Antes da Chuva de Milcho Manchevski (1994) é um filme que se passa em sua maior parte na Macedônia, ambientado no esfacelamento da Iugoslávia. Seu roteiro utiliza a técnica elíptica, utilizada também em Pulp Fiction (Quentin Tarantino, 1994), essa técnica de narração embaralha o tempo cronológico em relação ao dramatúrgico, ou seja, o encadeamento início, meio e fim, não seguem a ordem cronológica natural, mas a que interessa para a narração do enredo e do entendimento da história real que o autor quer contar, se alternando. No caso, uma sociedade macedônia dividida em religiões antagônicas, que até poucos anos antes eram amigas e até tinham relações românticas, mas no momento do filme se preparam para a guerra e extermínio de um e de outro.
O nome do filme vem da frase repetida ao longo do filme com personagens olhando para o céu e avaliando as nuvens: vai para chover, uma analogia à guerra que virá. Como o filme tem o tempo elíptico, a guerra já pode ter ocorrido ou estar ocorrendo.
Olhando para o céu da política brasileira de hoje, nos traz também a impressão nítida de nuvens de chuva, a qual talvez já esteja ocorrendo sobre nós. As postagens nas redes Bolsonaristas que acabaram estancando a crise entre o presidente do executivo e o da câmara, associavam o Rodrigo Maia à prisão do ex-ministro Moreira Franco, além dos ataques ao STF, com deputados da base pedindo o impeachment de ministros do supremo. Radicalizando o discurso, o próprio presidente insinua que articulação política seja na verdade, as práticas criminosas de governos anteriores, estimulando a população ao seu projeto anti-político, afinal foi a narrativa que o elegeu, de descartar congresso e supremo e governar diretamente com a vontade popular, da qual ele seria o catalisador, manifestas nas rede sociais. Pois por ser um homem simples, que compra camisa do seu time de futebol no camelô, camisa pirata mesmo, e se reúne com ministros com roupas de ocasião, erra concordância, bem ao estilo Roriz, e vai as redes perguntar o que é Golden Shower, pergunta que poderia ter sido feita em privado a um assessor ou até mesmo ao GSI, se lhe fosse importante saber. Mas na verdade sua busca era a de provocar a balbúrdia que queria e conseguiu.
Apesar do peso, as redes sociais não são o povo brasileiro em sua totalidade, e na verdade são bolhas hipertrofiadas com uso de robôs. Ao que parece, até agora, a Força é refratária a aventuras golpistas e o demonstrou barrando as iniciativas do chanceler, seu filho Eduardo e do próprio presidente, de apoiar e até se envolver em ação militar na Venezuela.
A sociedade não joga parada e em recente jantar com empresários na FIESP, o vice-presidente Mourão precisou reforçar o apreço do presidente pela democracia. Jantar lotado, seu simbolismo é o de que os empresários já procuram Mourão, o que também traz o perigo conhecido de nossa república de vice-presidentes, tradição que se inicia logo no primeiro mandato com o Marechal Floriano, o marechal de ferro, que deu no que deu.
Ferro e fogo é o que o Brasil não precisa, pelo contrário é preciso que todos tenham a ciência de seu papel na república e no fortalecimento das instituições, para que a democracia resolva. Nenhum céu de brigadeiro irá nos iluminar se não superarmos a pauta econômica, e nesse caso, a probabilidade de chuva aumenta, e um vento pode evoluir pra ciclone tropical.
Paulo Siqueira é diretor de cinema e escritor