MANCHETES
O Globo
Após crise, governo teme que reforma seja desidratada
Decreto do governo cortará apenas 159 cargos
Um hospital onde crianças têm seus desejos realizados
Venezuela recebe militares e aviões russos
O Estado de S. Paulo
União dividirá com cidades e Estados R$ 17 bi do pré-sal
“O presidente precisa descer do palanque”, diz Pereira
Congressistas abrem mão de aposentadoria especial
Risco de ruptura em barragem põe cidade sob vigilia
Droga vence antes de chegar a doentes
Aviões russos desembarcam com militares na Venezuela
Relatório isenta Trump de concluio com a Rússia
May resiste no cargo para salvar Brexit
Folha de S. Paulo
Disparam denúncias de tortura em prisões de SP
Olavo é chulo, diz ministro general ao rebater ofensa
Após bate-boca, líder do governo na Câmara piora crise
Crise entre presidente e Maia leva investidor da Bolsa da pisar no freio
Com sobrevida alemã, brasileiro se aposenta 10 anos mais tarde
Investigação não vê conluio de Trump com a Rússia em eleição
Venezuela recebe aviões militares da Rússia com material e soldados
EDITORIAIS
O Globo
O retrocesso no combate ao sarampo
Com circulação do vírus, Brasil perde certificado de erradicação da doença dado pela Opas em 2016
A decisão já era esperada, mas, nem por isso, a notícia de que o Brasil perderá o certificado de erradicação do sarampo, conferido pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), em 2016, se torna menos desastrosa. É consequência natural da confirmação, em 23 de fevereiro deste ano, de mais um caso da doença no Pará, significando que o vírus já circula há 12 meses no país — a primeira notificação acontecera em 19 de fevereiro de 2018. Motivo suficiente para que o atestado de área livre do sarampo seja revogado pela instituição.
Na tentativa de estancar o prejuízo, o Ministério da Saúde anunciou que agirá para retomar o certificado nos próximos 12 meses. Mas será preciso ir além das boas intenções, já que o cenário da doença no país é preocupante. Segundo o próprio ministério, o Brasil teve no ano passado 10.302 casos confirmados de sarampo, espalhados por 11 estados, embora 90% deles tenham se concentrado no Amazonas. O pico da doença aconteceu entre julho e agosto, e pelo menos três unidades da Federação —Amazonas, Roraima e Pará —enfrentaram surtos.
Isso já seria motivo de preocupação, mas a situação se torna ainda mais complicada quando se observam os anêmicos índices de vacinação. Pelos números do Ministério da Saúde em 2018, divulgados mês passado, dos 5.570 municípios, praticamente a metade (49%) não atingiu a meta, que é de 95%. E as piores coberturas estão justamente nos estados em que elas são mais necessárias. No Pará, por exemplo, 83% dos municípios estão desprotegidos; em Roraima, 73,3%, e no Amazonas, 50%.
A reentrada do sarampo no Brasil teria acontecido a partir da vizinha Venezuela, país que, sob a cleptocracia de Nicolás Maduro, atravessa grave crise política, econômica e social. Mas o reaparecimento da doença tem sido verificado também nos EUA e em países da Europa e da África.
No Brasil, esse retorno certamente está relacionado ao fato de que, de mo-
do geral, os índices de vacinação têm despencado na última década, facilitando o reaparecimento das doenças.
Pode-se supor que em estados de grande extensão territorial, como Amazonas e Pará, que enfrentam surtos de sarampo, haja problemas de logística, mas os baixos índices de cobertura em praticamente todo o país mostram que o motivo não é esse.
O que tem de ficar claro é que a vacina é a maneira de se evitar que a doença se espalhe, levando o país a regredir, como agora, numa área em que já havia conseguido avançar minimamente.
É evidente que não se deve menosprezar o efeito dos ataques anti-vacinas que contaminam as redes sociais, mas, para combatê-los, existem campanhas educativas.
O fundamental é que autoridades dos três níveis de governo se mobilizem para que sejam alcançadas as metas de vacinação no país. Existem exemplos bem-sucedidos, como a disponibilização de doses em estações de transporte, onde há grande circulação. Há muitos outros. Basta querer agir.
O Globo
Lei Seca é exemplo de como mudar comportamentos na selva do trânsito
Números mostram que Operação, que completa dez anos, reduziu em 51% mortes por acidentes no Rio
Dez anos atrás, o Rio vivia uma epidemia de acidentes de trânsito. Um tipo, especificamente, desafiava autoridades e a sociedade em geral, pela repetição. Nas noites de sexta, sábado e domingo, jovens, muitas vezes ao volante de veículos possantes, empreendiam longas jornadas etílicas, que, não raramente, terminavam no meio do caminho, de forma trágica —as cicatrizes são visíveis até hoje, na forma de santuários improvisados em logradouros da cidade.
A combinação de álcool e direção sempre se revelou fatal. Equipamentos eletrônicos que flagram excesso de velocidade e avanço de sinal foram espalhados às centenas pelo Rio, especialmente em vias campeãs de acidentes, com as avenidas das Américas e Ayrton Senna, na Barra, e a orla da Lagoa Rodrigo de Freitas, mas não se mostraram suficientes para interromper essa aventura letal. Tanto quanto campanhas educativas e o próprio rigor das normas do Código de Trânsito Brasileiro, como a perda de pontos na carteira.
Essa conduta nefasta no trânsito só começaria a ceder a partir de março de 2009, com a implantação da Operação Lei Seca. Nesses dez anos, as blitzes conjuntas da PM com o Detran, sem local e dia predefinidos, e feitas simultaneamente em vários pontos, sinalizados por balões brancos, passaram a integrar a paisagem da cidade. E mais que isso: conseguiram modificar um comportamento que parecia imutável.
Essa transformação é constatada a olhos vistos, mas não faltam números para confirmá-la. Segundo a Secretaria estadual de Governo, em uma década, o número de mortes em acidentes de trânsito no estado caiu 51%. Em 2008, o seguro DPVAT pagou 5.173 indenizações aparentes de vítimas de acidentes fatais. No ano passado, foram 2.547.
Outro dado relevante mostra que o número de motoristas flagrados sob efeito de álcool caiu cerca de 50%. Significa que houve redução na quantidade de condutores que insistem em atropelar a lei.
No mês passado, o estado anunciou que as blitzes da Lei Seca passariam a ocorrer também durante o dia, e já se estuda a ideia de estender o teste para drogas como cocaína e ecstasy.
O fato é que a Lei Seca chega aos dez anos como exemplo bem-sucedido de ação para mudar um comportamento criminoso no trânsito. Essa inversão não aconteceu apenas pelo efeito educativo, mas principalmente pelo rigor. Quem é escolhido para se submeter ao teste do bafômetro corre o risco de perder a carteira, tero carro apreendido ou ser levado para uma delegacia, caso esteja embriagado. Ainda terá de pagar multa de R$ 2,9 mil. Talvez este seja o grande mérito dessa operação. Fazer cumprir o que estabelece a lei.
O Estado de S. Paulo
A harmonia entre os Poderes
Para voltar aos trilhos do desenvolvimento econômico e social, o País tem claras e imediatas necessidades. É preciso realizar reformas estruturantes, a começar pela reforma da Previdência. É preciso restabelecer um ambiente de normalidade e estabilidade jurídico-institucional. Há ainda um longo caminho no combate à criminalidade e à impunidade, mas nem tudo é corrupção ou podridão, e tratar o cenário nacional como terra devastada, além de injusto, significa pôr a perder muitas coisas boas construídas ao longo do tempo.
É preciso também amenizar a polarização político-ideológica. Compreensível numa campanha eleitoral, o clima de conflito, se estendido ao longo do tempo, esgarça as relações sociais e gera danos em todas as esferas da vida nacional. Se as atuais necessidades do País são evidentes, está claro também que os Três Poderes têm sido incapazes – ao menos, até o momento – de atender a contento a essas demandas. Na semana passada, houve um almoço em Brasília que reuniu a cúpula dos Três Poderes a respeito dos possíveis caminhos para, diminuindo as tensões entre Executivo, Judiciário e Legislativo, torná-los mais funcionais. É preciso, por exemplo, trabalhar coordenadamente para que a reforma da Previdência, prioridade nacional, seja de fato aprovada pelo Congresso.
“Há um intuito de todos de construir uma nova agenda e de aprovar a reforma da Previdência. Este encontro é um sinal importante, estamos construindo um pacto para governar o Brasil”, afirmou o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, anfitrião do almoço. Nessa trajetória de união e cooperação entre os Poderes é indispensável que o Executivo cumpra o seu papel. Desde a posse, tem causado perplexidade o fato de o presidente Jair Bolsonaro, em vez de buscar a união nacional, continuar alimentando polêmicas e fissuras, num clima de guerrilha eleitoral. No dia anterior ao almoço, por exemplo, o presidente da República compartilhou em sua conta no Twitter vídeo em que seu filho Carlos criticava a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da competência da Justiça Eleitoral.
Não é disso que o País precisa. Nesse reequilíbrio institucional em busca de maior funcionalidade, é também evidente a necessidade de o Ministério Público (MP) adequar-se às suas competências institucionais, sem que alguns de seus membros invadam outras searas ou agravem desnecessariamente as tensões. A Suprema Corte tem sido alvo de ataques, nas redes sociais, de grupos que desmerecem, desautorizam e ridicularizam todos aqueles que ousam ter opiniões divergentes das suas. É surpreendente, no entanto, que alguns desses ataques venham de membros do MP, cuja função é defender a ordem jurídica e o Estado Democrático de Direito. Para diminuir as tensões, é preciso também uma atitude de cooperação e de menos protagonismo dos ministros do STF.
Não poucas vezes, são os próprios integrantes da Corte que alimentam divisões, promovem embates e, mais grave, ferem o caráter colegiado do Supremo. É urgente a promoção de uma nova cultura no STF, mais disposta a aceitar a posição majoritária, a conferir estabilidade à jurisprudência ao longo do tempo, a restringir as decisões monocráticas para os casos imprescindíveis, a defender e a aplicar a Constituição e as leis, sem imiscuir-se com tanta frequência em trajetórias alternativas. O Congresso tem também papel especial na busca da funcionalidade institucional. É ele quem deve processar com diligência as reformas de que tanto o País precisa. A renovação ocorrida nas eleições passadas deve servir para banir velhos costumes que são absolutamente deletérios para o interesse nacional.
No entanto, tanto os antigos parlamentares como os novos não podem se furtar de fazer política, na melhor acepção da palavra. A decisiva contribuição do Congresso para o País decorre precisamente dessa busca por encontrar os consensos e propostas possíveis para os problemas nacionais. Não é no grito, na intolerância e, muito menos, na violência, física ou verbal, que o Legislativo cumprirá o seu papel. É essencial o diálogo entre Executivo, Judiciário e Legislativo. Mas o principal fruto que se espera desse diálogo é que cada um dos Poderes cumpra seu dever. Essa é a harmonia institucional de que o País precisa.
O Estado de S. Paulo
O novo surto de sarampo
A dura realidade do presente teima em esmaecer visões mais alvissareiras que se possa ter para o futuro do Brasil. O mesmo país que pleiteia o ingresso no grupo de elite das nações nos grandes fóruns internacionais ainda tem de lidar com mazelas que há muito não deveriam mais causar tanta preocupação. O registro de um novo caso de sarampo endêmico no País, ocorrido no dia 23 de fevereiro no Pará, marcou o período de um ano de “transmissão sustentada” da doença. Com isso, o Brasil perderá o certificado de país livre do sarampo que havia sido concedido pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) em 2016.
O novo caso de infecção viral foi comunicado à entidade pelo Ministério da Saúde há uma semana. O sarampo voltou a afligir os brasileiros no início do ano passado, a partir de Estados da Região Norte. Como é sabido, o País recebeu um grande afluxo de refugiados venezuelanos naquela região, o que, em alguma medida, explica o aumento dos casos de infecção, já que o país vizinho vem sofrendo com um surto da doença há mais tempo. Entretanto, não seriam casos em número suficiente para, por si sós, levar o Brasil a perder o certificado.
Especialistas em saúde pública alertam que caso a vacinação da população brasileira fosse adequada não haveria como um novo surto de sarampo se estabelecer no País. O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, disse que as taxas de vacinação no País caíram muito nos últimos anos, para bem abaixo dos 95% considerados ideais. “Nosso plano consiste em encaminhar medidas importantes ao Congresso Nacional como a exigência do certificado de vacinação, não impeditiva, para ingresso na escola e no serviço militar”, disse o ministro. Está prevista ainda a criação de uma secretaria para “monitorar os índices de vacinação no País”.
É bom saber que o Ministério da Saúde pretende agir para livrar o Brasil de uma condição vergonhosa e, no decorrer dos próximos 12 meses, adotar as medidas para obtenção de um novo certificado de país livre do sarampo. Porém, tendo-se em vista o que foi divulgado até agora, não há sinais claros de que isso se materializará no tempo desejado. Nosso sistema de vacinação pública é um caso de sucesso amplamente reconhecido no exterior. Segundo o Ministério da Saúde, anualmente são aplicados cerca de 300 milhões de doses de 25 diferentes tipos de vacinas, em 36 mil postos de saúde espalhados por todo o País. Ou seja, vacinas gratuitas não faltam, tampouco acesso a elas pela população. Falta bom senso. Segundo o Unicef, o País vai na contramão da tendência mundial que aponta para o crescimento do número de crianças vacinadas.
Em grande medida, a responsabilidade por esse retrocesso recai sobre pais e responsáveis. Tem sido observado o crescimento de campanhas antivacinação no mundo inteiro, por incrível que possa parecer, em especial no Brasil. Contribui para essa tolice irresponsável a disseminação de informações falsas pelas redes sociais quanto aos possíveis “males” que as vacinas poderiam causar para a saúde das crianças. Será inócua, portanto, a exigência do certificado de vacinação para matrícula de crianças em escolas, como pretende o Ministério da Saúde, caso seja mantido seu caráter “não impeditivo”. Se pais e responsáveis não são sensibilizados pela imensa oferta de informação científica confiável hoje disponível, faz-se absolutamente necessária uma ação mais incisiva do Estado para preservar a saúde de milhões de cidadãos.
Os não vacinados, convém lembrar, são um risco para toda a população. Há quem veja programas de vacinação estatal como uma forma de “violência stalinista” contra o cidadão. É o caso de Massimiliano Fedriga, político da Liga Norte, partido de extrema direita da Itália e um dos mais aguerridos defensores de movimentos antivacinação em seu país. Ironicamente, ele foi internado na semana passada após contrair catapora. O Brasil não precisa chegar neste nível de ridículo. Que prevaleça a sensatez.
O Estado de S. Paulo
Persistência no erro petista
Nos anos em que o PT esteve no governo federal, adotou-se, com enorme prejuízo para o País, a chamada diplomacia Sul-Sul. Em vez de defender o interesse nacional, a política internacional lulopetista esteve orientada por questões partidárias e ideológicas. O objetivo era atender ao projeto de poder do sr. Lula da Silva. Durante a campanha eleitoral do ano passado, o então candidato Jair Bolsonaro prometeu acabar com essa política. No entanto, a impressão é de que o País ainda não se desvencilhou do ranço petista.
Mesmo com todas as promessas de que a política internacional teria no governo Bolsonaro uma nova orientação, o Brasil teve relevante participação em conferência da ONU sobre a cooperação Sul-Sul. Realizada em Buenos Aires no final de março, a “Segunda Conferência de Alto Nível das Nações Unidas sobre Cooperação Sul- Sul” discutiu o papel da modalidade diplomática terceiro-mundista para a implementação da Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável.
Por ocasião da reunião, o próprio Itamaraty informou que o Brasil segue mantendo 380 iniciativas de cooperação Sul-Sul, distribuídas por 63 países em desenvolvimento ao redor do mundo. Ou seja, o governo do presidente Jair Bolsonaro continua apostando no erro petista. O Brasil deve ampliar as parcerias e oportunidades internacionais com todos os países possíveis, tendo sempre o interesse nacional como critério. Por exemplo, o Brasil é o maior exportador de carne do mundo, mas só tem acesso a cerca de metade dos mercados. O restante ainda está fechado ao produto brasileiro. Há, assim, um longo caminho de ampliação de oportunidades comerciais, nos mais variados campos, o que deve incluir necessariamente os países em desenvolvimento. O equívoco não é, portanto, estabelecer e ampliar relações com os países do hemisfério Sul.
O problema da tal “cooperação Sul-Sul” é subordinar a política externa a critérios ideológicos, com prioridades que não correspondem ao interesse nacional. Não tem por que o Brasil priorizar relações com os países em desenvolvimento sem que para isso existam motivos claros e objetivos. Como se sabe, a diplomacia terceiro-mundista do mandarinato lulopetista causou grandes danos para o Brasil, deixando o País em condição periférica no grande jogo político e econômico mundial. Sob o pretexto de promover a integração regional, o País alinhou- se a ditaduras companheiras na América Latina. E sob a desculpa de preocupar-se com a situação social do continente africano, o governo petista aproximou-se de cleptocracias africanas, em parcerias que em nada contribuíam para o desenvolvimento do País.
Enquanto isso, muitas oportunidades de acordos com outros países e blocos foram perdidas, por mera antipatia ideológica. A expectativa era de que o governo Bolsonaro fosse capaz de romper com essa política lulopetista. Não é, no entanto, o que se viu em Buenos Aires. A participação do Brasil na Cúpula Sul-Sul mostra também que não basta um discurso de campanha inflamado para mudar de fato a orientação do governo. É preciso realizar na prática a política prometida. Nesse sentido, o evento na Argentina é mais um alerta sobre a diferença entre fazer campanha eleitoral e governar de fato o País. Recentemente, em aula magna no Instituto Rio Branco, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, criticou o terceiro-mundismo, que teria levado a “uma aposta em parceiros que não foram capazes de nos ajudar no nosso desenvolvimento”.
Anuncia-se o diagnóstico crítico, mas a política criticada é mantida. O País deve parar de promover uma diplomacia tacanha, guiada por limitações ideológicas, de esquerda ou de direita. Urge retomar uma política externa historicamente equilibrada, de soluções de compromisso, de respeito ao direito internacional e disposta ao entendimento multilateral. O governo de Jair Bolsonaro tem sido pródigo em criticar e denunciar tudo o que acha que é “submissão ideológica”. Falta agora fazer.
Folha de S. Paulo
Em suspenso
Motivado por cautela diante de incertezas diversas, bloqueio de R$ 30 bi no Orçamento federal diz bastante sobre o estado geral da economia do país
A frustração do crescimento econômico se tornou também evidente nas finanças públicas. O Ministério da Economia anunciou que, por precaução, vai suspender gastos de quase R$ 30 bilhões neste ano, até segunda ordem, a depender de melhoras no cenário.
Conforme o jargão brasiliense, o governo recorreu ao contingenciamento, tradicional expediente de início de ano destinado a corrigir excessos de otimismo na elaboração do Orçamento e evitar o descumprimento de metas.
Dado que a maior parte das despesas tem caráter obrigatório, caso do pagamento de salários, aposentadorias e benefícios assistenciais, a contenção provisória deve recair, como é também de costume, sobre a conta de investimentos.
Esses desembolsos, em obras e equipamentos, estão à míngua desde 2015. No ultimo ano, mal passaram de R$ 50 bilhões, o equivalente a apenas 4% do gasto federal não financeiro — entre 2008 e 2015, essa proporção foi em média de 6,5%.
Nas estimativas da equipe econômica, a receita de impostos tende a ser menor do que a prevista na lei orçamentária deste 2019. A projeção para a expansão do Produto Interno Bruto, afinal, caiu de 2,5% para 2,2%. Além do mais, conta-se com a possibilidade de frustração de recursos vinculados à privatização e à exploração do petróleo.
Está claro, decerto, que se trata apenas de cálculos e procedimentos de cautela. No curto prazo, a arrecadação tem comportamento um tanto errático e, assim, pode vir a surpreender de modo positivo, mais adiante.
No entanto o contingenciamento diz bastante sobre o estado geral da economia brasileira.
Mesmo que a receita pública se recupere, a perspectiva por ora é de contenção, de menos obras e de maior degradação da infraestrutura nacional, com efeitos de arrasto no setor privado.
No conjunto das atividades, o sentimento não se mostra diferente. As previsões para o crescimento da produção e da renda se tornam mais modestas — dependem, em particular, da duvidosa capacidade política do governo para o avanço de reformas.
Sem garantias de que o conserto virá, empresários e consumidores também contingenciam gastos, a sua maneira. O resultado é uma economia quase estagnada em um patamar baixo de emprego.
A incerteza não tem efeitos apenas sobre a programação de gastos do governo, das famílias e das firmas. Também a política monetária vive momento de indefinição.
Discute-se cada vez mais a adequação do nível da taxa de juros básica, que o Banco Central deixou mais uma vez intocada na semana passada. Acentua-se a percepção de que existe margem para reduzi-la, mas adia-se a decisão devido à insegurança quanto ao sucesso das reformas no Congresso.
Trata-se de um país em suspenso, portanto, à espera dos sinais do governo Jair Bolsonaro (PSL), até aqui pouco encorajadores. O panorama atual inspira, nos setores público e privado, mais cautela do que esperança e ousadia.
Folha de S. Paulo
Neurose ambiental
Já é desconfortável o bastante que o governo Jair Bolsonaro (PSL) ostente um ministro do Meio Ambiente na condição de réu acusado de improbidade administrativa quando secretário estadual em São Paulo. Ricardo Salles, ademais, dá seguidas mostras de que pretende acumular conflitos na pasta.
Baixou, por exemplo, uma norma apelidada de “mordaça” no Ibama, por proibir dirigentes de dar entrevistas sem autorização da assessoria de imprensa do ministério. Exonerou 21 dos 27 superintendentes regionais da autarquia detestada pelo presidente e pescador por ela autuado.
Chamou o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, para inspecionar na sede do BNDES contratos de financiamento de projetos do terceiro setor com recursos do Fundo Amazônia. Desconfiança: que uma doação da Noruega custeie o que Salles já chamou de “indústria das ONGs ecoxiitas”.
O banco atua como gestor do fundo, seguindo normas de governança aprovadas pelo governo federal. Pouco mais da metade dos projetos apoiados procedem, com efeito, do terceiro setor, mas as ONGs até aqui levaram somente 38% das verbas comprometidas.
O estilo paranoide atingiu, na última investida, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), órgão que atua na formulação de normas e critérios para a aplicação de leis ambientais.
Conta mais de uma centena de membros titulares e suplentes, representando cinco setores: órgãos federais (26 titulares), estaduais (27) e municipais (8), entidades empresariais (8) e sociedade civil (22, portanto minoria).
Na primeira reunião do colegiado, Salles lançou mão de medidas um tanto intimidatórias. Transferiu o encontro do auditório amplo do Ibama para um na sede da pasta, mais acanhado. Designou lugares marcados a cada titular, por ordem alfabética, como se fora uma classe de ginasianos.
Embora previsto em regimento, negou direito à palavra aos suplentes. Manteve-os segregados em outra sala, com ajuda de seguranças. Um inconformado terminou agredido e teve os óculos quebrados.
Salles confunde dirigir com impor e debater com ditar. Desgasta-se desnecessariamente na condução de sua pauta revanchista.