NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE
A atribulada audiência do ministro da Economia, Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ontem, revelou que ele está só na busca de economizar R$ 1 trilhão em 10 anos com as mudanças. Guedes foi muito atacado pelos petistas, mas deu seu recado de que não é possível o país continuar gastando R$ 700 bilhões com a Previdência e apenas R$ 70 bilhões com a Educação. Entretanto, deixou no ar falta de apoio na base do governo ao projeto integral, e também revelou certo desconforto com o fato de a própria base querer modificar a proposta. O presidente Jair Bolsonaro ter emitido sinais de que o problema da aprovação da reforma é do Congresso, e não do governo.
Guedes insistiu muito na tese de que uma reforma meia boca custará mais caro no futuro. No entrevero com os petistas, rechaçou cobranças ao atual governo, acusando a oposição de desperdiçar a oportunidade de ajustar a Previdência à realidade atuarial por um custo muito menor nos 18 anos que esteve no poder. Para o ministro, “faltou coragem”. Segundo ele, o aspecto fiscal da reforma é imperativo: “A principal componente de alta dos gastos foi com pessoal e, dentro disso, o elemento do deficit galopante tem sido a Previdência”, disse.
O ministro da Economia afirmou que o Brasil tem despesas previdenciárias muito elevadas, mesmo tendo uma população bastante jovem. Comparou a situação do Brasil com a de outros países: “Existem sistemas que quebraram, a Grécia, e estamos vendo o exemplo de Portugal. Imaginamos como não deve estar o problema previdenciário na Venezuela hoje”. Na sua avaliação, a economia de R$ 1 trilhão que pleiteia é essencial para que se possa fazer uma transição do sistema de repartição para o de capitalização, que, na sua opinião, é a solução definitiva para o problema previdenciário.
Mudanças
A reforma da Previdência, porém, está perdendo base de sustentação por causa da ausência do presidente Jair Bolsonaro nas articulações políticas. Enquanto Guedes tenta aprovar a reforma ideal, o presidente da República fala em reforma possível, sinalizando para a própria base do governo que lava as mãos em relação às mudanças que forem feitas no Congresso. Há, sim, parlamentares governistas que defendem, integralmente, a proposta do governo, mas são uma minoria. A maioria já decidiu, por exemplo, fulminar as novas regras de concessão da aposentaria rural e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) concedido a idosos de baixa renda na própria Comissão de Constituição e Justiça.
Por enquanto, além de Guedes, somente o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o secretário de Governo, general Santos Cruz, estão empenhamos no corpo a corpo com os parlamentares para articular a base do governo no Congresso. Bolsonaro ainda não entrou em campo, espera-se que faça isso nesta volta de Israel, onde foi pródigo em declarações polêmicas e econômico na defesa da reforma. Não é normal o presidente da República e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não terem sentado para conversar sobre a aprovação da reforma.
Ontem, a expectativa na base do governo era de que o presidente da República mudaria de atitude em relação à reforma, se reunindo com a base para tratar do assunto após chegar da viagem a Israel. Com o tempo perdido, o ambiente favorável à reforma no Congresso começa a mudar; o governo perde apoio popular, em razão das confusões criadas por alguns ministros e declarações polêmicas do próprio presidente da República. Bolsonaro precisa se comprometer efetivamente com a aprovação da reforma.
Orçamento
Do outro lado do Congresso, o Senado aprovou, por ampla maioria, a proposta de emenda à Constituição do Orçamento Impositivo, que engessa ainda mais as contas do governo, ao tornar obrigatória as emendas de bancadas estaduais, a exemplo do que já acontece com as emendas individuais de deputados e senadores. Um acordo com o líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE), para evitar um desastre no Tesouro, estabeleceu regras de transição para reduzir o impacto no Orçamento dos próximos dois anos. Um acordo de lideranças permitiu que a emenda constitucional fosse examinada na Comissão de Constituição e Justiça e votada em plenário duas vezes, num único dia. A proposta voltará à Câmara, para nova apreciação. (Correio Braziliense – 04/04/2019)