Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (05/07/2019)

MANCHETES

O Globo

Reforma avança na Câmara, mas PMs mantêm privilégios
Guedes: após Previdência, foco será privatizações e tributária
Em busca de base, governo oferece regalias
Cabral confessa compra de votos para Olimpíada
Operação prende 45 da milícia que apavora Itaboraí
Na Coreia do Sul, 5G muda hábito da população

O Estado de S. Paulo

Previdência passa em comissão, mas lobbies pressionam por alterações
Família quer PF na escolta de Bolsonaro
Dedução com médico pode acabar no IR
Chavismo mata 14 por dia, diz ONU

Folha de S. Paulo

Comissão aprova texto-base da reforma da Previdência
Em live, Jair Bolsonaro ignora reforma e defende trabalho infantil
Para ministro, Amazônia tem ‘desmatamento relativo zero’
Cabral admite que comprou votos do COI por Olimpíada
Defesa de Lula diz que empreiteiro fabricou versão
Hospitais públicos de SP atuam sem atestado contra incêndio
Relatório da ONU cita esquadrões da morte na Venezuela
EUA comemoram o dia a independência com Trump no centro das festividades

Valor Econômico

Reforma passa em comissão, bolsa bate recorde e dólar cai
Mudança não é suficiente, dizem Armínio e Tafner
Petrobras tem quatro ofertas pela Liquigás
B2W testa o uso de drones em entregas
Canhões em Washington
STF reduz em 3 mil número de processos no semestre

EDITORIAIS

O Globo

Demonstração de força das corporações

Início da votação é positivo para a reforma, mas lobby dos servidores tem o reforço até do presidente

As corporações em geral e as dos servidores públicos em particular, em que estão representantes de segmentos privilegiados na sociedade brasileira, agem há algum tempo contra a reforma na Previdência, por meio de seus representantes no Congresso e no próprio Executivo.

Para que não reste dúvida, o presidente da República, Jair Bolsonaro, pegou o telefone na quarta-feira para defender junto a congressistas reivindicações de policiais federais e rodoviários também federais. O lobby do presidente é em defesa da reivindicação das categorias para, por exemplo, não cumprirem o limite de idade de 55 anos para a aposentadoria, muito baixo considerando a expectativa de vida do brasileiro adulto.

O pedido não entrou no relatório do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), cujo texto básico foi aprovado ontem na Comissão Especial da reforma, por 36 votos a 13. Também foi tentada, sem êxito, a inclusão de uma emenda ainda mais generosa para esses policiais. Isso não significa muito, porque haveria entendimentos para as benesses entrarem na reforma, na votação em plenário.

O deputado Bolsonaro passou 28 anos na Câmara representando esses grupos. Sempre foi contra mudanças na Previdência. Evitou ao máximo o assunto na campanha, mas, eleito, não havia como escapar do tema, o mais estrutural dos obstáculos à volta do crescimento e, consequentemente, do emprego.

Mas, como os compromissos corporativistas de Bolsonaro se revelam mais fortes que suas responsabilidades como chefe da nação, o presidente engrossou o lobby dos policiais. Não é um trabalho fácil odo agente de segurança, mas é preciso reconhecer que são categorias privilegiadas em relação à grande massa do povo brasileiro, que se aposenta por volta dos 65 anos de idade, para receber um salário mínimo ou pouco mais.

Esta primeira fase da tramitação da reforma sinaliza positivamente para o projeto, mas confirma o poder de lobbies dos servidores públicos. Há sinais da atuação deles. Na redação original do relatório, por exemplo, Samuel Moreira suavizou a transição do funcionalismo e, para compensar a injustiça do benefício, fez concessões para a grande massa dos empregados no setor privado, segurados do INSS.

O resultado é reduzir o impacto fiscal da reforma. O objetivo, em dez anos, é de uma economia de R$ 1 trilhão. Por enquanto, o alvo está sendo atingido. Mas é necessário saber como. Recuos diante de pressões de grupos organizados implicam reduzir a “potência fiscal” do projeto, termo do ministro Paulo Guedes, da Economia.

Como a tendência é estes lobbies ficarem ainda mais ativos, cabe lembrar: o aposentado na iniciativa privada recebia em média, em2017, R$ 1.369; no Executivo federal, R$ 8.478; no Ministério Público, R$ 14.656; R$ 18.065, no Judiciário, e extravantes R$ 26.823 no funcionalismo do Congresso.

O Globo

Tragédia no trânsito tende a se ampliar com decisões de Bolsonaro

Extinção de pardais e mudanças no Código para aliviar punições aumentam riscos nas estradas

Os números alarmantes da violência no trânsito não recomendam que se alivie a punição a motoristas imprudentes, nem que se reduza a vigilância sobre os infratores. Como revelou reportagem do GLOBO no último domingo, a cada 15 minutos uma morte é registrada em ruas e estradas do país.

Levantamento feito com base nos dados do Ministério da Saúde mostrou que nas duas últimas décadas 734.938 pessoas morreram em consequência de acidentes, contingente que corresponde à população de uma cidade como Florianópolis. O estrago é comparável ao provocado pelas armas de fogo. Há estados inclusive que contabilizam mais vítimas de trânsito do que de assassinatos — caso de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Essa carnificina gera impactos não só na vida das famílias, mas também nos orçamentos da União e de estados e municípios. Entre 1998 e 2018, o país gastou R$ 5,3 bilhões no atendimento a vítimas de trânsito. O Conselho Federal de Medicina estima em 160 mil o número de internações a cada ano. Evidentemente, se o Brasil conseguisse reduzir a quantidade de acidentes, parte desses recursos poderia ser destinada a outras áreas da saúde. Além disso, há reflexos na produtividade do país, à medida que as ocorrências afetam pessoas em idade economicamente ativa.

É possível que esses números fossem ainda mais trágicos se não estivesse em vigor o Código de Trânsito Brasileiro, sancionado em 1997. A nova legislação, bem mais restritiva que a anterior, visava a reduzir o número de mortes no trânsito e atirar do país a pecha de campeão mundial de acidentes. Daí a novidade da pontuação na carteira. Embora tenha caído num primeiro momento, a quantidade de óbitos voltou a subir. E hoje se encontra num patamar ainda inaceitável — cerca de 35 mil por ano. Da mesma forma, o país continua como um dos que registram maior número de acidentes.

Atropelar o Código certamente não resolverá o problema. Mas é o que o governo Bolsonaro tem feito. Primeiro, com a desativação de radares nas rodovias federais. Segundo, com a proposta de dobrar, de 20 para 40, o número de pontos que leva à cassação da carteira. Sem falar em outros equívocos, como acabar com a multa para motoristas que transportam crianças sem cadeirinha, ou extinguir a exigência de teste toxicológico para condutores profissionais.

Tudo isso abre caminho para que se amplie a matança no trânsito, pois significa sinal verde para condutores que desprezam os limites de velocidade, avançam sinais, ignoram normas de segurança, dirigem embriagados etc., pondo em risco a vida deles e de outros. Se o projeto vingar, estarão liberados para fazer o dobro de atrocidades.

O Estado de S. Paulo

O preço da paralisação

Na última terça-feira, dia 2, a Câmara dos Deputados instalou uma comissão para acompanhar a execução de obras inacabadas. O mais recente levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU), assumidamente incompleto devido à carência de dados consolidados, revela um cenário exasperador. O Tribunal estima que, dos mais de 38 mil contratos de obras públicas, cerca de 14 mil (38%) estão paralisados.

Os valores destes contratos totalizam R$ 144 bilhões. De R$ 11 bilhões a R$ 12 bilhões já foram executados, de modo que seriam necessários R$ 132 bilhões para os concluir – sem contar gastos com danos resultantes do abandono. Além dos valores investidos, há prejuízos indiretos de difícil mensuração, como os entraves à movimentação da economia local e a privação de serviços à população, como atendimento hospitalar ou esgotamento sanitário. Um estudo citado pelo TCU constatou a paralisação de 3 mil obras de creches (75 mil vagas), resultando em um impacto na renda anual das famílias desamparadas da ordem de R$ 3 bilhões.

O problema de boa parte das obras começa antes mesmo de seu início, na deficiência dos projetos, devido a prazos curtos de elaboração e falta de estudos e amadurecimento, resultando em atrasos e majoração dos custos. Em parte, a razão é que as licitações costumam priorizar os preços mais baixos. Ao invés disso, o Tribunal recomenda a realização de concursos em que a qualificação técnica seja mais bem ponderada como critério de escolha.

Outra causa de paralisação é a incapacidade de Estados e municípios em honrar a sua parte no financiamento das obras pactuadas com a União. Uma das dificuldades é a regra que determina que a União não fará aportes adicionais, ficando todo o risco de acréscimos de valores, seja por ajustes no projeto, aditivos contratuais ou atualização monetária, por conta dos entes subnacionais. De resto, além da queda na arrecadação dos últimos anos, há uma insuficiência dos atuais instrumentos de orçamentação para planejar empreendimentos plurianuais.

Tudo isso, somado ao baixo índice de responsabilização dos gestores, resulta na pouca confiabilidade das garantias e compromissos assumidos por Estados e municípios. Ante essa ineficiência endêmica, ao invés de racionalizar os procedimentos com critérios mais rigorosos, o poder público, segundo o TCU, tende a iniciar um número excessivo de empreendimentos, na expectativa de que uma parcela seja realizada. O resultado é mais ineficiência, desperdício e sobrecarga administrativa. Outro fator crítico é a disparidade entre os procedimentos exigidos pela União e a capacidade técnica dos entes subnacionais para executar o projeto.

Uma das estratégias sugeridas para suprir esse déficit é promover parcerias com o setor privado. Também é necessário aprimorar os critérios de aferição da capacidade técnica dos tomadores de recursos. Além disso, o TCU recomenda o fomento de consórcios intermunicipais a fim de reduzir a desigualdade técnica entre os municípios menos favorecidos. “Quando a Administração consegue ponderar adequadamente esses fatores – fiscalização alinhada com boa gestão; capacitação e aperfeiçoamento do quadro técnico; precaução em se fazer projetos mais precisos, coerentes com as expectativas da comunidade e sem grande lapso temporal entre projeto e obra; recursos assegurados em tempo regular –, o risco de se ter uma obra paralisada é mitigado.”

Em vista disso, o TCU recomenda a catalogação das boas práticas, campanhas de conscientização e premiações às obras que se destacarem na superação dos parâmetros estabelecidos. Para que as autoridades possam se precaver contra paralisações e monitorar o desempenho das obras, o TCU considera fundamental que o Ministério da Economia desenvolva um banco de dados consolidado e também um fórum permanente envolvendo múltiplos atores. É inaceitável que bilhões do contribuinte sejam desperdiçados em esqueletos de concreto que só servem como monumentos à ineficiência e irresponsabilidade do poder público.

O Estado de S. Paulo

Névoa de suspeição

A ONG Missão Evangélica Caiuá, controlada pela Igreja Presbiteriana do Brasil, recebeu R$ 262 milhões em repasses do governo federal no primeiro semestre deste ano para cuidar da saúde de 83 mil índios em Mato Grosso do Sul, principalmente no município de Dourados, onde está sua sede. Esse montante, repassado à ONG por meio de nove convênios assinados com o Ministério da Saúde (MS), representa quase a metade do total de repasses autorizados pelo presidente Jair Bolsonaro em 2019 (R$ 603 milhões). A ONG Missão Evangélica Caiuá foi recordista no recebimento desses repasses.

No entanto, a qualidade do atendimento prestado pela entidade aos índios das etnias terena, guarani e caiová não condiz, sequer remotamente, com o substancial volume de recursos públicos a ela repassados. A precariedade é tal que, num caso extremo, a equipe do Estado, que esteve em Dourados na quinta-feira passada, viu-se na contingência de oferecer o veículo da reportagem como meio de transporte para uma das equipes médicas.

A falta de viaturas e combustível é apenas uma das graves deficiências encontradas pelo Estado na execução dos milionários convênios assinados pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e pela Missão Evangélica Caiuá. É corriqueira a falta de remédios e de equipamentos para realização de exames. Faltam ainda instalações minimamente apropriadas para o atendimento da população. Os dois maiores postos de saúde administrados pela ONG estão em situação “deplorável”, segundo seus próprios funcionários. De fato, a reportagem encontrou portas arrombadas e tapumes no lugar de janelas. A indignidade na prestação do serviço é proporcional ao volume de recursos recebidos pela ONG Missão Evangélica Caiuá.

Não é de agora que a Missão Evangélica Caiuá é uma das maiores beneficiárias de repasses federais. De acordo com o Portal da Transparência, a ONG recebeu R$ 2,1 bilhões nos últimos cinco anos. Criada em 1928, a Missão Evangélica Caiuá mantém o Hospital Porta da Esperança, uma escola municipal em Dourados e um instituto de pesquisas bíblicas na região. O secretário executivo da ONG, reverendo Benjamin Benedito Bernardes, afirma que o hospital não recebe “um centavo” dos convênios firmados com o MS.

Segundo ele, opera com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) e da prefeitura de Dourados, além de doações dos fiéis. “Se a gente (da ONG) tivesse esse dinheiro todo que dizem, seríamos um hospital de primeiro mundo, mas não é essa a realidade”, afirmou o reverendo Bernardes. A julgar pelas condições encontradas nos postos de saúde, o atendimento é de terceiro mundo, muito aquém do que se espera de uma ONG que recebeu tamanha quantia de recursos públicos.

Foi tanto dinheiro que a Controladoria-Geral da União (CGU) decidiu realizar uma auditoria nos contratos. Em relatório publicado em 2016, a CGU já apontava para a “ausência de procedimentos e rotinas para avaliação da prestação de serviços”, “inexistência de procedimento de atualização de metas e indicadores do convênio” e desvio de função dos funcionários da missão. Em suma, para o órgão de controle, não há controle algum na execução dos contratos.

Por meio de nota, o MS afirmou que assinou os convênios com a Missão Evangélica Caiuá este ano, mesmo diante das irregularidades apontadas pela CGU, seguindo orientação do Ministério Público Federal (MPF), a fim de evitar a paralisação dos serviços nas aldeias. Diante das condições precárias encontradas pela equipe do Estado no local, na prática, os serviços já estavam, há muito, paralisados. O ministro Luiz Henrique Mandetta, deputado federal pelo Mato Grosso do Sul, afirmou na nota que “avalia que a assistência indígena precisa ser reformulada para qualificar o atendimento”. O contribuinte agradecerá se esta reformulação for rápida e contar com o olhar diligente do MPF. Muito dinheiro para péssima prestação de serviço não leva a outra coisa que não suspeição.

O Estado de S. Paulo

Reconstruindo o potencial

Condição essencial para um crescimento firme, isto é, para vários anos de prosperidade, a capacidade produtiva do Brasil expandiu- se em maio. Nesse mês, o investimento em máquinas, equipamentos e outros ativos fixos aumentou 1,3% em relação ao total de abril. Ainda é possível acrescentar, dando alguma razão aos otimistas, dois detalhes positivos. Primeiro: no trimestre móvel terminado em maio, houve avanço também de 1,3%.

Segundo: em 12 meses, a expansão do valor investido passou de 2,7% em abril para 4,2% em maio. Todos esses dados são do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A melhora seria mais ampla se a construção civil, grande geradora de emprego e importante componente do capital fixo, também tivesse crescido. Mas a construção recuou 0,8% em maio, diminuiu 1,3% no trimestre móvel e encolheu 1,8% em 12 meses.

Para uma avaliação realista, ainda é preciso incluir esses dados num quadro amplo e levar em conta um período mais longo. Em maio, o nível do investimento produtivo foi o mais alto deste ano e um dos mais altos desde o fim da recessão, em 2017. Mas ainda é muito baixo, quando comparado com os valores de antes da grande crise de 2015-2016. Os desafios ficam mais claros quando se fazem alguns confrontos baseados na série de índices construída pelo Ipea. O investimento em capacidade produtiva realizado em maio continuou abaixo do registrado em novembro de 2015, quando terminava o primeiro ano da recessão.

A distância é muito maior quando se considera um número anterior à crise. O índice de maio de 2019 está 27,8% abaixo do registrado em agosto de 2013. Mas essa é a diferença vista de cima para baixo. Quando se olha de baixo para cima, o quadro é bem mais feio: será necessária uma escalada de 38,4% para voltar àquele nível. Se essas porcentagens parecerem estranhas, um exemplo poderá ajudar. Quando um preço cai de R$ 100 para R$ 50, a redução é de 50%. Quando, ao contrário, sobe de R$ 50 para R$ 100, o valor é duplicado, isto é, há uma alta de 100%.

Olhar de baixo para cima, nesse caso, dá uma ideia mais clara do esforço necessário para voltar a um dos valores de investimento mais altos do período anterior à recessão. Esse retorno será complicado para o governo, assim como para as empresas, mas os desafios serão diferentes em cada caso. O governo continuará com suas finanças em condições precárias ainda por vários anos, mesmo com a aprovação da reforma da Previdência. Os investimentos em infraestrutura – rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, sistemas elétricos, saneamento, etc. – vão depender da mobilização de capitais privados, por meio de privatizações e concessões. Projetos em todas essas áreas serão indispensáveis para ganhos de eficiência em todos os setores.

O investimento privado dependerá das condições de financiamento, mas têm ocorrido melhoras importantes nessa área. O impulso inicial virá do aumento da demanda, principalmente do consumo familiar, mas as decisões serão afetadas também pela confiança dos empresários, hoje muito baixa. A aprovação da reforma da Previdência poderá tornar o horizonte um pouco mais claro, mas serão necessárias indicações mais precisas sobre o rumo da política econômica.

Em 2018, 75% das empresas industriais investiram, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Mas apenas 49% das com investimentos programados realizaram seus planos integralmente. Em 2012, 57% haviam conseguido o mesmo sucesso, mas naquele ano 84% haviam investido. Em 2019, segundo o mesmo levantamento, 80% das empresas planejam investir. O porcentual é o mesmo do ano passado, mas aposta-se numa execução mais próxima da planejada.

Levar o investimento aos mais altos níveis anteriores à crise será apenas um dos desafios. Nos últimos dez anos, o total investido raramente superou 20% do Produto Interno Bruto (PIB). A taxa é normalmente igual ou superior a 25% nos países emergentes mais dinâmicos. Até lá haverá um percurso trabalhoso.

Folha de S. Paulo

O pacto que importa

Bolsonaro sepulta, como era previsível, ideia de um entendimento entre os Poderes pelas reformas; cumpre, isso sim, abraçar o convívio democrático

No dia 27 de maio, o presidente Jair Bolsonaro apresentou ao país uma proposta que, embora se mostrasse pouco realista, parecia ao menos conter um impulso positivo. Tratava-se de firmar um pacto entre os Poderes com vistas a assegurar o encaminhamento e a aprovação de um leque de reformas necessárias para o futuro do país.

Passado mais de um mês, na quarta (3) o mandatário cedeu às evidências de que o acordo, como foi aventado, não seria viável — e decidiu enterrá-lo. Em evento que marcou a troca de chefia no Comando Militar do Sudeste, Bolsonaro afirmou que “não precisamos de pacto assinado no papel”.

O importante, frisou, é que se votem matérias e proposições “que fujam ao populismo”.

Em maio, quando foi formulada a ideia do entendimento formal entre os Poderes, o país passava por mais um dos momentos de acirramento de tensões que vêm pontuando a dinâmica do atual governo.

Bolsonaro havia divulgado um rumoroso texto de autor não identificado acerca da impossibilidade de governar o país sem ceder a conchavos. Na semana seguinte, foi a vez de o ministro da Economia, Paulo Guedes, ameaçar deixar o governo, caso a reforma da Previdência se tornasse insatisfatória — com o que o presidente anuiu.

Por fim, no dia 26 daquele mês, bolsonaristas saíram às ruas em vaga defesa da Presidência, com protestos localizados contra parlamentares, o presidente da Câmara e membros do Judiciário.

Nesse cenário, um gesto de pacificação entre os líderes dos Poderes poderia ser visto com simpatia — embora predominassem, naturalmente, as reações de ceticismo.

Agora, num período mais favorável, de avanços na tramitação das mudanças nas aposentadorias, as declarações presidenciais acerca dos objetivos que uniriam Executivo e Legislativo se revestem de ares de civilidade e equilíbrio.

Mas nem tudo foram flores na manifestação de Bolsonaro durante a cerimônia militar de quarta. A certo ponto de seu discurso, o mandatário voltou a despertar inquietações ao dizer que somente ao povo brasileiro, “mais importante que qualquer instituição nacional”, deve “lealdade absoluta”.

Difícil não interpretar tais palavras como um recado aos demais Poderes e um reforço ao pacto, este sim já consumado, do presidente com sua base política mais radical — uma parcela do eleitorado na qual alguns encaram as instituições da democracia como um obstáculo ao que seria uma imaginária revolução na maneira de governar.

Como se disse aqui na ocasião em que a proposta veio à luz, melhor faria o chefe do Executivo se esposasse, sem hesitações, os comandos basilares da Constituição e as regras de convívio democrático. A alternativa é condenar o governo e o país a um padrão estressante e desnecessário de instabilidade.

Folha de S. Paulo

Confusão generalizada

Sai um general e entra outro na Secretaria de Governo da Presidência de Jair Bolsonaro (PSL). Entretanto nem com a nomeação de um amigo de alto coturno do presidente, Luiz Eduardo Ramos, para o lugar de Carlos Alberto dos Santos Cruz vislumbra-se a paz nas relações do Planalto com o generalato.

Cruz terminou derrubado pelo fogo amigo do rebento mais loquaz do presidente. Quando parecia que Carlos Bolsonaro se dedicaria menos a petardos eletrônicos e mais às obrigações de vereador carioca, ele retomou a artilharia.

Em sua mira entrou o general Augusto Heleno, comandante do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Após falhas óbvias no episódio dos 39 kg de cocaína em avião da Presidência, o segundo filho aproveitou para anunciar nas redes sociais que recusava seguranças pessoais oferecidos pelo GSI.

O vereador disse que pode haver agentes bem-intencionados no órgão, mas que estão subordinados a algo em que não acredita. “Tenho gritado em vão há meses internamente e infelizmente sou ignorado”, lamuriou-se, em questionamento ao comando de Heleno — e, por extensão, do pai.

Registre-se que o general à frente do GSI não prima pelo comedimento. Heleno deu tapas na mesa em conversa com jornalistas e compareceu a manifestação recente em apoio ao ministro Sergio Moro, da Justiça. Alvejá-lo com despropósitos decerto não contribui para a estabilidade de uma administração já por natureza errática.

Prova e recibo do mal-estar das altas patentes com a família Bolsonaro vieram em palavras de outro general (da reserva), Luiz Eduardo Rocha Paiva. Membro da Comissão de Anistia do governo, ele qualificou Carlos Bolsonaro como “imaturo, irresponsável e mal-educado”.

Paiva foi além em sua defesa de Heleno. Acusou o edil carioca de ser “pau-mandado” do escritor Olavo de Carvalho, que teve participação na queda de Cruz, e cobrou uma atitude do presidente.

“Bolsonaro deve dizer aos militares que desautoriza qualquer manifestação dele. Espero que se dê um basta nisso, porque [há] questões muito mais importantes para resolver do que ficar esse ‘tititi’ de uma pessoa que é mal-educada e desclassificada” disparou o general.

Nos bastidores, a tática do presidente foi mandar dizer que apoia Heleno, mas a questão estratégica é outra: enquanto não desautorizar publicamente o filho, manterá a suspeita de que Carlos fala, sim, também por ele — e de que ambos têm interesse na confusão.

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IMPRENSA HOJE

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