Após rejeitar o decreto das armas do governo, o Senado trabalha em um projeto de revisão do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826, de 2003). Escolhido por lideranças partidárias para relatar a proposta, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) ouviu nesta quinta-feira (4) em audiência pública da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) representantes de diversos setores da sociedade sobre a situação do registro, posse e porte de armas no Brasil.
O senador do Cidadania, que foi o relator do projeto de lei que estende a posse de armas na zona rural para toda a área das propriedades (PL 3.715/2019), aprovado pelo Senado na semana anterior, também assumiu a tarefa de relatar o PL 3.713/2019.
A proposta — batizada de PL das Armas — foi apresentada por senadores do PSL e pelo líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-CE), e praticamente repete o teor dos decretos editados no primeiro semestre deste ano pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. Mas o relator já adiantou que pretende construir um texto equilibrado que considere sugestões da sociedade civil e de parlamentares, incluindo medidas previstas em outros projetos sobre armas.
Acesso a armas
Para o senador, a audiência desta quinta-feira (4) evidenciou que a posse — ou seja, a manutenção de arma para proteção da residência — é mais tolerada pela sociedade do que o porte – direito de circular com armas. Ele ressaltou, contudo, que é preciso avaliar a inclusão de critérios mais rígidos para acesso a armamentos e munições. O senador também estuda medidas que tornem mais eficaz o rastreamento de armas e balas.
“Há necessidade de ter muito rigor e cautela na liberação; há exigências técnicas. O que vamos fazer é buscar um parâmetro”, apontou Alessandro Vieira.
Durante a audiência, o delegado Kleber Silva Júnior, do Conselho Nacional dos Chefes da Polícia Civil, defendeu o direito à proteção individual e do lar. Ele admitiu que as forças de segurança pública têm limitações e também pediu mudanças na legislação para não criminalizar o instituto da legítima defesa.
“O crime no âmbito do domicílio é crime em um solo sagrado. Os trabalhadores da segurança pública não têm o dom da onipresença”, defendeu.
Para Michelle dos Ramos, da organização não governamental Igarapé, “não podemos cair na armadilha de defender o porte civil como solução para a segurança pública”.
“Em nenhum lugar do mundo armar a população foi exitoso no combate ao crime organizado”, apontou.
Retrocesso social
Especialista em segurança e coronel da reserva da Polícia Militar do Ceará, Plauto Ferreira considera que fatores diferentes contribuem para o aumento da violência e que colocar a arma na mão dos cidadãos é um fator de risco:
“Será um salve-se quem puder, um retrocesso social. Nosso país não está preparado, especialmente diante de todo o cenário de políticas públicas deficitárias”, alertou.
Rastreamento
Representantes de caçadores, atiradores esportivos e colecionadores pediram que seja mantida previsão que consta nos decretos do governo que facilitam o acesso a munição e transporte de armas de fogo para esse grupo. Jodson Edington Junior, vice-presidente da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo, disse que a quantidade de armas e de munição autorizado é insuficiente para treinos.
Felipe Angelli, do Instituto Sou da Paz, afirmou que é preciso melhorar o rastreamento de armas e munições em circulação no país, que muitas vezes caem nas mãos de criminosos. De acordo com o coronel Dimas Silvério da Silva, do Exército, o Brasil é um dos poucos países que marca munições.
“Atualmente, a cada 10 mil munições o lote muda e esse lote tem que ser vendido a um órgão específico”, assinalou.