Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (06/12/2019)

MANCHETES

O Globo

Fernández planeja atos protecionistas e acena a Bolsonaro
Moro quer reincluir itens rejeitados no pacote anticrime
Doria recua e defende punir abusos de PMs em Paraisópolis
Polícia investiga morte de humorista no Morro do Dendê
O Bonequinho indica filmes imperdíveis do Festival do Rio
No bufê a quilo, a carne agora tem status de sushi
Cruzeiros em alta na cidade

O Estado de S. Paulo

Defesa e Ciência não poderão sofrer cortes, decide Bolsonaro
Tributo para educação e saúde pode ser menor
Crianças venezuelanas chegam sós ao Brasil
Atleta flagrado após uso de cocaína e maconha só receberá advertência
Lula articula chapa de Haddad e Marta em SP
Startup criada em 2011 com US$ 100 vale US$ 1,3 bilhão
Compra de até US$ 1 mil fora do País será isenta
Gestão Doria quer gravar policiais
França tem ato contra reforma previdenciária

Folha de S. Paulo

Doria recua e admite rever protocolo de ações da PM
Sob críticas, ministro de Energia deve ser trocado
Reforma faz INSS suspender análise de aposentadorias
Comitê pró-Bolsonaro não foi declarado à Justiça Eleitoral
Congresso manobra para ter fundo eleitoral sem desgaste
País corre risco de ter professores em excesso, diz estudo
Turista poderá trazer até US$ 1.000 em compras dentro do Mercosul
Eletricista atira na mulher, mata cinco e se suicida no litoral de SP
Greve contra nova Previdência para serviços na França

Valor Econômico

Títulos com ágio de 169% rendem R$ 1,6 bi a S. Paulo
Educação e saúde discutem novas alíquotas
Retorno cai e gestora devolve R$ 400 milhões
Maia busca conciliação em visita à Argentina
MST reduz invasões e avança nos negócios
Nacionalismo toma espaço do liberalismo

EDITORIAIS

O Globo

Volta da prisão na 2ª instância ganha fôlego no Senado

Perspectiva para o retorno à jurisprudência melhora com tramitação de projeto na Casa

Percalços ocorridos na caminhada da sociedade contra a corrupção e o crime organizado em geral têm sido atenuados nos últimos dias. A decisão do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, de acolher pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro para suspender investigação do Ministério Público sobre o cliente, aberta a partir de dados sobre movimentações financeiras atípicas detectadas ainda pelo Coaf, hoje Unidade de Inteligência Financeira (UIF), parecia o prenúncio de um retrocesso de dimensões inimagináveis.

Os advogados argumentavam que teria havido quebra ilegal de sigilo bancário. Para agravar os temores, Toffoli estendeu a decisão a todos os inquéritos semelhantes. Quase mil ficaram paralisados.

Felizmente, depois de várias sessões, na quarta-feira, dez dos 11 ministros da Corte — Marco Aurélio Mello ficou isolado — avalizaram a tese formulada com base em voto de Alexandre de Moraes pela qual volta-se à regra de que UIF e Receita podem compartilhar dados financeiros e fiscais com MP e polícias, antes que haja um pedido formal de quebra de sigilo, respeitadas regras razoáveis. Como em qualquer país civilizado.

No mesmo dia, ganhou velocidade a importante tentativa que o Congresso faz para restabelecer o início do cumprimento da pena na confirmação da sentença em segunda instância, revogada há pouco no Supremo pela maioria de apenas um voto.

Restabelecido o entendimento de que o conceito constitucional do “transitado em julgado” significa esgotar todos os incontáveis e abusivos recursos permitidos pela legislação brasileira, causa da prescrição de crimes, o Congresso passou a tratar de mudanças em textos de leis para evitar este retrocesso. Dos dois caminhos possíveis — por meio de Proposta de Emenda Constitucional ou de projeto de lei comum, neste caso, para alterar artigo do Código de Processo Penal (CPP) —, um entendimento entre Câmara e Senado deu prioridade à PEC, que se encontra na Câmara. Caminho mais longo, porém alegadamente mais seguro.

Quarta-feira, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), diante de um pedido formal de 43 dos 81 senadores, decidiu, corretamente, colocar o projeto de lei que altera o CPP em votação na semana que vem.

Não faz mesmo sentido esperar. Defende o ministro da Justiça, Sergio Moro, com razão, que os dois projetos devem tramitar ao mesmo tempo. O certo é que, incluída na Carta ou no CPP, a mudança — o cumprimento da pena a partir da segunda instância — será contestada no Supremo. Em que há pelo menos cinco votos favoráveis a ela. Basta uma conversão.

Uma preocupação deve ter estimulado senadores a defender a tramitação do PL: o temor de que a opção pela PEC se deva, com todas as vênias, a pressões dos interessados de sempre em que a lentidão proverbial dos tribunais continue favorecendo a impunidade.

O Globo

Mercosul é desafio à competência política de Bolsonaro e Fernández

É inconcebível que disputas personalistas entre líderes resultem em ameaças de ruptura no bloco

Jair Bolsonaro se apresenta como porta-voz do conservadorismo. Alberto Fernández, presidente eleito da Argentina, se define como progressista. Um parece decidido a não gostar do outro, e ambos ameaçam o Mercosul ao projetá-lo como reflexo das respectivas agendas domésticas.

Não importam as mútuas restrições, políticas ou pessoais. Bolsonaro e Fernández precisam se encontrar no pragmatismo, porque a partir da próxima semana serão responsáveis pelo destino desse bloco com 263,7 milhões de brasileiros, argentinos, paraguaios e uruguaios.

É fácil listar os defeitos de uma obra inacabada. Difícil é exercer a liderança, abstraindo personalismos, com vigor político e senso prático, para equacionar as diferenças entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, que não são insuperáveis, como no caso da tarifa externa comum.

A partir de quarta-feira, Bolsonaro e Fernández têm o desafio de consolidar esse instrumento de defesa de interesses geopolíticos regionais para negociar com Estados Unidos, China e União Europeia. Essa é a tarefa essencial que, se espera, eles demonstrem competência para realizar.

Até agora, o presidente do Brasil e o eleito da Argentina se refugiaram em negação da realidade: o Mercosul não é miragem econômica, é um dos maiores blocos do mundo, resultante da interdependência das respectivas populações. Elas constituíram uma base comum de riqueza de US$ 3 trilhões anuais, se medida pelo Produto Interno Bruto. Vai a US$ 4,5 trilhões, abrangendo 82,3% do PIB da América do Sul, se considerados os associados (Chile, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana e Suriname). Não é pouco.

Foi a percepção da política externa como fator de poder que levou o conservador Julio Roca, caudilho argentino do final do século XIX, a propor ao Legislativo brasileiro uma união Brasil-Argentina. Getúlio Vargas ouviu a mesma proposta do presidente Agustín Justo em 1935. Meio século depois, José Sarney e Raúl Alfonsín superaram rivalidades e inauguraram uma efetiva integração, que os sucessores formataram no Mercosul.

O bloco é um ativo inegável, amparado em preceito constitucional brasileiro. A habilidade de Mauricio Macri e Michel Temer, com aval de Bolsonaro, permitiu concluir 20 anos de negociações com a União Europeia num acordo transformador para 32 países nos dois lados do Atlântico.

É inconcebível que disputas personalistas, agora, entre líderes dos países-fundadores redundem em ameaças de ruptura do Mercosul. Na escassez de bom senso e pragmatismo, Bolsonaro e Fernández se arriscam a uma colisão com a História.

O Estado de S. Paulo

Quem paga a fatura maior

Como seu orçamento é muito apertado, os pobres pagam a conta mais pesada pelo repique dos preços da alimentação e da habitação em novembro

Os pobres pagam a conta mais pesada pelo repique dos preços da alimentação e da habitação em novembro. Como seu orçamento é muito apertado, as famílias de baixa renda são afetadas de modo especialmente doloroso por qualquer desarranjo nos preços ao consumidor. Não poderia ser diferente, porque sua pauta de consumo quase se restringe aos itens indispensáveis. No mês passado, o custo da comida subiu 0,60%, mais que revertendo a queda de 0,18% registrada em outubro. A conta de luz aumentou 2,85%. No mês anterior havia diminuído 3,26%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1 (IPC-C1), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Com isso, a inflação das famílias com renda mensal de 1 a 2,5 salários mínimos voltou a ultrapassar a dos grupos mais bem remunerados. A piora de condição das pessoas mais pobres torna ainda mais urgente movimentar os negócios e apressar a recuperação, até agora muito lenta, do mercado de emprego.

O custo do churrasco virou assunto de queixas e de humor negro nas últimas semanas, quando ficou evidente a grande alta de preços ocasionada pelo aumento das vendas à China. Com novo surto de peste suína, o mercado chinês passou a demandar volumes maiores de carnes produzidas em outros países. Lucram os criadores brasileiros e a conta de comércio ganha um reforço num momento de forte instabilidade cambial. Mas esses efeitos positivos impõem novos custos à maior parte das famílias, principalmente às de orçamento mais curto.

Vários bens e serviços consumidos pelas famílias com ganho mensal de 1 a 2,5 salários mínimos subiram mais em novembro do que no mês anterior, mas os maiores impactos vieram mesmo da carne e da eletricidade. Feito o balanço, os preços pagos por essas famílias aumentaram 0,56% no mês, 3,64% no ano e 3,98% em 12 meses. O indicador mais amplo e mais tradicional da FGV, calculado para famílias com renda mensal de 1 a 33 salários mínimos, aumentou 0,49% em novembro, 3,31% no ano e 3,61% em 12 meses. Na média, portanto, esse conjunto de consumidores ficou em posição menos desconfortável que a das famílias mais pobres.

O noticiário dos últimos dias mostrou ao mesmo tempo esse dado negativo, o novo aperto para a maior parte dos brasileiros, e alguns sinais de reativação econômica. O Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre foi 0,6% maior que o do segundo. A produção industrial continuou em crescimento em outubro, com avanço mensal de 0,8%. A construção civil tem reagido e deve terminar 2019 em alta, depois de cinco anos de retração.

Entre outubro e novembro diminuiu de 24,9% para 24,7% a parcela das famílias com dívidas em atraso. Ao mesmo tempo, a proporção das famílias com dívidas passou de 64,7% em outubro para 65,1% em novembro, um provável sinal de crédito mais amplo e mais acessível. Esse pode ser um fator adicional de expansão do consumo e de estímulo ao crescimento da economia.

Nada garante, por enquanto, a realização das boas promessas aparentemente embutidas nos vários sinais positivos. Mas a reação otimista a essas boas notícias pode também contribuir para a melhora das condições econômicas.

Essa melhora, no entanto, deixará de respingar em muitos milhões de famílias, se as condições de emprego continuarem mudando muito lentamente. Nesse caso, dezenas de milhões deixarão de partilhar dos ganhos de renda ou participarão de modo muito limitado. Se os preços de alimentos e outros itens essenciais continuarem pressionando os orçamentos, as melhoras para as famílias pobres serão nulas.

O ganho real de renda proporcionado pela inflação baixa será perdido ou talvez até revertido. Não se espera, já indicou a ministra da Agricultura, uma queda significativa dos preços das carnes em 2020.

Ganho de renda por meio de emprego é a melhor e mais segura solução para esse e para muitos outros problemas. A mera redução de direitos, principal fórmula até agora apresentada pelo governo, está longe de ser uma resposta aos problemas dos milhões de famílias mais afetadas pela crise.

O Estado de S. Paulo

Os desafios da Otan

Reunião da Cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) consolidou e ampliou abordagem de segurança, mas expôs conflitos internos

Setenta anos após ser criada para confrontar o império soviético de Stalin e 30 anos após a queda da Cortina de Ferro, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) congregou os líderes dos 29 países-membros para uma celebração ambivalente. Por um lado, a cúpula consolidou e ampliou sua “abordagem de segurança de 360 graus”, mas, por outro, expôs sem meias palavras seus conflitos internos.

Numa tentativa de mostrar unidade após os confrontos entre seus líderes, a Aliança concordou em promover em 2020 uma revisão de seus objetivos estratégicos. É uma das reações às provocações do presidente francês, Emmanuel Macron, que recentemente afirmou que, devido às manobras erráticas dos EUA e à desarticulação em zonas críticas como a Síria, a Otan estaria sofrendo “morte cerebral”. Numa curiosa inversão de papéis, coube a Donald Trump, que outrora acusou a Aliança de “obsoleta”, desagravar as declarações que classificou de “muito insultuosas” e “muito ignóbeis”.

A cúpula expôs também os atritos entre Macron e o presidente da Turquia, Tayyip Erdogan, em razão dos ataques no norte da Síria a militantes curdos, aliados da França, Grã-Bretanha e até recentemente dos EUA no combate ao Estado Islâmico. A Turquia, por sua vez, chegou a ameaçar bloquear os planos da Otan para a defesa da Polônia e dos Estados bálticos, caso a milícia curda YPG não fosse reconhecida como terrorista.

Colegas europeus do presidente francês também têm se inquietado com suas declarações relativizando a ameaça de Vladimir Putin, temerosos de que isso debilite o consenso formado após a invasão da Crimeia, em 2014, em razão do qual a Otan vem promovendo operações de tropas multinacionais nos Estados bálticos e na Polônia.

Tais divergências permitem questionar até que ponto, no caso de uma improvável agressão a um dos aliados, o pacto de defesa mútua, pilar de sustentação da Aliança consagrado no artigo 5.º da sua Constituição, seria efetivo. Isso num momento em que, como diz a declaração oficial da cúpula, aos velhos desafios pós-guerra fria, como as hostilidades da Rússia, o terrorismo, as imigrações irregulares, somam-se novos riscos “emanando de todas as direções estratégicas”, como as ameaças cibernéticas e híbridas, e – numa menção inédita – a “influência crescente da China”.

Contrariando Macron, a declaração foi bastante enfática quanto aos riscos que a Rússia impõe à segurança euro-atlântica, sobretudo após a ampliação de seu arsenal de mísseis que levou neste ano à revogação do Tratado de Forças Nucleares de Médio Alcance.

A declaração sugere protocolarmente que a China apresenta “tanto oportunidades quanto desafios”. Em entrevista, o secretário-geral Jens Stoltenberg foi mais explícito: “Os vemos no Ártico, na África, os vemos investindo pesado em infraestrutura europeia e claro no ciberespaço”. Como ele notou, a China logo será a maior economia do mundo e já tem o segundo maior orçamento de defesa. “Nos últimos cinco anos, a China acrescentou 80 navios e submarinos à sua marinha, o equivalente à marinha britânica”, e “desenvolveu um míssil intercontinental capaz de atingir os EUA e a Europa.” Os desafios extrapolam a esfera militar: “A China está se tornando líder em tecnologia, do 5G ao reconhecimento facial, e da computação quântica ao acúmulo de vastas quantidades de dados globais”.

Mas entre ameaças reais e potenciais, a Otan chega aos 70 anos em forma. Não sem propósito, declara-se como “a mais forte e mais bem-sucedida Aliança da história”. A Otan responde por 70% dos gastos mundiais com defesa. Neste ano, nove países atingiram a meta de aplicar 2% de seu PIB em defesa, e em 2020 o Canadá e os europeus investirão US$ 130 bilhões a mais do que investiram em 2016. O que a cúpula mostrou é que o maior desafio da Aliança talvez venha de dentro. Se há algo positivo a se tirar da retórica abusada de líderes como Macron e Trump, é que ela expõe às claras as fissuras que cabe à diplomacia sanar.

O Estado de S. Paulo

As corporações reagem

Associações de funcionários públicos recorrem ao Judiciário para tentar reaver benefícios e privilégios

Um dia após o Congresso Nacional promulgar a Emenda Constitucional (EC) 103/19, que altera as regras relativas a aposentadorias e pensões, seis associações de servidores públicos ingressaram com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade de dispositivos da reforma da Previdência. Trata-se de uma manobra conhecida. Basta o Legislativo contrariar seus interesses para que as corporações corram ao Judiciário, na tentativa de reaver benefícios e privilégios.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) apresentou duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) contra a reforma. As petições também foram assinadas por mais quatro entidades – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT).

A argumentação das cinco associações é chocante, muito especialmente pelo fato de que os membros dessas entidades são servidores com formação na área jurídica. Em tese, deveriam conhecer e respeitar a Constituição. Por exemplo, numa das ações, as associações insurgem-se contra o aumento da alíquota de contribuição previdenciária. A EC 103/19 estabeleceu um porcentual progressivo para as alíquotas, variando de 12% a 19%, a depender do salário do servidor público. Antes, havia apenas uma única alíquota, de 11%. Segundo as entidades, a mudança de alíquota fere cláusulas pétreas da Constituição. Parece não haver limites para o descaramento. A Carta de 1988 estabelece apenas quatro cláusulas pétreas. Não pode haver proposta de emenda tendente a abolir (i) a forma federativa de Estado; (ii) o voto direto, secreto, universal e periódico; (iii) a separação dos Poderes e (iv) os direitos e garantias individuais.

A segunda ação da AMB, com as outras quatro entidades, volta-se contra o § 3.º do artigo 25 da EC 103/2019, que exige, para o cômputo do tempo de exercício de outra atividade no cálculo da aposentadoria, a comprovação por parte dos juízes e procuradores do pagamento das contribuições ao INSS referentes à atividade profissional anterior. Trata-se de uma questão básica: o sistema previdenciário nacional tem caráter contributivo. No entanto, as entidades voltam a sustentar que a alteração fere cláusulas pétreas.

A terceira Adin contra a reforma da Previdência foi proposta pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Ela também questiona a progressividade das alíquotas das contribuições previdenciárias. Para tanto, vale-se de um argumento sempre presente nas contendas por interesses corporativos – o princípio da isonomia. Cada corporação almeja que lhe seja aplicada a regra mais benéfica. O efeito é desastroso. Todo ganho obtido por uma categoria é estendido, por via judicial, para as outras categorias. No caso, a Ajufe reclama que haveria um tratamento não isonômico entre servidores federais e estaduais.

Cabe ao Judiciário rejeitar, com rigor, as três ações dessas entidades. Depois de uma longa tramitação, o Congresso aprovou a reforma da Previdência, com objetivo de atualizar as regras, reduzir o déficit e diminuir as desigualdades entre os dois sistemas previdenciários, o geral e o público. Não faz sentido que a vitória obtida no Legislativo seja anulada ou mitigada pelo Judiciário.

Recentemente, o STF julgou improcedente uma ação da AMB contra a reforma da Previdência de 2003. Por unanimidade, o plenário da Corte rejeitou a alegação da entidade de que as normas da EC 41/2003, ao alterarem o regime previdenciário dos servidores e magistrados aposentados, tinham invadido matéria reservada à iniciativa legislativa do Judiciário. Além de não ter fundamento constitucional, a pretensão da associação era a continuidade do privilégio, almejando que as aposentadorias e pensões dos juízes fossem regidas por regras exclusivas, propostas pela própria classe. Tais manobras são incompatíveis com o Estado de Direito.

Folha de S. Paulo

Decisão sensata

Plenário do STF acaba com incerteza criada por Toffoli para conter investigações

Ao disciplinar o acesso de órgãos de investigação a informações sigilosas detidas pelo governo, o Supremo Tribunal Federal fez o bom senso finalmente prevalecer numa discussão que se prolongou por meses desnecessariamente.

Nesta quarta-feira (4), o plenário da corte decidiu que a Receita Federal e a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), vinculada ao Banco Central, podem compartilhar dados com o Ministério Público e a polícia sem a necessidade de uma autorização judicial prévia —e sem restrições.

Basta que os investigadores protejam o sigilo garantido pela Constituição às informações bancárias e fiscais dos alvos de suas apurações. Cabe à Justiça exercer o controle posteriormente em casos de vazamento ou mau uso dos dados.

O Supremo estabeleceu ainda o entendimento de que a comunicação entre esses órgãos e o repasse das informações devem ocorrer sempre de maneira formal e por meio de canais oficiais —uma norma já prevista pela legislação, mas nem sempre respeitada.

A orientação foi amparada pela formação de ampla maioria no STF. Somente 2 dos 11 ministros que integram a corte divergiram, opinando pela necessidade de autorização judicial prévia para compartilhamento das informações.

A decisão põe fim à incerteza criada por uma decisão do ministro Dias Toffoli, que preside o tribunal e determinou em julho a suspensão de todas as investigações em andamento no país que fossem baseadas em informações de órgãos como a Receita e a UIF.

Toffoli o fez de forma monocrática, assinando uma ordem de caráter provisório, para atender a um pedido do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro que é investigado pelo Ministério Público do Rio.

Ao estender a decisão a outros casos semelhantes, Toffoli paralisou centenas de investigações em todo o país e travou a ação da UIF, que neste ano assumiu as funções do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O presidente do Supremo chegou ao ponto de exigir que a Receita e o Banco Central lhe dessem acesso a todas as informações compartilhadas com órgãos de investigação nos últimos anos —decisão da qual acabou por recuar diante da repercussão embaraçosa.

Após quase cinco meses de indefinição, Toffoli desistiu de impor restrições aos investigadores, modificando seu voto para juntar-se à maioria formada pelo colegiado no julgamento da questão.

Como infelizmente se tornou comum de tempos para cá, um integrante do STF impôs à corte enorme desgaste ao tomar uma decisão de grande alcance sem submetê-la ao plenário. O desfecho da controvérsia mostrou mais uma vez que a manifestação do colegiado é o melhor caminho para conferir credibilidade às decisões do tribunal.

Folha de S. Paulo

Cannabis tardia

Norma facilita venda de remédios à base de maconha, mas falha ao vetar cultivo

Chega tarde e com timidez a regulamentação de produtos feitos à base de Cannabis para fins terapêuticos aprovada pela Anvisa. Ainda assim, é positivo que a resolução tenha finalmente saído dos escaninhos da agência sanitária.

Data de 2006 a legislação que autoriza a União a disciplinar a utilização, para fins medicinais e pesquisas científicas, de plantas das quais se possam extrair drogas ilícitas. Em mais de uma década, entretanto, sucessivas administrações pouco fizeram pela matéria.

Na principal falha da regulamentação agora apresentada, a Anvisa vetou o cultivo da planta por qualquer agente. Com isso, a matéria-prima terá de ser importada, o que limita a possibilidade de redução dos preços ao consumidor.

Não se trata de mero detalhe. O único medicamento à base de maconha vendido hoje nas farmácias brasileiras, o Mevatyl, um composto de canabidiol (CBD) e tetraidrocanabinol (THC), indicado para portadores de esclerose múltipla, custa mais de R$ 2.000 a caixa, que é suficiente para cerca de um mês de tratamento.

Com preços assim exorbitantes, não surpreende que pacientes optem por consumir a maconha in natura, que pode ser obtida a um custo muito menor por meio de um traficante —desserviço à saúde pública e incentivo ao crime.

De mais importante, quando a resolução estiver em vigor, dentro de cerca de três meses, produtos à base de Cannabis poderão ser mais facilmente registrados no Brasil. Será mais simples e menos burocrático importá-los ou produzi-los.

A medida vale por três anos, durante os quais os preparados passarão pelo escrutínio da agência, que, em tese, toma decisões a partir de evidências científicas —e não de preferências, como parece ser a regra nos ministérios.

Não há razão para a medicina deixar de valer-se de princípios ativos úteis apenas porque eles provêm de uma planta em torno da qual existe uma polêmica cultural.

A facilitação do registro não elimina o debate em torno da legalização para fins recreativos, que mais cedo ou mais tarde o país terá de enfrentar. Esta Folha defende que não cabe ao Estado decidir quais substâncias o cidadão pode consumir, desde que ele esteja ciente dos riscos que corre e não coloque terceiros em perigo.

Valor Econômico

Mudança do mapa político coloca em risco o Mercosul

É impossível prever seu futuro, mas, em uma atmosfera propensa a conflitos, tudo o que puder dar errado, dará

A insatisfação dos eleitores na América do Sul colocou governos de direita e de esquerda igualmente em apuros. A desaceleração econômica, primeiro, e o baixo crescimento, depois, não pouparam os esquerdistas da Frente Ampla, no Uruguai, Evo Morales, na Bolívia, e Lenín Moreno, no Equador. Foram igualmente destrutivos para governos liberais, como o de Mauricio Macri, na Argentina, devastando a popularidade dos direitistas Sebastián Piñera, no Chile, e Ivan Duque, na Colômbia, testados por enormes manifestações de rua.

O panorama político é movediço e multifacetado, assim como seus principais atores. Há esquerdas que diferem bastante entre si, como os peronistas argentinos e os da frente governista uruguaia. E uma distância considerável entre direitistas como o presidente Jair Bolsonaro e o presidente eleito uruguaio, Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, que desalojou do poder, após 15 anos, a Frente Ampla.

O redesenho político produziu inevitavelmente novas tensões no principal bloco econômico da região, o Mercosul, e pôs um ponto de interrogação sobre seu destino. Bolsonaro e Alberto Fernández, peronista que passa a ocupar a Casa Rosada a partir do dia 10, agrediram-se durante e depois da campanha eleitoral argentina. No balanço interno do bloco, o pêndulo político não se inclina para a Argentina, embora não se desloque inteiramente para o Brasil, pois Lacalle Pou, que tem uma agenda liberal na economia, diverge no tratamento de questões sociais. O Paraguai tem boas relações com o governo Bolsonaro.

As mudanças políticas tiveram efeitos opostos nos países que se associaram ou se aproximaram do Mercosul. A Venezuela, que contava com a benevolência do governo uruguaio, deixará de tê-la com o novo presidente. No campo externo, disse Lacalle Pou, “vamos chamar os ditadores de ditadores”. O que não significa, porém, que Juan Guaidó, reconhecido pelo governo brasileiro, terá o apoio uruguaio. A Bolívia tende a ser ideologicamente mais amigável, apesar do pragmatismo de Evo Morales nos últimos anos – ele compareceu à posse de Bolsonaro, por exemplo. Não está certo se o liberal Carlos Mesa vencerá as novas eleições, já que o bom desempenho econômico de Morales poderá render a vitória a seu Movimento ao Socialismo, embora esse não seja o cenário mais provável.

O Brasil impulsiona no bloco a abertura econômica, que encontrará na Argentina seu principal obstáculo. Fernández disse que tem restrições ao acordo firmado pelo Mercosul com a União Europeia e seu discurso possui todas as marcas do protecionismo kirchnerista, que caracterizou os governos de sua vice, Cristina Kirchner. O governo Bolsonaro propôs uma redução da tarifa externa comum (média de 14% hoje), que foi discutida rapidamente na reunião de cúpula do Mercosul em Bento Gonçalves, ontem. Não houve decisão porque estavam presentes governos que foram rejeitados nas urnas e ausentes os novos presidentes. Mas é quase certo que a iniciativa liberal do Brasil será rejeitada por Buenos Aires.

Do lado brasileiro, há indefinição. O Itamaraty e a ala dura do governo lançaram vários balões de ensaio: se a Argentina se fechar, o Brasil abandonará o bloco. Alguns líderes políticos, que não são bolsonaristas, acreditam que é necessário rebaixar a pretensão do bloco e regredir para uma área de livre comércio, uma vez que a união aduaneira consubstanciada no Mercosul pouco avançou.

Lacalle Pou quer mais espaço para negociar acordos individualmente, o que não desagrada, em tese, o Brasil, às turras com a Argentina. Unidos pela agenda liberal, porém, estão a léguas de distância na social. Pou deixou claro que não revogará as medidas da Frente Ampla, que legalizou o casamento homossexual, o aborto e a maconha. Seu problema interno é um aliado, Guido Manini Rios, de extrema direita. O novo presidente precisará do apoio na Câmara dos 11 deputados do Cabildo Aberto, de Rios. Como Bolsonaro, Rios defende ex-torturadores e ditadores.

Pou mantém a esperança de que “o pragmatismo vai superar a ideologia”, referindo-se ao relacionamento entre os dois sócios maiores do Mercosul. Tanto em Brasília como na Casa Rosada, o clima é de beligerância e desprezo mútuo. A inclinação protecionista argentina é evidente e é possível que o país volte ao “comércio administrado” que infernizou o Mercosul e, em especial, os exportadores brasileiros. É impossível prever seu futuro, mas, em uma atmosfera propensa a conflitos, tudo o que puder dar errado, dará.

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