Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (23/04/2019)

MANCHETES

O Globo

Previdência – Por votos, governo cede, mas mantém a meta da reforma
Bolsonaro recua e critica fala de Olavo sobre militares
Greve de caminhoneiros é descartada após reunião
Toffoli: inquérito irá para o Ministério Público Federal
País tem 11% menos acidentes nas estradas no feriado
Desconfiança e ausência de incentivo fiscal freiam doações
Cultura: Teto de captação da lei de incentivo cai de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão

O Estado de S. Paulo

Governo atende Centrão e espera que CCJ vote reforma
Sob pressão de militares, Bolsonaro critica Olavo
Toffoli vai mandar ao MPF conclusão de inquérito
Frete atrelado a diesel faz caminhoneiro descartar greve
Teto de projeto na Lei Rouanet cairá para R$ 1 milhão
Empresário pede à Justiça para vender sítio de Atibaia
Planilha cita R$ 3,5 mi da Odebrecht a taxista
Trump ameaça país que comprar petróleo do Irã

Folha de S. Paulo

Governo aceita mudar texto para votar Previdência hoje
Bolsonaro faz crítica a Olavo após reação de ala militar
Não se pode afetar honra, diz ministro ao explicar censura
Ministério nega, outra vez, acesso a documentos
Aterros cheios e pouca reciclagem são desafios em SP
Sri Lanka atribui série de ataques a radicais islâmicos

Valor Econômico

Ministérios divergem sobre a devolução de concessões
Governo exclui itens polêmicos da reforma
Trump aperta sanções e Irã ameaça fechar rota de Ormuz
Reajuste dos fretes afasta risco de greve
Copag luta contra baralho importado
Populismo e prévia eleitoral frustram mercado argentino

EDITORIAIS

O Globo

Reforma da Previdência pede urgência

Economia não cresce, e desemprego sobe ao mesmo tempo em que projeto não avança no Congresso

Enquanto a tramitação do projeto de reforma da Previdência se atrasa, a economia demonstra que a recuperação ensaiada há pouco é mesmo de fôlego curto, algo como um “voo de galinha”, se tanto. Os políticos próximos ao governo — ainda parece um exagero chamá-los de “base parlamentar” — demoram a se articular, e a oposição, sem qualquer proposta alternativa, vê facilitado o trabalho a que se propôs, ode obstruir. Espera-se que hoje, afinal, a Comissão de Constituição e Justiça aprove na Câmara o parecer positivo sobre o projeto, para que se possa formar a comissão especial em que as discussões e negociações se aprofundarão. Deputados e senadores não devem esquecer que o desemprego voltou a subir. No trimestre encerrado em fevereiro, a taxa, calculada pelo IBGE, subiu de 11,6%, no mesmo período imediatamente anterior, para 12,4%, o que não pode ser explicado apenas por sazonalidade — passagem das festas de fim de ano, por exemplo.

É possível que a situação não tenha melhorado em março. O que há mesmo é um PIB que rasteja — o indicador antecedente do Banco Central, IBC-Br, sinaliza que o país pode estar enfrentando novamente uma recessão neste início de 2019. E os políticos têm responsabilidade direta por ela, devido à lentidão no início da tramitação propriamente dita da reforma, azedando o humor dos agentes econômicos, que tomam decisões com base nas expectativas. Como elas têm se degradado — e nisso gente do Planalto também tem culpa —, investimentos não são feitos, e as engrenagens da economia não se movem como é preciso.

Daí os 13,1 milhões de desempregados, havendo ainda outros 14,8 milhões com trabalho informal de menos de 40 horas semanais e que tentam, mas não conseguem, voltar ao mercado formal. E há também 4,9 milhões de desalentados. Já não procuram emprego. As estatísticas são preocupantes e deveriam sensibilizar parlamentares. Reportagem do GLOBO trouxe no domingo um outro indicador da debacle previdenciária: segundo levantamento feito a pedido do jornal pela Confederação Nacional do Comércio (CNC), existia, no fim de 2017, um total de 1.874 cidades em que havia mais aposentados do que trabalhadores com carteira assinada, contribuintes, portanto, do INSS. Estavam nesta condição33% dos 5.570 municípios.

É um quadro aritmeticamente insustentável, até para as próprias cidades, porque não será a renda de aposentados e pensionistas que gerará empregos nos municípios, já em processo de esvaziamento demográfico. Esta realidade reflete o desbalanceamento provocado pelo regime de repartição da Previdência e o fenômeno demográfico do envelhecimento da população, concomitante a uma da taxa de natalidade em queda: cada vez há menos jovens para com sua contribuição pagar os benefícios previdenciários dos mais velhos. Daí a crise estrutural colocada à frente dos parlamentares, a começar pelos da CCJ.

O Globo

Relatório desconstrói governo e anima oposição a Donald Trump

Não se vê chance de impeachment, mas investigação municia bastante os Democratas para o ano que vem

Mês passado, na reunião anual do Partido Republicano, Donald Trump arriscou-se numa previsão: “Nosso futuro é ilimitado”, disse, “vamos ganhar em 2020 por margem maior do que ganhamos em 2016”. Trump tem mais 70 semanas de campanha até a eleição e sérios problemas pela frente. O principal é como chegar lá e vencer a reeleição. No meio do caminho, além do Partido Democrata, agora há um extenso relatório judicial que descreve o governo Trump como caótico, incapaz, frequentemente mentiroso, tóxico aos interesses nacionais americanos e à ordem internacional. A versão integral do relatório ainda não é conhecida, mas o resumo divulgado expõe um presidente flagrado em pelo menos uma dezena de ocasiões dando ordens para obstrução de investigações da Justiça.

O delito, grave e eventualmente punível com a perda de mandato, não chegou a ser consumado, registrou o procurador Robert Mueller. Isso porque assessores da Casa Branca simplesmente se negaram a cumprir as ordens do presidente para impedir ou dificultar apurações sobre a extensão da sua aliança com a Rússia de Vladimir Putin, na campanha de 2016. Na época, a candidata democrata Hillary Clinton foi alvo de ações coordenadas de espionagem, de contrainteligência e propaganda negativa, que ajudaram Trump a vencer a disputa pela presidência dos EUA.

O procurador não encontrou provas de conluio do republicano com Putin, mas comprovou o entusiasmo de Trump com o auxílio eleitoral do Kremlin, o inimigo construído no imaginário dos cidadãos dos EUA durante toda a Guerra Fria. As 448 páginas divulgadas, com trechos censurados, indicam eventos apurados com potencial de desconstruir um governo cujo protagonista se esforça para tornar-se mítico, com um repertório cotidiano de ataques s a minorias via redes sociais.

É previsível que o Partido Democrata se empenhe em tornar pública a íntegra do relatório, porque pode usá-lo para deixar o governo em xeque até o fim do mandato e exibi-lo na campanha contra a reeleição. Derrotá-lo é outra coisa. Depende de um oposicionista eleitoralmente viável e capaz de superar Trump na habilidade para reverter situações desfavoráveis — ele já diz que foi “inocentado” pelo relatório. O impeachment, por enquanto, é miragem, sem apoio visível sequer da influente democrata Nancy Pelosi, presidente da Câmara. A oposição aposta no desgaste. Isso quer dizer que a vida de Trump na Casa Branca será duríssima pelos próximos 18 meses.

O Estado de S. Paulo

A estagnação nas fábricas

Com fábricas produzindo muito abaixo da capacidade e pessoal muito reduzido, empresários da indústria continuam à espera de um sinal de Brasília para pisar no acelerador e entrar em recuperação mais firme. Passados quase seis meses da apuração do segundo turno, a economia continua travada e a maior parte da indústria de transformação opera em nível inferior ao de antes da crise. Que os negócios continuam muito fracos é um fato bem conhecido, mas o quadro pode ser bem mais feio quando se examinam os detalhes. Exemplo: só três de quinze segmentos da indústria de transformação avaliados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) funcionam em nível pelo menos igual à média histórica do período de 2001 a 2018. O levantamento foi feito por solicitação do Estado.

Já no terceiro ano depois de encerrada a recessão, a maior parte das fábricas mantém um baixo grau de utilização das máquinas, equipamentos e instalações. Na média dos 15 segmentos analisados, só houve uso de 74,6% da capacidade instalada no primeiro trimestre deste ano. Na série histórica examinada no estudo da FGV, houve uso médio de 81,1% da capacidade produtiva. Entre janeiro e março deste ano, só os segmentos farmacêutico e de papel e celulose superaram sua média histórica. Um terceiro, o de vestuário, funcionou dentro de seu padrão normal. Todos os demais continuaram com ociosidade maior que a observada antes da crise.

A estagnação da indústria de transformação é atribuível, em primeiro lugar, ao baixo consumo das famílias. A moderação nas compras está claramente associada à insegurança, num ambiente de alto desemprego. Nem todas as famílias perderam renda, mas a maioria tem excelentes motivos para ser muito cautelosa nas despesas.

Diante do consumo retraído, os dirigentes de indústrias são levados a limitar severamente a formação de estoques. Nem acumulam estoques de produtos prontos, porque as vendas são incertas, nem compram matérias- primas e bens intermediários além do volume necessário numa situação de negócios fracos. Ao restringir as compras de matérias-primas e bens intermediários, transmitem a crise aos elos anteriores da cadeia de produção.

Com baixo uso de máquinas, equipamentos e instalações, há pouco ou nenhum motivo para investir na capacidade produtiva. Não teria sentido acumular bens de capital ou ampliar galpões, quando o parque produtivo ainda está largamente subutilizado. Tem havido, apesar disso, algum investimento, porque parte das empresas deve estar sendo forçada a substituir máquinas e equipamentos muito velhos. Em algumas, pode estar ocorrendo uma substituição de bens de capital por outros mais modernos, mas, de modo geral, faltam estímulos para investir. Isso se reflete na indústria de máquinas. No primeiro trimestre, o segmento usou 69,9% da capacidade instalada, ficando muito abaixo da média histórica de 80,3%. A diferença entre o uso atual da capacidade e a média de utilização nesse segmento é a maior encontrada em todo o levantamento.

A eleição e a posse de um novo presidente da República poderiam ter clareado o horizonte e contribuído para a intensificação da atividade, mas quem acreditou nisso acabou frustrado. Superada a incerteza eleitoral e instalado o novo governo, permaneceu a insegurança em relação à política e às perspectivas da economia. O escasso envolvimento do presidente na condução dos assuntos mais urgentes, como a reforma da Previdência, foi certamente um dos fatores negativos. A desorientação evidente e as trapalhadas mais ostensivas do governo, com muitas trombadas no primeiro escalão e enorme dificuldade na relação com o Legislativo, dificilmente poderiam ter melhorado as expectativas de quem olha os fatos a partir da planície do dia a dia dos negócios.

O exame dos 15 segmentos industriais enriquece, enfim, o quadro geral já apontado pela FGV: entre o trimestre móvel encerrado em novembro e aquele terminado em fevereiro o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) foi zero. Nulos são ainda os sinais de melhora.

O Estado de S. Paulo

A lição da Unasul

O governo brasileiro formalizou a saída do País da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). O Itamaraty comunicou a decisão ao governo da Bolívia, país que exerce a presidência pro tempore do bloco, na segunda-feira dia 15. A saída do Brasil do grupo de viés bolivariano surtirá efeitos transcorridos seis meses desta data.

O ato diplomático do Brasil foi mera formalidade. Na prática, a Unasul é irrelevante e maior prova disso é que a longa crise por que passa a organização não produz qualquer resultado além de expor ainda mais a pobreza dos desígnios que inspiraram sua criação. Paraguai e Argentina anunciaram que também deixarão o bloco. A Colômbia já havia denunciado seu tratado constitutivo em agosto do ano passado, três dias após a posse do presidente Iván Duque. Hoje, apenas Bolívia, Guiana, Uruguai, Suriname e Venezuela compõem o bloco.

A questão de fundo no ocaso da Unasul – e esta é a lição que há de ser tirada do episódio – é o desvirtuamento de organizações internacionais, desde sua concepção, para uso político ideológico de governantes de turno. A rigor, estes fóruns deveriam se ocupar de questões de Estado, bem mais perenes.

Não custa lembrar que a Unasul foi ideia do coronel venezuelano Hugo Chávez para servir como espécie de contraponto à suposta influência dos Estados Unidos na América do Sul por meio da Organização dos Estados Americanos (OEA), com sede em Washington. O delírio do falecido caudilho foi acompanhado por outros líderes regionais, como Lula da Silva, a argentina Cristina Kirchner, o equatoriano Rafael Correa e o boliviano Evo Morales, entre outros.

Em março deste ano, o presidente Jair Bolsonaro e representantes de outras sete nações – Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai e Peru – assinaram a Declaração de Santiago, que propõe a criação do Foro para o Progresso da América do Sul (Prosul), em substituição à Unasul. De acordo com nota do Itamaraty, “o novo foro terá estrutura leve e flexível, com regras de funcionamento claras e mecanismo ágil de tomada de decisões. Terá, ainda, a plena vigência da democracia e o respeito aos direitos humanos como requisitos essenciais para os seus membros”. A Venezuela não foi expressamente citada no documento, mas a mensagem é clara.

Se, de fato, o Prosul servir para engajar os países da região na inarredável defesa dos valores do Estado Democrático de Direito e no respeito aos princípios e tratados que regem as relações internacionais, a troca terá valido a pena. Não se descarta, no entanto, o risco de o novo bloco ser uma Unasul com sinal invertido. Ao menos sob a perspectiva do Brasil. Os sinais emitidos pelo Itamaraty em pouco mais de quatro meses de governo do presidente Jair Bolsonaro não são nem um pouco alvissareiros. Bastaria dizer que o chanceler Ernesto Araújo é dos mais ardorosos críticos do que genericamente classifica como “globalismo”, um “complô” de organizações internacionais a fim de atacar os valores “judaico- cristãos” do Ocidente, a soberania dos países e seja lá o que mais isso signifique.

À época da concepção da Unasul, o populismo de esquerda grassava na América do Sul. O enfraquecimento da organização nos últimos anos está diretamente ligado à ascensão de novos governos alinhados ao centro e à direita do espectro político na Argentina, no Brasil, na Colômbia, no Paraguai e no Chile. Estes países, não por acaso, decidiram suspender a participação na Unasul em abril do ano passado.

Por outro lado, a simples troca de governo em alguns países da região por líderes alinhados ao polo ideológico oposto ao de seus antecessores não significa, por óbvio, o fim da tentação populista. Não faltam exemplos de casos recentes que recomendam prudência e constante vigilância. A experiência da moribunda Unasul terá valido por um bom propósito se ao menos servir como alerta sobre o que não deve ser feito com uma organização internacional que se pretende relevante.

O Estado de S. Paulo

A CPI das Universidades

Deve ser instalada nesta semana, pela Assembleia Legislativa de São Paulo, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para “investigar irregularidades na gestão das universidades públicas no Estado de São Paulo, em especial quanto à utilização das verbas públicas repassadas a elas”, conforme se lê no Diário Oficial. Não há menção a nenhuma irregularidade específica, o que torna o objeto da CPI vago o bastante para ser entendido como uma tentativa de interferir na autonomia universitária.

O artigo 207 do texto constitucional diz que “as universidades gozam de autonomia didático- científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial”, mas parece que esse aspecto foi amplamente ignorado pelos deputados estaduais paulistas, o que abre caminho para contestações judiciais. Seja como for, a CPI deverá ser instalada sob o patrocínio da base parlamentar do governador João Doria (PSDB) – o autor do requerimento da comissão é o deputado Wellington Moura (PRB), vice-líder do governo na Assembleia. A justificativa do parlamentar é que as universidades “se declaram em crise financeira”, ao mesmo tempo que pagam “salários acima do teto” constitucional e cometem “irregularidades na concessão de aposentadorias” e “no valor das diárias pagas a servidores das reitorias”.

Tampouco estão claras as motivações do governador João Doria, que até ontem não havia se manifestado sobre essa iniciativa dos deputados governistas. Contudo, a julgar pelas declarações dos deputados governistas, depreende-se que a CPI está em linha com o clima de caça às bruxas que se pretende instalar nas universidades no País desde a eleição do presidente Jair Bolsonaro. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, por exemplo, já disse que sua “contribuição” para o País será “vencer o marxismo cultural nas universidades”.

Em perfeita sintonia com essa disposição do governo federal, Moura disse que seu objetivo ao propor a CPI era “analisar como as questões ideológicas estão implicando no orçamento”. Ou seja, a crise financeira das universidades, a julgar pela visão do parlamentar governista, resultaria do manejo “esquerdista” das verbas públicas. “Eu percebo um predomínio da esquerda nas universidades. Infelizmente, muitos professores levam mais o tema ideológico do que o temático para a sala de aula”, disse Moura.

Do mesmo modo, a líder do PSDB na Assembleia, deputada Carla Morando, disse que “é público e notório” que as universidades públicas são “dominadas pela esquerda”, o que afetaria a gestão e o ambiente educacional.

Observa-se, portanto, que o problema de gestão de recursos públicos não é de fato o centro das preocupações da CPI, e sim o “esquerdismo” das universidades, acusação que permite todo tipo de interpretação e que, no limite, pode basear medidas que acabem de alguma forma tolhendo a liberdade acadêmica. E aí o céu será o limite: como comentou o deputado Wellington Moura, “muitas ideias vão surgir” depois da CPI, como, por exemplo, um decreto legislativo para alterar a forma de escolha dos reitores das universidades, dando ao governo estadual e à Assembleia maior poder de influência.

“Não temos o que temer com a CPI, mas preocupa esse tipo de discussão sobre a importância da universidade”, disse o reitor da Universidade de São Paulo, Vahan Agopyan. Ele lembrou que “as universidades de pesquisa não são só para formar excelentes profissionais e fazer pesquisas”, mas também para “discutir políticas públicas para melhorar a sociedade”. Para isso, é preciso total autonomia, sem nenhuma interferência estatal, para que as ideias sejam discutidas sem embaraços de qualquer ordem.

É fato que a autonomia universitária não faz desses centros de pesquisa e educação entidades desvinculadas do contexto social e econômico em que foram criados; no entanto, nenhuma iniciativa com vista a cobrar-lhes respeito ao orçamento pode vir acompanhada de ameaças obscurantistas contra a liberdade acadêmica, um dos alicerces do regime democrático.

Folha de S. Paulo

Sigilo injustificável

Pasta da Economia nega de modo descabido acesso a dados sobre a reforma da Previdência, cruciais ao debate parlamentar e ao escrutínio da sociedade

A prepotência tecnocrática ou alguma estratégia política obtusa talvez o explique, mas nada justifica o estapafúrdio sigilo decretado pela pasta da Economia acerca de documentos que embasam a reforma da Previdência Social.

Nem mesmo deveria ter sido necessário que esta Folha pedisse ao ministério, com base na Lei de Acesso à Informação, registros de projeções e estudos relacionados à proposta de mudança do sistema de aposentadorias em tramitação na Câmara dos Deputados.

Trata-se, afinal, de projeto que afeta diretamente a enorme maioria dos trabalhadores brasileiros, além de conter objetivos econômicos de interesse de toda a sociedade. O singelo bom senso recomenda que todos os dados a seu respeito precisam estar disponíveis de pronto ao escrutínio público.

Não param de pé os argumentos utilizados pela pasta ao negar o pleito deste jornal. Alega-se que os documentos foram classificados com nível de acesso restrito — só podendo ser consultados por certos servidores e autoridades — em razão de seu caráter preparatório de um ato administrativo, conforme previsto na legislação.

Ora, mesmo do ponto de vista desse formalismo míope, a proposta de reforma já está no Congresso, não mais nos escaninhos do Executivo. É a deputados e senadores que cabe, agora, debater e negociar o texto com as melhores informações à disposição.

Não por acaso, lideranças da Câmara já indicavam nesta segunda-feira (22) que o sigilo do material cairá quando o projeto chegar à comissão especial encarregada de examinar seu mérito — logo depois, portanto, da votação pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), na qual apenas se considera sua adequação à Carta.

Já se conta com fartura de dados a comprovar o estado calamitoso das finanças da Previdência; ademais, o governo divulga anualmente, com o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentarias, projeções para os regimes que atendem a trabalhadores da iniciativa privada, servidores federais civis e militares.

Falta, em particular, o detalhamento das estimativas do impacto de cada medida proposta, fundamental para a discussão parlamentar. Sabe-se que a reforma se propõe a economizar cerca de R$ 1,1 trilhão em dez anos — e que é virtualmente nula a chance de passar incólume pelo Congresso.

Possivelmente o governo tema a distorção e a exploração demagógica de cifras, que decerto ocorrerão. A transparência implica custos, de fato; do contrário, não seria uma virtude tão preciosa.

Folha de S. Paulo

Páscoa sangrenta

Sri Lanka sofre um dos atentados terroristas mais brutais dos últimos tempos

O domingo em que se celebrou a Páscoa ficou marcado por um dos atentados terroristas mais brutais e hediondos dos últimos tempos.

No Sri Lanka, ilha com cerca de 20 milhões de habitantes localizada no oceano Índico, uma série de explosões atingiu igrejas e hotéis em três cidades, incluindo a maior do país, Colombo, deixando ao menos 290 mortos e 500 feridos.

Os ataques ocorreram de forma coordenada e, segundo relatos oficiais, foram perpetrados por homens-bomba. De forma emergencial, o governo decretou toque de recolher e adotou a medida extrema de bloquear o acesso a redes sociais e a aplicativos de mensagens, com o objetivo declarado de evitar a disseminação de boatos.

Até o momento, nenhuma organização reivindicou os ataques. As autoridades, no entanto, apontaram a facção radical islâmica National Thowheeth Jama’ath (Organização Nacional Monoteísta) como responsável pela carnificina.

Forças de seguranças sabiam havia quase duas semanas que o grupo preparava atentados —embora, aparentemente, nada tenham feito para evitá-los. Se a suspeita vier a se confirmar, os eventos de domingo representarão sinistra novidade em um país que registrara poucos episódios de jihadismo.

De 1983 a 2009, o Sri Lanka foi devastado por um conflito civil que opôs sobretudo a maioria cingalesa, que segue predominantemente o budismo, e a minoria tâmil, majoritariamente hindu. Embora guerrilhas tâmeis tenham utilizado homens-bomba, elas tinham como foco figuras políticas.

Já no caso dos ataques de domingo, além do método suicida empregado, a escolha dos alvos —religiosos e turísticos— afigura-se típica de grupos jihadistas. Ademais, dada a complexidade e a coordenação dos atentados, especialistas consideram provável o envolvimento de grupos estrangeiros, como Al Qaeda ou Estado Islâmico.

Enquanto prosseguem as investigações, traz algum alento a notícia de que cristãos, budistas, hindus e muçulmanos, apesar de suas diferenças históricas, têm doado sangue às centenas de feridos. A demonstração de fraternidade é, neste momento, a resposta mais forte àqueles que promovem o ódio e a intolerância.

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