MANCHETES
O Globo
Maioria dos estados gasta mais com PM aposentado que na ativa
Só 5 estados têm controle eficaz de munições das polícias
Invicto, Brasil vence Peru e ergue 9ª Copa Amércia
EUA levam o Mundial feminino
Adeus a João será em seu último palco no Rio
Vigilância com reconhecimento facial é reforçada em Copacabana
Aplicativos ajudam a colocar as finanças em ordem e investir
Inverno chega com força total
O Estado de S. Paulo
Delação da Odebrecht ‘ignora’ favorecidos por R$ 14 milhões
Governo tenta barrar lobby de policiais
Plano começa a oferecer consulta virtual
Eike dá dica para passar por crise
Brasil conquista Copa América pela nona vez
Poeta Paulo Bomfim morre aos 92 em SP
Conservadores vencem esquerda em eleição grega
Irã desafia EUA e eleva teor de urânio
Folha de S. Paulo
Bolsonaro tem apoio de 1/3 da população, diz Datafolha
Brasileiro teme mais inflação do que desemprego
Amil desconsidera conselho e lança teleatendimento
Brasileiro teme mais inflação do que desemprego
Eike Batista – Governo tirou minha empresa do leilão do pré-sal
Valor Econômico
Governo prepara pacote do ‘day after’ da reforma
Deus ajuda a quem cedo madruga
Inflação trienal é a menor desde anos 30
Benefício a juízes na mira do MPF e AGU
Argentina terá maior cota de carne na UE
Justiça do Trabalho abre sigilo de e-mail
EDITORIAIS
O Globo
Europa avança com o Mercosul no vácuo dos EUA
Acordo reafirma aposta em valores da democracia liberal e na cooperação multilateral
Um dos aspectos mais relevantes do Acordo Mercosul- União Europeia está na sua natureza de contraponto à tática do presidente americano Donald Trump de usar o sistema de tarifas alfandegárias como parte da política de segurança nacional dos Estados Unidos. Com olhos na disputa pela reeleição, em 2020, Trump adotou como regra criar conflitos comerciais, a partir do aumento de impostos sobre mercadorias importadas. Provoca um clima político de tensão global para obter concessões tanto de países competidores dos EUA, como a China, quanto de aliados como México e Canadá. A China se exercita num jogo de paciência, enquanto expande o seu poder e influência na Ásia e na África.
E já iniciou negociações para um acordo monetário com a Rússia. Na fronteira sul dos EUA, porém, a impulsividade de Trump induz a uma gradual desestabilização do México. Combinada com o agravamento da situação econômica e social em Honduras, Guatemala, El Salvador, Haiti, Cuba e Nicarágua, a Casa Branca se arrisca a fomentar uma situação crítica para todo o continente americano, que já convive com o drama da crise humanitária da Venezuela. É irrealista achar que os interesses estratégicos dos EUA ficariam incólumes a uma convulsão abaixo do Rio Grande. Sob Trump, os Estados Unidos optaram pela unilateralidade com restrições comerciais a todos, até violando compromissos assumidos.
A Casa Branca perde tempo se entretendo em enjaular crianças, filhos de imigrantes, e erguendo um muro social para os vizinhos latinos, quando deveria ajudar a promover o desenvolvimento regional. O resultado está na perda de espaço geopolítico também nas Américas, onde se assiste a uma inédita penetração diplomática, econômica e militar da China e da Rússia. Em contraste, a Europa avança no vácuo criado pela letárgica e belicosa política externa da Casa Branca. “Consolidamos a posição de líder global em comércio livre e sustentável”, celebrou Cecília Malmström, comissária de comércio da UE, ao anunciar o acordo com o Mercosul.
A saída dos EUA do Acordo de Associação Transpacífico (TPP), com onze países, abriu mais uma oportunidade para a União Europeia, que dinamizou negociações para tratados comerciais com Japão, Vietnã, Canadá, México, e agora Mercosul. O Acordo Mercosul-União Europeia tem a característica de uma declaração política de uma comunidade de 780 milhões de pessoas, responsáveis por 25% do PIB mundial. Numa época de exacerbação de nacionalismos antiquados, e falidos, reafirma nas duas margens do Atlântico a aposta em valores da democracia liberal e na cooperação multilateral, balizada por direitos civis e pela proteção ao meio ambiente. Deveria inspirar Washington a revisar sua política para a região.
O Globo
Abstenção nas primárias impõe desafio a candidatos no Uruguai
A Frente Ampla, coalizão de centro esquerda no poder, dá sinais de perda de prestígio eleitoral
A campanha eleitoral no Uruguai começou com surpresas. A principal foi a abstenção nas eleições primárias da semana passada. A maioria (60%) dos eleitores inscritos nos partidos, aptos a votar para definir as listas de candidatos, simplesmente se recusou a comparecer às urnas. O voto só é obrigatório no pleito de outubro, quando se elegem presidente e Congresso, mas chamou a atenção a elevada ausência em um eleitorado tradicionalmente polarizado. Sugere aos partidos um renovado desafio: mobilizar a população. Com 3,5 milhões de habitantes, metade em Montevidéu, o Uruguai cresceu em velocidade significativa até o primeiro semestre de 2017, mas perdeu fôlego com a estagnação dos vizinhos Brasil e Argentina.
Ano passado a economia avançou 1,8%. No melhor cenário, isso deve se repetir neste ano. O país tem uma tradição de estabilidade social, consolidada a partir dos anos 30 do século passado com políticas progressistas no campo das liberdades civis e sedimentada por um nível médio educacional acima do padrão latino-americano. No entanto, está sendo surpreendido pela epidemia de violência que devasta as Américas, na esteira da expansão do narcotráfico. Ano passado, registrou 382 homicídios, aumento de 35% em relação a 2017. É um recorde de violência.
O eleitorado sinaliza insatisfação. A primeira vítima foi a coalizão de centro-esquerda que domina o poder há década e meia. A Frente Ampla, liderada pelo presidente Tabaré Vázquez, emergiu das primárias da semana passada com um volume total de votos quatro vezes inferior às próprias expectativas e, também, com evidente preponderância dos partidos mais à esquerda. No conjunto, como observou o secretário-geral do Partido Comunista, Juan Castillo, a coalizão reafirmou o descenso do seu prestígio eleitoral.
Os eleitores alistados na Frente Ampla se recusaram a reforçar a candidatura presidencial de Daniel Martínez, ex- prefeito de Montevidéu, que ficou com 23,6% dos votos. Já a oposição conservadora obteve importante vitória nas primárias presidenciais. Conseguiu 41,6% dos votos para o candidato do Partido Nacional, Luis Lacalle Pou. No Partido Colorado, Ernesto Talvi, empresário, superou Julio María Sanguinetti, que já foi duas vezes presidente. A corrida para a eleição de 27 de outubro apenas começou. Candidatos tentam descobrir as razões do fastio do eleitorado. Talvez devam fazer uma autocrítica sobre os impasses políticos que turvam as perspectivas de progresso do Uruguai.
O Estado de S. Paulo
O consolo da inflação menor
Num país com 13 milhões de desempregados, incluídos cerca de 3,2 milhões sem ocupação há mais de dois anos, qualquer trégua da inflação é especialmente bem-vinda. A bênção é ainda maior quando o alívio é encontrado nos preços da comida, como vem ocorrendo há uns dois meses. Comer ainda é uma necessidade vital e corresponde, no jargão orçamentário do governo, às chamadas despesas não discricionárias. Quando o desemprego se prolonga e o dinheiro escasseia, até esse tipo de gasto se torna muito difícil para as famílias. A situação poderia melhorar se algum estímulo animasse os negócios a curto prazo e abrisse caminho para mais contratações. Mas qualquer estímulo, insiste o governo, dependerá do andamento do projeto de reforma da Previdência. Até surgir o sinal desejado, milhões de famílias terão de esperar. Como sobreviver é problema delas. Enquanto isso, há o consolo de uma inflação menos maligna.
A última novidade nesse front foi divulgada na sexta-feira passada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em junho, a vida ficou um pouco menos cara para famílias de renda modesta, com ganho mensal entre 1 e 2,5 salários mínimos. Usado para medir a inflação desse grupo, o Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1 (IPC-C1) caiu 0,07%, acumulando alta de 2,72% no ano e 3,85% em 12 meses. Em maio, havia subido 0,26%. No mês passado, baixaram os preços de quatro grandes categorias – habitação, transportes, alimentação e despesas diversas. Para quem vive com orçamento muito apertado, todas essas alterações são crucialmente importantes.
O custo da alimentação, item de maior peso no orçamento dessas famílias, baixou 0,16%. Em maio havia caído 0,26%, ainda no início da acomodação, depois de alguns meses de alta incomum, resultante principalmente de perdas de produção causadas por más condições do tempo. A FGV já havia apresentado boas notícias quando divulgou seu índice com maior cobertura dos preços ao consumidor, o IPC-BR, com recuo de 0,02% em junho e aumentos de 2,41% no ano e 3,73% em 12 meses. A inflação mais contida, com menor avanço e até recuo dos preços pagos pelas famílias, também tem aparecido nos indicadores oficiais, produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. A prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de junho, publicada no dia 25, mostrou uma alta mensal de apenas 0,06%, a menor para o mês desde 2006, quando houve queda de 0,15%.
Apesar de baixas pelos padrões brasileiros, as taxas anuais de aumentos de preços – em torno de 4% – ainda superam as médias internacionais, especialmente dos países desenvolvidos. O recuo da inflação brasileira, nos últimos anos, apenas aproximou a evolução dos preços internos brasileiros daquela observada nas economias mais avançadas. Além disso, o recuo recente favorece condições de vida um pouco menos duras para famílias empobrecidas pela crise econômica e pelo desemprego. No Brasil, tem crescido, entre os desempregados, a parcela dos desocupados de média e de longa durações – os primeiros sem emprego entre um e dois anos e os segundos há mais de dois anos nessa situação.
A participação conjunta desses grupos passou de 33,8% para cerca de 39% a partir do primeiro trimestre e aí se manteve até os três meses iniciais deste ano. Mas a composição desse bloco se tem alterado com aumento dos desocupados de longa duração. Esse segmento correspondeu, no trimestre de janeiro a março, a cerca de 25% – aproximadamente 3,2 milhões – do total dos desempregados.
Desocupados de longo prazo normalmente encontram maior dificuldade para se recolocar. Por isso, são mais propensos a aceitar salários menores, a concordar com contratos informais e a contentar-se com funções menos qualificadas que as anteriores. A equipe econômica deve ou deveria conhecer todos esses dados. O Banco Central os estudou recentemente. Mas nada, além de uma inflação menos corrosiva, facilitará sua vida, enquanto a equipe econômica preferir alongar a provação desses trabalhadores e de suas famílias.
O Estado de S. Paulo
Distorções nas políticas agrícolas
Enquanto União Europeia e Mercosul pactuavam a abertura do comércio intercontinental, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publicava um estudo mostrando que em todo o mundo a produção e o comércio agropecuários são distorcidos por políticas protecionistas e ineficazes.
Somados, os 53 países avaliados investem US$ 705 bilhões ao ano em políticas agropecuárias. Três quartos desse valor são direcionados aos produtores individuais. Em média, entre os 36 países da OCDE quase 20% da receita dos produtores vem de subsídios. Nos países em desenvolvimento essa média é inferior a 10%. A OCDE estima que 70% de todos os subsídios aos produtores rurais têm origem em medidas que distorcem o negócio agropecuário, notadamente tarifas e tabelamentos ou compensações por quedas nos preços, pragas ou desastres naturais.
Políticas assim alteram artificialmente os valores de mercado, afetando em primeiro lugar os preços no mercado interno, em geral mais elevados do que no mercado internacional. Embora essa diferença tenha diminuído desde 2000, nos países da OCDE os consumidores domésticos pagam em média 11% a mais do que os internacionais. Esse “imposto implícito” prejudica sobretudo os mais pobres, cujos gastos com comida representam uma parcela considerável do orçamento familiar, e também as indústrias domésticas de alimentos, que pagam mais pelos mesmos insumos comprados por suas concorrentes internacionais.
Para a OCDE, políticas que priorizem o subsídio ao preço de mercado e outras formas distorcivas de suporte precisam ser reduzidas e ao fim eliminadas. Os investimentos deveriam priorizar a produtividade, o desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade das fazendas, especialmente em setores aos quais o mercado não oferece incentivos, como serviços e infraestrutura. “As estratégias do governo deveriam focar no financiamento de áreas que complementem mais do que substituam os esforços privados.”
Um mecanismo importante é o condicionamento dos subsídios a metas que fomentem bens não comerciais, como a preservação ambiental e o bem-estar dos animais. Mas trata-se de um dispositivo utilizado por um número limitado de países, que não responde por mais de 20% do total de subsídios ao setor. O dado alvissareiro é que o Brasil é um dos países que mais se aproximam dos ideais preconizados pela OCDE. Praticamente todos os produtos agropecuários brasileiros estão livres de taxas de exportação. No último biênio, enquanto nos países da OCDE os subsídios aumentaram em média 18%, no Brasil diminuíram 30%. No Brasil menos de 3% da receita dos produtores vem de subsídios.
Se na maioria dos países o preço pago pelo consumidor doméstico é mais elevado que o cobrado aos importadores, podendo ser até 110% maior, o Brasil é um dos quatro países excepcionais onde essa diferença é praticamente nula. Ao contrário de quase todos os países, a maior parte dos subsídios do País não distorce o mercado. Todos os programas de crédito do Brasil – dois terços do total de subsídios – condicionam os produtores a critérios de eficiência, e os financiamentos para reflorestamento cobram juros abaixo do mercado.
Para dois terços dos países, os investimentos em infraestrutura correspondem a cerca de 30% dos subsídios. No Brasil passam de 50%, mais da metade em sistemas de inovação. Em média, nos países da OCDE os subsídios respondem por 44% do valor agregado agrícola. No Brasil respondem por menos de 8%.
Como se vê, a ministra da Agricultura estava coberta de razão ao se contrapor à eliminação dos subsídios do setor. Num mundo ideal eles não existiriam, mas no real o “desmame” dos agropecuaristas deve ser gradual e, sobretudo, condicionado a cortes muito mais drásticos na maioria dos outros países, onde os concorrentes mamam às fartas os recursos do contribuinte.
O Estado de S. Paulo
Fim de um privilégio esdrúxulo
Entre as medidas que constam do relatório da reforma da Previdência aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados, uma determina o fim da aposentadoria compulsória como punição para juízes condenados por corrupção, desvio de função e improbidade administrativa. Incluída na Constituição e na Lei Orgânica da Magistratura, essa sanção disciplinar foi classificada como um “privilégio esdrúxulo” pelo relator da Proposta de Emenda Constitucional da reforma previdenciária, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP).
Pela legislação em vigor, quando um juiz perde o cargo por decisão administrativa adotada pelas corregedorias judiciais ou pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ele tem direito a receber a aposentadoria com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Sensatamente, o relator da reforma previdenciária afirmou que, do ponto de vista ético e legal, nada justifica que juízes tenham tratamento diferente ao atribuído pela reforma previdenciária ao regime comum dos servidores públicos. Se a proposta for aprovada, ela será aplicada aos magistrados que forem afastados compulsoriamente daqui para a frente. Os que já foram afastados, contudo, continuarão recebendo a aposentadoria regularmente.
Custa crer que a medida moralizadora proposta pelo relator, que ainda terá de ser aprovada em duas sessões plenárias na Câmara e no Senado, tenha demorado tanto tempo para voltar a ser discutida. Entre 2003 e 2013 tramitaram no Senado e na Câmara propostas semelhantes, que revogavam o direito à aposentadoria de juízes afastados compulsoriamente e estabeleciam regras mais severas para punir magistrados corruptos. Por causa da oposição de entidades de juízes, porém, elas não foram aprovadas.
Em diferentes ocasiões os dirigentes dessas entidades alegaram que o fim da aposentadoria compulsória era uma tentativa do Legislativo de enfraquecer o Judiciário. Também afirmaram que, embora alguns juízes possam cometer “falhas”, não seria “justo” que fossem afastados sem receber qualquer remuneração. Segundo eles, a perda do cargo já é uma sanção rigorosa e a cassação da aposentadoria, além de ser uma sanção “adicional”, permitiria ao poder público “apropriar-se” das contribuições previdenciárias que os juízes aposentados fizeram ao longo de sua vida.
Desde que começou a funcionar, em 2005, o CNJ já puniu 35 juízes de primeira instância, 22 desembargadores e 1 ministro do Superior Tribunal de Justiça com aposentadoria compulsória, por venda de liminares e sentenças para bicheiros, narcotraficantes e donos de casas de bingo, estelionato e desvio de recursos públicos. Nesse período, esses 58 magistrados receberam vencimentos totais de R$ 137,4 milhões, em valores corrigidos pela inflação. Com esse valor seria possível pagar no mesmo período, 1.562 aposentados pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
As informações foram divulgadas após a aprovação do relatório da reforma previdenciária pela revista piauí, em seu site, e os valores foram atualizados por um escritório por ela especialmente contratado para esse fim. Segundo a reportagem, esses juízes foram aposentados em períodos distintos, mas, na média, recebem o benefício há cinco anos e dois meses. Neste período, o valor médio do benefício pago pelo INSS foi de R$ 1.415, enquanto a média mensal salarial dos 58 magistrados punidos foi de R$ 38 mil. Em outras palavras, cada excluído dos quadros da magistratura recebe, por mês, o equivalente ao pagamento de 27 aposentados.
É no mínimo estranho que associações de juízes não queiram que se aplique a alguns de seus membros as medidas que prescrevem para cidadãos comuns. Por isso, a iniciativa do relator Samuel Moreira merece aplauso, na medida em que tenta pôr fim a um prêmio atribuído a quem comprovadamente se revelou indigno da toga. Qual o sentido em se obrigar os contribuintes a continuarem sustentando juízes corruptos e criminosos?
Folha de S. Paulo
Não é o povo
Jair Bolsonaro (PSL) deu na sexta-feira (s) sua declaração mais reveladora a respeito dos questionamentos à conduta pregressa do hoje ministro Sergio Moro, da Justiça. “O povo vai dizer se estamos certos ou não”, disse o presidente.
A frase escancara uma estratégia do Palácio do Planalto e do titular da Justiça — tanto quanto possível, tratar apenas na esfera política da divulgação de conversas que revelam uma proximidade indevida entre Moro, quando juiz da Lava Jato, e procuradores da operação.
Aposta-se, claro, no respaldo da opinião pública ao ministro, capaz de mobilizar manifestações de apoio como as que tomaram ruas do país no domingo de 30 de junho.
“Eu vejo, eu ouço”, gabou-se o ex-magistrado diante dos atos, nos quais se ouviram ataques ao Congresso e ao Supremo Tribunal.
Um par de dias depois, ele ainda mostraria disposição para o enfrentamento ao falar por mais de sete horas na Câmara dos Deputados, sob ataque dos oposicionistas que querem a revisão da sentença que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Joga-se com o inegável — e merecido — prestígio da Lava Jato na sociedade. Não poucos terão visto os parlamentares inquisidores como meros defensores da corrupção própria ou de aliados.
Entretanto a percepção do eleitorado a respeito do tema se mostra mais sofisticada, conforme indica a pesquisa Datafolha publicada neste domingo (7).
Para 58% dos brasileiros, as trocas de mensagens reveladas pelo site The Intercept Brasil, depois analisadas também por esta Folha e pela revista Veja, mostram atuação inadequada de Moro. São 31% os que aprovam os procedimentos.
As proporções se repetem entre os que defendem a revisão de decisões judiciais, em caso de irregularidades, e os que entendem serem mais importantes os resultados do combate à corrupção.
Em nada mudou, porém, a divisão em torno da condenação de Lula, justa para 54% e injusta para 42% — este percentual oscilando na margem de erro ante os 40% de sondagem de abril de 2018.
Os clamores populares talvez sejam decisivos na permanência ou não de Moro no Executivo. Não podem sê-lo, certamente, na delicada análise jurídica que o caso impõe.
Novos diálogos revelados reforçam a impressão de cumplicidade entre o ex-juiz e os acusadores, mas ao Supremo restará traçar alinha entre o aceitável e o suficiente para anular um julgamento. Isso, óbvio, se os vazamentos forem admitidos como evidências.
Ao ministro cabe apresentar esclarecimentos objetivos sobre seus atos, anteriores e atuais. A popularidade, como todo político deveria aprender, é um ativo volátil.
Folha de S. Paulo
Imensa dor
João Gilberto exemplificou em sua saga musical um projeto cosmopolita de Brasil
A morte de João Gilberto representou para o Brasil mais do que a perda de um cantor e compositor com qualidades acima da média, o que já faria de seu desaparecimento físico motivo para imensa dor.
O artista de Juazeiro usou seus notáveis dons para elevar a tradição artística a que se filiava —a da música popular brasileira— a seu ponto culminante de sofisticação.
Num empreendimento estético ambicioso, fez da invenção de um gênero, a bossa nova, um projeto de reformatação do repertório antecedente, lançando luzes a um só tempo para o passado e o futuro.
Composições de autores consagrados, que pareciam prontas e acabadas, encontraram em suas releituras, não raro geniais, um insuspeito acréscimo de excelência.
Não pode passar despercebido o fundo significado político e cultural de sua trajetória, não naquilo que esse tipo de manifestação tem de mais elementar, a semântica empenhada em veicular mensagens.
João exemplificou em sua saga musical a possibilidade de materialização de um projeto cosmopolita de Brasil, simultaneamente rigoroso e radiante, capaz de circular pelo mundo com a naturalidade de patrimônio universal.
O que fez com sua arte permanece como utopia em muitos outros territórios da nacionalidade.
João Gilberto, obviamente, não surgiu na cena brasileira como um raio em céu azul. Quando lançou a marcante gravação de “Chega de Saudade”, de Tom Jobim e Vinicius de Morais, em 1958, o país vivia dias ímpares em termos de inventividade e adensamento cultural.
Em todos os campos do que atualmente se classifica de indústria criativa, eclodiam expressões engenhosas e promissoras.
A música, o teatro, a arquitetura, o cinema, a literatura, as artes visuais e, não menos importante, o futebol, tudo conspirava para dar ao Brasil a massa crítica necessária para o exercício internacional de um “soft power” que, infelizmente, em anos recentes parece ser alvo de perversa autossabotagem.
Lembre-se que pouco antes do lançamento da bossa nova, o Brasil conquistara, em campos europeus, a sua primeira Copa do Mundo, revelando ao planeta o talento inigualável do jovem negro Pelé.
A vitória no Mundial da Suécia representava para o país uma resposta ao padrão de baixa autoestima, que foi apelidado por outro grande artista, Nelson Rodrigues, de complexo de vira-lata.
Com Pelé e João Gilberto, na bola, na voz e no violão, a nação atingiu em finais dos anos 1950 um padrão de proficiência e talento que ficará para história como sinal inequívoco da potência do país. Que sirva de inspiração para o presente.