Folha: Presidente da OAB vai ao STF contra fala de Bolsonaro

Na ação, Felipe Santa Cruz argumenta que dar informações falsas sobre desaparecidos é crime

Thais Arbex e Daniel Carvalho – Folha de S. Paulo

Brasília- O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, ingressou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para que Jair Bolsonaro esclareça as informações que diz ter a respeito da morte de seu pai, Fernando Santa Cruz, desaparecido na ditadura militar.

Ele pede que Bolsonaro esclareça se “efetivamente tem conhecimento das circunstâncias, dos locais, dos fatos e dos nomes das pessoas que causaram o desaparecimento forçado e assassinato” de Santa Cruz e se o presidente sabe o nome dos autores do crime e onde está o corpo.

O presidente da OAB questiona por qual razão, caso Bolsonaro tenha tais informações, ele não denunciou os fatos ou mandou apurar a “conduta criminosa revelada”.

“A negativa de informações ou a prestação de informações falsas sobre o paradeiro de pessoas desaparecidas constitui ação que integra a prática do crime de desaparecimento forçado e que atinge a esfera subjetiva dos familiares da vítima, também sujeitos passivos da violação”, diz a ação ao STF.

Santa Cruz afirma ao Supremo que, caso tenha realmente informações sobre as circunstâncias da morte de seu pai, Bolsonaro “tem o dever legal e básico” de revelá-las ou, se não as tem, pratica manobra diversionista para ocultar a verdadeira autoria de criminosos que atuaram nos porões da ditadura civil-militar, de triste memória”.

A interpelação é assinada pelos ex-presidentes da OAB. Como revelou a colunista Mónica Bergamo, os antigos dirigentes figuram como advogados de Santa Cruz.

Chancelam o documento nomes como Cláudio Lamachia, Cezar Britto, Marcus Vinícius Coelho, Ophir Cavalcante, Marcello Lavenére, Roberto Busato, Reginaldo Oscar de Castro e Roberto Batochio.

Nesta quarta (31), Bolsonaro voltou a afirmar que não quebrou o decoro ao dizer que poderia dizer a Santa Cruz como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar (1964-1985).

“Não tem quebra de decoro. Quem age desta maneira, perde o argumento”, disse Bolsonaro, ao deixar o Palácio da Alvorada pela manhã.

“Muita coisa aconteceu, lamentamos muita coisa. Mas não pode valer um lado só da história. E como eu sempre disse: Alguém acredita que o PT está preocupado com a verdade? Tá de brincadeira.”

“Quando aqueles caras criaram a Comissão da Verdade, eles deram gargalhadas. Vocês da imprensa sabem o que é informação, contra informação e contra contrain-formação. É muito simples”, afirmou o presidente.

Criada em 2011 e instalada em 2012, durante o governo Dilma Rousseff (PT), a Comissão Nacional da Verdade teve por finalidade apurar graves violações contra os direitos humanos de setembro de 1946 a outubro de 1988. Ela foi concluída em dezembro de 2014.

Seus integrantes foram advogados, especialistas em direitos humanos, um ex-procurador geral da República e um ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Foram ouvidos vários militares que atuaram na repressão às organizações de esquerda durante a ditadura militar (1964-1985).

A CNV trabalhou com diversas bases documentais, mas as principais informações vieram das Forças Armadas.

Fernando Santa Cruz desapareceu em fevereiro de 1974, após ser preso por agentes do DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura militar, no Rio de Janeiro. Felipe, atual presidente da OAB, tinha dois anos.

No último dia 24, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), hoje ligada ao ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, emitiu um atestado de óbito de Santa Cruz, no qual informa que ele morreu de forma “violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.

Esse tipo de declaração é considerado reparação moral, eqüivalendo ao reconhecimento da culpa do Estado.

Segundo depoimentos do ex-analista do DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura militar, Marival Chaves, Santa Cruz foi assassinado, junto com outros ex-integrantes da organização de esquerda Ação Popular, numa operação executada por conhecidos militares da repressão, como o então coronel do Exército Paulo Malhães (1937-2014), que assumiu ter conhecimento de diversos atos de tortura e assassinato de opositores políticos.

Na segunda-feira (29), Bolsonaro disse que tinha informações divergentes sobre a morte de Santa Cruz.

Ao reclamar sobre a atuação da OAB na investigação de Adélio Bispo, autor do atentado à faca de que foi alvo, Bolsonaro afirmou: “Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB? Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto pra ele”.

Após a manifestação, Bolsonaro voltou afalar sobre o assunto em uma live nas redes sociais. Ele negou que militares sejamos culpados pelo desaparecimento de Santa Cruz e acusou o grupo Ação Popular pelo assassinato — o que contraria documentos e explicações oficiais dadas à família.

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