Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (04/04/2019)

MANCHETES

O Globo

Bolsonaro articula base de apoio com 9 partidos
Previdência está condenada, não importa o governo, afirma Guedes
Vélez quer revisão do Golpe de 1964 em livros didáticos
Pancadaria antes de jogo da Libertadores deixa torcedor em estado grave
TCM alertou prefeitura sobre dívidas de firmas
Chicungunha tem risco de se tornar doença silvestre
Israel lucrou com visita, diz embaixador
‘Partidos de direita abraçaram causas da ultradireita’

O Estado de S. Paulo

Cuba e Venezuela já devem R$ 2,3 bilhões ao BNDES
‘Tchutchuca é a mãe’, diz Guedes na CCJ
Bolsonaro vai receber partidos para formar base no Congresso
Bloco manobra e atrasa projeto anticorrupção em partidos
Orçamento impositivo é aprovado no Senado
Credor põe Gol e Latam na disputa por Avianca

Folha de S. Paulo

Ida de Paulo Guedes à Câmara acaba em confusão; Bolsa cai
Senado aprova PEC de menor impacto sobre o Orçamento
Em 3 meses, Mais Médicos soma 1.000 desistências
Vélez nega o golpe e diz que didáticos serão alterados
Carlos Ghosn é preso pela quarta vez no Japão
Venezuela sofre crise humanitária complexa, diz ONG

EDITORIAIS

O Globo

Conjunto da obra é que ameaça Crivella

Processo de impeachment tem força nas ruas, devido ao abandono em que está a cidade

A aprovação da abertura do processo de impeachment contra o prefeito Marcelo Crivella, algo inédito no Rio desde o fim da ditadura militar, há 34 anos, é mais um fato que reforça a ideia de degradação exposta pela política praticada na cidade e no estado. Inquéritos, julgamentos e prisões têm sido frequentes, como nunca no passado na democracia. Algo salutar, porque significa que as instituições reagem, mas não deixa de ser reflexo do baixo padrão ético da administração pública.

O processo foi instaurado por 35 votos a 14, quórum de cassação, com base em denúncias de que o prefeito prorrogou indevidamente um contrato de exploração do mobiliário urbano por empresa privada. A incorreção está capitulada na legislação e pode ser punida com a perda de mandato.

Prosseguirá a discussão sobre a denúncia, em termos quase sempre distantes do entendimento da população, para a qual o que condena Crivella é o conjunto da obra de sua gestão: despreocupação com a cidade, descaso com suas raízes culturais, desprezo com projetos importantes de revitalização de áreas degradadas (o Porto e o Centro) e ausência de manutenção mínima dos logradouros. Faltam, também, iniciativas para enfrentar problemas financeiros sérios na saúde, setor estratégico, e até mesmo na coleta de lixo.

O delito na prorrogação de um contrato de empresa, inclusive em dívida com a prefeitura, é grave. Mas, para a cidade e os cariocas, o delito maior é terem sido abandonados pelo poder público. Processo de impeachment tem ritos legais, necessita estar lastreado em fatos, mas depende da política. É o que aconteceu com a petista Dilma Rousseff no Congresso. Embora fosse flagrante e sério o crime de responsabilidade cometido ao manipular as contas públicas, a fim de escamotear o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, foi ao desprezar o Legislativo que a petista queimou as naus que a levariam à terra firme.

No caso do Rio, a crise também deriva da imperícia do prefeito em gerenciar sua base. Não se desconhece que a Câmara de Vereadores, chamada de “Gaiola de Ouro”, é parte da degradação da política carioca e fluminense: milicianos eleitos e presos, infiltração do crime organizado em geral, corrupção e encarceramento de parlamentares etc.

Neste contexto, o pedido de impeachment, pela ótica do cidadão, deve ser visto como uma chance de melhorias na desastrosa administração da cidade. Mas não há esperanças de que, caso ocorra o impedimento de Crivella, seja feita uma faxina ética, e avancem os costumes no exercício da política. É apenas uma oportunidade de troca de inquilinos no Palácio da Cidade. Não é pouco, porque, se ocorrer, será a reafirmação do estado de direito. Servirá de alerta aos próximos prefeitos, mas mudanças de fundo dependerão de eleições.

O Globo

País segue na contramão ao extinguir pardais nas rodovias

Números do Dnit mostram que radares eletrônicos reduziram em 25% as mortes nas estradas

O presidente Jair Bolsonaro anunciou a suspensão da instalação de 8.015 pardais eletrônicos em rodovias federais de todo o país. Como mostrou reportagem do GLOBO, os equipamentos foram licitados durante o governo Michel Temer, em 2016, e seriam implantados gradualmente, parte deles em substituição aos que hoje estão inoperantes.

Até dezembro do ano passado, os 52 mil quilômetros de estradas federais eram monitorados por 5.500 radares, mas, com o fim de contratos de manutenção, a maior parte foi desativada, restando apenas 440 em funcionamento, ou 8% do total. O projeto do atual governo é cancelar os novos equipamentos e rever os que estão em operação. A intenção seria acabar com uma suposta indústria da multa.

Convém lembrar que o termo “pardal” surgiu nos anos 90, durante a gestão do então governador do Distrito Federal Cristovam Buarque. Radares ficavam instalados sob árvores para flagrar infratores que faziam da capital federal uma das campeãs de acidentes no país. Eram parte de uma bem-sucedida campanha de educação no trânsito que reduziu as mortes em 70% e virou modelo.

Posteriormente, o Denatran proibiu que os equipamentos ficassem escondidos — eles precisam estar bem sinalizados —, mas o objetivo, freara violência no trânsito, continua o mesmo. Desde então, esses aparelhos se espalharam por vias municipais, estaduais e federais com resultados incontestáveis na redução de mortes no trânsito. Basta recorrer aos números do próprio Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).

Segundo o órgão, entre 2010 — quando foi implantado o Programa Nacional de Controle Eletrônico de Velocidade — e 2016, a presença dos radares nas rodovias federais contribuiu para a redução de cercade 25% no número de mortes. De fato, radares não são instalados aleatoriamente, mas em locais onde são necessários para garantir a segurança de motoristas e pedestres.

Como imediações de escolas, trechos de vias onde há maior aglomeração urbana, ou locais que registram altos índices de colisões e atropelamentos. Alguns desses equipamentos substituem as obsoletas lombadas no asfalto. É indiscutível que o excesso de velocidade contribuiu de forma decisiva para o aumento do número de acidentes. E o radar eletrônico é uma forma de coibi-los, não só no Brasil, mas em todo o mundo.

Apesar de ter implantado no fim dos anos 90 um Código rigoroso, o país ainda é um dos campeões mundiais de mortes no trânsito. Condição que nos envergonha. Aliás, frear este descalabro é um compromisso assumido com a ONU. Mas, infelizmente, decide-se seguir na contramão, rumo a um desastre iminente.

O Estado de S. Paulo

Um pacote útil, mas limitado

O pacote de simplificação prometido pelo governo tem aspectos positivos, mas é limitado e nem de longe caracteriza um plano de desenvolvimento

Fazer negócios no Brasil poderá ficar mais fácil e mais barato com o pacote de simplificação prometido pelo governo, mas serão necessárias medidas de outro tipo para desemperrar a economia no curto prazo e criar empregos. Para evitar enganos, decepções e perda de tempo, é bom distinguir os problemas e separá-los em pelo menos dois grupos. O mais urgente é movimentar a economia e tentar fazê-la crescer pelo menos na faixa de 2% a 2,5% neste ano. Isso poderá ocorrer mesmo sem grandes mudanças de caráter institucional. O outro grupo inclui os vários entraves associados à organização dos mercados, à operação do governo e à estrutura legal. Burocracia demais, impostos complicados e insegurança jurídica são exemplos desses entraves. Prejudicam a economia em qualquer fase, com crescimento de 5% ou 1,1% ao ano, taxa verificada em 2017 e 2018. Remover esse entulho tornará a atividade empresarial mais ágil e mais competitiva no médio e no longo prazos, mas o desafio imediato é de outra ordem.

Mesmo com todos aqueles problemas institucionais, a economia brasileira já foi muito mais dinâmica, avançou mais velozmente e foi mais ágil na criação de empregos. Consumidores e empresários tinham alguma segurança para suas decisões e a produção respondia à demanda – interna e externa. A ação do governo contribuía para a elevação da capacidade produtiva e ajudava a movimentar os negócios com os investimentos públicos. A má administração, a irresponsabilidade fiscal e a corrupção forçaram a interrupção desse papel e o início de uma fase de ajuste complexo, penoso e ainda incompleto.

Pelo menos dois fatores poderão contribuir para o retorno ao dinamismo. Recriar confiança deve ser a primeira providência. Um governo mais empenhado na reforma da Previdência, menos perdido em confusões internas e mais claro em seus propósitos dará aos empresários e consumidores maior segurança para suas decisões. Com um pouco mais de segurança, as empresas começarão pelo menos a engordar seus estoques, de insumos ou de produtos finais, e isso já será um ganho para os negócios.

Uma segunda providência será avançar mais velozmente no programa de concessões, mobilizando capitais privados para obras de infraestrutura, com efeitos a curto prazo pela geração de empregos e pela demanda de equipamentos e materiais. Efeitos de médio e de longo prazos aparecerão no ganho geral de eficiência.

O pacote em preparação no Ministério da Economia deverá, segundo reportagem do Estado, incluir quatro planos: Simplifica, Emprega Mais, Pró-mercados e Brasil 4.0. No caso do Simplifica, o primeiro na lista de lançamentos, o secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade, Carlos da Costa, destaca a reformulação do eSocial, um sistema complexo de informação sobre relações trabalhistas. O Emprega Mais deverá implantar uma nova estratégia de qualificação profissional baseada no critério de empregabilidade, sustentada em parte com recursos do governo e em parte com dinheiro do Sistema S. Haverá licitação de empresas qualificadoras. O terceiro plano será destinado a aliviar a regulação e facilitar o funcionamento do mercado em vários setores. O quarto deverá proporcionar apoio à digitalização dos processos empresariais.

A curto prazo, o efeito dessas medidas na atividade e na geração de empregos deverá ser nulo ou muito pequeno. Benefícios deverão surgir a médio prazo, mas isso dependerá de alguns cuidados. Em alguns Estados o Sistema S tem sido eficiente na formação de mão de obra qualificada com base nos mais atualizados padrões tecnológicos. O governo estará preparado para mexer nesse esquema de qualificação? Pelos padrões atuais da política educacional, a resposta é indiscutivelmente negativa.

Ganhos de eficiência dependerão também de outros fatores. Muito importante será uma reforma tributária mais técnica e menos ideológica do que as mudanças indicadas pelo governo. Enfim, o pacote agora prometido tem aspectos positivos, mas é limitado e nem de longe caracteriza um plano de desenvolvimento.

O Estado de S. Paulo

Ocupação de espaços

Na falta de articulação política do governo para garantir as reformas, empresários se organizam para angariar apoio

Na falta de articulação política do governo que garanta um mínimo de suporte às reformas no Congresso, empresários estão se organizando para, por conta própria, angariar apoio parlamentar à agenda reformista.

O movimento, registrado em recente reportagem do Estado, é mais um indicativo de que o establishment político e empresarial está se mobilizando para ocupar o vácuo criado pela decisão do presidente Jair Bolsonaro de não negociar com as forças políticas.

Antes dos empresários, os próprios líderes políticos no Congresso, a começar pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), passaram a articular entre si a aprovação da reforma da Previdência, sem esperar que o governo saia de sua inércia e que o presidente da República finalmente mostre convicção sobre as mudanças indispensáveis para tirar o País da crise.

Do mesmo modo, governadores já sinalizam a disposição de negociar sua pauta diretamente com o Congresso, desistindo de tentar qualquer articulação com o governo federal. Alguns têm se queixado da falta de abertura de Bolsonaro e de seus ministros para ouvir o que eles têm a dizer a respeito da difícil situação nos Estados.

Um dos governadores que reclamaram publicamente foi o baiano Rui Costa, do PT, natural opositor do governo, mas as ressalvas ao comportamento político do presidente Bolsonaro estão partindo também de seus apoiadores.

É o caso do grupo de empresários intitulado Instituto Brasil 200, que fez campanha entusiasmada para Bolsonaro na eleição do ano passado. Ainda que evitem críticas diretas ao presidente da República por ter deliberadamente se distanciado do Congresso, esses empresários, na prática, assumiram para si uma função que, todos sabem, deveria ser de Bolsonaro e de seus articuladores políticos: o corpo a corpo com os parlamentares. O grupo pretende abrir um escritório em Brasília e terá interlocutores no governo para negociar modificações no texto da proposta de reforma. Além disso, esses empresários têm abordado individualmente os congressistas na tentativa de obter deles o compromisso formal de apoio à reforma – segundo o Instituto Brasil 200, a lista já tem as assinaturas de 230 deputados e 10 senadores.

Os empresários não escondem sua frustração com a omissão do governo e com o embate do presidente Bolsonaro com os parlamentares justamente no momento em que a habilidade política se faz mais necessária. Flávio Rocha, um dos líderes do Instituto Brasil 200, considera que o governo precisa abandonar o tom de campanha eleitoral. “Agora é preciso aglutinar todos a favor da reforma”, disse ele.

Para o empresário Antônio Carlos Pipponzi, toda a euforia com a eleição de Bolsonaro e a escolha de Paulo Guedes para o Ministério da Economia já arrefeceu ante a evidente falta de traquejo do governo para fazer avançar sua agenda no Congresso – conforme mostrou o Estado, nenhum dos 16 projetos e medidas provisórias enviados pelo governo Bolsonaro para a Câmara nos três primeiros meses foi aprovado, e todos tramitam em ritmo lento.

Nada disso autoriza qualquer otimismo, e é por essa razão que, enquanto o presidente Bolsonaro dedica seu tempo e seu mandato a alimentar um discurso “anti-establishment”, o establishment assume a tarefa de aprovar a agenda reformista e liberal que Bolsonaro, na campanha eleitoral, dizia defender.

O problema é que a ausência do presidente – Bolsonaro dedica mais tempo ao carnaval, às multas de trânsito, lombadas eletrônicas e bananas do Equador do que à reforma da Previdência e às prometidas privatizações – torna esse processo muito mais caótico e incerto do que normalmente seria. Não se sabe o que resultará de uma negociação política da qual não participa o chefe de governo – que não foi eleito para ser mero despachante de projetos, e sim para implementar um programa de governo, cuja realização depende de diálogo com o Congresso e da liderança política do presidente, já que o regime é presidencialista. Sem isso, o que se tem é uma profunda indefinição, que compromete o futuro imediato do País. Como alertou o presidente da Suzano, Walter Schalka, a propósito da necessidade de atrair investimentos estrangeiros, “quem ainda não está aqui não vai colocar dinheiro no País diante dessas incertezas”.

O Estado de S. Paulo

A Otan aos 70 anos

Ironicamente, como se a guerra fria se repetisse como farsa, as maiores fontes de instabilidade na aliança hoje são os presidentes da Rússia e dos Estados Unidos

Em reportagem dedicada à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que completa hoje 70 anos, a revista The Economist pontuava que a aliança “merece um retumbante ‘feliz aniversário’. Manteve a paz por 40 anos de guerra fria, protegeu a Europa ocidental do comunismo, ajudou a estabilizar a Europa central após o colapso da União Soviética e possibilitou uma prosperidade sem precedentes”. O sucesso foi tão grande que ela integrou em si os sete países satélites da URSS na sua nêmesis, o Pacto de Varsóvia. Paradoxalmente, esse triunfo leva muitos críticos a questionar sua pertinência num mundo multipolarizado. Mas, desde a queda do Muro de Berlim, ela adotou uma estratégia de defesa de 360 graus, atuando para pacificar os Balcãs e em ações contra o jihadismo no Afeganistão, Iraque e Líbia e contra a pirataria na Península Somali.

Ironicamente, como se a guerra fria se repetisse como farsa, as maiores fontes de instabilidade na aliança hoje são os presidentes da Rússia e dos Estados Unidos. Com a ascensão do ex-coronel da KGB Vladimir Putin, a Rússia passou a exercitar seus músculos no Báltico, explorando, nas palavras do diplomata britânico Peter Ricketts, “a área cinzenta entre intimidação e subversão e conflito aberto” com táticas híbridas de desinformação e agressão de tropas mercenárias. Deste lado do Atlântico, Donald Trump já declarou que a Otan é “obsoleta” e alegou que seus aliados estão “se aproveitando” dos EUA, chantageando-os com a retirada caso não investissem mais em defesa. De fato, este é de longe o ponto mais crítico da aliança.

Os membros europeus da Otan têm um PIB dez vezes maior que o da Rússia e eles gastam quase quatro vezes mais com defesa. Apesar disso, a contribuição para o orçamento da Otan dos países da União Europeia – sem contar a Grã-Bretanha, à beira de deixá-la – é de meros 20%. Se um tweet de Trump anunciasse a retirada dos EUA, o panorama seria sombrio. Comparada à autocracia russa, a união consensual entre as dezenas de membros da Otan já é suficientemente atravancada. Numa coalizão exclusivamente europeia, sem a mão pesada dos EUA, seria ainda mais. Segundo Jonathan Eyal, do Royal United Services Institute, seria um “frenesi de atividade, uma cacofonia de cúpulas”, que, na opinião do funcionário da Otan Michael Rühle, “iria arrebatar os europeus política, financeira e militarmente.”

Malgrado esses problemas, a Otan parece estar mais forte do que nunca. Dos 12 países iniciais, hoje conta com 29, que cobrem mais de 930 milhões de pessoas e respondem por mais de 70% dos gastos mundiais com defesa. A Otan tem o apoio majoritário do Congresso e da população dos EUA, e Trump, com sua ambivalência característica, já declarou que a aliança “não é mais obsoleta” e que os EUA estão “com a Otan 100%”. Mais importante, em sua gestão os EUA aumentaram sua presença militar na Europa em 40%, em resposta à anexação da Crimeia pela Rússia. Como parte dessa mesma iniciativa, chamada de Dissuasão Europeia, os europeus já investiram US$ 87 bilhões a mais, e pactuaram que até 2024 atingirão a meta de investir 2% de seu PIB em defesa.

Assim, a aliança parece estar respondendo bem ao desafio lançado por seu primeiro secretário-geral, Lord Ismay, de manter “os russos fora, os americanos dentro e os alemães abaixo”, com a diferença de que, agora, trata-se de manter os alemães acima, sobretudo nos aportes de recursos. Quanto à Rússia, apesar do oportunismo de Putin bombeado por seu aparato nuclear, é um poderio que tende a diminuir e se regionalizar.

As novidades no horizonte são a revolução digital e a emergência da China. A Otan já reconheceu que, além de mar, terra e ar, o ciberespaço é um quarto domínio de guerra, e Putin mostrou que não terá escrúpulos de estender suas aventuras beligerantes a ele. Quanto à China, embora não seja uma ameaça militar eminente, é sempre um regime autocrático, em vias de se tornar a maior potência econômica mundial, com manifestas ambições no campo da inteligência artificial, big data e computação quântica, todas com vastos usos militares.

A Otan certamente tem trabalho à frente na defesa da ordem liberal. Mas, como disse seu atual secretário-geral, Jens Stoltenberg, ela é “a mais forte e mais bem-sucedida aliança da história, porque fomos capazes de mudar”.

Folha de S. Paulo

Teoria do vácuo

Sinais de desgaste episódico de Jair Bolsonaro estimulam a concorrência política, uma onda que o governador paulista, João Doria, ensaia aproveitar

A espécie de corredor polonês em que se meteu, por seus próprios atos, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) nas últimas semanas redespertou um truísmo da sabedoria política: não existe vácuo no poder.

Quem não o exerce com a mínima eficácia logo atrai outros atores sequiosos por praticá-lo em seu lugar. Nesse sentido, a percepção de enfraquecimento episódico do presidente ensejou demonstrações de força do Congresso.

Elas ocorreram seja na votação surpreendente da proposta que engessa mais o Orçamento, seja em conversas menos explícitas sobre manejo autônomo da pauta de votações pelos parlamentares ou sobre reformas profundas para subtrair prerrogativas do Executivo.

O líder que vacila também estimula a concorrência direta. Figuras que cogitam disputar a Presidência da República em 2022 buscam contrastar-se com o incumbente.

Partidos de esquerda esboçam uma união, embora nada tenham dito de novo ou alvissareiro em suas manifestações. Quem esteve mais próximo da corrente que atropelou lideranças tradicionais em 2018 também percebe a oportunidade de dar seus vagidos emancipatórios em relação a Bolsonaro.

Este parece ser o caso do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que correu a declarar apoio entusiasmado ao postulante do PSL tão logo se definiu o segundo turno presidencial. Agora, em entrevista à Folha, dá a impressão de que começa a tomar certa distância do bolsonarismo governista.

Doria criticou a decisão de determinar a comemoração do golpe de 1964, bem como as tentativas de reescrever a história baseadas no infantilismo ideológico de um núcleo que influencia o Planalto. Também mitigou mensagens belicosas sobre emprego da força policial que difundiu na campanha.

Afirmou que nunca esteve colado a Bolsonaro e que, portanto, não estaria agora se descolando dele. A frase é boa, embora inexata.

Já na montagem de seu secretariado, com quadros de boa qualidade técnica e experiência na gestão pública, João Doria se diferenciava do método heterogêneo utilizado pelo presidente da República para definir os seus ministros.

O afastamento, entretanto, se mostra apenas relativo porque o governador paulista mantém-se alinhado à administração federal em temas centrais, como a reforma da Previdência e a agenda de liberalização econômica.

Afigura-se firme sua conexão com o ministro da Justiça, Sergio Moro, evidenciada na transferência de chefes de facções criminosas para presídios federais.

No conteúdo, Doria ensaia uma correção de rota para melhor. Fica a dúvida — que sempre vai acompanhá-lo após o abandono precoce da prefeitura paulistana — sobre se o faz por mero oportunismo.

Folha de S. Paulo

A imagem da PM

Um país que se quer civilizado não pode aceitar a cifra de 5.159 mortos pelas mãos da polícia, como ocorreu no Brasil em 2017. Apenas quatro anos antes, a letalidade policial havia vitimado menos da metade disso, 2.112 pessoas.

A violência estatal, portanto, recrudesce. Não é descabido, ademais, o temor de que a situação possa deteriorar-se com o avanço de teses caras ao bolsonarismo como a perigosa ampliação do conceito de legítima defesa.

Verdade que foram abatidos no país, no ano retrasado, 367 agentes (ante 490 em 2012), um patamar também inaceitável. A desproporção com o outro número, entretanto, é patente e sintomática.

Em 2018, contaram-se no estado de São Paulo 851 mortos pela polícia e 60 policiais assassinados. Uma quantidade enorme, mas aquém da que se observou no Rio de Janeiro, com população 62% menor e quase o dobro de vítimas de forças de segurança (1.534 em 2018).

Eis aí um sinal sugestivo de que a PM paulista segue trajetória diversa da fluminense, cuja letalidade avançou durante os meses de intervenção federal. Em São Paulo, espera-se agora que a violência excessiva de alguns profissionais termine contida ainda mais por uma providência simples: câmeras como parte do uniforme.

Não se conte com uma panaceia, por certo. Os dispositivos destinados a incrementar a transparência durante operações policiais serão incorporados como procedimento da tropa de maneira paulatina, começando por não mais de 4 batalhões na capital e 2 no interior (são 52 só na Grande São Paulo).

Além disso, agentes mal intencionados podem desligar o equipamento quando praticarem abusos — já se conhecem casos de profissionais que retiram da farda a faixa com sua identificação.

Mas serão a exceção à regra, dado que a maioria terá interesse de ver documentada as ações legítimas e não raro corajosas que têm de praticar na defesa dos cidadãos.

A primeira fase envolve investimento de R$ 5 milhões, valor baixo diante do orçamento anual de R$ 16 bilhões da corporação. É desejável que, após análise do experimento inicial, câmeras passem a compor o fardamento de todos os PMs nas ruas — sobretudo naquelas unidades, como a Rota, mais associadas com a letalidade.

Ninguém duvida de que compete ao policial reagir com violência proporcional à agressão de criminosos, no intuito de proteger a própria vida, as de companheiros e as de civis. O registro de imagens permitirá destacar melhor os que o fazem em obediência às leis.

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