Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (29/03/2019)

MANCHETES

O Globo

Trégua entre Maia e Bolsonaro pode destravar reforma
Governo estuda incentivo para estado que privatizar
Justiça condena Picciani, Paulo Melo e Albertassi
Temer vira réu no caso da mala com R$ 500 mil
Trecho da Norte-Sul é arrematado por R$ 2,72 bi
TSE multa Haddad por campanha contra Bolsonaro
Após crítica, Brasil amplia ajuda a Moçambique
Receita do petróleo cai 75% na Venezuela

O Estado de S. Paulo

Guedes e Maia vão tocar a Previdência por conta própria
Acordo é fechado para acelerar pacote anticrime
Empresários se mobilizam para blindar reforma
Temer vira réu no caso da mala de R$ 500 mil
Rumo leva Norte-Sul por R$ 2,7 bilhões
TSE multa Haddad por campanha
Chanceler diz que ‘fascismo e nazismo são de esquerda’
Jerusalém pode ter só escritório do Brasil

Folha de S. Paulo

Bolsonaro e Maia mudam de tom e ensaiam pacificação
Reaproximação leva a modo montanha-russa, Bolsa sobe e dólar cai
Para Guedes, reforma vai deslanchar após trégua
Temer se torna réu em caso da mala de R$ 500 mil da JBS
‘Comemorar’ vira ‘rememorar’ em fala sobre 1964
Ibama exonera fiscal que autuou Bolsonaro por pescaria ilegal
TSE multa campanha de Haddad por conteúdo irregular contra rival
Para TSE, autorizar abate em cultos afro é constitucional
Jerusalém pode ter escritório no lugar de embaixada

Valor Econômico

Guedes fará articulação política da Previdência
Estreante do PSL será relator da reforma
Banqueiros pedem fim de bate-boca
Campos evita discutir tese de Lara Resende
Brasil tem 12 dos mais influentes cientistas
Secretaria quer coibir abuso em telemarketing
BRF vai produzir na Arábia Saudita

EDITORIAIS

O Globo

O confronto como método é receita para o fracasso

Manter-se em campanha é grave erro de Bolsonaro, que ontem, porém, fez gestos de apaziguamento

Nestes quase 90 dias de poder, se há um método de governar do presidente Jair Bolsonaro, é o do confronto, o que tem produzido na política algo próximo ao caos. Depois de breve armistício, Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, passaram a quarta-feira em refregas. Em entrevista à TV Band, o presidente, indagado sobre os choques com Maia, em torno da articulação política para a aprovação do projeto da reforma da Previdência na Câmara, fez ironia com o fato de o marido da sogra do deputado, Moreira Franco, ter sido preso pela Lava-Jato fluminense: “ele está um pouco abalado com questões pessoais que vem enfrentando’..

No troco dado por Maia, o deputado afirmou que Bolsonaro está “brincando de presidir o Brasil”. Na tarde de quarta, enquanto a troca de salvas de artilharia entre Maia e Bolsonaro era retomada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, dizia no Senado que, se seus projetos forem rejeitados, não ficará. Mesmo que tenha atenuado a afirmação ao dizer que isso não acontecerá na “primeira derrota”, os mercados reagiram como previsto. O clima criado a partir do Planalto, degradando ainda mais o relacionamento entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, leva a que os agentes económicos, dentro e fora do país, trabalhem com a possibilidade concreta de serem baixas as chances de o governo aprovar seus projetos no Congresso.

Esta é uma conclusão racional, reforçada pela aprovação a toque de caixa, na Câmara, de projeto de emenda constitucional que amplia a já elevada parcela de despesas carimbadas previstas no Orçamento (de 93% para 97%). Tudo com apoio do PSL, partido do presidente, e comemoração do filho deputado, Eduardo Bolsonaro. Tamanha demonstração da falta de base no Legislativo estimula novas estocadas em um governo cujo chefe se recusa a trabalhar politicamente para viabilizar seus projetos.

Mas ontem foi um dia de apaziguamentos, nesta gangorra de humores que tem sido o governo Bolsonaro. Maia tomou café da manhã com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e parece terem se entendido sobre a tramitação do pacote anti-crime. O almoço foi reservado para o ministro da Economia, Paulo Guedes, com quem o presidente da Câmara já mantém contatos. Guedes voltou a demonstrar otimismo. Para completar o dia de relaxamento de tensões, o próprio Bolsonaro disse que os choques com Maia são “página virada”, que tudo não passou de “chuva de verão”

Resta esperar. Por exemplo, que o Planalto deixe de agir como se a campanha eleitoral não houvesse acabado. A própria determinação do presidente para os quartéis relembrarem o golpe de 31 de março de 64 é um ato de confronto. Coube aos generais, com bom senso, registrar, na Ordem do Dia que será lida na data, a importância da transição democrática.

Bolsonaro embarca sábado para Israel. Quando o então presidente Sarney se ausentava de Brasília, FH comentava: “a crise viajou…”

O Globo

Política externa está à margem dos interesses nacionais

Viagem de presidente a Israel é opção pelo alinhamento à agenda de Trump no Oriente Médio

Prevista para amanhã, a viagem do presidente Jair Bolsonaro a Israel é relevante porque deverá expor contradições de um projeto de política externa claramente incoerente nos fundamentos com os interesses do Estado brasileiro.

A principal motivação da visita presidencial é a opção pelo alinhamento mecânico à agenda de Donald Trump no Oriente Médio. Não se cuidou de analisar as implicações nem mesmo nas relações com as nações árabes e o Irã, compradores de metade da proteína animal produzida no Brasil.

Além de condicionar a diplomacia brasileira à lista de necessidades da Casa Branca, a viagem tem a conveniência política de reforçar laços com frações do ativismo neopentecostal e do ultraconservadorismo judaico, aliados eleitorais de Bolsonaro.

Tudo isso sob uma insólita concepção de Estado que o chanceler Ernesto Araújo tentou traduzir em Washington, há duas semanas. “Quando os cidadãos olham e enxergam apenas o Estado, isso não os transforma” —disse, no seu esforço de dar sentido lógico à atual política externa. “Porque o Estado não gera sentimentos” — continuou—, “e o ser humano é movido por sentimentos. Mas quando olham e enxergam a nação, surge um potencial incrível de criar energia e de unificar o país.” Arrematou lembrando o slogan eleitoral de Bolsonaro: “‘Deus acima de todos’. Aqui se introduz a concepção de uma realidade vertical, onde o ser humano sabe que possui uma dimensão espiritual e onde a vida não se reduz às leis da física. Com esse lema, o presidente está reconfigurando a realidade brasileira. Com apenas oito palavras está enfrentando o sistema. Um sistema que produziu, por exemplo, uma relação de indiferença ou de hostilidade para com os Estados Unidos”

Seria uma formulação cómica se não tivesse o caráter de anúncio de quem governa um país regido por Constituição laica, independente de fé religiosa. A ideia de transferência da Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém, por exemplo, confronta diretamente esse fundamento laicista da Carta, sem que seja possível indicar serventia a um só interesse nacional concreto.

Ao contrário, desde o enunciado rompe-se um compromisso de ponderação e equidistância preservado desde 1947, quando Oswaldo Aranha presidiu a sessão da ONU que levou à criação do Estado de Israel e de um Estado árabe, ainda inexistente.

Bolsonaro deveria visitar um símbolo desse legado de ponderação e equidistância, que ameaça destruir. No centro de Jerusalém há uma praça chamada Oswaldo Aranha. Fica próxima ao cemitério muçulmano.

O Estado de S. Paulo

Alta confusão, baixas expectativas

Turbulência na Bolsa, dólar em disparada, insegurança nos mercados e piora das expectativas compõem o balanço econômico dos primeiros três meses de governo do presidente Jair Bolsonaro. Todas as projeções de crescimento foram revistas para baixo desde o início do ano. O Banco Central (BC) cortou de 2,4% para 2% a previsão de aumento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entidade também oficial, reduziu sua expectativa de 2,7% para 2%. No mercado, a mediana das estimativas bateu em 2,01% no último fim de semana, segundo a pesquisa Focus, atualizada semanalmente pelo BC. Até o Ministério da Economia, responsável principal pelas finanças públicas e pela política de expansão dos negócios, baixou sua aposta. Segundo a conta revista, o PIB deverá avançar 2,2% neste ano, em vez dos 2,5% indicados no Orçamento-Geral da União. O cenário de susto estava armado no mercado financeiro e de capitais, na quinta-feira de manhã, quando o BC e o Ipea divulgaram suas novas projeções para a economia brasileira.

O dólar havia superado a cotação de R$ 4 no dia anterior, voltando aos níveis alcançados antes da eleição presidencial. A instabilidade continuava ontem, nas primeiras operações, quando o BC entrou no mercado com um leilão de R$ 1 bilhão. Foi uma operação fora da rotina, destinada a corrigir uma situação cambial considerada anômala. O mercado comprou todos os dólares oferecidos e o cenário se tornou menos turbulento. Além da venda de moeda americana, pelo menos dois fatores contribuíram para baixar a agitação. O presidente da República declarou superada sua briga com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o PSL, partido do governo, fechou questão a favor da proposta de reforma da Previdência. No meio da tarde, o mercado de câmbio estava mais tranquilo, mas o dólar continuava na vizinhança de R$ 3,93, uma cotação muito acima dos níveis observados desde o fim de 2018.

Não é fácil prever a duração do comportamento pacífico anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro nem o instante de surgimento de novas grandes tensões no Executivo ou, mais amplamente, na Praça dos Três Poderes. Também é difícil dizer, neste momento, como e por quem as negociações entre governo e Congresso serão conduzidas e como se comportarão os filhos do presidente Jair Bolsonaro. Se as expectativas mais otimistas – e talvez irrealistas – forem confirmadas, as incertezas serão atenuadas e um avanço econômico mais firme será engatado. O resultado talvez seja algo melhor que a expansão de 2%. Se os problemas políticos e administrativos se repetirem, talvez nem o pífio crescimento hoje projetado seja conseguido em 2019. Nesse caso, o resto do mandato do presidente Jair Bolsonaro poderá ser comprometido.

O BC reduziu as estimativas de crescimento para todos os grandes setores. Para a agropecuária, o corte foi de 2% para 1%. Para o conjunto da indústria, de 2,9% para 1,8%. Para a indústria de transformação, o segmento mais importante por seus efeitos de irradiação e pela qualidade do emprego gerado, a revisão foi de 3,2% para 1,8%. No caso da indústria extrativa, a redução de 7,6% para 3,2% reflete, entre outros fatores, os efeitos do rompimento da barragem de Brumadinho. Para o setor de serviços, o corte da projeção foi muito pequeno, de 2,1% para 2%. Do lado da demanda, o consumo familiar, ainda afetado pelo alto desemprego, deve crescer 2,2%, em vez dos 2,5% estimados no fim do ano.

O BC prevê inflação ainda bem comportada neste ano e nos próximos dois, mas isso dependerá, como já foi comentado em outros documentos, da manutenção de expectativas bem ancoradas. Expectativas favoráveis, como se lembra mais uma vez, poderão desaparecer, se o governo falhar na política de ajustes e reformas. Também ontem, a Fundação Getúlio Vargas informou um recuo do índice de confiança do comércio para 96,8 pontos, o nível mais baixo desde outubro. Dificilmente o presidente poderá culpar a imprensa por qualquer dessas pioras. Talvez ele pudesse pensar um pouco sobre isso.

O Estado de S. Paulo

Trump e as Colinas de Golan

Ao reconhecer, em 21 de março, a soberania de Israel sobre as Colinas de Golan, tomadas à Síria na Guerra dos Seis Dias, em 1967, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, exercitou mais uma vez seu voluntarismo, mais nocivo precisamente onde suas prerrogativas de chefe de Estado o liberam de alguns freios legislativos e judiciários: as relações internacionais. Localizado entre Israel, Síria e Jordânia, o planalto rochoso de Golan sempre foi palco de disputas por seus recursos hídricos. Era sobretudo uma fortaleza para a Síria. A 60 km da capital síria, Damasco, tornou-se, a partir de sua ocupação, um escudo nas mãos de Israel, que dali expulsou cerca de 150 mil sírios e estabeleceu assentamentos e postos militares. A comunidade internacional, a começar pelos Estados Unidos, sempre negou a legitimidade da ocupação, conseguindo que Israel ao menos considerasse a retirada em troca de concessões sírias. Assim, Trump contrariou décadas de políticas não só de seus antecessores, como também de seus aliados na ONU e na Otan, além do procedimento consensual em casos de ocupações territoriais: o não reconhecimento acompanhado da negociação diplomática.

Desde a 2.ª Guerra Mundial, os próprios Estados Unidos não reconheceram nenhum outro território ocupado. Agora abriram um precedente para que outras potências pisoteiem o direito internacional em ocupações forçadas – como a Rússia na Crimeia ou a China no Mar do Sul da China. O anúncio – via Twitter, naturalmente – muda pouco a situação no campo. Mas, antes de tudo, aquele que se vangloria de ser um “master negotiator” fez um péssimo acordo para seu país, entregando de graça uma alavanca diplomática importante só para prestigiar seu aliado, o premiê israelense, Binyamin Netanyahu, envolto em escândalos em plena corrida eleitoral. Mas é questionável que Israel mesmo saia ganhando. Segundo Fred Hof, ex-funcionário do Departamento de Estado responsável pelas negociações com a Síria, o anúncio será “bem acolhido pelos inimigos mais amargos de Israel – o Irã e o Hezbollah –, que verão a anexação como uma justificativa adicional para operações terroristas”.

O ditador sírio, Bashar al-Assad, por sua vez, tem a oportunidade de posar de vítima, desviando a atenção dos seus crimes de guerra. A reação dos países árabes só não foi pior porque nos últimos anos têm se aproximado de Israel como um aliado contra o Irã. Mas a promessa eleitoral de Trump de conduzir um acordo entre israelenses e palestinos se torna ainda mais irrealista, uma vez que estes últimos, já humilhados pelos cortes de recursos e pela mudança da embaixada norte-americana para Jerusalém, promovidos por Trump, têm mais motivos para temer que o mesmo reconhecimento possa acontecer na Cisjordânia, também ocupada na Guerra dos Seis Dias. É mais um episódio em que a personalidade instável de Trump desestabiliza as relações internacionais de seu país e do mundo – como a guerra comercial com a China, as ameaças de intervenção militar na Venezuela ou a retirada de acordos internacionais como o tratado nuclear com o Irã ou o acordo climático de Paris.

Trump parece transpor a sua cultura empresarial para as relações exteriores, como se estas fossem só negociações competitivas, e as conduz como fazia em seus reality shows, promovendo a imprevisibilidade e a rotatividade dos protagonistas para se manter como estrela do espetáculo. Com isso, acentua a velha ambivalência dos Estados Unidos em relação à multilateralidade diplomática. Como apontou a revista The Economist, “a vontade singular dos Estados Unidos de liderar fundindo poder e legitimidade serrou a União Soviética e os conduziu à hegemonia”, e a ordem mundial que os norte-americanos engendraram “é o veículo para esta filosofia”, mas “o sr. Trump prefere recair na velha ideia da lei do mais forte”. Com tamanha truculência, é cada vez mais difícil para a comunidade global acreditar num líder do mundo livre que não acredita no mundo livre.

O Estado de S. Paulo

Deserto de projetos

O governo Jair Bolsonaro parece ser uma fonte inesgotável de ideias e opiniões. Nas redes sociais, o presidente fala de tudo – das ideologias, do comunismo, dos costumes, da imprensa, da lombada eletrônica, da placa de automóvel e até de uma questão do Enem da qual ele discorda. Nos discursos, o tom é altivo. Seu papel não seria apenas o de chefiar o Executivo federal. De acordo com suas palavras, sua missão no Palácio do Planalto consistiria em refundar o País, com a instauração de uma nova ordem social, “libertando-o definitivamente do jugo da corrupção, da criminalidade, da irresponsabilidade econômica e da submissão ideológica”, como afirmou no discurso de posse. A abundância de ideias e opiniões do governo Bolsonaro contrasta, no entanto, com a ausência de projetos e políticas públicas para o País. Em recente entrevista ao Estado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, fez notar que, além do projeto de endurecimento das leis penais de Sergio Moro e da proposta de reforma da Previdência – que o próprio Jair Bolsonaro não assume completamente, dizendo que preferiria não ter de aprová-la –, o novo governo não tem um projeto para o País.

“Se tem propostas, eu não as conheço”, disse Rodrigo Maia. Ao falar da constante presença de Jair Bolsonaro e de sua família nas redes sociais, o presidente da Câmara lembrou um dado básico, que já havíamos ressaltado nestas páginas: “O Brasil precisa sair do Twitter e ir para a vida real. Ninguém consegue emprego, vaga na escola, creche, hospital por causa do Twitter. Precisamos que o País volte a ter projeto”. É um engodo a ideia de que se está construindo um novo Brasil, “livre de amarras ideológicas”, por força da atuação do presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais. E a população dá sinais de ter percebido essa realidade. As pesquisas de opinião indicam uma significativa deterioração da avaliação de Bolsonaro em menos de três meses de governo. A tarefa de governar o País é muito diferente do que simplesmente criticar políticas e ações públicas do PT no governo federal.

“Criticaram tanto o Bolsa Família e não propuseram nada até agora no lugar. Criticaram tanto a evasão escolar de jovens e agora a gente não sabe o que o governo pensa para os jovens e para as crianças de zero a três anos”, afirmou o presidente da Câmara. A ausência de propostas e projetos consistentes para o País contraria diretamente uma das promessas mais repetidas por Bolsonaro e seu entorno – de que o seu governo imprimiria um rumo completamente novo ao Brasil. Sem propostas para os problemas reais, não há como falar em novos caminhos para o País. A consequência imediata dessa incapacidade de apresentar propostas é a continuidade nos erros da era petista. Foi o que se viu, por exemplo, na participação do Brasil na “Segunda Conferência de Alto Nível das Nações Unidas sobre Cooperação Sul-Sul”. Apesar de todo o discurso de que o governo Bolsonaro imprimiria uma nova política internacional, o Brasil deu mais um passo no sentido de reafirmar a tal cooperação Sul-Sul, com suas conhecidas limitações e entraves para uma adequada inserção do País no cenário internacional.

Não se sabe quais são os projetos do governo Bolsonaro para a saúde pública, tema de primeira importância para a população. O mesmo acontece na área de educação. Ao abdicar de apresentar propostas concretas, o governo Bolsonaro reduz sua atuação a disputas verbais, agressões e escândalos. A manutenção do País num clima conflituoso de campanha eleitoral, que parece ser até aqui um dos grandes objetivos de Bolsonaro, condena, assim, o seu próprio governo a uma preocupante paralisia. Aquele que prometeu um novo Brasil parece agora mais interessado na repercussão de seus tuítes. As urnas deram a Jair Bolsonaro uma missão bem concreta e com precisas responsabilidades institucionais. Ao presidente da República cabe construir soluções para os problemas nacionais. A ausência de projetos é caminho certo para o fracasso. O País não merece tamanho descuido.

Folha de S. Paulo

Dominó e xadrez

Bolsonaro e Paulo Guedes, cujos atos enervaram os mercados, ainda precisam dar mostras de maior disposição para o jogo político mais complexo

Houve algo de revelador quando o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou, na terça (26), que não iria jogar dominó com os antecessores Michel Temer (MDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no xadrez.

O atual mandatário não corre hoje o risco de ir preso. Por outro lado, o desempenho presidencial indica que suas limitações e a lógica maniqueísta que lhe é peculiar o credenciam mais a abraçar o dominó que o xadrez — o jogo.

Diante de Rodrigo Maia (DEM), chefe da Câmara que o desafiou para o tabuleiro complexo do Parlamento, viu apenas as cores preta e branca. Não se deu conta de que o deputado está cercado por 512 peões, cavalos, bispos, reis e rainhas.

Maia lhe diz que é preciso ir a campo e negociar para aprovar a reforma da Previdência, e Bolsonaro lhe pespega de pronto a pecha de fisiológico, como se qualquer barganha política fosse corrupta.

Quando todos se voltavam para panos quentes, o presidente não resistiu a ironizar o parlamentar em tacanha entrevista na TV. Na mesma conversa de tergiversador, acusou esta Folha de inventar que elogiou o sanguinário ditador chileno Augusto Pinochet, coisa que fez em 2015 e nunca renegou.

Escolheu, por razões ideológicas, um ministro calamitoso para a pasta nevrálgica da Educação, Ricardo Vélez, que o próprio Bolsonaro agora reputa neófito e desprovido de tato político.

Todos sabem que cogita demiti-lo, mas o presidente espalha nas redes sociais desmentidos falaciosos só para achincalhar a imprensa como inventora de falsidades.

Em lugar de manter foco na vitória estratégica, a reforma do sistema de aposentadorias, ele e acólitos colecionam escaramuças com os que poderiam ajudar a aprová-la no Congresso. Suas catilinárias nas redes sociais são amplificadas, quando não terceirizadas, pela troca de filhos desbocados.

Justiça seja feita: Bolsonaro faz escola. Conta ainda, fora da família e no primeiro escalão do Executivo, com coadjuvantes propensos a falar mais do que devem.

O ocupante da superpasta da Economia, Paulo Guedes, compareceu na quarta-feira (27) a uma comissão do Senado no papel de apóstolo da nova Previdência, mas acabou por alimentar hipóteses sobre sua permanência no cargo, ao qual disse — em tom que parecia de desafio — não ter apego.

Bolsonaro e Guedes colheram o que semearam: assustados com a deterioração do clima político, seus apoiadores no mercado se retraíram, derrubando a Bolsa e fazendo a cotação do dólar disparar.

Guedes e o ministro da Justiça, Sérgio Moro, felizmente não perderam a capacidade de agir racional e calculadamente. Nesta quinta (28), acorreram ao Congresso para compor-se com Maia. O próprio Bolsonaro recuou e disse que o conflito era página virada, contribuindo p ara um dia de maior serenidade e recuperação dos mercados.

Que assim seja — e se provem exagerados os temores de uma espiral precoce de crise política e econômica. O presidente ainda dispõe de tempo para aprender xadrez.

Folha de S. Paulo

Cabide terceirizado

Parece ilimitada a imaginação criativa do mundo político-administrativo do país quando se trata de arquitetar estratagemas para beneficiar autoridades e apaniguados.

Não são apenas as tramas mirabolantes e bilionárias de desvios, como as que se tornaram públicas com a Operação Lava Jato; vicejam também maquinações menos espetaculares, embora também perniciosas no que representam de burla aos fins do serviço público.

Um desses casos prospera na Secretaria de Habitação da prefeitura paulistana. A repartição, como revelou esta Folha, utiliza empresas que mantêm contratos com o município para acomodar aliados, amigos e parentes de dirigentes políticos e servidores.

Não se destaca aqui apenas o abuso rotineiro de destinar cargos comissionados para simpatizantes da sigla contemplada no loteamento. Criou-se na pasta, chefiada por Aloisio Pinheiro (PRB), ligado à Igreja Universal, uma espécie de cabide de empregos terceirizado.

São as empresas contratadas para obras e assessorias técnicas que acolhem, numa folha de pagamento paralela, membros do partido, fiéis da igreja e parentes indicados.

Pinheiro, que era adjunto, chegou ao comando da secretaria neste ano, na gestão de Bruno Covas (PSDB). O prefeito, que assumiu em substituição a João Doria (PSDB), eleito governador, loteou o órgão — cujo Orçamento se aproxima dos R$ 500 milhões anuais — para o PRB, com o intuito de ganhar apoio da bancada religiosa.

Por meio da Lei de Acesso à Informação, a reportagem encontrou casos como o da irmã do presidente estadual da sigla, o pastor da Universal Sérgio Fontellas, que foi empregada pela empresa Gomes Lourenço para atuar em obras voltadas para áreas de mananciais.

Também outras duas fiéis da igreja, Luciana Cereser e Natália Garbini, passaram a trabalhar para a Simétrica, outra firma que presta serviços à secretaria. Os exemplos são muitos e indicam que motivações técnicas e interesse público foram relegados a segundo plano.

Embora tenha considerado que a responsabilidade é das empresas prestadoras, Bruno Covas disse nesta quinta (28) que pedirá à Controladoria Geral do Município (CGM) uma apuração sobre o caso. Menos mal, desde que não se trate de mera formalidade.

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