No Jornal Nacional, Marcelo Calero critica inquérito da censura aberto pelo STF

Alexandre de Moraes autoriza busca de arquivos digitais no inquérito que investiga ofensas a ministros do STF

Ele determinou o bloqueio de contas em redes sociais de oito investigados. Os mandados se basearam em opiniões negativas dessas pessoas sobre o STF e em ofensas à corte.

Jornal Nacional – TV Globo

O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes autorizou nesta terça-feira (16) buscas de documentos e arquivos digitais e determinou o bloqueio de contas em redes sociais de oito investigados. Ordenou, também, que todos prestassem depoimento à Polícia Federal. Os mandados se basearam em opiniões negativas dessas pessoas sobre o STF e em ofensas à Corte. Em alguns casos, as buscas se basearam no que o STF considerou ser ameaças ao tribunal.

Veja aqui o vídeo da reportagem

Os policiais federais cumpriram os mandados em São Paulo, Goiás e em Brasília. A TV Globo teve acesso à decisão do relator. O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes autorizou buscas de documentos e arquivos digitais.

O despacho que informa que a apuração é sobre “a existência de notícias fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e infrações que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares”.

Esse inquérito foi aberto em março por ordem do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, sem pedido de órgãos de investigações, o que é uma exceção.

Na decisão, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que “os documentos e informações juntados até o momento aos autos fornecem sérios indícios de prática de crimes” e que “verifica-se a postagem reiterada em redes sociais de mensagens contendo graves ofensas a esta corte e seus integrantes, com conteúdo de ódio e de subversão da ordem”.

O despacho listou os alvos das buscas e as suspeitas relacionadas às postagens feitas em 2018 e 2019. O relator argumentou que as mensagens têm conteúdo de “propaganda de processos ilegais para alteração da ordem política e social”.

Segundo a decisão “no caso de Omar Rocha Fagundes, por exemplo, há publicação em que se vê a seguinte frase: ‘O nosso STF é bolivariano, todos alinhados com os narcotraficantes e os corruptos do país. Vai ser a fórceps’”.

Em outra postagem, segundo a decisão, Omar incita a população a impedir o livre exercício dos poderes da União, afirmando que “o Peru fechou a corte suprema do país. Nós também podemos! Pressão total contra o STF”. Segundo o ministro, ele é membro da Polícia Civil do estado de Goiás, “andando constantemente armado”.

Em relação a Isabella Sanches de Souza Trevisani, a decisão afirmou que “ela postou nas redes sociais que se lê ‘STF vergonha nacional! A vez de vocês está chegando´”. Em outro momento, “atribuiu a um ministro da suprema corte fato definido como crime ou ofensivo à reputação: ‘Esta é a recepção do ministro ladrão de toga’ (enquanto exibe uma cesta com ovos, em vídeo publicado em 29/03/2019”.

Sobre Carlos Antônio dos Santos, a decisão relatou que o alvo postou: “STF soltou até traficante. Em outra postagem, “incita a população a impedir o livre exercício dos poderes da União, afirmando que: ‘É desanimador o fato de tantos brasileiros ficarem alheios ao que a quadrilha STF vem fazendo contra a nação´”.

Sobre Ermínio Aparecido Nadin, a decisão diz que ele compartilhou publicações como: “Não tem negociação com quem se vendeu para o mecanismo. Destituição e prisão. Fora STF”. Em outra ocasião “imputa fato ofensivo à reputação de ministros: ‘Máfia do STF: empunha papéis e canetas, protege criminosos, cobra propinas de proteção de corruptos, manipula a lei, mata pessoas’”.

No caso de Paulo Chagas o despacho afirma que “há postagens nas redes sociais de propaganda de processos violentos ou ilegais com grande repercussão entre seguidores; em pelo menos uma ocasião o investigado defendeu a criação de um tribunal de exceção para julgamento dos ministros do STF ou mesmo substituí-los”.

Gustavo de Carvalho e Silva e Sérgio Barbosa de Barros foram alvos das buscas em Campinas e São Paulo.

O ministro Alexandre de Moraes ordenou que, após as diligências, todos os suspeitos prestem depoimentos à Polícia Federal.

Para o jurista Thiago Bottino, professor da Fundação Getúlio Vargas, as postagens não podem ser interpretadas como ameaça se não houver mais outros indícios do crime. Ele acrescenta que, muitas vezes, ministros do Supremo precisam tomar decisões contrárias à opinião publica, para fazer valer o que está na Constituição e não devem se melindrar com críticas.

“Primeiro, o crime de ameaça existe quando essa ameaça é real, efetiva. O fato de simplesmente postar coisas na internet não necessariamente reflete o desejo de realizar aquele tipo de atividade. Com relação a ofensas, é muito comum que funcionários públicos, como juízes, estejam mais expostos a esse tipo de reclamação do público. Quando você vai ao Maracanã e xinga o juiz dizendo que ele é um ladrão as pessoas não estão realmente querendo dizer que ele é um ladrão. As pessoas estão simplesmente indignadas, reagindo daquela forma. E as decisões do Supremo devem gerar esse tipo de indignação porque elas, muitas vezes, são contrárias ao que a maioria quer, ao que a maioria pensa. A pessoa que toma esse tipo de decisão e sabe que ela gerará esse tipo de reação não pode ficar melindrada com ofensas que fazem parte da sua atividade”, afirmou.

A operação repercutiu no Congresso. O senador Randolfe Rodrigues, da Rede, vê exageros do Supremo nas ações desse inquérito.

“É um caminho muito perigoso para a democracia brasileira. Primeiro a corte constitucional que deveria ser a guardiã da Constituição estabelece censura a meios de comunicação, ferindo um princípio sensível da própria Constituição. Complementar a isso, o que faz? Se autoprovoca, em algo inédito na história jurídica do mundo, para realizar busca e apreensão àqueles que criticam. Qual vai ser o próximo passo? Fazer busca e apreensão, fechar o Congresso e procurar aqueles parlamentares que criticam o Supremo? É um caminho tenebroso para a democracia brasileira. O Senado necessita, em defesa da democracia, reagir”.

O inquérito foi aberto no dia 14 de março por ordem do presidente do Supremo, Dias Toffoli. A portaria que instaurou o inquérito não deixou claro o alcance da investigação nem quais são as pessoas investigadas. Toffoli se valeu do artigo 43 do regimento interno do Supremo, que prevê investigações se ocorrer infração na sede do tribunal, e avaliou que os ministros têm jurisdição nacional, são ministros onde estiverem, por isso o inquérito podia ser aberto.

De lá para cá já houve duas operações: a desta terça-feira e a do dia 21 de março, e duas buscas: uma em Alagoas e outra em São Paulo. Os alvos eram suspeitos de postagens com ofensas a ministros.

A investigação vem recebendo críticas de procuradores e juristas, que dizem que falta delimitar o que está sendo apurado, ou seja, o objeto do inquérito; que o relator não deveria ter sido escolhido pelo presidente do Supremo e sim sorteado, como é o usual; e que o inquérito não podia ser aberto de ofício, só se houvesse pedido de algum órgão de investigação.

O deputado federal Marcelo Calero, do Cidadania, também criticou a investigação: 

“A gente parece que está diante de um tribunal da Inquisição porque a mesma corte que abre a investigação, determina as diligências e depois vai julgar. Está se criando um clima muito ruim, muito perverso para a nossa democracia de atentado contra a liberdade de expressão”.

E foi também nesse mesmo inquérito que o ministro Alexandre de Moraes tomou outra decisão muito criticada: censurou sites e mandou retirar reportagem que relatava que Marcelo Odebrecht disse que a empreiteira tratava Dias Toffoli como Amigo do Amigo de Meu Pai nos e-mails internos – sem menção a dinheiro ou a pagamentos. O ministro Alexandre de Moraes determinou a retirada da reportagem da revista Crusoé do site, afirmando que as informações eram falsas. A revista afirmou que a reportagem se baseou em informações verídicas, que constam dos autos da Lava Jato. A TV Globo confirmou que o documento citado pela revista foi de fato anexado aos autos do processo.

O advogado da revista Crusoé, André Marsiglia dos Santos, confirmou que um dos sócios da revista, Mário Sabino, foi ouvido nesta terça pela Polícia Federal em São Paulo por determinação do ministro Alexandre de Moraes.

Na tarde desta terça-feira, o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello chamou a decisão de censura e disse à TV Globo que o Supremo sempre esteve engajado na preservação da liberdade de informação e de expressão e que a decisão do colega Alexandre de Moraes é um retrocesso. E que mandar tirar do ar uma reportagem que cita integrante da corte parece “atuar em causa própria e é inconcebível”.

Nesta terça, o ministro Luiz Edson Fachin, do STF, pediu informações ao colega Alexandre de Moraes sobre censura a sites. O procedimento de pedido de informações é praxe e está previsto em lei. Fachin pediu a manifestação de Moraes após ação da Rede, que requereu decisão para revogar a censura.

Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil disse que, “em qualquer democracia, a liberdade vem atrelada à responsabilidade, não sendo crível afastar de responsabilização aqueles que, por qualquer razão ou interesse, possam solapar o correto uso da liberdade garantida para fins proibidos na legislação brasileira, mas somente após obedecidos os princípios da ampla defesa e do contraditório, dentro de um devido processo legal”.

E afirmou que “a liberdade de imprensa é inegociável, até porque é fundamento da democracia representativa, razão pela qual a diretoria do conselho federal e o colégio de presidentes da OAB esperam o pleno respeito à Constituição federal e a defesa da plena liberdade de imprensa e de expressão”.

O que dizem os citados

Paulo Chagas disse que está absolutamente tranquilo e considera que apenas expressa sua própria opinião.

Em uma rede social, Isabella Sanches de Souza afirmou que é contra o que chamou de ditadura do Judiciário, arbitrariedade e censura.

Gustavo de Carvalho e Silva negou que tenha feito ofensas ou ameaças contra ministros do STF. Ele disse que já tinha sido intimado, prestou depoimento à Polícia Federal há dez dias e ficou surpreso com a operação desta terça.

O JN não conseguiu contato com Carlos Antônio dos Santos, Ermínio Aparecido Nadin, Sérgio Barbosa de Barros e Omar Rocha Fagundes.

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