Jair Bolsonaro teve de superar suas próprias convicções antirreformistas e, mesmo de modo hesitante, encaminhou uma proposta ainda mais ousada que a do ex-presidente Temer, incentivado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Assim, ainda que o próprio governo não tenha se empenhado como deveria e poderia em favor da reforma, o tema praticamente monopolizou o debate nacional, do qual participaram formadores de opinião e funcionários do governo bastante qualificados e que conseguiram, à custa de muita perseverança, derrubar uma a uma as mistificações em torno da Previdência e alertar o País para os riscos de não reformar o sistema de forma abrangente.
Mesmo com atrasos causados pelas confusões protagonizadas pelos articuladores do governo, a reforma avançou e chegou ao plenário sem ter sido substancialmente desidratada, o que foi uma vitória dos deputados reformistas contra os grupos organizados interessados em manter privilégios de corporações – algumas das quais apoiadas explicitamente por deputados governistas e pelo próprio presidente Bolsonaro. Nessa fase, já estava ficando claro para todos que a reforma já não era mais do governo, que em vários momentos parecia querer sabotá-la, e sim do Congresso, o que foi reafirmado diversas vezes pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), seu grande fiador.
Rodrigo Maia assumiu a liderança das negociações para arregimentar apoio à reforma, muitas vezes sob duras críticas de Jair Bolsonaro e dos filhos do presidente, sempre dispostos a criar antagonismos com o que chamam de “velha política”. Sem ter a caneta presidencial para liberar cargos, verbas e poder, Maia teve de convencer seus pares a assumir o protagonismo de uma reforma sem a qual o País quebraria. A julgar pelo placar do primeiro turno, foi muito bem-sucedido nessa empreitada: foram 379 votos a 131, ou seja, 71 votos além do necessário para a aprovação do projeto. Houve apoio inclusive de vários deputados de oposição, o que, de quebra, ajudou a isolar ainda mais a esquerda corporativista radical formada pelo PT e por seus satélites, agarrados à pauta única do “Lula livre”.
Trata-se de grande demonstração de força, que Rodrigo Maia procurou capitalizar em discurso no plenário: “Não haverá investimento privado sem democracia forte. Investidor de longo prazo não investe em país que ataca as instituições”, disse o presidente da Câmara, em referência nada sutil aos seguidos ataques que Bolsonaro faz ao Congresso. E completou: “Nossos líderes são desrespeitados, são criticados de forma equivocada, mas são esses líderes que estão fazendo as mudanças no Brasil”.
A despeito da justificada celebração, a reforma da Previdência, mesmo em sua melhor forma, está incompleta. Não incluiu Estados e municípios, responsáveis por parte considerável do déficit do sistema. Há também concessões exageradas a esta e àquela categoria profissional e é possível que mais benefícios sejam criados ou ampliados até a última etapa de votação. Obstáculos não faltam. Por essa razão, Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente, do Senado, calcula que será necessário fazer uma nova reforma em no máximo dez anos. O que importa, contudo, é que o desfecho do primeiro turno de votação é um forte indicador da mudança de humor da sociedade brasileira em relação às reformas. E ainda há muito a reformar.
O Estado de S. Paulo
O morticínio chavista
O recente informe sobre a Venezuela do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos nada diz de novo, mas torna mais difícil aos apoiadores do chavismo justificar seu descolamento da realidade ou hipocrisia. Desde 2016, o “Estado de exceção” decretado por Nicolás Maduro se renova a cada 60 dias, conferindo poderes amplos, vagos e discricionários a seus militares, milícias e militantes. Em 2018, segundo dados oficiais, foram executadas extrajudicialmente 5.287 pessoas, uma média de 14 por dia, a maioria pelas Forças de Ações Especiais – a “Gestapo venezuelana”, segundo um general da reserva. O Comissariado constata um padrão: os esquadrões bloqueiam as ruas vestidos de preto, sem identificação, e “invadem as casas, tomam seus pertences, exercem violência sexista contra mulheres e meninas, incluindo nudez forçada”, sequestram os dissidentes e os executam.
Críticos do regime e seus familiares, em especial mulheres, são detidos, sem acesso a advogados, e interrogados “sob uma ou mais formas de tortura ou crueldade, tratamento ou punição desumana ou degradante, incluindo eletrochoques, sufocamento com sacos plásticos, afogamento, espancamentos, violência sexual, privação de água e comida, posições excruciantes e exposição a temperaturas extremas”. Segundo o informe, poucas pessoas recorrem à Justiça por medo de retaliação e o Ministério Público “contribui para a retórica oficial estigmatizando e desacreditando os críticos do governo”.
Não se sabe quantas pessoas morreram por fome ou doença. Em metrópoles como Caracas faltam de 60% a 100% de medicamentos essenciais e as famílias dos hospitalizados têm de prover água, luvas e seringas para seus parentes. Em quatro meses, 1.557 morreram por falta de suprimentos nos hospitais. Só os apagões de março mataram 40 pessoas. Doenças erradicadas ou controladas, como sarampo e difteria, reemergiram. Em muitas regiões faltam contraceptivos. As doenças sexualmente transmissíveis se alastram e em três anos a gravidez adolescente aumentou 65%.
Desde 2013, quatro anos antes das sanções norte-americanas, o PIB encolheu 44% e a inflação alcançou inacreditáveis 3.000.000%. O salário mínimo de US$ 7 paga 4,7% da cesta básica. Sete milhões de venezuelanos, ou um quarto da população, precisam de assistência humanitária, a qual, diz o relatório, o governo administra com negligência e parcialidade. Quatro milhões fugiram do país; 3,7 milhões, em maior medida crianças e grávidas, estão desnutridos. As filas por comida tomam em média 10 horas por dia e muitas mulheres são coagidas a pagar com sexo. Comunidades indígenas são escravizadas para a extração ilegal de ouro.
A oposição pediu que o relatório fosse encaminhado à Corte Penal Internacional. Maduro protestou: “Há inumeráveis imprecisões e erros”. Tem razão. Com a transparência peculiar do governo e a imprensa venezuelana sufocada – às vezes literalmente –, o retrato traçado pela insuspeita socialista Michelle Bachelet é seguramente bem menos brutal que a realidade. Sua fórmula mais recorrente é: “Necessário investigar mais”.
Os entusiastas do regime responderam com um silêncio ensurdecedor, a começar pelo PT, logo ele, que alardeia qualquer memorando de alguma subsecretaria não colegiada como “Declaração da ONU”, desde que abone seu chefe – que manipulou como ninguém a máquina estatal e o dinheiro dos brasileiros para abastecer o chavismo. Por uma constrangedora ironia, aquilo que as esquerdas tanto denunciam na polícia brasileira – legitimar sua truculência acusando suas vítimas de “resistência à autoridade” – é a maior blindagem legal da polícia bolivariana para suas chacinas.
A declaração protocolar do Comissariado é que “a única solução é o diálogo”. Se for, deveria começar no Conselho de Segurança da ONU com os sustentáculos do regime venezuelano, Rússia e China. Mas a menos que esse diálogo leve à deposição do ditador e suas quadrilhas para que respondam por seus crimes, não levará a lugar algum além do abismo.
O Estado de S. Paulo
Estados em busca de equilíbrio
Em Nota Técnica sobre a situação fiscal dos Estados, a Secretaria da Fazenda Federal afirma: “O equilíbrio fiscal é um ativo importante para assegurar avanços na prestação dos serviços à população, além de trazer um ambiente seguro para novos investimentos privados, criando mais oportunidades de emprego e renda”. Se fosse só por isso, a Secretaria não teria feito mais que constatar o óbvio – o que não é pouco, considerando- se as políticas fiscais heterodoxas ou simplesmente irresponsáveis adotadas por tantos Estados. Mas a nota traz dados que mensuram o quão verdadeira é esta constatação.
Muitos Estados chegam a comprometer entre 70% e 80% de sua receita com gasto de pessoal. “Esse descontrole fiscal,” ressalta a Secretaria, “foi agravado (mas não determinado) pela forte crise econômica enfrentada pelo País desde 2014”, quando as fontes de arrecadação começaram a secar. No ano passado, enquanto os Estados destinaram R$ 94 bilhões a 2,3 milhões de servidores inativos, gastando em média mais de R$ 40 mil com cada um deles, o investimento em toda a população, de 200 milhões de pessoas, foi quase quatro vezes menor (R$ 25 bilhões), com gasto médio de R$ 125 por pessoa.
O boletim do Tesouro Nacional aponta que entre os casos mais graves de descontrole estão Minas Gerais, com quase 80% da receita comprometida com despesa de pessoal, Mato Grosso do Sul (77%), Rio Grande do Norte (72%), Rio de Janeiro (71%) e Rio Grande do Sul (69%). Entre as consequências estão os atrasos nos salários dos servidores e nos pagamentos dos fornecedores e a depreciação da infraestrutura, uma vez que os recursos são cada vez mais contingenciados para cobrir o déficit previdenciário e os salários dos servidores.
Para avaliar o impacto do ajuste fiscal sobre os Estados, a Secretaria analisou dois grupos: um dos que passaram a controlar despesas com pessoal desde o início da crise e outro dos que não alteraram a sua trajetória. O primeiro é formado por Alagoas, Ceará e Espírito Santo. O segundo, por Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
A comparação é relativamente desigual, já que os três últimos Estados têm maior infraestrutura e grandes mercados. Mas chama a atenção que, mesmo com esta diferença de tamanho, os Estados apontados como exemplos de boa gestão fiscal alcançaram melhores resultados econômicos e sociais. Apesar de ter um PIB cinco vezes menor, este grupo faz, em valores brutos, mais investimentos com recursos próprios que o grupo dos Estados em desequilíbrio. Em termos per capita a diferença é maior: em 2018, enquanto o grupo dos equilibrados investiu R$ 381 por pessoa, os desequilibrados investiram apenas R$ 91,7.
Outro indicador é o desempenho educacional. A Secretaria constata que não só mais gastos com pessoal não implicam melhor desempenho, como parece haver justamente uma correlação inversa. Cotejando- se o ranking do Índice de Desenvolvimento de Educação Básica entre 2013 e 2017, Espírito Santo, Ceará e Alagoas subiram entre seis e nove posições, ao passo que os três Estados desequilibrados caíram entre seis e doze posições.
O mesmo diagnóstico de desequilíbrio se verifica na União: “Muitos recursos alocados para pagamento de pessoal ativo e inativo e poucos recursos restando para o investimento para toda a população”, diz a nota. Entre 2010 e 2019, a proporção da receita líquida gasta com pessoal saltou de 60% para 80%, enquanto o gasto com investimentos caiu pela metade: de 12% para 6,5%.
O governo anunciou que prepara para o segundo semestre um projeto de reforma administrativa do funcionalismo, aproveitando algumas propostas já estudadas no governo Michel Temer. Não só por uma questão de ajuste, mas de justiça, essa reforma precisa ser feita. Para que seja bem feita – contra o empenho das piores forças do funcionalismo – será indispensável o empenho das melhores forças da sociedade civil.
Folha de S. Paulo
Reforma para todos
Senado fará bem em adequar servidores estaduais e municipais às regras previdenciárias votadas na Câmara; empenho de governadores é essencial
Com a reforma da Previdência perto da aprovação definitiva pela Câmara dos Deputados, são animadoras as notícias de que no Senado já se discutem propostas para adequar servidores estaduais e municipais às novas regras.
Os governos regionais acabaram excluídos do texto votado na quarta (10) em razão de uma combinação de mesquinharias políticas. Governadores de oposição, em especial do Nordeste, relutaram em apoiar publicamente a reforma, enquanto parlamentares favoráveis a ela se recusaram a ajudar administrações de adversários.
Há meios de reparar o dano, embora o entendimento partidário possa se mostrar difícil. Estuda-se a apresentação de uma proposta de emenda constitucional específica para os demais entes federativos, de modo a não atrasar a tramitação do projeto original.
Fato é que em boa parte dos estados as despesas previdenciárias já ameaçam diretamente a prestação de serviços básicos à população.
Segundo estudo da Instituição Fiscal Independente, órgão consultivo ligado ao Senado, em 2017 o déficit dos regimes estaduais chegou a R$ 89 bilhões, valor equivalente a nada menos de 14,7% da receita.
Em alguns casos, como os de Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, o rombo fica entre 25% e 30% da arrecadação. É absurdo que tamanha parcela dos recursos disponíveis se destine a um estrato diminuto da sociedade — enquanto carências em educação, saúde e segurança afetam a todos.
Observa-se hoje um óbvio desequilíbrio entre o número de funcionários que contribuem para a Previdência e o de inativos. A relação é de apenas 1,13 para 1, e em pelo menos quatro estados os aposentados e pensionistas já superam em quantidade os que estão na ativa.
Corporações influentes, como fiscais de renda, procuradores e membros do Judiciário continuam a ignorar restrições orçamentarias. Outras, como professores e policiais, numerosas e importantes, gozam de regras mais benevolentes.
Entre 2006 e 2015, o valor da remuneração média dos servidores estaduais cresceu 50,8% acima da inflação, ao passo que o benefício médio pago aos inativos subiu 32,7%. Em muitos casos ainda se permitem integralidade (aposentadoria com o último salário) e paridade (correções de benefícios equivalentes às dos salários da ativa).
Com déficits explosivos e serviços em colapso, não há mais espaço para subterfúgios. O mais simples e rápido é incluir todos os entes federativos na reforma nacional. Caso não seja possível, os Executivos e Legislativos locais precisam enfrentar o problema.
Em qualquer hipótese, os governadores, especialmente os de oposição, devem se dedicar mais a expor publicamente a situação de suas contas e a urgência dos ajustes.
Folha de S. Paulo
Terror venezuelano
A ex-presidente chilena Michelle Bachelet, socialista, não pode em sã consciência ser chamada de direitista ou agente do imperialismo. Toda pessoa que preze democracia e direitos humanos, qualquer que seja sua inclinação ideológica, deveria espantar-se com o relatório que produziu sobre a Venezuela.
À frente do Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU, Bachelet visitou Caracas entre 19 e 21 de junho. Sua equipe colheu 558 testemunhos de venezuelanos sobre violações de garantias individuais e a situação socioeconômica do país. O panorama deles extraído é acabrunhante.
Não que os excessos da ditadura de Nicolás Maduro fossem propriamente desconhecidos. Mesmo assim, choca ver tantas desgraças reunidas sob a frieza dos números.
Em 17 meses, de janeiro de 2018 a maio de 2019, ao menos 6.856 pessoas acabaram mortas por supostamente resistir à prisão. Segundo organizações não governamentais, entretanto, o total alcançaria 9.647.
Pelos relatos amealhados, a maioria dos casos seria de execuções extrajudiciais perpetradas por razões políticas. Esquadrões da morte invadem residências de opositores sem mandados, matam homens e despem ou violentam mulheres.
Houve ainda 80 pessoas mortas em protestos, duramente reprimidos pela Guarda Nacional Bolivariana e a Polícia Nacional Bolivariana, e mais de 15 mil detidos por motivos políticos. Não faltam os relatos de torturas.
Um regime de terror, não resta dúvida, ao menos para quem não tem os olhos anuviados pela cegueira ideológica. Não bastassem a repressão abjeta e a supressão das liberdades, a população da Venezuela sofre com o estado terminal da economia sob a gestão de Maduro.
O relatório Bachelet não poupa cifras do descalabro: o salário mínimo de US$ 7 mensais não compra nem 5% da cesta básica; gastam-se dez horas por dia em filas por alimentos; em quatro meses, ocorreram 1.557 mortes em hospitais por falta de suprimentos.
Caem no ridículo as alegações de Maduro de que tudo decorre do embargo dos Estados Unidos e de uma fantasiosa conspiração fascista. Sua ditadura sanguinária fracassou em todas as frentes, mas não cede no ânimo de manter amordaçados os venezuelanos.
Evidência disso são as limitações impostas a duas dezenas de presos políticos libertados depois das denúncias da ONU. Embora livres do cárcere, lideranças como a juíza Maria Lourdes Afiunie o jornalista Braulio Jatar estão impedidos de viajar, dar entrevistas ou de frequentar redes sociais.