Partidos exigem mudanças na PEC da reforma
Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro – Valor Econômico
Partidos que representam 282 deputados na Câmara divulgaram ontem nota dizendo que serão contra três pontos da reforma da Previdência proposta pelo governo: a desconstitucionalização das regras previdenciárias e as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado para idosos de baixa renda, e na aposentadoria rural.
O posicionamento pode dificultar a alteração do regime de repartição, sistema em que as contribuições dos trabalhadores da ativa e das empresas pagam o benefício de quem já está aposentado, para o regime de capitalização. De acordo com o anúncio feito pela equipe econômica no mês passado, na capitalização brasileira cada trabalhador faria sua própria poupança e o governo só garantiria o pagamento de um salário mínimo para aqueles que não conseguiram atingir nem esse nível de economia.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma só estabelece as diretrizes para o regime de capitalização e deixa para lei complementar definir as regras. Segundo o Valor apurou, os partidos não discutiram esse ponto a fundo e não há oposição antecipada a que as regras da capitalização sejam jogadas para a lei complementar, mas também não há apoio.
Se for mantido o entendimento de que as regras do sistema precisam estar na Constituição para garantir a segurança jurídica da população, o governo terá que mandar outra PEC para estabelecer como funcionará a capitalização. A tramitação seria muito mais longa e exigiria apoio muito maior do que o governo espera. São necessários 257 deputados, dos 513, para aprovar uma lei complementar, ao passo que para dar um aval à PEC são necessários 308.
Líderes disseram que há uma resistência conceitual em se jogar regras que hoje estão na Constituição para leis complementares. “A minha opinião é de que a alíquota e idade mínima podem ser por lei complementar, por serem mais transitórios, mas que as regras de como funcionará a capitalização precisam estar na PEC”, disse o representante do Cidadania (antigo PPS), deputado Daniel Coelho (PE).
Além da demora maior, a sinalização dos partidos reduz a economia esperada pelo governo com as regras na aposentadoria rural – o Ministério da Economia não divulgou o valor exato de cada ponto do projeto, mas o impacto total da proposta era de R$ 1,1 trilhão em 10 anos.
A alteração proposta no BPC, outro ponto vetado pelos partidos, criaria um benefício de R$ 400 para os sexagenários, que seria elevado ao salário mínimo depois que o beneficiado completar 70 anos. Hoje, o idoso carente começa a receber salário mínimo aos 65 anos. Na aposentadoria rural, o governo quer aumentar a idade mínima e estabelecer 20 anos de contribuição.
Na nota, os 12 partidos dizem que a reforma “deve ter como princípios maiores a proteção aos mais pobres e mais vulneráveis” e por isso resolveram retirar da proposta a “parte que trata de forma igual os desiguais e penaliza quem mais precisa”. Também não permitirão a “desconstitucionalização generalizada” para garantir a segurança jurídica de todos. A exclusão deve ocorrer apenas na comissão especial, após votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Assinaram o documento: DEM, PP, PR, PSD, PRB, Pode, PTB, MDB, SD, Cidadania, Patri e PSDB. As mudanças também têm apoio da oposição – um representante do PCdoB participou da reunião na segunda-feira, na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para elaborar o documento.
Esses partidos também querem que o PSL assuma a relatoria da reforma na CCJ e na comissão especial. “Isso dará oportunidade de o governo indicar alguém da sua estrita confiança e o único partido que está na base do governo hoje é o PSL do presidente”, disse o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA).
O posicionamento ocorre num momento de conflito entre o Congresso e o governo Bolsonaro. Alguns líderes chegaram a levantar até a possibilidade de votar a reforma da Previdência do governo Temer como alternativa, mas isso foi de pronto descartado por Maia. Segundo fontes, ele acha que isso tiraria força da reforma, daria espaço para a oposição reclamar da falta de debate e munição para Bolsonaro jogar no colo dos deputados uma eventual derrota – ou até de receber as benesses da aprovação sem o desgaste de defender o projeto.